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Incursões

Instância de Retemperação.

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Instância de Retemperação.

Pedro Homem de Mello e a Mística Portuguesa

Incursões, 28.02.06

O postal do Rui do Carmo, ao tratar daqueles belos lenços, obra do saber ancestral do nosso povo, saber esse que muitos “pós-modernos” rejeitam como algo de reaccionário ou ultrapassado, fez-me recordar esse poeta e estudioso do nosso folclore, das nossas danças e cantares que foi Pedro Homem de Mello. Um grande Poeta com efeito, com obras como “Caravela ao Mar”de 1934, “ Nós Portugueses Somos Castos” e o maravilhoso “Há Uma Rosa na Manhã Agreste” de 1964. Já viram a beleza do título?! E livros editados (aqueles que eu tenho) pela “Edições Ática”, infelizmente desaparecida.

Foi um homem cuja Alma estava em sintonia perfeita com o povo e a sua cultura (esse mesmo povo que, à época, ainda não tinha sido “estragado” pelos “reality shows” e pelas telenovelas…).

Aliás, Júlio Dantas definiu-o como “poeta de alta estirpe”. José Régio considerou-o “um dos mais verdadeiros líricos da nossa tradição poética”. E João Gaspar Simões afirmou que ele tinha sido “um mestre, mestre no sentido em que são mestres os que abrem caminhos de poesia”.
Mas quem exprimiu, de uma forma tão comovedoramente bela, a obra de Pedro Homem de Mello, foi outro poeta, Vasco Graça Moura:

“Em Pedro Homem de Mello concretiza-se uma das nossas mais belas poesias da transgressão, “numa tensão entre angústia, o remorso, a consciência do pecado, a culpa e a vertigem erótica que é indissociável do êxtase ante a beleza humana e o prazer físico, da explosão dos sentidos, do pulsar do sangue, da memória dos efémeros momentos vividos nessa entrega e da trágica solidão que a ela se seguiu”.

Vou deixar aqui um poema que se insere na misticidade de Pedro Homem de Mello, celebrizado por Amália.
Povo que Lavas no Rio
Povo que Lavas no Rio
Povo que lavas no rio
Que vais às feiras e à tenda
Que talhas com teu machado
As tábuas do meu caixão,
Há-de haver quem te defenda,
Quem turve o teu ar sadio,
Quem compre o teu chão sagrado,
Mas a tua vida não!

Meu cravo branco na orelha!
Minha camélia vermelha!
Meu verde manjericão!
Ó natureza vadia!
Vejo uma fotografia...
Mas a tua vida, não!

Fui ter à mesa redonda,
Beber em malga que esconda
Um beijo, de mão em mão...
Água pura, fruto agreste,
Fora o vinho que me deste,
Mas a tua vida não!

Procissões de praia e monte,
Areais, píncaros, passos
Atrás dos quais os meus vão!
Que é dos cântaros da fonte?
Guardo o jeito desses braços...
Mas a tua vida, não!

Aromas de urze e de lama!
Dormi com eles na cama...
Tive a mesma condição.
Bruxas e lobas, estrelas!
Tive o dom de conhecê-las...
Mas a tua vida, não!

Subi às frias montanhas,
Pelas veredas estranhas
Onde os meus olhos estão.
Rasguei certo corpo ao meio...
Vi certa curva em teu seios...
Mas a tua vida, não!

Só tu! Só tu és verdade!
Quando o remorso me invade
E me leva à confissão...
Povo! Povo! eu te pertenço.
Deste-me alturas de incenso.
Mas a tua vida, não!

Povo que lavas no rio,
Que vais às feiras e à tenda,
Que talhas com teu machado,
As tábuas do meu caixão,
Pode haver quem te defenda,
Quem turve o teu ar sadio,
Quem compre o teu chão sagrada,
Mas a tua vida, não!

(Aqui fica este poema, em homenagem à nossa ultramarina Sílvia, tendo em atenção os seus românticos poemas, ela que anda muito silenciosa…deve ter “sambado” muito por estes dias… )

Em tempo: lembrei-me agora que as "nossas" graças aqui são três! São as nossas "santas" cá de casa! ( ai o que eu fui dizer...). Bem, então, a poesia, romântica e apaixonada de Pedro Homem de Mello, toda ela aqui dedicada às musas do blog...)

dlmendes

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