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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

As coisas que ele consegue ver

JSC, 30.09.13

Cavaco Silva retirou as conclusões do acto eleitoral antes deste ter ocorrido. Mas para que ninguém se perdesse a questionar o porquê dessas conclusões, Cavaco apressou-se a garantir que “"Portugal já saiu da recessão”. Melhor ainda, Portugal “apresenta o maior crescimento de toda a União Europeia”. O Governo de Cavaco Silva levou uma brutal sova nas eleições autárquicas? Verdade. Mas Cavaco só vê benfeitorias na governação. E se os juros continuam acima do aceitável, Cavaco imputa a responsabilidade para os mercados.Não existe nenhuma razão lógica” para taxas de juro de 7%, diz.

 

Tempos houve em que Cavaco via os mercados com benevolência, que não devíamos hostilizar. Agora temos Cavaco a defender o seu Governo da irracionalidade dos mercados e do mau juízo dos eleitores. Razão para não haver mudanças de protagonistas nem de política.

estes dias que passam 303

d'oliveira, 27.09.13

 

Aberrante?

Não: simplesmente á portuguesa!

 

Já por aqui falei da lei que proíbe acumular mais de três mandatos de presidente de Câmara ou de Junta de Freguesia.

Considerei tal dispositivo legal uma burrice supina e uma prova provada de quão difícil é fazer política em Portugal. De todo o modo, nessa mesma ocasião, eu entendia (para alguma coisa me serve um já inútil dioloma de licenciatura em Direito, ganho penosamente no tempo em que aquilo parecia uma dupla maratona salpicada de obstáculos e barreiras várias) que a solução era a da proibição total de candidaturas mesmo em áreas geográficas diferentes.

Tudo porque só assim se conseguiria a tal “renovação” de pessoal político que agora parece erigida em dogma de democraticidade. Foi outro o entendimento dos senhores juízes do Tribunal constitucional que assim se fizeram  momentaneamente perdoar de anteriores tropelias contra o actual Governo.

Aliás, eu também recordava que a lei me parecia infeliz e estúpida (qualidades bastante generalizadas na nossa legislação recente). De facto,

ao só contemplar presidentes de câmara e de junta (coitados destes últimos), a lei deixava de fora  a multidão imensa dos vereadores que pelos vistos se podem perpetuar ad aeternum sem mossa nem beliscadura para a famosa renovação. Convenhamos que, num grupo de uns bons milhares de eleitos, ir tocar apenas em pouco mais de 350, parece facécia de mau gosto. Sobretudo quando, nos que escapam à rasoira democratoide, estão os senhores vereadores das obras e de outras competências igualmente interessantes do ponto de vista financeiro.

Em segundo lugar, porque atrás deste tonto dispositivo legal, que o TC manteve em toda a sua inanidade jurídica e (sobretudo) ética, aflorava uma velha ideia mesquinha e populista: a ideia de que “eles” andam ali para se governar, acrescida a estoutra igualmente manhosa: se há cacau para encher a burra de um deve haver para o resto da malta.

Em Portugal, todo o eleito é corrompivel ou assim parece. A ideia de alguém se dedicar generosa e simplesmentye ao bem comum parece ser mera ingenuidade e tolice a toda a prova.

Não que eu negue quer há lideres municipais corruptos, Deus me livre! O que não percebo é como se castigam os pecadores permitindo-lhes ao fim de doze anos a ida para o consellho exactamente ao lado. E sobretudo porque é que se castiga toda a gente?

E finalmente porque, como agora se vê abundantemente, não só os senhores eleitos com mais de doze anos se transferem em número apreciável para outras municipalidades ou freguesias, como também, e à falta de lugar, optam (e são mais de cinquenta!) por ir dar uma voltinha nas Assembleias Municipais –onde farão tudo para manter o seu controlo político partidário – ou até se candidatam como vereadores...

Parece que ao alto critério dos defensores da falida “renovação” e de todos quantos sobre o assunto fizeram lei, escapou esta tão lusitana espertalhice.

Mas deixemos este problema e passemos à substância das eleições que se avizinham.

Por um lado, o país  indefeso viu-se atacado por hordas de listas independentes que não só não o são mas nem sequer disfarçam. O presidente A ou o vereador B não foi (como esperava e pensava merecer) reconduzido?  Aguenta aí que é só desfiliar-me e candidatar-me aureolado por uma independência manca e manhosa que eventualmente poderá enganar uma dúzia de eleitores desprevenidos.

Um pequeno partido do arco parlamentar não tem gente suficiente (ou não lhe convém aparecer sob o seu nome) ou garantias mínimas de impreesionar o pagode? Sai rapaidamente outra lista independente, cidadã, virgem e inocente.

O PCP como de costume aparece vestido de CDU, como se os raros ecologistas daquela coisa “os verdes” fossem mais do que uma antena “companheira de viagem” ilustrada pela senhora Apolónia.

O PPD, em vários sítios, mormente no Porto (ó esperteza saloia e aldrabona) não é PPD é “porto forte”! E nesse porto fortalhaço aparece em fundo azul (cor muito ppd!) um cavalheiro chamado Meneses, responsável pela colossal dívida camarária de Gaia. A criatura pálida apesar do fotoshop a que os criativos da publicidade o submeteram, desdobra-se em mangas de camisa e muito leitão assado em promessas que, pelos vistos, não convencem a cidade que durante doze anos premiou Rui Rio com maiorias absolutas.

Deus, se existir, honrará seguramente as sondagens que dão Meneses em 2º lugar.

Na mesma zona geográfica o herdeiro de Meneses, uma tonitruância que dá por Abreu Amorim também não parece entusiasmar os gaienses. Do outro lado, um trauliteiro matosinhense que em seu tempo se ilustrou nas violências da doca de Matosinhos (que perderam Narciso Miranda), aparece como candidato do P.S.!!! Dermasiado mau para ser verdade mas, pelos vistos, também esse ferrabrás de bairro parece batido pelo actual presidente de Câmara, agora independente, que se não conformou com as conspiratas concelhias que Seguro (o homem não acerta uma!) avocou.

Como exemplo de renovação política, o mesmo Seguro, ou alguém por ele, candidata por Coimbra o viçoso Machado, ex-dinossaurio local.

Outro dinossáurio, pior do que o de Coimbra, Moita Flores, foi exportado de Santarém, onde já não cabia, para Oeiras. É um favor que fazem à lista chefiada pelo nº 2 de Isaltino.  Aliás em Oeiras, onde agora estou, o delírio dos candidatos da oposição atinger as raias do absurdo no que toca a promessas.

Claro que não vão ao ponto de, como o inefável dr. Seabra, prometer um túnel para o Saldanha. Passo lá frequentemente e nunca vi, fosse a que horas fosse, a necessidade de   um buraco em tal sítio. O dr. Seabra é, como eventualmente não se sabe, o menos péssimo de três comentadores de futebol num programa televisivo medíocre mas que deverá ter imensa audiência. Disse o menos péssimo porque assistir aquilo e às tiradas dos outros dois contrincantes de Seabra deve dar remissão dos nossos pecados por dez anos.

Convinha explicar ao dr. Seabra que quanto a túneis nem toda a gente é Santana Lopes, quand-même. E que há túneis e tonéis, neste caso vazios como a promessa de Seabra. De todo o modo, Lisboa parece vir a ser um passeio para Costa e um pesadelo para Seguro.

Em Lisboa ainda, alguém, candidato sem esperanças,  propunha-se meter o fado como disciplina obrigatória no ensino unificado!  A burrice e a estultícia juntas não têm limites...

E por aí fora.

Estas eleições são, convém acentuar, locais. Ou seja, fora dois ou três grandes centros urbanos, vá lá seis, joga-se sobretudo no plano municipal. Mesmo que se queira dar aos escrutínios  de domingo, um carácter nacional, o que é duvidoso, é bom lembrar que, em eleições intercalares o Governo costuma perder. Todavia, para que destas corridas municipais saia de facto uma derrota (merecidíssima!) para Coelho, Portas & comandita, é preciso perder muito mais do que o que se adivinha. E, para o P.S., é preciso ganhar muito mais do que está ao alcance dele. Aliás, a previsível derrota no Porto (e seria a quarta vez!) e o infamante 3º lugar, que tudo indica o seu candidato obterá, empanarão sempre a inalcansável vitória dos socialistas. Na melhor das hipóteses conquistarão Sintra (à sombra desse socialista dos quatro costados e de sempre, que é Basílio Horta que pelos meus cálculos ainda acabará a sua deriva polítca, iniciada na extrema direita, no Bloco – se o aceitarem!), reconquistarão Coimbra e mais um par de praças semi-abandonadas pelo PPD. Como já disse, se Costa ganhar Lisboa com a percentagem que lhe auguram, tal vitória trará amargos de boca a Seguro, líder frágil e pouco convincente e facilmente ejectável assim que comece a cheirar a eleições.

Ao jogar (tolamente) tudo por tudo nesta jornada, Seguro arrisca-se a sair mais depressa da cena  política. É com ele. E da sua evicção também não virá mal ao mundo, aos portugueses e muito menos ao P.S. O homenzinho era um jarrão mudo no Parlamento mas o silêncio só é de oiro quando depois se virem as pepitas. Com boa vontade e muita compaixão, de Seguro só se viu até agora uma vaga purpurina e já é ser generoso.

Quanto a Coelho (e nem se fala no rapazinho Portas responsável máximo da falta de consideração de que gozamos na  Europa), tem os seus tristes dias contados. A menos que surja um milagre, as legislativas estarão perdidas. E nós com elas, cumpre dizer, graças à mediocridade, à falta de senso e de inteligência da criatura.

 

 

 

 

Porque será?

O meu olhar, 25.09.13

O Paulo Portas das feiras desapareceu. O agora Vice só faz comícios em recintos fechados.
O mesmo acontece com Passos Coelho que hoje o máximo que arriscou foi andar 150 metros de rua, em zona residencial, cercado por nove seguranças e tapado pelas suas hostes.
Esta é uma campanha muito especial...

Muito mais que umas eleições autárquicas

JSC, 18.09.13

 

Começou a campanha eleitoral para as autarquias locais. A pré-campanha foi preparada pelos partidos do governo com muito cuidado. A própria remodelação governamental obedeceu a esse preceito. Idem, para o atraso na elaboração do Orçamento do Estado para o próximo ano. Pelo caminho, apareceram novos figurantes para entreter com briefings e coisas afins, com maduros e rosalinos a fazerem de tropa de choque da troika governativa – Coelho, Portas & Cavaco. A própria libertação de Marco António do exercício de funções governativas, para se dedicar a tempo inteiro à campanha eleitoral, mostra a importância que Passos Coelho deu ao que ele anunciou “que se lixem as eleições”. Marco António é a pessoa certa para falar, falar, falar, para as rádios e Tvs, para fingir de vitima, para desculpabilizar o líder. Depois, só tem de esperar que RDPs, TSFs e TVs cumpram o seu papel de replicadores.

Mas a preparação da campanha eleitoral pelos partidos do Governo foi bem mais abrangente. Na pré-campanha até Durão Barroso apareceu com aquele discurso em que apresentou o caso de Portugal como bom exemplo da austeridade. As rádios e as Tvs lá passaram e repassaram a ideia e quase nos convenceram que somos mesmo um caso de sucesso.

O que não se esperava é que o Presidente da República também acabasse por entrar, mesmo em cima do início da campanha eleitoral. Mas entrou. Outrora, Cavaco Silva entendia que não havia mais lugar para novos sacrifícios. Agora, quando os sacrifícios se multiplicaram por N e todos os planos do governo falharam, Cavaco foi visitar os jovens "empreendedores que não se resignam". Em boa verdade, Cavaco Silva nunca abandona os seus. Os portugueses é que estão abandonados à sua sorte, abandonados pelo Governo, que olha para nós com a única preocupação de sacar dinheiro (legal ou ilegalmente); abandonados pelo Presidente que inventa realidades e faz apelos ao bom senso, quando deveria ser ele a usar o bom senso. Será neste quadro que os portugueses vão eleger os autarcas. Nunca numas eleições locais se justificou tanto que o voto de cada um seja decidido mais pelo que se passa no país e bem menos pelo que pode acontecer localmente.

Voltar as costas aos políticos

José Carlos Pereira, 06.09.13

A recente decisão do Tribunal Constitucional (TC) veio pôr fim à indefinição que se abatia sobre as candidaturas dos autarcas que, após atingirem o limite de mandatos consecutivos num determinado município, decidiram candidatar-se noutro concelho. Não querendo discutir aqui a bondade da decisão do TC, que reuniu com um colégio mínimo de juízes, não posso deixar de dizer que é absolutamente lamentável e desprestigiante para o regime democrático e o Estado de Direito que a decisão fosse conhecida por alguns dos interessados, com todos os pormenores, dois dias antes do respectivo anúncio público.

Estas candidaturas autárquicas dos denominados “dinossauros”, conjuntamente com as dos ditos “independentes”, que, na sua esmagadora maioria, não são mais do que ex-autarcas e dirigentes partidários preteridos pelos respectivos partidos, vieram aumentar o descrédito dos eleitores sobre os partidos, os políticos e o sistema em geral.

Naturalmente, o período que atravessamos, com a perda continuada de direitos e rendimentos, o aumento do desemprego e das falências e a persistência de alguns privilégios por parte dos detentores de cargos públicos, também leva o cidadão comum a rever-se cada vez menos nas atitudes e nos princípios seguidos pelos políticos que dirigem o país e cada parcela do território nacional, criando uma onda crescente de descontentamento e de alheamento.

Estou convicto que a abstenção vai aumentar nas próximas eleições autárquicas e nas que se seguirem de âmbito nacional e este é um problema que deve ser atacado de frente por todos os agentes políticos, antes que despertem entre nós fenómenos extremistas iguais a alguns que vemos lá por fora. Ainda há dias, em Marco de Canaveses, tive oportunidade de comentar isso mesmo com Jorge Lacão, ex-ministro e líder parlamentar do PS. Não é pelo facto de estar presentemente na oposição que o PS deve cavalgar a onda do “quanto pior melhor”, pois num futuro mais ou menos breve o PS voltará ao poder e aí vai ter o problema a estourar-lhe nas mãos.

estes dias que passam 302

d'oliveira, 03.09.13

Um pobre diabo, pouco dotado, inculto e politicamente menor ou

 

Abertura da época de caça adiada sine die

 

 

 

Para quem não perceba, estou a falar do senhor Passos Coelho que, actualmente, exerce sem brilho, sem ideias, sem garra, as funções de 1º Ministro.

 

Como é que um ex-jota (mais um!!!...) do PSD, um ex-administrador de várias empresas insignificantes, um ex-docente de Matemática numa escola secundária perdida em Cu de Judas, um licenciado em Economia numa dessas fábricas de diplomas (uma tal Universidade Lusíada...),  nascido em 54, chegou onde chegou?

 

Pois por inércia, por desatenção, por um mero acaso ligado à incompetência do anterior 1º Ministro que, de vitória em vitória, de obra faraónica em obra faraónica, de esperteza saloia em esperteza saloia, lá afocinhou a meio do mandato.

 

Lembremos os factos. O desditoso e pouco entusiasmante 2º governo de Sócrates (a que nenhuma cicuta misericordiosa acorreu para salvação dos portugueses) percebeu, atónito, que de PEC em PEC as Finanças Públicas entravam em colapso.

 

A crise já vinha de longe, é verdade. Vinha de meados dos anos 90, mesmo se antes já se percebessem sinais evidentes de exaustão: as receitas não conseguiam crescer o suficiente para acompanhar crescentes despesas públicas. O crédito fácil, a euforia de deixar obra (estádios agora uivantemente desertos, auto-estradas para cuja construção nunca se fizeram contas quanto ao tráfico, a inacreditável campanha sumptuária da renovação das escolas que fez a gloria da ministra Lurdes Rodrigues a quem, por tão alto feito, premiaram com um lugarzinho confortável na FLA, os projectos megalómanos de aeroportos, caminhos de ferro que custaram o que custaram, ao mesmo tempo que iam para o lixo os anteriores projectos de obras semelhantes que também custaram apreciáveis bagatelas e o que mais adiante se verá...), a displicência, a cultura do desperdício, o novo riquismo bacoco e grosseiro, fizeram o resto. Ou melhor: aumentaram o buraco pavoroso em que nós todos estamos metidos.

 

Não omitamos a história triste e ridícula dos primeiros ministros fujões, desaparecidos do combate, reaparecidos em invejáveis lugares onde também não brilham nem mostram obra que se veja e que orgulhe, sequer, as mais estremecidas avós dos mesmos.   

 

No meio desta história cruel que repete, passo por passo, a eterna história dos políticos nacionais desde há século e meio (leiam Eça, por favor. Ou Ramalho. Ou Fialho. Ou dezenas de outros críticos portugueses que perderam tempo, sono e esperança a tentar fazer o retrato dos parlamentos que se sucediam), dos sátrapas que comiam à mesa do Estado, das combinatas, dos escândalos, das intentonas, das conspirações, dos roubos, da corrupção endémica e do desprezo universal dos eleitores, eles próprios desprezados e maltratados pelos poderes públicos e fácticos que se sucederam, há uma constante:

 

Quando se perde o Poder e se mergulha na Oposição é o deserto. Quem por lá vegeta, não manda, não é respeitado, não interessa ninguém, não sabe o que se passa, não é informado.

 

À conta dessa triste situação, que fazem os manda-chuvas partidários? Calculam cuidadosamente o tempo de exílio interior que a chefia da oposição representa e movem os cordelinhos de modo a mandar um inocente para o cargo. Na altura devida, fazem um congresso, varrem o “totó” e rgressam triunfantes ao poder partidário e eventualmente à ribalta política se ganharem as eleições que se perfilam no horizonte próximo.

É o que se está a passar com aquele cavalheiro Tó Zé Seguro, outra excrescência das jotas, outra revelação universitária (desta feita é Relações qualquer coisa, por outra universidade privada e desconhecida...): com o PS na  oposição, os barões atiraram com o mudo e quedo deputado para as trincheiras. Na altura devida, garanto, aparecerão os verdadeiros artistas.

 

Ora, o frágil Passos Coelho é fruto de uma situação idêntica no outro partido do “centrão”. É verdade que tinha sido escovado pela equipa da drª Ferreira Leite que, compreensivelmente, o achava sensaborão e de duvidosas capacidades. Engano fatal da boa senhora que se esqueceu que a criatura tinha as manhas todas do longo estágio na jota e contava com o apoio daquele inesquecível Relvas, o doutor apeado, que não terá estudos suficientes mas que os substitui por um virtuosismo conspirativo e aparelhístico invulgar.

 

De todo o modo, se Passos queria, Manuela não conseguia pará-lo e os abutres do partido viram na criatura, um excelente “inocente útil” para os momentos de solidão a que, provavelmente o partido estava votado. Ninguém acreditava na queda de Sócrates, o que também mostra bem a falta de análise política e o amadorismo daquela gente que confunde política com oportunismo e conspiração barata.

 

Com se vê, os interesses da Pátria estão bem entregues!

 

Portanto Sócrates no seu mais que merecido ocaso e Coelho na gaiola dourada do seu novo poder. Desconhecendo tudo e não vendo serem-lhe facultadas informações fiáveis, completas do “estado da Nação” eis que a criatura se embrenha numa propaganda tonta e optimista quanto ao eventual acesso ao poder. Foi isso que perdeu Sócrates. Dum lado, um politico acossado por todos os lados, incapaz de perceber que a sua estultícia o cegava, do outro um medíocre adversário que, ignorando tudo, tudo prometia.

 

E um segundo e mais fatal engano: a multidão eleitoral não queria Passos mas apenas ver-se livre de Sócrates.

 

Quando, ao fim de um par de semanas, o recém eleito começou a ver o que se passava ainda não era tarde. Ou melhor: já era tarde porque ele não era a pessoa indicada para atalhar os males carregados pela situação. E, em poucos meses, seis, sete ou dez, eis que a avalanche das más notícias, amplificada pela incúria, pela incapacidade de as perceber e atalhar, lhe caiu em cima. Não é segredo para ninguém (excepto eventualmente para ele e para os seus áulicos) que a população o detesta, que troça dele, que os intelectuais e as escassas elites o desprezam, que a Oposição radical o odeia. E que a Europa, Merkel incluída, o considera pouco. Aturam-no porque querem mostrar à Grécia que alguém faz por pagar. Cá dentro, Portas toureia-o com eficiência e descaramento. Os poderosos do PSD já lhe preparam a certidão de óbito, escrita e reescrita por Pacheco Pereira que acumula contra o pobre diabo, diatribes, sarcasmo, desqualificações várias e um ódio de estimação. Tirante este último, desnecessário, está cheio de razão.

 

A classe média que, quanto a coelho, só á caçadora, arrepela-se: boa parte dela, dependente do Estado, vê afundarem-se ordenados, pensões e expectativas.

É difícil encontrar, na imprensa, um articulista que sequer finja consideração ou estima pelo homem.

 

Só o terror de ver Seguro ao leme do Estado, aguenta Coelho. A esquerda radical, ou assim-assim, ainda anda de lanterna à procura de algo que substitua a derrocada final do cadaveroso Leste ou essa mistificação que se chama República “Popular” da China onde um partido comunista recheado de empresários de sucesso leva a julgamento um dos seus mais distinguidos elementos. O homem vai ser condenado por corrupção, por manobras anti-partido, por espionagem, por ofender a memória de Mao ou apenas porque sim. E por cornudo, já me esquecia.  

 

Coelho, enquanto ainda há por aí caça maior e mais interessante, vai-se escafedendo até umas eleições que o PS já não quer próximas. Et pour cause: foi tal e tão forte a dose de cavalo aplicada ao país que algum resultado por fraco que seja poderá animar as hostes. O PS reserva-se para mais tarde, não quer pegar neste doente moribundo e espera, ansioso, pelos resultados das eleições municipais que, queira-se ou não, são importantes para medir não tanto o clima político no Porto ou em Lisboa, mas os eventuais progressos da indignação cidadã (listas independentes) ou os eventuais progressos, sempre marginais mas significativos, do PC e do BE.

 

Há um trégua implícita mesmo se os arrufos de Coelho com o Tribunal Constitucional (as bojardas da criatura sobre o assunto são grosseiras e mostram a incapacidade política que já se referiu. Aquilo é falta de tino e muita cabeça perdida, se cabeça ainda há e em regular estado de funcionamento) podem fazer pensar o contrario. A troika ronda por aí, o turismo está a dar um respiro ao emprego, as exportações lá se vão portando menos mal e até as vendas de carros subiram ligeiramente por comparação com o ano de 2012 (de todo o modo estão abaixo de finais dos anos 90...).

 

Dito de outro modo: a situação é tão medonha que ninguém, excepto os que nunca chegarão ao poder, se arrisca. E quando  a podridão reina, as varejeiras consolam-se. E vivem. Assim vai Coelho (tirado da cartola de quem nós sabemos).

 

Miserere nobis!

 

 

 

 

 

 

 

                                       

 

no labirinto alfarrabista 3

d'oliveira, 03.09.13

 

 

Um general alemão

Ainda não convalesci desse vulcão chamado “Servidões” de Herberto Hélder. Nem espero convalescer, convenhamos. Ando com o livro debaixo do braço e só leio um texto por dia. Às vezes nem isso. Como uma criança com um bolo, esforço-me por fazer render o peixe. Bem sei que, em acabando, posso sempre recomeçar. Mas não será nunca a mesma coisa. À uma porque a leitura de HH é sempre diferente. Desde o momento solar em que li “Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra e arbusto de sangue. Com ela encantarei a noite...” (muitas graças se deem a António Carlos Manso Pinheiro, meu amigo, meu irmão nestas coisas, meu colega desde o 1º ano do liceu, levado por um cancro ignóbil que poupa os velhacos e nos rouba os melhores e que num dia alucinante me leu estas linhas – há de ter sido em 61 ou 62- o mundo nunca mais foi o mesmo)já senti essas palavras mudarem de cor, de volume, de sentido, mil vezes.

Não consigo imaginar HH, que conheci e frequentei durante algum tempo (tempo de espanto e lume!) aos 80 anos a criar mais outro momento único da poesia portuguesa. Mas criou!

Por isso o vou lendo, respirando, mastigando com a gulosa lentidão do que sabe que a poesia é para quem dela precisa.

Sendo assim, e continuando uma tradição comum a tantos leitores, vou entremeando HH com outros autores. O último em data é Paul von Lettow-Vorbeck(Memórias da guerra na África Oriental, 1914-1918). Dito assim, é provável que ninguém saiba quem é.

Mas é alguém bem próximo de nós, portugueses, pelos  que estimam a História pregressa do seu país. Von Lettow foi o general alemão que nos derrotou sem apelo nem agravo, no Norte de Moçambique, durante a 1ª Grande Guerra.

Todavia, não nos derrotou apenas a nós. Com um exército que nunca teve mais de 300 a 500 branco e dois a quatro mil askaris (soldados negros de grande qualidade) Von Lettow derrotou sucessivamente exércitos ingleses muito superiores (chegaram a ter vinte vezes mais tropas do que as dele, invadiu a Rodésia do Norte (actual Zambia)) e numa das suas entradas em Moçambique, quase chegou às margens do Zambeze. Contra ele combateram sucessivamente 127 (cento e vinte sete) generais dos quais se deve destacar o sul africano Smuts.

Acresce que, em tempos tão difíceis como aqueles, a “força de protecção alemã da colónia do Tanganika” nem sempre teve o apoio dos políticos coloniais aí instalados. Em último lugar, se a guerra é sempre violenta e despiedada, valha a verdade que as tropas de von Lettow conseguiram ganhar a admiração dos adversários por não terem feito jus à má fama de gozavam os alemães. Os prisioneiros foram, regra geral, correctamente tratados e aos oficiais prisioneiros apenas se exigia a palavra de honra que, uma vez devolvidos à liberdade (às tropas alemãs em constante movimento não convinha manter prisioneiros quanto mais não fosse por nem sequer terem sempre os mantimentos necessários para se manterem em forma)não voltariam a pegar em armas contra os seus captores. Os soldados negros eram libertados rapidamente pelas mesmas razões (economia de meios)e porque, em muitos casos, o português é o mais evidente, tinham sido mobilizados à força e a sua fidelidade aos antigos chefes militares era, a existir, extremamente reduzida.

Acabada a guerra, declarado o armistício, foi o pequeno exército alemão, reduzido a cerca de trezentos europeus e menos de mil e quinhentos askaris, instado a cessar hostilidades sob a garantia de que isso não seria considerado uma rendição. Claro que, uma vez depostas as armas, a situação dos alemães pouco se diferenciou da rendição.

Quando regressaram à Alemanha, foram recebidos como heróis o que não é de estranhar num país acabrunhado pela derrota. Von Lettow passou pouco tempo depois à reserva mas, mesmo se nacionalista, recusou altivamente apoiar Hitler fosse de que forma fosse. Junker, prussiano, conservador mas demasiado apegado a valores que exluiam totalmente qualquer adesão ao Reich de 1000 anos e à infâmia do NSDAP. A edição portuguesa que encontrei depois de anos de procura (e depois de ainda há pouquíssimo tempo ter encontrado uma italiana) é ilustrada por desenhos e mapas de operações e está sublinhada a lápis pelo anterior leitor e proprietário que não se coíbe de comentar. Um “must”!