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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Au Bonheur des Dames 299

d'oliveira, 31.10.11

O que é que eu não percebi?

 

 

 

Comecemos pelo trivial: o Ministro da Educação revelou que há 1850 professores a horário zero. Horário zero? Quererá isso dizer que há quase dois mil mártires docentes que diariamente vão para o seu posto de trabalho e, uma vez lá chegados, encostam às boxes, contam as moscas, pensam no infinito e depois de umas horas nesta imensa solidão (que não me parece criadora) regressam a penates, cansados e desiludidos?

 

Não haverá nas escolas nada que eles possam fazer? Não estou a propor que lhes ponham uma vassoura na mão ou que os mandem fazer uma ronda pelas imediações à caça de dealers, de pequenos gatunos, de alunos que se piraram à aula, nada disso.

 

Mas não poderiam manter um gabinete de tutoring, substituir professores doentes, ajudar nos trabalhos docentes que eventualmente apareçam?

 

Ou então, se é que horário zero, é mesmo isso, nada, raspas de coisa nenhuma, não seria mais misericordioso mandá-los para casa, para um café, para um jardim, garantindo à mesma o salário que eventualmente recebem?

 

 

 

2 O excelente Jerónimo de Sousa veio, uma vez mais –e não há de ter sido o único – vociferar contra as ajudas à Banca que, segundo a sua limitada ortodoxia, só empata quem trabalha. Corrijam-me se estou errado: não é o partido desta cavalheiro que denuncia dia sim, dia não, o sufoco em que estão as empresas, sem créditos, sem meios, sem dinheiro para pagar aos desgraçados trabalhadores que ainda têm?

 

Será que, num regime capitalista, as pessoas podem prescindir da Banca? Será que na finada, e raramente chorada, União Soviética não havia umas coisas patuscas chamadas “bancos”? Será que na risonha China não há bancos?

 

Mas, mais e melhor, será que o auto-proclamado arauto dos trabalhadores portugueses e das restantes classes a eles aliadas, recomenda um regime socialista, como o do extinto “sol da terra”? Será que aí os trabalhadores recebiam coisa que se visse, tinham sequer uma pálida imitação do estilo de vida dos de cá, digamos um carrito, uma casa (mesmo se alugada ou a pagar em horrendas e duríssimas prestações) só para eles e familiares directos? Será que podiam fazer greve? Dizer mal do Governo? Falar da “ditadura do proletariado”, do “centralismo democrático” (coisas que, como se viu –e isso desde Kronstad – só existiam nos manuais de exportação e sempre, mas sempre, a favor da “nomenklatura”)?

 

 

 

Reina uma certa consternação nos meios ditos culturais. Que com os cortes “cegos” (surdos e mudos) no Orçamento da SÉCULO, vbai ser um descalabro. Que se vai assistir a um desemprego maciço entre os trabalhadores culturais que, numa percentagem de cerca de 70% (!!!???) são precários (!!!).

 

E nos filmes nacionais nem se fala. E naquela coisa patusca que era a dos subsídios reembolsáveis, ainda menos!

 

Conviria perguntar, começando pelo fim, se alguma vez os tais subsídios reembolsáveis foram honrados. Não foram. Andam por aí milhões de euros que alguém se esqueceu de devolver ao Estado. Muitos milhões! Eu só não percebo porque é que os chamavam “reembolsáveis”. Mais valia dizer que eram subsídios e basta.

 

No que toca ao glorioso cinema português, haja alguém que me explique esta coisa simples: em qualquer parte do mundo, mesmo no Irão, há receitas de bilheteira. Que, no caso dos países mais ricos e que mais filmes produzem (Índia, Estados Unidos, Japão, por exemplo), geram grandes lucros, mesmo quando os filmes não são exportados para o estrangeiro. Quanto é que, em média, é gerado por um filme nacional, dos nossos, dessas obras primas que produzimos sempre com o máximo de estrelinhas no painel dos críticos do Expresso e restantes jornais de referencia? Não me atrevo a perguntar se alguma vez um filme português se pagou a si próprio, se deu lucro ao produtor. Ingénuo, sim, mas não tanto. A pergunta que faço é mais simples: de que é que vivem as pessoas – e são muitas – que giram nesta actividade? Não é dos lucros, cuja ausência uiva, como os lobos de Aquilino. Então do que é? Será que andam por aí, disfarçados e irreconhecíveis, alguns mecenas amantes da 7ª Arte e do fantasma de Lilian Gish e pagham gernerosamenter tudo? Será que os produtores, os argumentistas, os realizadores e restante parafernália cinematográfica lusitana, não comem, não bebem, não se vestem, não educam filhos, não têm carro, doenças, encargos e vivem como Diógenes, dentro de um barril emprestado? Ó que admirável devoção à causa cultural e cinéfila!

 

 

 

Consta que os senhores políticos no “inactivo” vão deixar de contar com a famosa subvenção vitalícia a que o seu alto patriotismo, acrisolado amor da pátria, devotado empenhamento na causa pública, faziam jus. De que é que vai viver o nunca assaz louvado engenheiro Ângelo Correia, o portentoso Lello, o senhor Melancia que, coitado!, lá andou por Macau, mais desventurado que Fernão Mendes (e olhem que este foi não sei quantas vezes cativo de piratas horríveis e infiéis...), defendendo o bom nome de Portugal e Algarves, para pasmo de chineses, malaios, siameses e outros povos menos conhecidos, mas todos célebres pela roubalheira e pela desvergonha com que consideram indefinida a fronteira entre a fazenda pública e os bens privados? O meu velho, cansado e mal humorado coração sangra por estes cruzados modernos da boa governação, ora abandonados à mais negra e inclemente miséria.

 

 

 

Acabemos nessa coisa meritória e de excelência que é a nossa televisão. Um cavalheiro façanhudo e pouco dado a devaneios que, dizem chamar-se qualquer coisa Relvas, veio anunciar a iminente venda de um canal da RTP. E, para já, ter-lhe-á diminuído o orçamento. Eu, que sempre me surpreendi com o alto nível intelectual dos dois canais, do RTP memória, do RTP África, dos canais açorianos (desculpem-me se esqueci algum), nunca percebi que por lá se pagassem alguns ordenados que duplicavam ou triplicavam o do Presidente da República. Nunca! Bem sei que os eventualmente beneficiados eram autênticas catedrais do saber, da cultura, da imaginação, do arroubo, da ousadia, do desafio aos poderes constituídos, da coragem cidadã e do amor pela humanidade. Mas aqueles ordenados eram pagos por uma “empresa pública” cujo accionista era o Estado. Então o mais alto magistrado do Estado, da Nação, ou disto que por cá temos, recebe menos?  

 

 

 

Em post-scriptum: 80%  dos portugueses desconfia da Justiça. Dos Tribunais, dos Juízes, dos Procuradores, dos advogados, das leis e de quem as faz (?, céus que horror...). Todos se queixam, com razão, sem dúvida, e, pior, todos acham que é exasperantemente lenta, duvidosamente justa, inegavelmente de classe. De classe, repito. Ou de classes, pois também aparecem uns juristas fresquinhos e "muy progres" que acham que é preciso arrear no “sistema”, no “capital” na plutocracia e em sei lá que mais coisas. 

 

Tremo, e sou jurista, só de pensar que alguma vez poderei ter de entrar num desses execráveis “palácios da justiça”, como testemunha, eventualmente como autor e, espero-o fervorosamente, nunca como réu (deixo isso aos cavalheiros da banca, da política e de outras malas-artes).

 

Não falo da impreparação científica, da falta de visão, de experiência de vida, que para isso lá estão o dr. Marinho (por quem Deus nos vem avisar!!!) com a sua tonitruância, ou o sr. Procurador Geral cuja eloquência sempre admirarei de joelhos e olhos postos em alvo. Falo, de raspão, dos mimosos auditores do CEJ apanhados a copiar. Além do mais, deviam ser castigados duplamente: pelo copianço e pela falta de discernimento demonstrado pelo facto de serem apanhados mais depressa do que um estudante de doze anos. Amanhã esses cavalheiros vão julgar-vos, queridas leitoras, respeitáveis leitores.

 

Deixo-vos com este piedoso pensamento.

 

Ámen! 

 

A gravura: uma composição de Serge Poliakoff, pintor francês de origem russa que me anunciou, ainda eu andava no liceu, a arte moderna. Que emoção!

 

 

Não arranjam emprego? Emigrem!

JSC, 31.10.11

Como se sabe, um dos temas da campanha eleitoral passou pelo actual primeiro ministro acusar (e bem) o governo de não ter um plano para o emprego dos jovens. Apontava muitos exemplos de jovens acabados de se formar e que tinham de ir para o estrangeiro, porque não tinham oportunidades por cá. Não podia ser, gritava o então candidato. Se ganhasse as eleições iria encontrar soluções para reverter a situação. O Estado não podia andar a investir na formação dos nossos jovens para depois os empurrar para o estrangeiro. Era intolerável a “fuga de cérebros”, empobrecia o país. Tudo isto e muito mais formava o discurso psdiano, há uns meses.

 

Ganhou. Formou o governo pequenino (em tudo) que se conhece. E, finalmente, encontrou a solução para os jovens recém-licenciados e para os jovens em geral.

 

Hoje, o Secretário de Estado da Juventude e Desporto, de seu nome Miguel Mestre, revelou a política governamental para a Juventude:

 

1.º Os jovens desempregados devem sair da "zona de conforto" e devem emigrar ir para além fronteiras.
2.º O país não pode olhar a emigração apenas com a visão negativista da "fuga de cérebros".
3.º Se o jovem optar por permanecer no país que escolheu para emigrar, pode dignificar o nome de Portugal e levar know how daquilo que Portugal sabe fazer bem.

 

Conclusão. Um génio este Secretário de Estado. Ainda bem que ele não teve de emigrar para nos poder dar tamanha contribuição para a criação de emprego e para a competitividade nacional (tão cara a um ministro ex-emigrante).

 

Anoto, porém, que falta um 4.º ponto na sapiente intervenção de Sua ex.ª. De facto, esqueceu-se de pedir aos futuros emigrantes que não se esqueçam de enviar as respectivas remessas financeiras para ajudar a equilibrar a Balança de Pagamentos, como no tempo da outra senhora.

Frases que ficam

JSC, 31.10.11

O aumento de meia hora por dia no horário de trabalho "é de facto trabalho obrigatório não remunerado, coisa que na nossa civilização não existe há vários séculos".

 

João Ferreira do Amaral, Economista

Intento (17)

sociodialetica, 29.10.11
“O conhecimento é, pois, apenas conhecimento humano, ligado às formas intelectuais humanas, incapaz de atingir a natureza das próprias coisas, as coisas em si”
Edmund Husserl. 1986. A Ideia da Fenomenologia. Lisboa: Edições 70, 44

Relvas "admite" a Noruega na UE

José Carlos Pereira, 28.10.11

"Mas deixe-me dizer-lhe que muitos países da União Europeia - cito a Holanda, a Noruega, a Inglaterra - vários países da União Europeia só têm 12 vencimentos", Miguel Relvas, ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares, em entrevista à TVI.

Alguém deve explicar ao senhor ministro que os rendimentos nesses países não são exactamente iguais aos dos portugueses. Ah...e que a Noruega não integra a União Europeia.

 

Crise europeia, Banco Central e Dívida

sociodialetica, 26.10.11
Um pequeno filme que me dispensa de escrever um artigo, que estava em preparação, sobre a importância dos bancos centrais.
Apenas falta dizer que para além da forma de funcionamento descrita, típica do neoliberalismo e da subordinação da economia ao capital financeiro, houve, com a união monetária, o fim da actuação do Banco de Portugal como instituição financiadora em última instância e que o Banco Central Europeu não serve os países da Europa mas apenas alguns!

Estamos Salvos, Revelou-se o Predestinado

JSC, 25.10.11

Perante uma plateia de doutores em economia e especialistas na arte de bem gerir, Pedro Passos Coelho revelou que o “destino de Portugal não está decidido”  e que “o nosso caminho está por escrever”. Perante esta fatalidade, é óbvio que Pedro Passos Coelho acredita que só ele é capaz de decidir do destino de Portugal e de escrever (traçar) o caminho a percorrer. Mas Passos Coelho já começou a escrever o nosso caminho e a decidir o nosso destino: “Só vamos sair desta situação empobrecendo”, anunciou também hoje.

 

Pomposos ajudantes de campo abrem imensas clareiras para, desde já, facilitar a árdua tarefa a que Passos Coelho se propos, desde que decidiu chumbar o famigerado PEC IV (de que já ninguém tem memória). À frente do pelotão de ajudantes vem António Saraiva, da CIP, que considerou que "as empresas para manter o volume de emprego vão ter que fazer ajustamentos salariais, sejam eles no subsidios, sejam eles nos proprios salários". Mas com receio de que não o entendessem, explicitou melhor: é "preferível avançar com redução de salários a cortar empregos”.

 

Por sua vez, Henrique Neto, também hoje,  previu que "algumas empresas portuguesas sigam o mesmo caminho do Estado e não paguem o subsídio de Férias e de Natal aos seus trabalhadores". E até apontou o método para convencer os trabalhadores: "Os trabalhadores podem ser convencidos a fazer esse sacrifício se a alternativa for o despedimento”. O que Henrique Neto quer dizer é que se o patrão Estado saca o dinheiro aos seus trabalhadores, então, também os patrões do sector privado têm o mesmo direito a sacar o dinheiro aos respectivos trabalhadores.

 

O que é que falta para compor o ramalhete e formatar o destino de Portugal? Falta tratar da vidinha do serctor financeiro. Mas também neste domínio Pedro Passos Coelho já escreveu o caminho:  O primeiro-ministro anunciou hoje que o Conselho de Ministros vai aprovar as regras para o recurso por parte da banca à linha de recapitalização de 12 mil milhões de euros do programa assistência financeira. E para acalmar os senhores da banca e sem trair os homens da troika, Pedro Passos Coelho anunciou que o Estado, que vai dotar a banca com 12 mil milhões de euros, abdica de exercer os seus direitos porque o mesmo “Estado será um agente passivo” na Gestão da banca.

 

Em conclusão, como se vê, Pedro Passos Coelho, quando hoje falou na conferência do DE, omitiu alguns dados. Na verdade, o destino de Portugal está decidido e o caminho até está escrito nas estrelas.  A grande verdade que anunciou é que a solução que tem para nos oferecer é, em termos relativos e em termos absolutos, ficarmos mais pobres.

A Violência ganha terreno

JSC, 25.10.11

É voz corrente que se aproximam dias difíceis. O próprio primeiro ministro disse hoje que a solução que tem para o país passa por empobrecer o país.

A voz do povo começa a interiorizar que, para além das dificuldades económicas, vem aí uma vaga de assaltos, crimes cada vez mais violentos e de insegurança generalizada. Da leitura dos jornais e do que vai passando é bem provável que a tal vaga já está em andamento.

A prová-lo estão as notícias que alguns jornais nos dão hoje, mas que não diferem muito das que vão saindo dia após dia:

1.ª Notícia  - “Um grupo armado de quatro indivíduos agrediu e roubou, na madrugada de segunda-feira, no Porto, três condutores de veículos de alta cilindrada.”
2.ª – “Um homem morreu e outro ficou ferido durante um assalto, na madrugada desta segunda-feira, a uma pastelaria no Barreiro, disse fonte da PSP.”
3.ª – “A Polícia Judiciária deteve, na área de Lisboa, um homem e uma mulher, de 24 e 30 anos, suspeitos de roubo, sequestro e ofensas à integridade física de um sexagenário.”
4.ª – “Um habitante da Maia, de 75 anos, foi esfaqueado mortalmente na varanda da sua habitação e o suspeito do crime, já detido, é o ex-namorado da sua neta.”
5.ª – “A PSP anunciou, esta segunda-feira, a detenção de quatro pessoas e a apreensão de outro e prata, numa operação policial na zona centro e norte do país ligada à investigação de branqueamento de capitais, fraude fiscal e receptação”.
6.ª – “Um jovem de 15 anos foi, esta segunda-feira, esfaqueado no Vale da Amoreira, concelho da Moita, tendo sido transportado para o Hospital do Barreiro. “
7.ª – “A Polícia Judiciária anunciou, esta terça-feira, a detenção de seis alegados membros de um grupo que efectuou diversos assaltos na península de Setúbal, utilizando o método de explosões de caixas multibanco”.

 

O curioso é que todas estas notícias, seja qual for o meio que as transmite, são-nos debitadas em si, como se fossem geradas pelo sobrenatural, sem qualquer referência a causas ou responsáveis.

Curioso, ainda, é que as TVs e rádios tão afoitas a promover debates sobre tudo e mais alguma coisa, parecem alheadas desta violência em crescendo e nem vão ouvir nenhum psicólogo, sociólogo ou politólogo encartado.


De facto hoje os tempos são outros e mudaram tão rapidamente que o pessoal nem se deu conta. É que há pouco mais de uma dúzia de anos, em consequência de uma vaga de pequenos assaltos, que tiveram o seu apogeu no assalto a uma actriz num posto de abastecimento, o alarido feito, semanas a fio, pela comunicação social, levou à demissão do Ministro da Administração Interna. Alguém se lembra? E agora?

É preciso avisar toda a gente…

JSC, 24.10.11

A Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública, o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado e a Frente Sindical da Administração Pública arcaram hoje uma manifestação nacional para 12 de Novembro.

 

Um governo que não respeita os trabalhadores da função pública, que os apresenta à opinião pública como privilegiados e depauperadores do erário público, que lhes extorqui uma parcela significativa dos seus abonos, que os elege como adversários políticos, apenas pode merecer da parte dos  trabalhadores uma estrondosa manifestação de repúdio e revolta a par de uma grande desmotivação para cumprir uma política que a todos arruinará.

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