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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

estes dias que passam 290

d'oliveira, 29.11.12

Que seja para bem dos heróis do mar e do nobre povo!

 

Anteontem, na A8, uma dessas autoestradas que registam um deficit assustador de veículos e de utentes, logo à entrada  do troço gratuito da zona das Caldas, fui mandado parar por um amável agente da GNR que me encaminhou para um grupo de colegas e de outros condutores que ali estavam por razões idênticas às minhas: excesso de velocidade e pagamento da respectiva coima.

Um radar, desses amadores e ambulantes, provava à evidência uma velocidade que o pudor e a modéstia (ambos proverbiais em mim) me impedem de referir. Em termos monetários a coisa cifrou-se em mais de um cento de euros que paguei, não vou dizer gozosamente, sem pestanejar e educadamente.

Conversando com os outros involuntários contribuintes para o erário público, e depois de prestada uma informação por um dos agentes da GNR, fiquei a saber que já ali tinham entregue o seu óbolo (forçado pelo que não dá direito a nenhuma celestial bem-aventurança) cerca de um quarteirão de cidadãos. “Isto hoje está bom!”, comentou-me um praça da GNR. "O dia está bonito e os automobilistas carregam-lhe forte e feio. E como este troço é de borla, tem muita procura.”

Fiquei esclarecido. E depois de pagar o cacauzinho da ordem, vim durante o restante percurso até Lisboa, pensando em como o Governo do dr. Coelho (tirado da chapéu de quem sabem) ainda não percebeu a arma formidável que tem nas mãos.

Explico: o engenheiro Guterres, primeiro, e o quase engenheiro Sócrates depois (sem falar do anémico governo intercalar da dupla Barroso (o fujão) e Santana (o trapalhão) inçaram a pátria imortal de auto-estradas. (Hoje mesmo abriu uma outra: a que liga o Barreiro à Caparica, dois centros populacionais e industriais de altíssimo valor!)

Espíritos mal formados, bolchevistas ou, pelo menos, pedreiros-livres (vá lá, livre-pensadores...), dão ao demo tanto betão, tanto mal gasto tostão, tanta tesão automobilística. Estão enganados e bom seria que o interessante governo que nos caiu na rifa pensasse nas hipóteses que estas auto-estradas oferecem.

Suponhamos que em todas elas, excepção feita à A1, ou mesmo nessa, se estabeleciam uns troços gratuitos. É provável que, na mira de fugir ao cafarnaúm das estradas nacionais, muitos condutores se precipitassem para essa borla. Se é assim, e o agente da GNR parecia disso convencido, de certeza que muitos mais condutores cairiam na tentação de pisar forte o pedal.

Bastaria, para o efeito, estabelecer as entradas para essa abébia um par de quilómetros antes desses troços gratuitos. A malta entusiasmada e apressada para fugir do inferno das estradas congestionadas dava-lhe na quilometragem e depois era só colher oa relapsos no funil depois das portagens (no caso desportagens). 

Quero crer que em poucos meses e usando de malícia e prudência suficientes se colheriam milhares de incautos. Claro que não se poderia usar  o radar todos os dias. Ponhamos duas vezes por semana, sempre em dias diferentes, claro, e em paragens diferentes. Pelo menos arranjava-se mais dinheirto do que a miséria das portagens habituais. E dava-se treino à GNR que bem precisa.

E os clientes, perdão, os cidadãos delinquentes e imprudentes? Pois esses na vertigem da pressa, na voragem da velocidade, que remédio têm senão pagar? E mais: pagar com a sensação amarga que pecaram, que foram arrogantes, que se julgaram acima da lei.

Aliás, sempre pensei que é um contra-senso haver carros cada vez mais potentes, mais seguros, mais velozes e auto-estradas de excelente piso se a velocidade permitida é a miséria de 120 quilómetros!

Estas auto-estradas de país rico, estes automóveis quase sempre alemães (ó palavra maldita!), a pressa da vida moderna, o stress das estradas gratuitas, tudo, mas mesmo tudo, está ali à mão a pedir transgressão.

Tornemos a transgressão automobilística numa fonte de rendimentos para o Tesouro depauperado. Façamos de conta que isto é como o tabaco. O cigarrinho aumenta todos os anos e os os fumadores aguentam.

Já agora, eu até proporia de que se descriminalizasse de todo o tráfico de estupfacientes e se carregasse forte e feio a heroína, o craque e a erva, vendida já com selo governamental e de garantia do produto. Em tempo de doença há que recorrer a todas as mezinhas.

De qualquer modo, a gente morre. Que mal faz morrer num despiste aparatoso ou por overdose? Ao menos que se taxe antes o uso da velocidade e a passa transgressora, a injecção assassina, o charro pecador!

Com outra vantagem adicional. Morrendo mais e mais cedo, evita-se o pagamento de pensões, de subsídios de desemprtego (e diminui-se o desemprego!), a economia paralela.

Sei que muitos leitores poderão ficar chocados. Louvo-me, porém, num exemplo de grande autoridade: Jonathan Swift, o criador das “Viajens de Gulliver”, doutor em teologia e deão da catedral de S Patrício de Dublin.

Pertence a este pilar da Igreja e da “luta colérica pela liberdade” o famosíssimo panfleto “Uma modesta proposta para prevenir que na Irlanda as crianças dos pobres sejam um fardo para os pais e para o país e para as tornar benéficas para a República” escrito em 1729. Nele se propõe a criação dos filhos dos pobres para fins alimentares. Quem quiser saber como, pode ir a w.w.w. gazetadenovo com/index onde se pode ler na totalidade este admirável texto satírico.

 

 

 

 na gravura Jonathan Swift

au Bonheur des Dames 337

d'oliveira, 28.11.12

Carta ao condutor desconhecido

 

 

 

Caro Senhor

 

Não querendo ser apodado de misógino, apresso-me a justificar a escolha de sexo do destinatário. Como adiante se compreenderá, não creio que uma mulher, mesmo com a carta recém tirada, seria capaz de me dar um toque no carro e se pôr a mexer sem dizer água vai. As mulheres, e sobretudo as mulheres portuguesas, são automobilistas conscientes e responsáveis. Só um homem, mesmo português (ou por isso mesmo) é que, depois de ter dado uma porrada na viatura inocente estacionada ao lado, se punha a andar pensando encantado que a culpa era do parolo que tinha ousado pôr o carro ao lado do dele.

 

Portanto, e voltando à vaca fria, no caso à viatura ligeirtamente abalroada, volto a escrever: Caro Senhor

 

No caso em apreço este “caro senhor” deve ser lido cum grano salis. Eu queria dizer “ó meu grande fdp”, ó biltre ensimesmado”, “ó sacana do catorze”... etc, etc...

 

Todavia, num blog sério e responsável, lido pelas melhores elites do país , ou pelo menos, por um par de criaturas sem mais que fazer, há normas de cortesia a respeitar e esta do “senhor” antecedido por excelentíssimo, ilustríssimo ou simplesmente caro, é de uso.

 

Ora então vejamos: segunda feira passada, a pedido (ou exigência) da minha cara metade, deslocámo-nos ao “Corte Inglês” para comprar duas ou três coisas no supermercado. Acabaram por ser trinta ou quarenta mas isso é o que sucede a quem vai acompanhado da mulher amantíssima em vez de ir sozinho (como de resto é costume) fazer as compras da semana, ou simplesmente do dia.

 

Estacionei a minha viatura (termo que me foi recordado, hoje mesmo, por um agente da GNR que me mandou parar para me autuar por excesso de velocidade) dentro das linhas convencionais que determinam o lugar de cada viatura (cfr, fraze anterior). Procurei um local retirado das zonas de mais circulação já por (afinal desnecessária) precaução.

 

E fui percorrer a minha via crucis no supermercado.

 

Quando regressei ao local onde deixara indefesa e frágil a minha “viatura” eis que descobri um pequena raspadela no canto traseiro esquerdo. Nada de muito grave mas também naada que com uma esfregadela de desperdício pudesse desaparecer.

 

Caro e desconhecido cavalheiro que num repente de mau génio e pior condução roçou o meu carro e desandou como se nada tivesse acontecido: não o censuro (ou não o censuro demasiadamente) pelo facto de se ter posto ao fresco depois de arranhar o meu pobre veículo. V. lá terá pensado que também levava uma mossa idêntica pelo que, em democracia, nesta democracia, o sacrifício deve dividir-se por todos.

 

E, provavelmente não quis deixar um pequeno recado no meu para-brisas por razões todas elas ponderosas: não trazia caneta, ou trazendo-a faltava papel, ou tendo ambos não sabe escrever, ou não me queria surpreender usando um método civilizado de se mostrar responsável e educado.

 

E fez bem. Eu tenho desde há muito uma ideia pouco optimista sobre os meus compatriotas e se alguma coisa me espantaria seria aparecer-me V. com ar de Egas Moniz, de corda ao pescoço, a desculpar-se pela sua imperícia e a propor pagar o estrago mesmo se ligeiro num carro que, passe a imodéstia, parecia novo em folha.

 

Depois, eu no que toca a raspadelas no carro, sou muito cioso. Quem estraga o veículo, a viatura ou seja lá o que for, sou eu. Eu e mais ninguém. Tenho-me na conta de condutor distraído e relapso pelo que uma raspadela, uma amolgadela, enfim, um qualquer aleijão no carro devem-se a mim e só a mim. E levo esta mania a extremos estranhíssimos. Se porventura acerto na viatura de outrem, deixo um papelinho no carro a vangloriar-me da minha façanha e a pedir que me contactem para pagar a conta da oficina e assim ficar com um documento provando que aumentei em mais uma unidade o meu palmarés de choques, próprios ou alheios.

 

V. ao não dar notícia da sua identidade, deixando uma raspadela orfã de pai e mãe, priva-me de averbar  no meu currículo este incidente. Em boa verdade, o pudor, o pundonor, o orgulho não me permitem avocar este vago risco. Imagine o que posso dizer ao garagista amigo (e grato) que me trata do Jetta: “ó senhor fulano, bateram-me e deram às de vila Diogo!”

 

V acreditava? Eu também não. “Olha para o entrevadinho. Guia pior que uma toupeira asmática e agora arma ao pingarelho! Pensa que é um Ascari e afinal nem de triciclo devia andar. A quem é que o gajo pagou para arranjar a carta?”

 

Não creio que V frequente blogs, ou pelo menos este. No entanto, há milagres e, com a mesma fé que me fez, in illo tempore, acreditar no senhor engenheiro Sócrates, e agora no senhor doutor Passos Coelho, atiro esta mensagem para o éter, esperando que, como o apregoado fim do deficit lá mais para o Verão, ela encontre destinatário capaz, menos ingénuo do que eu, ou seja, o encontre a Si. Prometo que não lhe peço dinheiro nem que me repare a “viatura”. Ao fim e ao cabo só queria ver a cara de um bardamerdas incapaz. Será pedir muito?

 

De V.ª Exª, muito cordialmente

 

mcr

 

 

 

 

 

É a vez do PR agir

JSC, 27.11.12

Os contribuintes não têm quem os defenda ou os represente; o Estado, como se vê, sempre que necessita de emendar um erro, de pagar uma fatura, de salvar uns amigos é ao seu bolso que recorre.”

Verdadeiramente, este orçamento não merece vir a conhecer a luz do dia. Não merece entrar em vigor. E os contribuintes portugueses estão muito longe de merecer o flagelo fiscal que este orçamento lhes quer impor.”

 Chegou a vez de o PR agir. Será que ele vai fazer o que todos (salvo PPC e o indizível VG) desejam ou será que vai ser mais um deputado da maioria, a dizer sim ao OE, enquanto também pensa na catástrofe que este Orçamento prenuncia (e que todos, cá dentro e lá fora, dão como certa)?

diário Político 181

mcr, 26.11.12

 

sobre manifestações, violências ocorridas & similares

 

 

 

(Declaração de interesses: sou a favor de manifestações de rua. E sou-o desde os meus ingénuos dezoito anos, data em que me estreei levando um enxerto de bordoada da polícia. Desde esse pouco auspicioso início de opinião política até Abril de 1974 participei em todas as manifestações que me passaram ao alcance, incluindo no lote, algumas ocorridas em outras geografias (Espanha, França, Itália e Alemanha). Falo de manifestações políticas, protestárias as mais das vezes, sob o signo de reivindicações democráticas e desenrolando-se pacificamente)

 

 

 

Mais de uma dúzia de anos a levar no lombo, a correr o risco de ser preso, dão-me, no tema, alguma autoridade. Sem, todavia, querer editar um manual, penso que é possível firmar meia dúzia de verdades incontroversas.

 

Uma manifestação de protesto é sempre um risco. Primeiro porque suscita animosidade por parte da pessoa, entidade ou partido visados, depois porque pode sempre "degenerar". "Sempre" não é um abuso ou uma força de expressão. Razões de toda a ordem (ou desrazões, se quiserem) fazem com que haja normalmente quem pretenda aproveitar o reboliço causado por uma concentração de pessoas para criar problemas. aos manifestantes ou aos seus adversários.

 

É essa a razão de haver normalmente "serviços de ordem" que se encarregam, com a dureza necessária, de enquadrar, proteger, encaminhar os manifestantes ao mesmo tempo que, tentam evitar a colagem de elementos exteriores  que pretendam desviar o rumo da manifestação para actuações não previstas - nem desejadas - por quem decidiu organizar a manifestação.

 

Convenhamos que se trata de uma precaução evidente e necessária: as manifestações políticas são, as mais das vezes, contra um estado de coisas. Contra um poder. Contra quem tem a força do seu lado. Contra, finalmente,  quem seguramente iria responsabilizar os manifestantes pelos eventuais distúrbios que ocorressem durante a jornada de protesto.

 

A manifestação tem de ser protegida contra o desvario de algum manifestante mais exuberante e, sobretudo, contra elementos provocadores que nela se possam integrar com a finalidade de a desacreditar. 

 

Em segundo lugar, mesmo sabendo-se tudo o que acima se disse, pode sem grande dificuldade afirmar-se que há, sempre, entre os manifestantes quem não aprecie a moderação imposta. Ocorre, até, que a própria resposta à manifestação, desde a proibição à repressão, desde a tolerância ao desprezo, haja quem, por isso mesmo se irrite, se excite, perca a cabeça e tente ir além do mero protesto pacífico. 

 

Se, em casos extremos, a repressão assume violência, então é previsível que haja quem não goste de ser espancado, perseguido, preso, gaseado, molhado por mangueiras e tente defender-se ou ripostar.  

 

Em tempos bem mais interessantes do que os actuais, um grupo de amigos em que me incluía redigiu mesmo um guia para manifestantes. Entre outros conselhos, propúnhamos  o de ir junto da cabeça da manifestação para poder fugir à pancadaria furando a barreira policial. Tínhamos assumido que a primeira carga é sempre mais branda e menos colérica e, ainda hoje, penso o mesmo. Num primeiro momento a polícia apenas quer dispersar a multidão, depois, com as tentativas de defesa dos manifestantes, as coisas tornam-se mais difíceis.

 

Outro ponto em que insistíamos era o de que, uma vez começado o conflito entre manifestantes e "forças da ordem", já ninguém estava seguro. Violentos e não violentos comiam pela medida grande. No auge da repressão ninguém faz a diferença entre os bons e os maus. 

 

Quando, por conseguinte, algum comentador vem criticar o facto da polícia não distinguir na multidão quem é ou não violento, está claramente a delirar. E a pedir às "forças da ordem" uma calma e uma contenção que só existem nos espíritos bem intencionados. 

 

Nos tempos da "Rote Armee Fraktion", os militantes ultra-esquerdistas exploravam com eficácia germânica a porosidade dos agrupamentos manifestantes, desde o núcleo radical, até às margens vagamente simpatizantes. Citando Mao, "o guerrilheiro move-se no seio do povo como um peixe na água",defendiam que as massas simpatizantes (ou só tolerantes) eram um meio óptimo de permanecer ocultos. 

 

E insistiam que a repressão policial, que esperavam e provocavam, aumentaria o "estado de consciência das  (mesmas) massas" circundantes e criariam novos pólos de rebelião.

 

Por outras palavras, e no caso em apreço, por muito que a CGTP se indigne (justamente) com os excessos cometidos por "incontrolados", bom seria que pensasse que não basta ir até ao Parlamento vociferar três propostas e dar por terminada a actividade manifestante do dia e da jornada. É que, como se viu, ali ficaram os tais "incontrolados" e uma turbamulta que apenas queria apreciar o espectáculo e gritar um par de slogans. 

 

Esqueciam-se, os deste segundo grupo - o mais numeroso e pacífico- que a sua simples presença e o seu vago apoio traduzido em palavras de ordem, alguns "viva" e um que outro "morra", confortavam as criaturas que laboriosamente desfaziam a calçada, amontoavam as pedras que depois arremessavam aplicadamente contra a polícia que protegia o Parlamento. É verdade que alguns cidadãos, mais conscientes (ou inconscientes?) vieram fazer pequenas e ineficazes interposições entre os aspirantes a guerrilheiros urbanos e o destacamento policial. Melhor fora que tivessem avisado o restante e compacto grupo de interessadas testemunhas do que, sem dúvida alguma, mais tarde ou mais cedo, iria suceder. 

 

A carga policial que ocorreu, como era mais do que espectável, varreu a zona fronteira de S Bento e pouco mais. Na confusão, cidadãos curiosos e pacíficos tornaram-se alvo de bastonadas, situação claramente evitável se tivessem atempadamente retirado do local tornado perigoso pelas horas de pedradas aos agentes. 

 

Eu apenas vi estas cenas pela televisão. E se alguma coisa me espantou foi o tempo que demorou a ordem para a carga.   

 

Ou nem isso. Ainda que duvide da perspicácia policial, tenho por certo que há sempre um tempo de espera e de reflexão para activar a repressão bem como esse tempo pode ser prolongado para a desculpar permitindo que a televisão (como foi o caso) mostrasse complacente e demoradamente os manejos dos rapazolas que amontoavam a sua munição nas barbas da polícia e depois a usavam com algum sucesso (fala-se numa vintena de agentes feridos por pedradas). 

 

Vi, como qualquer outro tele-espectador, a polícia a fazer detenções e,ao contrário de um comentador habitual do público, não consegui verificar nenhuma expressiva violência. Se algum catecúmeno entende que a as detenções se devem fazer com cortesia, peço desculpa mas gostaria que me dissesse onde ocorre tal uso.  

 

Também, só por absurda toleima, se pode criticar  ou fingir surpresa quanto à existência de polícias à paisana no meio dos manifestantes. Mais perplexo fico quando alguém, sem o afirmar expressamente, vem arguir que os polícias à paisana e infiltrados não devem incitar a actos de violência. Houve incitamento? Verificaram-se provocações policiais por parte desses agentes? É acaso "desleal" a utilização de agentes à paisana? 

 

Se não ocorreu nenhuma das situações apontadas, então a que vem o argumento? 

 

Finalmente: mesmo se não se ouvem especiais críticas à actuação policial (e isto desde a CGTP ao PC ou ao PS),  subentende-se em certos e raros comentaristas  uma espécie de lamento indignado. Como se esperassem -desejassem? - mais sangue, mais raiva, mais vítimas maior tensão!…

 

O Secretário Geral do PCP veio, por seu turno, lamentar que da "grandiosa" Greve Geral (levada a cabo pela CGTP, organização teoricamente independente do Partido) só restem os ecos das pedradas. Singular ingenuidade! Será que Jerónimo não aprendeu que o homem mordido pelo cão não é notícia ao invés da do cão mordido pelo homem?  Ter-lhe-á por algum momento perpassado pela cabecinha pensadora que os media se precipitariam que nem abutres sobre o fait-divers das pedradas, mesmo se breve e insólito. Que a Greve seria grande não é novidade, já não é novidade. Basta atacar o sector dos transportes que, a partir daí, boa parte das empresas entra em desequilíbrio.  

 

A última questão que esta manifestação põe (e a mais sensível) é a que foi recentemente levantada pela pedido da PSP das filmagens não editadas pelas televisões. A polícia louva-se na necessidade de verificar se dentre as pessoas filmadas figuram elementos que praticaram ali actos violentos. As televisões retorquem que as imagens não editadas caem na esfera do sigilo profissional.  A pergunta a fazer é se, quando alguém atingir mortalmente outrem com uma pedrada ou com uma bastonada, isso ainda está protegido como se fora o sacramento da comunhão. 

 

A lei, no caso em apreço, dá todo o espaço a dúvidas. Qualificar imagens não editadas como "sigilo profissional" parece-me forçado. Todavia, a intangibilidade dessas filmagens em bruto pode ser a garantia de que os jornalistas e operadores de imagem necessitam para levar a cabo o seu trabalho sem serem incomodados. Doutro modo, poderia ocorrer que os manifestantes filmados, ou em vias de o serem, tentassem destruir as provas da sua presença agredindo os repórteres e destruindo-lhes o equipamento. Vir a este propósito como li, com o "direito a informar",  pode, porém, ser forçado. Mesmo sendo contra a ideia de que se deve legislar sobre tudo, conviria, numa matéria tão sensível, aclarar as dúvidas legais que se possam suscitar. Para não se cair na aberrante situação de anular como meio de prova uma filmagem que revele um delito (o já usado exemplo da pedrada que fere seriamente o alvejado. Ou que o fere, tout-court!)

 

O Ministro da Administração Interna já veio pedir à PGR um parecer sobre a questão. Fez bem mas teria feito muito melhor se o tivesse feito antes dos factos e da visita da PSP à televisão. Uma coisa é prever, outra emendar. E aos ministros pede-se mais do que andar a reboque dos factos. 

 

Finalmente: parece que uma criatura, dirigente de um dos fantasmáticos grupos manifestantes, veio a terreiro protestar não só contra a barbaridade policial mas também contra a adjectivação tola e forte com que foi crismado o seu grupo (qualquer coisa como "radical", "terrorista", "violento" ou similar). Vê-se que é bem portuguesa e bem estribada nos "brandos costumes" e que desconhece a "mansidão policial" geral e internacional. E adivinha-se na sua retórica indignação que a criatura não analisa sequer os termos com que descreve o Governo, os outros, os adversários e a polícia. Ou seja, desboca-se em imprecações contra os que lhe retorquem na mesma moeda. Uma linguagem violenta suscita outra de igual teor. O resto é tolice. 

 

*como se vê na imagem, o recurso piedoso a uma certa iconografia revolucionária não é exclusivo português. Apenas representa um imaginário conservador fora do tempo e da realidade. 

 

 d'Oliveira fecit 24.11.012

 

 

 

“Não martelem os dados” para atacar o Estado Social

JSC, 22.11.12

Santana Castilho é um reconhecido especialista na área da educação, cujo prestígio está acima de qualquer suspeita, com tribuna assente no Público.

 

Há dois, três anos, quando Passos Coelho começava a fazer o caminho que o confrontou com a opção “ou há eleições do país ou há eleições no PSD”, por essa altura, Santana Castilho parecia aproximar-se dessa ala de pensamento, a ponto de aparecer na comunicação social uma colagem do PSD ao pensamento de Santana Castilho (e vice-versa).

 

Chegado Passos Coelho ao poder, depressa Santana Castilho descobriu com que gente se tinha metido e mais depressa ainda se afastou das políticas delineadas para a educação pelo governo PSD/PP-CDS.

 

No artigo publicado no Público, sob o sugestivo título “Não martelem os dados”, Santana Castilho desmonta, de algum modo, a estratégia que o governo está a utilizar para desmantelar o sistema de ensino público. O Governo não teve pejo em utilizar uma instituição prestigiada como o Tribunal de Contas, com o objetivo de poder apresentar números não validados, falsos, mas que a comunicação propala segundo a visão dos promotores e que articulistas, tipo JMF, fazem eco e replicam numa visão ultra liberal, de autentica obstinação contra o ensino público, de defesa dos muitos interesses instalados no ensino privado pago com dinheiros públicos.

 

O recente artigo de Santana Castilho bem merecia ser lido, debatido e ser objeto de reflexão por todos os agentes do ensino público e pelas associações de pais. O Governo vai deitar mão de todos os instrumentos para desmantelar a educação pública. Para a reduzir a um sistema que apenas sirva os pobres e os novos pobres.

O negócio orçamental do costume

JSC, 22.11.12

Face à ameaça dos deputados do PSD-M votarem contra o OE2013, Passos Coelho propôs-se alterar a lei das finanças regionais com o objetivo de garantir um novo empréstimo de 1100 milhões de euros ao Governo regional, conseguindo, deste modo, assegurar os votos daqueles deputados.

 

O Parlamento aprovou o Orçamento retificativo que permite viabilizar a exigência do PSD-M, exigência que se estende a outras receitas. Segundo o Púbico, de ontem, os deputados do PSD-M exigem que o OE2013 atribua à Madeira várias receitas, designadamente:

 

- parte da receita da privatização da TAP; -a receita da sobretaxa do IRS; - a receita do imposto do vinho da madeira.

 

Imaginemos, agora, que a região do algarve também tinha os seus deputados e que estes exigiam, para a região, o imposto arrecadado com o turismo ou que a região do douro queria ficar com o imposto sobre o vinho do porto e assim sucessivamente.

 

Ainda bem, para Passos Coelho, que apenas tem de satisfazer os apetites do PSD-M. Vitor Gaspar é que lá terá de teorizar sobre o carácter “excecional e estratégico”, a fim de dar cobertura técnica e política ao negócio de compra de 6 votos por 1100 milhões de euros e reafirmar o rigor orçamental.

Que pensar dos políticos que em vez de assumirem responsabilidades culpam os portugueses?

JSC, 21.11.12

Segundo o Publico, Cavaco Silva acaba de dizer que os portugueses esqueceram o mar, a agricultura e a indústria.

 

Os portugueses esqueceram? Todos? Ou aqueles a quem Cavaco Silva, enquanto primeiro ministro, estimulou a desmantelar a frota piscatória? A abandonar a agricultura? E mesmo estes, serão eles os principais responsáveis?

 

Cavaco Silva bem podia olhar para o seu passado de mais de vinte anos no topo da chefia de órgãos do Estado e, num momento de pesar de consciência, em vez de criticar “os portugueses”, fazer uma autocrítica e pedir desculpa aos portugueses, a todos, incluindo aos que receberam dinheiro do OE para desmantelar, arrancar, enfim, para não produzir.

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