REORGANIZAÇÃO DO MAPA JUDICIÁRIO - II
A Constituição de 1976, (com as sucessivas revisões) não prescreveu para Portugal um sistema judicial unitário. E, para além disto, debruçou-se com atenção diversificada sobre a estrutura e regime próprios de cada uma das ordens dos tribunais que instituiu e cuja criação facultou.
A ordem jurídica portuguesa comporta, pois, diversos tribunais, sendo a medida de jurisdição de cada um a sua competência interna, e um dos factores delimitadores dessa competência é o território e outro a matéria da causa .
Para efeitos de organização judiciária comum a divisão ou circunscrição fundamental do país é a comarca, mas encontramos definidas na LOTJ divisões maiores como seja o distrito judicial e o círculo judicial.
A LOTJ prevê ainda que nos distritos e círculos judiciais pode haver tribunais de competência especializada ou genérica com jurisdição em todos ou algumas das comarcas a ela pertencente
Ensinava o insigne professor coimbrão Alberto dos Reis que “ a jurisdição significa o poder de julgar atribuído, em conjunto, a uma actividade do Estado ou a uma determinada espécie de tribunais; a competência designa o modo como a jurisdição se acha distribuída dentro da mesma actividade ou da mesma espécie de tribunais”
O poder jurisdicional é, no quadro da lei ordinária e no quadro da lei fundamental, um potestad, um poder-dever:” Pesa sobre o juiz o dever de jurisdição, o dever de administrar justiça às partes; e este dever não é senão contrapartida de um direito que a lei reconhece ao autor e a réu: o direito de acção e o direito de contradição.”
Como potestade dimanente da soberania do Estado, a jurisdição é necessariamente única ao contrário do que acontece com as competências. “Não obstante, alerta-se para o facto de se falar em jurisdição cível, jurisdição penal, jurisdição administrativa, jurisdição comum, e jurisdições especiais. Trata-se de um vício de linguagem nada técnica que provém de longa data (...) não existem várias jurisdições, mas várias manifestações de uma só jurisdição, esta a contracenante da acção. Ela é o dever geral de prestar justiça, em correspondência ao direito geral de acção que os particulares têm. Daí resulta que o juiz não possa abster-se de julgar (nº 1 do artigo 8º do Código Civil)”
Mas julgar nos tempos modernos é uma função jurisdicional que a sociedade civil quer actual, eficaz e rápida. Para isso é preciso especializar os tribunais,. As estruturas judiciais aperfeiçoam-se dificilmente porque as necessidades da Justiça superam as possibilidade dos meios disponibilizados pelo poder central.
A Justiça é uma aspiração profunda e uma sociedade é tanto melhor quanto os cidadãos possam obter mais celeremente a resolução dos seus litígios.
Urge que o poder político defina entre as diversas concepções de ordem política-social qual a mais apta a realizar os princípios constitucionais no que concerne à Justiça, supesando o interesse nacional de maneira racional e duradoira, sem preocupações das contigências e conjunturas populistas do momento, antes traçando uma política para o futuro.
“Pese embora a consciência generalizada, que aliás, muito tardiamente se instalou entre nós, de que o sistema de justiça que temos em Portugal não serve, continuam a ser raras as intervenções públicas em que se proponham soluções ou se defendam ideias com frontalidade e sem medo de enfrentar os interesses corporativos que vão sobrevivendo à sombra da inépcia do sistema”
É comummente aceite que urge rever o mapa judiciário. È fácil perceber que hodiernamente o caminho é a especialização dos tribunais, e consequentemente, dos juizes. Já Alberto dos Reis ao perguntar “Que fim se pretende atingir com a repartição da competência entre os tribunais especiais e o foro comum?” afirma: “Procura-se adaptar o órgão à função, procura-se assegurar a idoneidade do juiz; pretende-se que as causas sejam decididas por quem tenha uma formação jurídica adequada. Põe-se assim a matéria da causa em correlação com a preparação técnica do magistrado que a há-de julgar, de modo a obter-se um julgamento mais perfeito”
Claro que a especialização dos tribunais implica um investimento, não em sentido estrito mas em sentido amplo ; um investimento social de que a nação espera um acréscimo de rentabilidade na administração da Justiça. O investimento na Justiça representará, indubitavelmente, um progresso económico e social.
E esta afirmação não é de modo algum uma forma de impaciência respiratória que incita a roubar o oxigénio ao futuro, ou seja, não é uma utopia.