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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

diário Político 194

mcr, 25.02.14

Ontem a TVI apresentou a primeira parte de uma longa .sobre Angola. Vários portugueses emigrados, outros tantos angolanos de origem portuguesa proclamaram as excelências de Angola, as oportunidades, o progresso, a paz, ao mesmo tempo que criticavam os de cá que sobre Angola a prodigiosa teriam “ideias” erradas, falsas, antiquadas.

É verdade que anda por aí um relento de colonialismo, um despudorado racismo, muita inveja, enfim um cocktail miserável que surde a cada canto quanto se vê um “preto” rico a comprar o que por cá pouca gente pode adquirir.

Todavia, conviria lembrar a esses emigrantes felizes, a esses angolanos, brancos ou negros, orgulhosos da sua “angolanidade” que os progressos da fortuna, o mercado de trabalho aberto e generoso, os ordenados  e os empregos para todos não podem, nem devem, fazer esquecer a corrupção, as fortunas gigantescas e mal adquiridas, a escassa democracia, os direitos políticos negados, a brutalidade policial e todos os restantes desastres que um partido único (que é o que por lá há) traz sempre.

E, já agora, lembrar que a construção civil em Luanda, o restauro do caminho de ferro de Benguela, o reequipamento urbano do Huambo, do Lubango ou a eventual edificação de resorts turísticos para a zona do delta do Okavango, aproveitam ainda a muito poucos e que há em Angola um gigantesca massa de cidadãos que continuam a viver em condições infra-humanas. No musseque, pois claro. Sem electricidade, sem água canalizada, sem ruas pavimentadas, mas com moscas, com doenças e com miséria.

Percebe-se que os entrevistados prefiram não falar disso, vai nesse silêncio, nessa omissão, o seu futuro lá.

Que a TVI se embasbaque, se babe com o que viu (e não percebeu) é que mostra um servilismo diante de alguns poderes fácticos angolanos (e cada vez mais presentes na economia portuguesa) que se torna ainda mais estranho quando se assiste à sua desafiante posição perante as instituições portuguesas.   

Angola cresce, enriquece? Óptimo. Foi para isso que muito boa gente lutou cá e lá. Está lá tudo feito? Não. Tudo corre bem lá? De modo algum. Deveremos omitir, esconder, negar os vícios elite dirigente angolana? Claro que não. A solidariedade com Angola deve sobretudo ser a nossa solidariedade com todo o povo de Angola. Todo, repete-se e não só com o Sr. Santos, a sua família, os filhos, netos, primos, afilhados dele e dos seus amigos e camaradas e compadres. 

E, já agora, não seria interessante fornecer antecipadamente aos repórteres da TVI algumas noções úteis sobre Angola, a sua história, a sua gente, a sua idiossincrasia? Só 

 

 d'Oliveira fecit, 24.02.14

 

* na gravura: máscar tchokwé (ou quioco se preferirem). 

As ditas infra-estruturas de valor acrescentado

José Carlos Pereira, 25.02.14

Na semana passada, vi-me impedido, por razões profissionais, de participar na sessão de discussão pública promovida pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte sobre as infra-estruturas de valor acrescentado, na sequência do relatório elaborado pelo grupo de trabalho nomeado pelo Governo. Autarcas, académicos, empresários e dirigentes associativos do Norte envolveram-se numa reflexão sobre os investimentos prioritários definidos por esse grupo de trabalho, que não contou com representantes da região, e reivindicaram obras fulcrais para o desenvolvimento integrado do território, a realizar com o apoio do próximo ciclo de fundos comunitários 2014-2020.

Muito embora nenhum dos partidos do arco da governação se possa gabar de ter tido sempre um comportamento irrepreensível nestas matérias, estiveram bem os cinco presidentes de Câmara socialistas do distrito do Porto que entregaram um caderno de encargos na defesa de investimentos caros à minha região do Tâmega e Sousa: a electrificação da linha ferroviária do Douro até à Régua e recuperação da linha até Amarante; a construção do IC 35 de Entre-os-Rios a Penafiel; a requalificação da ligação rodoviária entre Marco de Canaveses (Soalhães) e Cinfães; a construção da ligação rodoviária entre Baião-Ponte da Ermida-Resende; e a consolidação do canal navegável do Douro.

Todos estes investimentos promoveriam a coesão do território de forma ímpar e ajudariam a “desencravar” uma das sub-regiões menos desenvolvidas, em termos económicos e sociais, do país. E se não forem concretizados com a ajuda do próximo quadro de apoios comunitários, é certo e sabido que dificilmente estes projectos alguma vez verão a luz do dia.

A troika e a roda da sorte

José Carlos Pereira, 21.02.14

O país caminha, aturdido, por entre os ecos da discussão sobre se Portugal vai ter uma saída limpa, um programa cautelar ou se recorre a uma terceira via após o final do programa de assistência económica e financeira. Ninguém sabe, neste momento, o que decidirá a Europa dos mais fortes sobre isso – sim, não seremos nós a escolher – mas o tema serve de mote para a discussão política dentro e fora de portas, nas vésperas da campanha eleitoral para as eleições europeias.

Como se não bastasse, o FMI acaba de vir dizer que a austeridade e os cortes serão para continuar, não deixando margem para dúvidas a esse respeito. O Estado tem de se reestruturar e reformar a sério e de caminhar para uma diminuição consolidada do défice orçamental.

Pois bem, como a reforma do Estado enunciada pelo vice-primeiro-ministro não passou de um guião a médio prazo, muito longe de se transformar numa realidade concreta, não surgiu melhor ideia aos nossos governantes do que insistir no aumento da receita fiscal. Se não vai a bem vai à força e então aí teremos em breve a caricata “factura da sorte” para premiar a abnegação dos portugueses na recolha de facturas.

Com esta opção, o Governo fez o trabalho de casa ao copiar modelos em vigor em países como a China e o Brasil, mostrando que se identifica em pleno com o desígnio “tuga”: o jogo, a sorte e o azar, o ganhar sem esforço, a invejazinha que nos faz olhar de lado para o carro artilhado do vizinho, tudo isso cala fundo à maioria dos portugueses. O Governo mais não faz do que procurar o pior que há em cada um de nós, lançando os portugueses na corrida ao jogo… à procura do carro topo de gama.

Melhor retrato do país e dos seus governantes era impossível.

Diário Político 193

mcr, 19.02.14

 

 

O bloco, ai, o bloco...

 

Devemos merecer isto: ver um partido afundar-se no seu próprio labirinto, suicidando-se a fogo lento, mercê das declarações dos seus líderes, dos erros clamorosos a que não resiste, da tentação de repetir oitenta anos depois as mesmas asneiras da 3ª Internacional que, perante o avanço do nazismo propunha, quando não exigia, a famosa teoria da “classe contra classe” e, na Alemanha, elegia o partido  socialista como inimigo principal.

Vem daí o apodo “social-fascista” com que uns rapazes, apesar de tudo mais cultos que a actual gente do BE, à voz de comando do PCC, crismaram a URSS e por extensão todos os partidos comunistas da Europa. Todos, não. Havia uma excepção, o partido “trabalhista” da Albânia sob a clarividente direcção de Enver Hodja. Como cultura marxista, Hodja era um zero total e se, durante tantos anos, exerceu o poder tal deve-se a uma ditadura absoluta que privou, e ainda priva, a Albânia de um futuro pelo menos prometedor. 

Deixemos porém estas miudezas históricas e regressemos ao BE, aqui e agora. Quando a coisa apareceu logo os mais precavidos entenderam estar-se perante um saco de gatos, um albergue espanhol um hospício decadente onde vão morrer os eternos descontentes. As diferentes e irredutíveis tendências que ali convergiam tinham em comum um passado de intensa disputa, de múltiplas alergias e inalcançável unidade fosse no que fosse, incluindo a acção.

Porém, sendo Portugal um país de milagres e de Virgens a cada canto, desde Fátima até à santinha da Ladeira, houve quem esperasse o inexpectável: desta vez é que ia ser. O novo milagre das rosas aconteceria pela mão dos senhores Louçã, Fazenda, Portas, Rosas & companhia limitada. O efeito de novidade, o cansaço compreensível perante um PC relutante a dessovietizar-se, a democratizar-se e a modernizar-se e um PS vergado a uma luta fraticida, sem história conhecida (por muito que o PS jure pelo anterior à Ditadura de nada lhe serve. Esse partido estava já morto e enterrado pela 1ª República, pela relutância dos trabalhadores que nunca se reviram nele, pela avidez do “Partido Democrático” que nunca lhe deu espaço e pela dramática inércia do escasso grupo que teimava em tirá-lo do coma. O PS é dos anos setenta, nascido na Alemanha pela mão do SPD e posteriormente benzido por todos quantos temiam o PC. Soares criou-o e, uma vez na direcção, foi eucaliptando o partido. À sua volta nada medrava e o resultado é este. De Soares a Constâncio (o breve), deste a Guterres (o desaparecido em combate) a e depois sempre numa descida fatal a Sócrates até se estatelar em Seguro (que ironia o nome!) o resultado está à vista: sem ideias, sem programa, sem rasgo. A única coisa que salva o PS actual é existir mPassos Coelho e as suas inépcias. )

Entre este PS caricatura grotesca de si próprio e o frio hieratismo dos herdeiros de Cunhal, parecia haver espaço para um grupo jovem e atrevido, mesmo se no que toca a juventude nenhum dos seus principais fundadores primasse pela frescura (de idade, de teoria, de prática e de projecto).

Deixemos de lado as razões que levaram Louçã a retirar-se (momentaneamente?) e vejamos o que faz e o que diz o casalinho que agora leva o  incerto leme desta barca.

Há uns meses andaram entretidos numa série de reuniões vagamente fundacionais de uma alternativa que rapidamente fizeram abortar. Tal iniciativa despertou, todavia, interesses inesperados, e eis que prosperam ajuntamentos de vária espécie e forma todos clamando por unidade desde que à sua medida e seguindo as suas regras. Alguns dos próceres do BE ouviram o canto dessas sereias e tentaram contra toda a lógica aparelhística, propor esse comboio ao partido. Foram derrotados ou, mesmo, esmagados, como se sabe. No entanto, a derrota destas criaturas não deixou de ter consequências. Primeiro a redução de efectivos militantes, mesmo se, como afirma o irredutível Semedo, isso apenas melhora a qualidade do partido (é a velha teoria do “partido melhora depurando-se”) e as saídas de cena não beliscam a coesão e a razão da organização... Tudo isto é velho e revelho na história das organizações protestarias e minoritárias na qual se inscreve o BE.

Este fim de semana, por ocasião de um magno conclave, eis que saiu fumo branco. A euro-deputada Marisa avisou que os bloquistas “são europeístas mas não são tontos”. A frase é engraçada mesmo se a maioria dos observadores entenda justamente o contrário: Que eles não serão assim tão europeístas, nem deixam de ser, ou parecer, tontos. Daqui a um par de meses, ver-se-á se o BE repete os três deputados europeus, se cai para dois, se volta a um ou se nem isso.

Já o dr. Semedo, no discurso que antecedeu a gritaria do encerramento a cargo da sua jovem colega de direcção, afirmou que “o Bloco não dará a mão ao PS”. A frase é intrigante por vários motivos. À uma, o PS, não pareceu nunca entusiasmado pelo casamento, noivado, namoro ou breve encontro com o BE. A Seguro e à sua gente, o BE aparece como um temível gang de marxistas (que exagero!) de esquerdistas (idem) e de criaturas temperamentais.  Seguro que não é jovem (tê-lo-á sido alguma vez?) desconfia da pseudo juventude de Semedo e dos arrebatamentos da sua companheira. E do bizarro europeísmo de ambos, claro.

Depois, o BE, com as saídas que o minguam, as incertezas que ambiguamente cultiva nas relações com os diferentes grupos que, ao cheiro de eleições europeias, subitamente despontaram e florescem na área da esquerda, não parece ter uma mão em estado conveniente de ser dada. Terá quanto muito uma mãozinha semiparalisada, um coto pouco apetecível ou, o que é pior (e será também um pesadelo de Seguro) um gancho como o do capitão com o mesmo nome, um artefacto flibusteiro com que sangrará o pescoço de quem se lhe apoiar.

É sabido que uma aliança entre um grande partido institucional e um parceiro menor é este que baralha e dá as cartas. O BE seria para o PS sempre um mau negócio (e para maus negócios, alguém, lá pelo Largo do Rato, ainda se lembrará de uma famosa Frente Republicana e Socialista que teve um triste resultado eleitoral que o dr Soares, sempre ele, classificou de “mau (ou péssimo) negócio”.

Finalmente, o PS nunca se mostrou inclinado a pedir fosse o que fosse ao BE. Ou melhor, pedir por pedir, exigia deste uma completa rendição, o abandono sensato de vários devaneios, isto para não falar de ter engolir uma manada de elefantes políticos e financeiros.

Portanto, a frase do dr Semedo carece de sentido, de oportunidade e de verdade. É apenas uma frase para militante ouvir e para a imprensa impante a repercutir. A bem dizer nem mereceria um comentário num blog, mas que querem?

Chove que Deus a dá, não vale a pena falar do tempo, o caso do Meco raia o pornográfico e ninguém se atreve a prognosticar os resultados do campeonato, a decisão sobre o eventual afastamento do FC Porto da Taça, ou os juros da próxima emissão de dívida pública.

 

D’Oliveira fecit (17.02.14)

*por razões meramente derivadas da preguiça, o texto sai com um atraso de 2 dias. Já não chove mas a meteorologia ainda insiste na ocorrência de aguaceiros Quanto ao resto tudo “com dantes quartel general em Abrantes”. 

 

na gravura: Duarte Almeida "o decepado" na versão de um aluno da escola EB1 (sanchequias?)

 

carta a um incursionista momentaneamente ausente

d'oliveira, 17.02.14

Aguenta pá!

Aguenta aí os cavalos e não deixes que uma merda de um enfarte do miocárdio te deite abaixo.

Mesmo se o sacana vier acompanhado por uma infecção pulmonar, desgraçada e cabrona, não te rendas! Tu vales mais do que essas duas circunstâncias canalhas que, insidiosas e com pezinhos de lã, rondam pela calada dos teus cinquenta e tal anos para te levar do abraço dos amigos, dos beijos das (ai tantas!...) namoradas, do calor do teu filho que há-de estar, como nós todos, ansioso e preocupado, a contar as horas, a espreitar o rosto dos médicos, a rezar sabe-se lá a quem.

Aguenta, faz forças da fraqueza, lembra-te que ainda não fizeste tudo o que te competia, neste percurso de incerteza e angústia que é o teu, o nosso, o de todos, que nós, mesmo nesta aflição, estamos contigo, estivemos contigo e queremos vir a estar novamente contigo.

O Inverno vai como tu sabes, o país, idem mas para lá dos ventos que assolam a costa, do mar que teima em invadir o litoral, das chuvas que empapam solos e galgam estradas, há sempre ou irá haver algum sol  que o mal não dura sempre. Aguenta, pá, lembra-te de ti e regressa desse coma induzido para nos contares como só tu o sabes fazer novas desse país onde agora estás.

Cá te esperamos.

Com ansiedade, com preocupação, com medo, com ternura e muita esperança.

 

Abraços 

d'Oliveira e mcr

au bonheur des Dames 353

d'oliveira, 15.02.14

 

 

Os desastres de Seguro (a partir da Condessa de Segur)

 

 

 

Alguma leitora ou leitor recorda os desastres de Sofia da senhora condessa de Segur? Daquela menina tão simpática e boazinha que só faz asneiras e que só piora a situação quando pretende remediá-los?

 

Parece que o livrinho faz parte de um qualquer programa nacional de leitura para criancinhas portuguesas, coitadas!...

 

Todavia, alguém, por acaso um rapazinho já crescidinho e impudentemente metido nas lides políticas, que por mera ironia, se chama Seguro, Tó Zé para os mais íntimos, não leu, ou se leu não percebeu a moralidade, o interessante livro da velha condessa.

 

Não faz mal. Provavelmente também não leu muitos outros autores, nacionais ou estrangeiros, situação em que estará em pé de igualdade com muitos outros (a esmagadora maioria) parlamentares. Os cuidados extremosos que dedica à Pátria amada e a devoção que manifesta pelo bom povo português roubam tempo ao vício solitário da leitura e, que eu saiba, não há filme recente sobre a desastrada Sofia. Portanto, Seguro não fará derreter seja o que for e não oferecerá um chá como o que a menina ofereceu às amigas.

 

Todavia, como se vai sabendo – e como aqui já se foi prevendo – Seguro anda em má maré: o dr Soares conspira abertamente e reúne de dois em dois meses mais uma mesa apocalíptica. Nela, alguns conspícuos cavalheiros com idades veneráveis mas ambições fortes, fingem de Cassandra e cospem fogo.

 

Alguns dos hierarcas (e são tantos) do PS desdobram-se em criticas cada vez menos veladas. Costa alerta para a necessidade de haver nome credível para lista do PS às europeias, lamenta que tudo ainda esteja no segredo dos deuses e que, concomitantemente, vários militantes prestigiados vejam os seus nomes gastos pelo arruído da comunicação social. Assis ou Carlos César já “foram”. O PPD, ainda há tão pouco desgastado, ganha novas forças ao ver o destroço que a imprudência e a impudência de Seguro, cada vez mais desbocado, provocam.

 

Por outras palavras, nem o desatinado e risível auto-esfacelamento do Bloco, nem o desconhecimento público e  a falta  de carisma do cabeça de lista do PC, permitem pensar numa eventual façanha socialista.

 

Claro que, mesmo sendo fácil, não há que atirar para cima do desastrado Seguro todas as culpas da actual situação. Por um lado, ele não foi nunca, apesar de eleito sem oposição, o homem querido e necessário pelos militantes. Depois, não afastou o espectro socratistista e, muito menos, alguns dos seus mais fortes apoiantes que semi-açaimados andam pelos cantos da Comissão Política a arreganhar a dentuça e a pear (para apear) a acção de Seguro. Finalmente, os diferentes barões que não quiseram pegar no comatoso PS aquando da derrota das eleições estão prontos para avançar sobretudo graças às continuas toliçadas de Passos & companhia, que eles, talvez prematuramente, já consideram vencidos. Algumas sondagens simpáticas prefiguram uma vitória do PS mesmo se ainda muita água vá correr debaixo da ponte.

 

Esta próxima oportunidade eleitoral poderá dar alguns sinais mas convirá que os Seguros não a tomem pelo que ela não é: uma vera eleição legislativa. Primeiro porque vota sempre menos gente, depois porque as legislativas se ganham distrito a distrito e essas matemáticas eleitorais podem implicar maioria de votos mas estabilidade de mandatos.

 

Todavia, se Seguro não obtiver um resultado evidente e confortável bem que pode pensar em arrumar as botas de cavaleiro que, cedo e mal, calçou.

 

Perceberá ele isto?

 

Au bonheur des Dames 352

d'oliveira, 14.02.14

Do bom uso da língua portuguesa

Começou ontem o julgamento dos principais responsáveis do BPP. Tarde e a más horas mas com estrondo.

De fato, o dr.  José Miguel Júdice entendeu tonitruar um par de “verdades” (pelo menos para ele) entre as quais esta pérola: os clientes prejudicados e ora queixosos seriam “hipócritas” (ou o país seria hipócrita, já nem sei) porque se tinham fartado de ganhar dinheiro graças ao dr Rendeiro mas que logo que perderam algum, entenderam pôr a boca no trombone.

Ora bem: parece que o dr Júdice, ou o dr Rendeiro via dr Júdice nasceram ontem e ainda não perceberam que quem se mete nestas negociatas quer ganhar sempre. Sempre e muito! A avidez dos investidores é algo que lhes é consubstancial. Se não quisessem ganhar balúrdios depressa e em segurança, não se metiam nestas altas cavalgadas. O risco é para os outros. Não vejo nisto nada que se configure como hipocrisia. A menos que os meus dicionários sejam diferentes dos de Júdice.

Eu não sei (nem, de resto, quero saber) se o dr Rendeiro perdeu dinheiro dele ou não. Se o veículo financeiro por ele idealizado era algo de absolutamente legítimo e legal ou se toda aquela construção tinha maus alicerces. A verdade é que de repente, pum catrapum, o famoso banco viu-se a cair a pique, pediu umas centenas de milhões ao Estado (que, desta vez, sabiamente, recusou) e naufragou ingloriamente no mar da palha da finança nacional.

Que os lesados uivem, compreende-se perfeitamente, mesmo se, no fundo, e comigo isso acontece, só façam rir o público impecunioso. O espectáculo da ignorância atrevida mas jogadora na bolsa e especuladora, é repelente e o seu fim dramático tem para a generalidade dos portugueses um gosto de comédia do parque Mayer.

Hipócrita seria aquele que ao ver como os pseudo-investidores afocinham ainda fingisse ter pena deles. Por aqui, nada disso. Arriscaram e perderam? É a vida. E se arriscaram é porque o tinham. Se o não tinham (o cacauzinho, claro) e o foram pedir emprestado, então, além do mais são parvos.

No “país da minha tia,/trémulo de bondade e aletria” (O’Neil) há sempre uns espertos que querem enricar sem trabalho. De vez em quando, a coisa corre-lhes mal. Todavia, conhecem-se, ai se se conhecem!..., casos de muito “boa” gente que anda por aí a pavonear-se na crista da onda sem que se lhe reconheça mérito, trabalho e tempo suficientes para justificar as fortunas que amassaram.

Não sei o que vai suceder aos actores deste processo, mesmo se tema que a coisa, entre recurso e recurso, acabe depois do passamento de alguns deles ou de todos. Ou morra na onda mansa das várias incompetências (é Júdice que as refere) que eventualmente se cruzem na acusação.

Gostaria, porém, de saber o que irá acontecer (ou o que aconteceu) ao espólio artístico do BPP (ou do dr Rendeiro, ou duma qualquer fundação por ele criada) que tinha um “valor” de mercado importante (mesmo que alguém o achasse empolado). É que depois do alarido sobre o ajuntamento de mirós de vária escolha, parece estranho este ominoso silêncio. Aliás, sobre os mirós, houve um cavalheiro (defendendo a sua incorporação nas colecções do Estado) com largo currículo crítico e museológico, com fartas responsabilidades nesta outra colecção em apreço, que tem mantido sobre este assunto um silêncio mais que prudente. Como se não tivesse nada a ver com as excentricidades coleccionadoras do dr Rendeiro... como se não tivesse estado sentado à mesa do orçamento deste último e da colecção do BPP...

Claro que isso não é “hipocrisia”...

E por aqui nos ficamos, que prosseguir só com a mão a tapar o nariz.

au bonheur des Dames 351

d'oliveira, 12.02.14

À (meia) dúzia é mais barato! *

 

1- Não há um jurista no PS? Não há ninguém que explique ao sr. dr. Seguro que não é de mais tribunais especializados que precisamos mas apenas de melhores tribunais, de menos burocracia judicial, de melhores juízes e mais claro castigo para quem tente atrasar processos através de expedientes dilatórios?

Confesso que sempre suspeitei que, por trás daquele estudado silêncio (no tempo em que impávido se sentava na bancada apoiante de Sócrates) e, agora, através da cacafónica gritaria com que pretende atrair médias e votantes, havia um medonho vazio de ideias, sejam elas quais forem (não são!).

2- Parece que a etérea senhora Presidente do Parlamento, farta de se sentir enxovalhada pelos ocupantes das tribunas destinadas ao público, encomendou um estudo sobre a legislação aplicável  aos díscolos noutras latitudes. A “Esquerda” já fez saber que é contra a “repressão”. Esperemos-lhe pela volta, quando for maioria...

Pessoalmente entendo que se há a obrigação de defender a todo o custo a liberdade de manifestação, esta não tem lugar nas tribunas. Por uma razão simples: há que dar aos representantes do povo, livremente eleitos, uma casa e um ambiente dignos. E livre de ameaças mesmo se camufladas em protestos. Há que dar aos cidadãos que se interessam pela coisa pública um local onde sejam respeitados e vejam ser respeitados não os deputados A, B ou C mas a generalidade dos eleitos que é outra coisa bem diferente. 

Ir organizadamente para as tribunas para assobiar, vaiar ou aplaudir, um deputado, um partido, uma moção, parece-me excessivo. Aliás, vezes há que ainda nem sequer um quiddam começou a perorar e já a galeria se manifesta. Inutilmente, de resto. A senhora Esteves ordena a evacuação e a assembleia prossegue como se nada fosse.

3- O que acima se escreveu não contempla o senhor deputado Jorge Lacão. A criatura entendeu, do alto do limitado discernimento com que foi contemplada, que falar uma inteira hora (ou quase: 59 minutos!) para fazer uma pergunta era um direito seu. Não é. Faz lembrar o falecido deputado Camoesas que uma vez (16 para 17 de julho de 1925?)  falou durante nove horas no Parlamento para tentar atrasar a sessão até à chegada do comboio do norte onde viriam os deputados “democráticos” ausentes (as “mulas de reforço”) e assim ganhar uma moção de confiança. Alguém terá dito de João Camoesas que não lhe admirava a verve mas sim a bexiga! (nota: o expediente não resultou mesmo se um outro correligionário (Agatão Lança) o tivesse imitado falando mais cinco horas!)

Voltando a Lacão: quando depois o interromperam, já ele levava mais um quarto de hora de parlapié, o homem protestou e os colegas solidarizaram-se!

Ao longo destes longos anos, sempre tive de Lacão uma opinião cada vez mais fortalecida: À boa moda galega, eu, quanto a Lacão, “só com grelos”.

4- Apareceu um estudo que prova que de 1995 em diante, foi óbvia e constante a preocupação em nomear para cargos da Administração Pública gente fiel ao partido no poder. Ou seja, os jobs foram mesmo para os boys. Cada vez mais me regozijo de, nesses tempos sumarentos, ter rejeitado duas sinecuras de alto gabarito, a saber: a direcção da Orquestra Sinfónica do Porto e, depois, o lugar de Director Distrital de Segurança Social do distrito do Porto. No caso deste último, recordo que ainda nem sabia do convite e já um cavalheiro do partido no poder me vir dizer que “ia estar muito de olho em mim”. Fiquei estarrecido pois só passadas algumas horas o convite –de quem não suspeitava-  se concretizou.  Ao contrário, anos antes, um Secretário de Estado da Cultura, convidou-me para Delegado Regional do Norte da SEC acrescentando para a Rádio que me nomeava mesmo “sabendo que eu era de Esquerda”. Fui obrigado, nesse mesmo programa a retorquir que “aceitara o lugar mesmo sabendo que quem me convidava era de Direita”.  Durei um ano no lugar pois demiti-me quando o referido político teve a bizarra ideia de transferir a sede da Delegação do Porto para Vila Real! Convém acrescentar que fui prevenido que a coisa não me afectaria pois já me tinham reservado um suculento lugar.  Pouco dado a ser considerado como objecto de compra e venda, pedi a demissão e fui condenado a vegetar na mesma Delegação durante cinco penosos e longos meses...

A tal Delegação continua teoricamente em vila Real mas a direcção está no Porto... Ninguém tem a coragem de acabar com aquele qui-pro-quo cretino e falhado...

5- Os jornais comoveram-se com a expulsão do dr Capucho. Independentemente do facto de considerar que no lugar dele faria exactamente o mesmo (tendo todavia o bom senso de imediatamente me desfiliar do PPD) não vejo razão para tanto choro e ranger de dentes. Os estatutos do partido em causa dizem o mesmo, a acção de Capucho e dos seus amigos, pode ter feito perder a Câmara de Sintra, e não me parece curial vir invocar em defesa própria a meritória carreira partidária anterior. Imagine-se que não havia sanção para um acto claramente dirigido contra o partido. Como é que depois se sancionavam futuras actuações idênticas? Aliás nem Capucho é um militante desconhecido nem a sua candidatura apenas denuncia uma crítica à direcção (boa ou má e, no caso, péssima) de Passos.

6- A Suíça entendeu num referendo limitar a livre circulação de pessoas oriundas de outros países, mormente europeus. Parece que a população acha que que mais de vinte por cento de estrangeiros é demais. Eventualmente, é. Todavia, desde que celebrou os acordos com a União Europeia e desde que isso se traduziu numa entrada maciça de alemães, italianos e portugueses no seu território (serão na totalidade quase um milhão de pessoas) os todos os índices de bem estar, de emprego e de sucesso económico se acentuaram. Mais: os imigrantes deram à Suíça a necessária mão de obra de que eles necessitavam urgentemente. Mandar embora muitos desses trabalhadores significará, por exemplo, o fim ou o estrangulamento de centenas de hospitais, casas de repouso, de cuidados intensivos, lares de idosos e  similares. E o fim de apanhadores de fruta, sapateiros, barbeiros, canalizadores, trolhas, empregadas domésticas, técnicos de toda a espécie,  etc...

Finalmente, foi o campo suíço (onde são raros os estrangeiros) e não as cidades (onde eles abundam) quem mais votou a favor da proposta da Direita. E foram sobretudo os cantões “germânicos” (mesmo contra os seus vizinhos linguísticos) quem mais apostou nesta reforma xenófoba.

Espera-se que a Europa (e os governos dos países dos cidadãos mais directamente atingidos) reaja com vigor e determinação a esta nova regra de vida suíça. Seria extraordinário que a União Europeia se rendesse ou “compreendesse” a decisão helvética.

Já alguém ouviu o sr Passos, o sr Portas ou qualquer um dos seus colegas? Já alguém ouviu o sr Seguro? Ou essas criaturinhas evanescentes andam demasiado ocupadas com a pala do estádio do Benfica?

 

estes dias que passam 317

d'oliveira, 07.02.14

 

 

O caso dos Miró em parte incerta

 

Antes de tratarmos dos quadros que andam fugidos convirá lembrar que estas agora tão almejadas “peças de arte fundamentais” pertenciam ao tristemente célebre Banco Português de Negócios que o anterior Governo entendeu dever nacionalizar. Recordemos ainda que tal decisão, na altura asperamente criticada por muito boa gente, custou ao país (isto é, a nós todos, contribuintes) quase quatro mil milhões de euros, se é que a coisa não aumentou. Dou de barato a miséria que um banco angolano deu pelo cadáver do banco mas que causou forte polémica, dessa feita com origem nas mesmíssimas criaturas que tinham apoiado entusiasticamente a nacionalização do banco.

Dentre o espólio que ficou em mãos do Estado, ou de uma empresa de que o Estado é o principal ou único accionista, há um estranho monte de quadros de Miró. Oitenta e cinco peças para ser mais preciso. Convenhamos que oitenta e cinco parece muito e, sobretudo, surpreendente. Como é que um banco, mesmo com a gestão que se conhece, apostava tão denodadamente num único autor que, sendo bom, não é, apesar de tudo uma referência inultrapassável na arte do século XX. Que diabo, nem um Picasso, um Braque, algum esquecido Modigliani, outro Léger, sei lá!... Nada, só Miró...

(convém referir que nada me move contra o catalão: tenho, paga com algum sacrifício, um múltiplo do senhor e que muito estimo. Comprei-o em Paris, numa excelente galeria da re Dauphine e ostento-o triunfalmente na sala de jantar.)

Tudo indica que se trata de sobras não vendidas do artista catalão. Assim se percebe o escasso valor atribuído o conjunto tanto mais que ainda hoje se soube de um “Miró” vendido em leilão por mais de três milhões...

Por outro lado, conheço (até por dentro) a triste situação dos nossos museus quanto a espólio pictórico, para não deixar de a lamentar e de pensar numa solução mecenática levada a cabo não por um par de criaturas ricas mas pelo esforço de milhares ou dezenas, ou centenas, de cidadãos. Curiosamente nos últimos dois anos, por escassos euros, apoiei duas compras de peças para museus franceses que conheço e estimo. Ambas as campanhas tiveram êxito e êxito rápido. E fi-lo espantando-me com este raio de país, com este raio de museus que nunca pensaram em mobilizar a sociedade civil do mesmo modo.

Mas voltemos à enxurrada de Mirós agora em causa. E pensemos com a raiva que qualquer cidadão sente ao saber que mais de cem mil portugueses mormente pensionistas vêem com apreensão senão com pavor o futuro próximo.

Não caio na facilidade de pensar que os estimados 35/40 milhões de euros previstos pela venda em leilão iria diminuir o desastre. Não é uma questão populista de dinheiro mas outra bem mais importante: é o que isso significa quando se fala da crise e dos sacrifícios. Com que cara se apresentarão os admiradores de Miró perante os portugueses a quem até o subsidio de reinserção social foi negado?

Depois, há uma outra questão: então o anterior Governo não sabia deste maná mironico? E sabendo nada fez?

Anda por aí uma criatura chamada Canavilhas que terá ,sem fulgor nem talento, exercido de ministra da Cultura. Do que foi o seu mandato fala (ou não) a memória: Nada! Ou menos, ainda.

Todavia, a senhora Canavilhas é actualmente deputada do PS (situação onde também, até ao momento, não parece ter brilhado) e do alto dessa tribuna tem feito um arruído tremendo sempre que se trata de dar na orelha ao actual governo que, coitado, também não dá nas vistas...

Ela e mais uns colegas de bancada entenderam ulular a sua patriótica indignação quanto à venda dos Miró. É o costume. Não se faz nada quando se pode mas depois é um ver se te avias...

A senhora Canavilhas afirma que fez imensas coisas em relação ao caso durante 2008, 2009 e 2010 mas que não teve êxito. E acrescenta, segundo o “Público” que só em 2012 é que “a colecção ficou na totalidade em posse do Estado”.

Conceda-se, sem prescindir de prova clara, que assim foi. Alguém ouviu da senhora Canavilhas ou dos seus camaradas de luta durante o último ano alguma referência, aviso, conselho, denúncia, do caso?

O mesmo se poderá dizer de um par de cavalheiros que, subitamente, subiram à mesma ribalta nacionalizadora e musificadora dos Miró. A começar pelo senhor Pedro Lapa que propõe que os miró confiscados tenham como destino o Museu Berardo. Ficariam lá lindamente com outros monos de 2ª e 3ª ordem que inçam a mesma colecção (ou ajuntamento).

Há nisto tudo o mesmo arrepiante relento oportunista, a mesma ideia de apanhar a boleia da facilidade, mesmo se nem sequer até este momento se tenha apontado destino para os quadros e, muito menos, qualquer ideia para substituir o eventual lucro da venda. Um país que não tem uma política séria e clara de aquisição de obras de arte, sequer uma política igualmente séria e clara e transparente, anda, volta que não volta, aos baldões graças à bizarria dos “expert” culturais, eles mesmos incapazes de propor soluções, de propor uma lei do mecenato exequível capaz de mobilizar os cidadãos para causas culturais.

Esta gentinha brande a palavra cultura como se fosse um pistolão apontado ao peito inerme do cidadão comum. Para caceteiros prefiro os profissionais: são mais sérios.

Gostaria, mesmo se se trata de algo pessoal, de contar o que se passa com algo que me pertence.

Tenho, neste momento, uma biblioteca que ronda as vinte e uma mil espécies bibliográficas. Dela constam primeiras edições de literatura portuguesa desde finais dos anos cinquenta, uma boa biblioteca sobre expansão portuguesa com algumas raridades (entre novecentos a mil exemplares), largos metros (permitam-me a brincadeira) de volumes de história, e algumas colecções de livros sobre arte, surrealismo (a tal coisa a que ligam Miró), curiosa, etc.

Entendi que uma biblioteca deste género poderia ser oferecida a uma Biblioteca Pública portuguesa. Devo a algumas bibliotecas públicas muitos dos meus mais felizes encontros com a escrita e começo a pensar que com a idade que levo devo destinar as minhas coisas. Tenho nisto o apoio dos meus familiares e que não tivesse. Com a biblioteca queria também encontrar destino para cerca de 9.000 discos, uma centena e meia de quadros e esculturas e quase meia centena de peças de arte africana.

Querem acreditar que nenhuma biblioteca se sente capaz de aceitar a doação? Todas as pessoas com que tenho falado ficam entusiasmadas. Todas sem excepção! Só que..., só que não têm espaço sequer para um quarto dos livros e revistas! Quase todas, não dispondo desde há muito de meios para adquirir livros recentes, gostariam de poder ter tudo o que se publicou na segunda metade do século passado, mormente os autores portugueses. Mas não têm espaço. Uma grande biblioteca, com uma dúzia ou dúzia e meia de anos, já tem o espaço de depósito completamente cheio com transferências de uma outra biblioteca situada na mesma cidade! Aliás o armazém dessa nova biblioteca dá no máximo para 150.000 livros!!!

Uma das bibliotecas consultadas, enfim, alguém responsável, jurou que me contactaria para pelo menos ver o que tenho. Estou à espera dessa gente há seis meses!

Um livreiro alfarrabista de Lisboa de que sou velho cliente disse-me (e outros já o corroboraram) que se trata de uma situação comum. E propôs-me fazer em devido tempo, suponho que logo que eu parta desta para melhor, um leilão com bom catálogo onde o meu modestíssimo nome seria lembrado para todo o sempre (há catálogos de leilões  que são eles mesmos peças de colecção!) ou pelo menos durante um par de meses.

Notem que eu nem sequer ponho a exigência de os meus livros ficarem em lugar especial e identificados com o dador. Quero lá saber dessa tonta glória. Quando morrer, morri. Estiquei, passei desta para melhor, fui dar uma volta ao bilhar grande...

Mas o país que temos é assim. Pobrete e não alegrete. Queixa-se de tudo, da Europa, do capitalismo, do comunismo, da Espanha, dos bancos, do senhor Passos Coelho, como amanhã se queixará do senhor Seguro, do tempo, da senhora Merkel mas nem sequer é capaz de aproveitar o pouco que tem ou poderia ter.

Estas criaturas agora arregimentadas na defesa dos mirós, como antes noutras, desde a pesca de arrasto nas albufeiras ou a redenção das almas dos caramujos em Alguidares de Baixo,  se quisesse fazer coisa boa proporia – no caso de haver – a compra dentro da colecção de um ou dos trabalhos bons e lançaria uma campanha pública de obtençãoo de fundos para o efeito. Desde já me inscrevo com cem euros, mas não creio que os tenha de gastar. Cá, no que toca a pagar com cacauzinho próprio, tudo foge. A galope.

8em tempo: esta colecção de mirós foi arrematada in illo tempor por um japonês nas barbas dos nossos vizinhos espanhóis que, pelos vistos, não tugiram nem mugiram perante tal atentado à sua riqueza nacional...

 

*na gravura: à direita o meu miró. Pago com o suor do meu rosto, acrescente-se.

O PS e as eleições europeias

José Carlos Pereira, 06.02.14

O país tem vivido anos de grandes dificuldades, com a crise económica e financeira a deteriorar as condições de vida dos portugueses até um ponto inimaginável. A quebra continuada de rendimentos, o aumento do número de falências, o crescimento estrutural do desemprego, contrariado nos últimos meses com a ajuda da emigração e do aumento do número de pessoas que “desistiram” de procurar emprego, e o corte abrupto dos apoios sociais atiraram muitos portugueses para um patamar de difícil sobrevivência.

Por muito que nos custe admitir, este caos social paga-se. O abandono escolar, nomeadamente entre os universitários, é um indicador relevante e penalizador para o futuro, mas o aumento do número de crimes e suicídios – basta abrir todos os dias as páginas dos jornais - é um dado camuflado na realidade do dia-a-dia que não pode deixar ninguém indiferente.

O descontentamento com o Governo e a maioria que o sustenta cresce a cada dia que passa, mas o que é certo é que o principal partido da oposição não consegue (ainda) convencer os portugueses de que será capaz de fazer vingar uma via alternativa, sólida e estruturada. As várias sondagens realizadas estão aí para demonstrar que o PS não consegue descolar.

António José Seguro tem nas eleições europeias uma oportunidade para derrotar de forma clara a maioria no poder e, tendo em vista o que se passou em Portugal e nos demais países sob assistência financeira, afirmar, em concertação com os demais partidos socialistas e sociais-democratas, um discurso sobre o papel e os desafios da Europa e das suas instituições diferente do que é projectado sob a actual liderança conservadora.

Infelizmente, o tempo passa e o PS não faz essa afirmação. Neste momento nem sequer escolheu ainda o cabeça de lista a essas eleições, o que é verdadeiramente incompreensível. Seguro diz que ninguém na direcção do partido está com pressa. Outra coisa não se esperaria dos intrépidos seguidores que o acompanham. Aliás, a falta de espessura de alguns dos porta-vozes apresentados pelo PS é outro dado que não ajuda a credibilizar o papel de liderança política e social que o PS deve ambicionar.

Por este andar, António José Seguro, como diz o ditado, arrisca-se a não ter uma segunda oportunidade para criar uma boa primeira impressão.

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