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Incursões

Instância de Retemperação.

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Instância de Retemperação.

Diário Político 180

mcr, 11.09.12

 

 

 

 

A caça às bruxas em versão nacional-bolchevique

 

 

 

Um Jdanov(zinho) de algibeira metido a Vichinsky doméstico entendeu expender em dois longos artigos no “Público” uma caricata “crítica” de uma História de Portugal coordenada por Rui Ramos e oferecida aos fascículos no “Espresso”. 

 

Quando li aquela vil sandice, esfreguei os olhos: não me recordava de RR exaltar Salazar, branquear o colonialismo etc... etc...

 

Entendia até, e isso mesmo terá aqui sido salientado, que esta "História de Portugal" vinha preencher um enorme vazio pois nada havia no género desde a congénere tentativa de Oliveira Marques, ha muito esgotada e desactualizada. Aliás, a crítica -especializada ou não - saudara entusiasticamente esta edição e, se bem me lembro, RR e os seus dois parceiros neste intento tinham mesmo recebido um importante prémio. 

 

Que RR não é um "revolucionário" (queira isso significar o que se quiser) não é novidade nenhuma.  Todavia, comparando a sua démarche (para já não falar nos seus estilo e escrita) com a de alguns representantes dessa outra tendência historiográfica, facilmente se detecta que em questão de "empapamento ideológico" (para usar uma expressão sinistra e infeliz de Fernando Rosas) está bem abaixo dos seus detractores (Rosas incluído). Ou de um jovem Avelãs Nunes que agora também saiu a terreiro na defesa de um excelso historiador do "fascismo" nacional. 

 

 

 

Este debate, que tem ocupado as páginas do "Público" caracteriza-se por algo de extraordinário. Por um lado RR foi acusado de uma extravagante defesa de Salazar  que nenhum leitor sério e honrado pode partilhar. Não há tal defesa, bem pelo contrário, não há branqueamento, ocultamento, olvido, desculpa, sequer simpatia pelo cavalheiro de Santa Comba. 

 

Num primeiro momento RR veio a terreiro e desfez as tolas acusações (e difamatórias) de que fora alvo. 

 

Esqueceu-se de referir que não tem culpa do sucesso absolutamente invulgar da venda do seu livro. Só isso dava para muito rapazola se sentir agravado. "Ai o mariola vai já na 5ª edição? Deixa estar que já tas canto…"

 

Entretanto, várias pessoas saíram a terreiro em defesa do bom nome de Ramos. 

 

Num segundo momento, Fernando Rosas entendeu dever pontificar. Pontificar, repito, pois FR, depois da sua assinalada entrada como comentador nas televisões, assumiu uma postura bizarra de pequeno oráculo político. 

 

Começando por declarar que todos têm direito a opinar (olha a novidade!…) FR recorre ao habitual truque de pôr em igualdade ofensor e ofendido, agressor e agredido. É a sua(dele) ideia de democracia. 

 

Faltando-lhe seguidamente argumentos para provar que RR branqueava o salazarismo, eis que Rosas desvia o tiro para a "1ª república". E vá de  atacar a ferocidade de RR quanto aos desastrosos (o adjectivo é meu e de uma esmagadora maioria de historiadores de todas as tendências que se debruçaram sobre o período) dezasseis anos de "República". 

 

Mas nem sequer aí Rosas atinge o alvo. Mais uma vez, assaca a RR  intenções e opiniões que qualquer vulgar estudioso do período 1910-1926   sabe reconhecer. Não vou aqui fazer o processo desses anos tumultuosos, carregados de intentonas, revoluções, golpes e contragolpes. Não vale a pena lembrar a severa condenação do regime e dos governos que levaram a cabo uma política tão anti-operária que a CGT qualificou de "racha sindicatos" e que está descrita, por exemplo, por César Oliveira ou Pacheco Pereira. Não é necessário lembrar as milícias partidárias à solta, a "formiga branca", os espancamentos na via pública, os ataques aos jornais adversários do partido democrático, os empastelamentos, a ofensiva gratuita contra o clero, os assassínios (e nem sequer refiro a "camioneta fantasma" cujos tripulantes abateram altas figuras da Revolução de 1910) de dezenas de pessoas, os atentados, a contínua dança de governos, as crises endémicas política e financeira.  

 

Não serve RR? Leiam-se António José Telo, Douglas Wheeler ou mais uma boa dúzia. Não servem? Leiam-se Raul Brandão, José Relvas ou João Chagas. 

 

E se nada disso chegar, atente-se que o 28 de Maio tem a assinatura de muitos e prestigiados republicanos (Gomes da Costa, Cabeçadas, por exemplo) de maçons (Carmona) de ex-ministros da República (por todos Cunha Leal), para já não falar da benigna expectativa de sectores da Esquerda (Seara Nova incluída) para com o movimento, melhor dizendo o "passeio" entre Braga e Lisboa. 

 

Tudo isto, porém, deve ser faits-divers para Rosas e para o seu defendido afilhado. No fundo, a História é para ser exercida por gente que pense pela mesma estreita cartilha embebida, mas não empapada, em progresso, amor pelo povo e muito materialismo histórico.  E outro tanto, senão mais,  de materialismo dialéctico. (Mal usados, um e outro, acrescente-se, mas isso deriva de outros factores e de uma deformada e exígua formação marxista: quem contra todas as evidências, tapou os olhos e os ouvidos a Praga 68, aos gulags, à degenerescência dos estados de democracia popular e ao abalo da Revolução Cultural, pode dar-se ao luxo de confundir agressores e vítimas, fascismo mau e fascismo bom (o que se se personificou nos infames pactos Ribentrop-Molotov, na entrega de refugiados alemães aos nazis, no apoio em bens e géneros de toda a ordem ao Reich quando este atacava as democracias ocidentais).

 

Em Portugal, as discussões têm sempre este lado escabroso. À falta de argumentos utiliza-se a cacetada e a confusão. Ao fim e ao cabo, daqui a dias já ninguém se lembra.

 

 

 

A latere: que este modesto caso não nos faça esquecer o excelso cavalheiro Relvas, subitamente tão discreto e silencioso.

 

ainda a latere: alguém viu por aí o tão prometido esclarecimento completo dos métodos usados pela universidade lusófona para atribuir créditos a quem não segue o percurso vulgar de estudos necessários à obtenção de licenciatura? 

 

 

 

 

 

nota final: os leitores terão reparado que não se identifica a criatura que em duas peças de má prosa e pior ética (?) atacou Rui Ramos. Esta gente não merece que sujemos metaforicamente o dedo dactilográfico com o seu nome. 

 

d'Oliveira fecit

 

 

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