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Incursões

Instância de Retemperação.

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Instância de Retemperação.

Au Bonheur des Dames 140

d'oliveira, 29.09.08

É uma casa portuguesa, com certeza...

Eu andei a fugir deste tema como o Demo da Cruz. É que, leitoras gentis e pacientes, eu faço parte dum pequeno clube, o clube dos camelos com três bossas de que foi fundador e presidente perpétuo o Rui Feijó e secretario geral o que abaixo se assina. Para ser membro do clube apenas era preciso ser português, ter vergonha na cara e acreditar que há limites que não se ultrapassam.
Os sócios não abunda(va)m, como calcularão. E com a morte do Rui, o clube periclita mas mantêm-se.
Portanto, eu a fugir de falar das casinhas lisboetas, acreditando que grande parte dos beneficiários viria dizer das suas razões, entregar as casas, desculpem lá qualquer coisinha, mas nada. Raspas de nada!
Ora pratiquemos: a Câmara de Lisboa, ao longo os últimos trinta anos (ou mais...) foi recebendo andares, apartamentos de diversos tamanhos nos mais diferentes locais da cidade. As notícias avançam que há 3.200 habitações nestas condições. Pelo menos!
Ou seja Lisboa, melhor dizendo a sua autocrática Câmara, teve ao seu dispor 3200 chaves para premiar, oferecer, recusar, emprestar, barganhar, uns milhares de cidadãos escolhidos a esmo entre conhecidos, edis, artistas, motoristas, desgraçadinhos, protegidos, coristas, arrivistas e eleitores. Três mil e duzentos “chefes de família”. Eleitores como já se disse. Beneficiados sem um motivo claro, dentre o montão de postulantes.
E quem é que dava o bodo aos pobres? Pois a vereadora da habitação sendo certo que o senhor presidente da Câmara saberia disso ou pelo menos não desconheceria a prática. Prática que vem de longe como a fama do brandy Constantino.
Não estamos a falar dos bairros sociais onde (Camelo de 3 bossas), julgo, haverá regras mais conformes com o Direito e a Justiça. Estamos a falar de “um património disperso”, proveniente de contra-partidas entregues à CML (e porventura a mais câmaras no país...) sobre o qual não há controle de qualquer espécie. Aliás não se sabe exactamente quantas habitações existem, onde estão localizadas, quem as usa (e abusa), quanto valem no mercado, quanto rendem, em que estado de conservação estão. O relatório onde esses dados constam não foi entregue à CML porque esta não o pagou!!!
Eu sou proprietário em Lisboa. Com a minha excelente Mãe e o meu não menos excelente irmão. Temos a (des)dita de ser donos de três prédios em bom estado, nos quais apesar das rendas miseráveis que recebemos sempre fizemos obras, mesmo quando a CML não o impôs. É que, camelos com três bossas (desculpa lá Mãe, desculpa lá irmão) sempre entendemos que devíamos algum respeito à cidade, aos inquilinos e a nós próprios.
Não vos conto quanto custa a mais simples obra, os malditos andaimes, o inferno burocrático a percorrer para obter a mais simples licença, os amargos de boca, a insolência de certos serviços, o ar condescendente com que nos recebem como se também nos fossemos pedir uma casinha à Câmara. Poderia, todavia, dizer que estas obras úteis, necessárias ou imperiosas se têm feito e pago com receitas provenientes de vendas de andares como facilmente deduzirão.
Pagamos, contrariados mas na hora certa, os impostos municipais, as taxas, as derramas e tudo o mais que “eles” inventam para fazer os “ricos” pagar a crise.
E agora vem esta gentuça, edis, serviços, beneficiados, dizer com ar de perfeita tranquilidade e insuspeita inocência que faziam o que faziam, davam o que davam, compravam o que compravam, corrompiam o que corrompiam, porque era costume, porque se fazia desde sempre, porque sei lá o quê.
Pergunta inocente: nunca ninguém ganhou algo por baixo da mesa? Nunca um desses inquilinos miraculados pagou uma gorjeta a quem tão simplesmente lhe atribuiu o andar assim, sem mais?
Deixemos este ponto, pouco atraente, e passemos a um seguinte. Pelos vistos até uma (só uma?) senhora vereadora (já não falo de uma citada Directora de Segurança Social de Lisboa cujo ordenado é de sub-director geral !...) viveu tranquilamente 20 anos num apartamento destes. Dizia-se que iria falar. Falou? Quando? Eu bem sei que a dita senhora (da qual aliás tinha excelente opinião...) foi para a casinha generosamente camarária antes de ocupar o lugar político que ocupa mas, e está aqui o busílis, tem desde há muitos anos actividade política relevante no PS. E isto não lhe chegava para ser mais prudente?
Mas deixemos isso. Que faz a CML entretanto? Ao que leio, vão estudar o problema e fazer um regulamento. Há um, feito há dois anos mas nunca foi aprovado. Pudera! Aprovar o papelucho ia, quand-même, meter alguma ordem na desordem, na rebaldaria. A solução foi deixar a aprovação lá mais para o Verão, para as calendas gregas, digo lisboetas. Agora não: agora vão estudar e decidir. No meio desta frenética actividade, haverá um par de criaturas que, a bem ou pressionadas, largarão as casinhas e irão acolher-se sabe-se lá a que novo artificio residencial. O resto ver-se-á. E já se fala de direitos adquiridos. Ao fim e ao cabo daqui a dez anos estará tudo em águas de bacalhau. Mas o escândalo estará enterrado sob uma nova camada de esquecimento e de outros escândalos.
Finalizemos: as leitoras sabem que nutro pelo dr Santana Lopes o mesmo carinho com que recordo a primeira indigestão que tive. Da senhora vereadora Lopes da Costa nem isso. Nunca a vi e não estou com especial vontade de a ver. Mas vê-los a eles no banco dos réus por fazerem o que todos, repito, todos os outros fizeram, incomoda-me. Estão na mó de baixo, são da oposição, Santana é (para desgraça dos lisboetas) potencial candidato à Câmara, portanto há que lixá-lo. Alguém me diz que uma coisa é a política e outra o poder judicial. Claro! Será mesmo? Então os senhores acusadores não descortinam no meio de tanto caso ultimamente contado pelos jornais outros presumíveis réus? E não acham extraordinário o absurdo número de beneficiados, a sua posição social, a sua influencia na sociedade? Não lhes ocorre perguntar se eles mesmos não terão culpas no cartório? Não haverá quem queira saber de que meios se serviram estes felizes usuários do direito à habitação para pagar em média 35 euros mês?

Por outras palavras: ninguém cora ao saber desta história? Aceitam-se apostas.

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