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Incursões

Instância de Retemperação.

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Instância de Retemperação.

Estes dias que passam, 129

d'oliveira, 31.10.08

JVC tire sa révérence

É verdade. O blog “meubloconotas” sai de cena. Não devia, digo eu, mas o João Vasconcelos Costa está já noutra, como me escreve.
Muitos dos meus leitores conhecerão este blog, fruto da inteligência (muita), da cultura (idem) do João. E de mais algumas pessoas que o entusiasmo do João arregimentou para a (boa) causa do ensino universitário e não só.
Eu sou amigo do João desde há décadas. Conheci-o através do meu irmão, quando ambos andavam em Medicina em Coimbra. Depois, como era norma do tempo, passaram-se para Lisboa onde continuaram a dar-se. Parece que se juntavam no velho “Bocage”, poiso do José Gomes Ferreira, do Abelaira e de mais alguns poetas e escritores. Imagino o que aqueles jovens estudantes estúrdios diriam dos “notáveis” que partilhavam o seu espaço.
Voltei a saber do João sempre que havia um desses vírus novos e tropicais. A televisão ia desencantar o senhor Professor Doutor para explicar a coisa. O João desempenhava o seu papel com segurança e rigor numa linguagem desarmantemente simples. O raio do homem tinha a vocação do Ensino (com letra grande) metida na pele.
Reencontrámo-nos fisicamente nas sessões dos “Estados Gerais” onde fazíamos uma perninha independente no Conselho Coordenador. Foi um tempo de esperança, igual a tantos outros por onde andámos empenhados e arriscando o canastro. Que o João, além de grande aluno, foi um dos homens fortes da R.I.A. em meados de sessenta (não sei mesmo se não terá sido seu Secretário Geral) e ao mesmo tempo estava metido até às orelhas no partidão. Isso no tempo em que a repressão era a sério e em que as denúncias e as traições além de serem frequentes eram o pão nosso de cada dia.
Um gajo destes, doublé de grande leitor, de imparável cozinheiro (com livro publicado: uma Bíblia para os gourmets!), dotado daquele humor açoriano que se temperou pelas europas, tinha por força que abrir um blog. Que teve (e tem) leitores fervorosos e dedicados para quem a notícia do fecho é uma má notícia.
Bem sei (ele já se tentou justificar) que há o cansaço, a ideia que poucos leitores se interessam pelo que dizemos, a concorrência feroz do dia a dia, o risco de termos de comentar constantemente a espuma do tempo, sei lá que chatices mais. Também sei que ele vai abrir uma coisa que me descreveu como um portal (que é que será isso?) onde poderá escrever textos longos sem receio que os leitores abandonem ao fim de dois parágrafos. Ou seja, o João vai continuar no éter, na estratosfera, nesta bolha, enfim nesta coisa de que não percebo patavina, mas tudo isso e o seu charme, o seu rigor, a sua indignação, as suas cóleras vulcânicas (ou não fosse ele dos Açores...), o seu humor, as suas frechadas sempre argutas e a acertar no alvo, não são suficientes para que não nos sintamos mais sós, mais desacompanhados.
Eu não sei se tenho muitos ou poucos leitores. Parece que há uma maneira de o saber mas, como sabem as leitoras gentis, eu sou um ignorante absoluto desta geringonça. A estimável Kamikaze, administradora deste blog considera-me um caso perdido mas, como toda e qualquer mulher bonita, ampara-me como se ampara um filho um pouco atontado. Com uma diferença: eu já não cresço. Ou melhor cresço para os lados, que o pneu está viçoso.
Pois bem, apesar de só saber dos leitores pelos comentários e pelos mails cá vou continuando a distribuir maravalhas, indignações e críticas con un palo dando y a Dios rogando. Também me canso, me farto, me irrito. Também sou tocado pela imortal deusa da preguiça (espero que haja uma no panteão grego, tão cheio de deuses oportunos e oportunistas), também descreio desta cruzada que o não é que eu para cruzadas já dei, fechei a loja há muito e não vai ser agora que a reabro. Desconfio de cruzadas, diga-se em boa verdade, mesmo (e sobretudo) das mais seráficas e inocentes. No outro extremo há sempre alguém que se lixa e eu não vim para redimir os humanos nem para servir de Vichinsky. Estou aqui como mera testemunha deste tempo armado de um computador MacBook Pro e da minha indignação. E do meu entusiasmo pelos livros, pelas pessoas e, já agora, por Mozart.
Percebo todavia que o JVC não pense da mesma maneira. Chateou-se e vai embora. Ou nem isso: vai para outra, mais séria, mais “portal” (seja lá isso o que for). Mas vai com, a minha saudade a minha amizade e a minha admiração: pelo que escrevia, como escrevia, pela elegância, pela ironia e pela vontade de ser útil. Raios partam os açoreanos...

Como prova de que sou um desastrado isto hoje sai tudo sublinhado. Juro que não estava assim no rascunho. As ilustrações reportam-se ao JVC himself e a dois (entre vários) livros que ele perpetrou: a ler sem falta!





A candidatura de Elisa Ferreira move-se

José Carlos Pereira, 30.10.08
A candidatura de Elisa Ferreira à Câmara do Porto começa a mover-se e a preparar-se para a luta. Elisa Ferreira tem reunido com universitários, gestores, empresários e quadros de reconhecida qualidade, que têm reflectido sobre o caminho e as opções a seguir. Diz-me quem tem frequentado esses encontros que há algumas presenças surpreendentes, sobretudo do meio empresarial, e que o clima que se transpira é de confiança, serenidade e firmeza na necessidade de debater a cidade (e a região) sem determinismos e sem cedências à demagogia barata.

As pessoas que estão com Elisa Ferreira, e a própria, parecem ter os pés assentes no chão, têm noção das qualidades e fraquezas de Rui Rio e isso é meio caminho andado para não embarcar em euforias. Assim como também conhecem as debilidades do PS local, a nível concelhio e distrital, e estão preparadas para lidar com isso.

O combate é difícil, mas deve ser sustentado em ideias, projectos e convicções. Com elevação. Pelo Porto.

Au Bonheur des Dames 146

Incursões, 29.10.08

Oh happy days!

Há dias assim; ou melhor fins de semana assim: estava eu sossegadinho da silva, a registar uns livros acabados de comprar com a ajuda sempre ineficiente da Ingrid Bergman, a gata amarela que não pode ouvir tocar em papel sem imediatamente se apresentar à espera de uma milagrosa bola (de papel bem amassado) para brincar durante horas, quando apareceu a CG seguida da Kiki de Montparnasse (a gata cinzenta) e, sem ter-te nem guar-te, disse: Vou mudar o meu escritório para a salinha de estudo da Ana. Não quer ficar com ele para pôr lá mais umas estantes e os livros que entretanto vai comprar?
As gatas estavam estupefactas e eu pensei que a CG estivesse a gozar. Uma sala belíssima, o segundo melhor quarto da casa, paredes laterais com cinco metros cada, ou seja sessenta metros de estantes prontas a encher, quem é que não queria?
Murmurei uma vaga aceitação, pois convém não mostrar demasiados arroubos nestas ocasiões. Pelo menos enquanto não soubermos o que a ocasional dadivosa criatura quer em troca.
Nada!, disse. Não queria nada. Ou coisa pouca, pouquíssima. É que, confidenciou-me, pensava que eu não quereria a estante preta que estava na parede esquerda.
A dita estante, se é que tal alboio se pode considerar uma estante, é uma monstruosidade preta (já o disse) de 3x2 metros com tábuas de sete centímetros de largura. Pesa um balúrdio, e veio de uma dessas lojas careiras onde ninguém percebe que uma estante é uma coisa para ter livros e não um o resultado da inteira desflorestação da Amazónia.
Mas a CG tomou-se de amores por aquela monstruosidade e achou que tábuas fortes eram o ideal para acomodar os muitos livros de arte que tem (A CG pinta, ganhou mesmo uns prémios e, nos tempos em que dava à paleta, ganhava o suficiente para ir comprando os carros ,sempre carrinhas para poder trazer as telas sem mexer no cacau que recebia pela profissão dominante). E vocês sabem o peso e o tamanho desse género de livros.
Portanto, a sala vinha inteira e virginal para este vosso criado, desde que eu desmontasse, carregasse e voltasse a montar aquela meia tonelada de madeira. Ai acham que não é meia tonelada? Então venham cá e vejam. Podem ser menos uns quilos mas eu que já não na primeira (nem na segunda) juventude sei bem o que carreguei. E há três dias que nem sinto as articulações.
Portanto, desmontámos a estante. Deitada no chão, claro para ver se não se morria de uma paulada das estantes. Depois carreguei as tábuas para a outra sala e toca de montar o objecto negregado. Como a sala é mais pequena tive de dar às meninges para ver qual era o modus faciendi mais prático. A parte mais larga, montou-se sem grande novidade, levantou-se e escostou-se à parede. Depois havia que lhe juntar uma parte mais pequena com cerca de um metro de largura que teria de ser ajustada á parte maior. O que significava, caso não saibam, fazer coincidir 10 parafusos (ou lá como se chamam com as estantes já montadas no alçado. E aí, digo-vos, aqui à puridade, foi o cabo dos trabalhos. À uma aquilo pesava que se fartava, depois, as estantes propriamente ditas tinham de ser mantidas a direito porwue com o peso podiam torcer os parafusos que as seguravam ao lateral. Enfim, um esforço hercúleo, quiçá o 13º trabalho do herói só que em versão lusitana e com um artista sexagenário! Perdi (foi a única coisa boa) cinco quilos de peso e dois anos de vida futura. Perdi ainda outros tantos dado o copioso número de palavrões que utilizei contra a estante e contra mim que caíra naquela asneira. Deus tem ouvidos, sobretudo ao fim de semana, altura em que os pecadores andam mais buliçosos e propensos ao pecado mortal.
Almoçámos já passava das três da tarde. Recuperei os quilos perdidos (cfr. supra) tal a fome que tinha.
A manhã passara totalmente preenchida com estes trabalhos de alta (e pesada) marcenaria pelo que só à tarde pude ver o correio. Então não é que um par de leitores e uma leitora entenderam afagar-me o ego a propósito das minhas pobres croniquetas com recados tão amáveis que me babei. Notem que eu não sou (nunca fui) modesto e muito menos humilde. Mas esta leitora, Manuela A. amiga de gatos e de jazz, o Alberto B., teólogo amador e leitor compulsivo e o temível e velho partner José (o leitor e comentador que me obriga a pensar e com quem tenho mantido cordiais diálogos por aqui) aliaram-se sem o saber para proporcionar a um escriba (a este escriba) um momento de prazer mesmo se (há que dizê-lo) tenham sido demasiado amáveis e exagerados nos cumprimentos que me fizeram.
Digamos que, apesar da estante preta, pesada, perversa, pavorosa e perigosa, o fim de semana foi glorioso. Quem ganhou com isto tudo foram as gatas a quem ofereci uma latinha de paté (para gatos) com que elas entraram em órbita e a CG que vai receber um sumptuoso álbum da primeira grande exposição de Matisse adquirido num leilão. Ela ainda não sabe mas este álbum é mesmo um caso sério. Excelentes reproduções, textos críticos de rara qualidade e a sombra luminosa e divertida desse mago das cores de quem Pimcrcasso disse uma vez que além de Deus só Matisse o poderia criticar com verdade e rigor.

a gravura representa, está bem de ver, as gatas cá de casa. O título (de um velho gospel) pretende homenagear os amadores de música negra e ocasionalmente os de música religiosa. E esta tema vale bem alguns outros magníficos de canto gregoriano, não?

O leitor (im)penitente 41

Incursões, 26.10.08

A minha avó era uma leitora sui generis. E uma contadora de histórias absolutamente abracadabrante. Capaz de tudo por um final feliz, um final como os que outrora uma escrava lhe contava. Uma escrava comprada para entreter a menina acabada de nascer. Uma escrava dirão? Sim, uma escrava ou algo igual e da mesma substância. As leis generosas e anti-esclavagistas só funcionavam em escassos sítios do Império e seguramente não funcionavam nesse Sul de Angola povoado por tchicoronhos (madeirenses), boers audaciosos e portugueses fugidos do Brasil onde um nacionalismo recente e exaltado não aceitava os portugueses que não adquiriam a nacionalidade brasileira.
A avó, além de contadora de histórias, tinha um fraco por pôr alcunhas. Era mesmo mortífera nesse exercício. Ainda me lembro de um desinfeliz a quem ela apodou de “batata rim”. A criatura nascera para aquele nome!
As escolhas literárias da avó, já o disse, eram inesperadas. Gostava do Ruben A (nos anos 60!...) e de um autor que nos deixava ( a mim e ao meu irmão) perplexos: Pires Cardoso. É que não conhecíamos ninguém com esse nome. O mistério durou algum tempo. Mais propriamente até ao dia em que ela exasperada pela nossa ignorância nos deixou um título: “O anjo ancorado”.
Mas é o Cardoso Pires, bradámos! Ou isso, respondeu a Avó que se tinha apoderado de uma “Retirada dos 10.000” na versão de Aquilino Ribeiro que me tinha sido oferecido por uma namoradinha chamada Judite. E continuou a ler.
Felizmente não conhecia Shakespeare, pelo menos em versão erudita, senão ainda nos tinha atirado com “o que é “um nome?” do Romeu e Julieta, para nos provar que a sua distracção quanto a identificações era uma mera formalidade dispensável entre pessoas de bem.
Lembrei-me de tudo isto ao ler hoje um belo texto de Vasco Pulido Valente sobre o Zé Cardoso Pires.
Eu também faço parte dessa confraria entusiasta de leitores. E isso desde um dia tristonho no colégio Almeida Garrett onde penava e tentava sobreviver lendo tudo o que me passava ao alcance. Numas das raras saídas autorizadas (para um concerto da Juventude Musical vira na livraria Divulgação (hoje Leitura) o livrinho, acabado de sair e, sem saber do que se tratava, gastara a mesada na compra do voluminho. Há exactamente cinquenta anos! Cinquenta anos em que gastei três edições do anjo. Uma dada como penhor de amorios juvenis, a segunda desaparecida por Coimbra, sabe-se lá graças a quem e a última comprada logo a seguir (pela data que ostenta) e que por milagre ainda habita uma estante da biblioteca junta com toda a restante produção do Zé Cardoso Pires.
Conheci-o mesmo e falei com ele um escasso número de vezes. Numa delas contei-lhe a confusão de nomes em que a minha avó persistia. E aproveitei para lhe pedir uma dedicatória um “Delfim” antecipadamente comprado na Opinião para oferecer à Velha Senhora. Nessa noite gloriosa, na “Trave” dos irmão Jaime e Santos, o Zé Cardoso dedicou com palavras carinhosas o seu livro para uma senhora de oitenta anos e assinou “José Pires Cardoso”.
What’s a name? That which we call a rose
By any other name woud smell as sweet

Ferreira Torres out

José Carlos Pereira, 25.10.08
Os jornais noticiaram esta semana que a juíza que preside ao colectivo que está a julgar Avelino Ferreira Torres expulsou da sala de audiências, por desrespeito ao Tribunal, o ex-vereador da Câmara de Amarante, ex-presidente da Câmara de Marco de Canaveses, ex-senador do CDS-PP e putativo candidato de novo à autarquia marcoense. Parece que após algumas ameaças inconsequentes a senhora juíza se encheu de brios e colocou mesmo Ferreira Torres de castigo, do lado de fora da porta de saída. Como ele merecia há muito tempo e como já teria acontecido a qualquer outro cidadão caso tomasse as mesmas atitudes de Ferreira Torres.

Avelino Ferreira Torres habituou-se durante anos e anos a insultar e agredir opositores nas mais diversas circunstâncias, gozando de total impunidade e da complacência de terceiros, fosse em reuniões do executivo, da Assembleia Municipal, em debates, na via pública ou nos campos de futebol. Há muita gente que sabe do que eu estou a falar…

Ainda bem que, finalmente, alguém o travou. Talvez tarde, mas travou

O Metro do Porto na Asprela (sempre em continuação)

José Carlos Pereira, 25.10.08
Escrevi aqui a última vez sobre a saga do Metro do Porto na Asprela, junto ao Hospital de S. João e ao campus universitário. Afinal, um ano depois continua por requalificar e ordenar o trânsito e o estacionamento na Alameda Prof. Hernâni Monteiro e na Estrada da Circunvalação, na zona fronteira ao hospital.

Não sei se a culpa é da Metro do Porto, da Câmara Municipal ou do Hospital de S. João. O que sei é que não é normal ver o estacionamento selvagem e os túneis abertos e sem uso, que apenas servem de depósito de lixo, numa das principais entradas da cidade, próximo da maior concentração universitária do Porto e no acesso a um hospital central. Mas como Rui Rio, presidente da Câmara e administrador da Metro do Porto só se preocupa com a Avenida da Boavista e com as corridinhas dos popós…

Estes dias que passam 128

d'oliveira, 23.10.08

As políticas de circunstancia
e as circunstâncias da política


Uma pessoa tem de se rir. Do pais, do governo, de si própria. Em tempos de crise “rir é o melhor remédio” como se dizia numa secção das Selecções do Reader’s Digest, nos tempos em que a revista era feita no Brasil.
Vem isto a propósito da célebre “mobilidade especial” um truque inventado pelas criaturas que velam por nós e sobretudo pelos funcionários públicos. Em teoria a coisa era mais ou menos assim:
Os funcionários públicos são uma récua de ignorantes, de preguiçosos, de vampiros que sugam o escasso sangue do povo português que “lhes paga os vencimentos”. Em troca não fazem nenhum, são cúpidos, cedem a cunhas e são regra geral incompetentes.
Em função do que vem de ser dito, o prestimoso governo que com imenso e abnegado sacrifício zela pela nossa vida e fazenda, entendeu mostrar urbi et orbe não só a maliciosa acção da funçanata pública mas igualmente quebrar-lhes a espinha e os gigantescos privilégios de que desfrutavam-
Nessa acção moralizadora tinham especial significado um par de avaliações, a entrega de competências do Estado a privados, o fim do “vínculo” e, last but not the least, uma generosa oferta: quem quiser ir embora pode pedir a mobilidade especial que em teoria significa receber cerca de 75% do ordenado sem ter que pôr o cadáver no serviço. Os descontos para aposentação e demais alcavalas ficam a cargo do funcionário. Pretendia-se atirar para fora do Estado com o maior número de pessoas, de modo a “emagrecer” uma administração pública empolada.
Digamos, para abreviar, que com essa cenoura se pensava alcançar sem grande esforço a saída dos milhares de funcionários (75.000 se não estou em erro) que se previra no inicio da legislatura.
A latere, as campanhas de desprestígio de várias camadas de funcionários desde magistrados a professores sem esquecer os “burocratas” avulsos, iam dando aos menos propensos á saída o pequeno e amigável empurrão que se calcula.
Num primeiro tempo, os funcionários, desconfiados de tanta fartura, não tugiram nem mugiram. Depois com a crispação a que se foi assistindo, alguns mais inconformados aceitaram. Renunciaram a 25% do gigantesco ordenado que auferiam (e que era pago pelo povo trabalhador...) pagaram de seu bolso os descontos legais e descobriram que há vida no exterior.
Sobretudo aqueles que eram relativamente novos e tinham formação superior (os chamados quadros técnicos superiores) verificaram que o rarefeito mercado de emprego os aceitava, os incluía e até os disputava. Parece que tinham experiência, conhecimentos, brio, vontade de trabalhar e entusiasmo.
Foi um rastilho: num ápice perfilaram-se à porta de saída fortes contingentes de técnicos superiores. Fartos de humilhações, de maus tratos, de condições de trabalho miseráveis, de chefias nomeadas pelo poder político e pelo respectivo cartãozinho partidário, vendo o seu mundo atravessado por disputas e denúncias de toda a ordem, eis que se resolviam a dar o salto às vezes depois de dez, quinze vinte ou mais anos de serviço público.
Paralelamente, começou a verificar-se a saída em magote, para a reforma, de milhares de funcionários com mais de cinquenta e muitos anos de idade e com tempos de serviço que ultrapassavam os trinta anos. Partiam, e partem, com fortes penalizações mas tudo lhes parece preferível ao caos que começa a instalar-se em muitos sectores da administração.
E, de repente, os alarmes dispararam: a ânsia de sair ameaça paralisar serviços inteiros. Os novos recrutamentos não trazem a esperada vivificação da função pública. Pior: nota-se que o nível dos recém-entrados apesar dos diplomas, das cunhas, da cor política, é baixo. Ou então, sabe-se como sempre se soube (só o virginal governo e os radicais anti-funcionalismo ignoravam) que a aprendizagem da função é longa, difícil, que necessita de um caldo de cultura, muitas vezes furiosa e estupidamente destruído pela sanha renovadora de quem governa e dos seus cabos de esquadra nos serviços.
E toca a fazer marcha atrás: os jornais de hoje já advertem que a mobilidade especial afinal não é para todos. Não é desde logo para os quadros técnicos superiores. Maria de Belém Roseira repetiu-o na televisão (ressalve-se que esta declaração foi antecedida de um profundo elogio ao funcionalismo, algo que se deve realçar porque vem de uma das mais respeitadas figuras do PS que ainda por cima já desempenhou cargos governativos) dizendo mesmo que lhe parecia estranho que o Estado pagasse para as pessoas irem para casa. Tem carradas de razão mas foi exactamente isso que este governo propôs e começou a levar a cabo. Agora percebem (tarde e a más horas) a asneira monumental que fizeram e vá de dar o dito por não dito.
Amanhã, não se espantem leitoras gentis, algum dos sátrapas que nos iluminam com a sua exuberante incandescência virá a terreiro afirmar que a função pública portuguesa (magistrados e professores incluídos) é da melhor do mundo. Vai uma apostinha?
Esta crónica poderia continuar recheada de exemplos caricatos. Não vale a pena. Basta atentar que se a função pública estivesse tão doente quanto a anunciam há muito que tudo isto tinha parado. E, já agora, se porventura vos vier à cabecinha pensadora fazer uma comparação entre eficiência do sector público administrativo e os diferentes privados que se esboroam ao cheiro da crise não hesitem. E digam-me depois a que conclusões chegaram.
E, já que estamos com a mão na massa, façam o pequeno exercício de tentar adivinhar quem prejudica mais o tal “povo” com que nos moem diariamente. Se a Banca, os Seguros, as empresas com E maiúsculo ou os tais malandrins que se escondem debaixo da mesa do Orçamento (que curiosamente se abre à voracidade privada com um descaramento de puta brasileira prestes a reformar-se, mas isso é outra história)?

Outra Faceta da Crise

JSC, 23.10.08
O Preço do Barril do petróleo baixa para preços de Maio de 2007. Entretanto, no primeiro trimestre deste ano os lucros GALP atingiram os 130 milhões de euros, o que representa uma subida de 43%.

Uma vez que estes lucros foram obtidos quando o preço o petróleo subia, agora, que está a descer, é de admitir que os resultados do próximo trimestre sejam negativos, o que explica que o gasóleo (e a gasolina) não baixe proporcionalmente à queda do preço do crude.

Novos Passos da Crise

JSC, 23.10.08
O Governador do Banco da Inglaterra revelou, ontem, a sua preocupação com o estado da economia do país, que enfrenta um cenário de recessão, apesar do esforço governamental de 37 mil milhões de libras para evitar o colapso da banca.

Na mesma altura, o responsável pela Reserva Federal dos Estado Unidos anunciava um novo programa para a compra de activos (que podem ser simples papel comercial ou fundos de tesouraria), no montante de 600 mil milhões de dólares, com o objectivo da dar mais liquidez ao mercado financeiro e permitir à banca cumprir as suas obrigações.

Ainda na mesma altura, o Banco Central Europeu anunciou ter emprestado aos bancos 305 mil milhões de euros e 101,9 mil milhões de dólares.

Na verdade, desde que deixaram que o Banco Lehman Brothers fosse à falência, os governos têm-se esforçado para impedir que muitos outros bancos tivessem o mesmo destino.

Mas de onde apareceu todo este dinheiro público, que se dirige para o mesmo fim? É espantosa a capacidade dos governos para mobilizar meios para nos proteger da derrocada financeira.

Igualmente espantosa é a declaração com que o Ministro das Finanças da Alemanha brindou o mundo ao afirmar que
a Suiça devia estar na lista negra dos paraísos fiscais, por potenciar a fraude.

Este filme vai ter um momento significante no próximo fim de semana, com a reunião de 40 chefes de estado e de governo europeus e asiáticos, em Pequim, para tratar da crise financeira global e do espectro de recessão.

Um bom exercício que poderiam fazer, tipo exorcismo, era hierarquizar o contributo que cada um dos presentes deu para a crise.

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