Diário Político 107
Revisões da matéria dada
As coisas estão ditas e reditas mas, de quando em quando, convém espevitar a memória do indígena.
Ou apenas redizer o já dito para que não nos tomem sempre por parvos.
Vem isto a propósito das últimas sobre o inefável Ministro da Justiça, Dr. Alberto Costa, as pressões verdadeiras ou inventadas, o sr. Procurador Geral e o sr. Procurador Geral Adjunto Dr. Lopes da Mota.
Declarem-se os interesses: nada tenho contra (ou a favor) estas eminentes criaturas. Não as conheço, não fui ouvido nem achado na nomeação para os cargos que exercem (nem teria que o ser, claro) e à partida, como cidadão, estaria inclinado a devotar-lhes o respeito que as altas funções que exercem merecem.
Estaria... mas começo a não estar. Já não vou falar da história de Macau que, a meu ver, inabilita (e de que maneira...) qualquer pessoa para o exercício de cargos em directo contacto com a justiça. Está tudo explicado, e bem explicado, aí em baixo.
Relembro apenas, por minha parte, o desastre que foi o Dr. Costa quando lhe puseram na mão frágil e insegura a pasta da Administração Interna. Não é preciso ser um lince (mesmo em vias de extinção...) para perceber que este cavalheiro não tem vocação para Ministro. Nem jeito. Nem golpe de rins. Acresce que não consegue explicar-se. Mesmo quando tem razão...
Passemos ao Dr. Lopes da Mota. Alguém me diz que, como magistrado, é competente. Competente, repito. Não será um génio nem isso é preciso. Mas é, dizem-me, competente, tenaz e diligente. Tudo qualidades excelentes para o ofício ingrato de procurador geral adjunto.
Todavia, (há sempre um “mas” nestas coisas) quer o meu informante quer os testemunhos publicados nos jornais acentuam um facto que, sendo irrelevante, tem alguma importância. É ambicioso. Quer voar alto. Ninguém me disse se isso se referia à normal carreira de um magistrado do MP (ser Procurador Geral, chegar ao Supremo...) ou se está tentado a fazer uma perninha noutras áreas, mormente a política. E parece que sim. Já foi Secretario de Estado. Da Justiça, precisamente.
Pessoalmente, desagradam-me os magistrados do MP e os Juízes que, volta que não volta, vão dar uma voltinha ao bilhar grande. Ao bilhar da política, para ser mais directo. É que no bilhar há sempre um taco e umas bolas que habilidosamente empurradas acertam noutras...
A política doméstica gosta de recorrer moderadamente a este género de pessoas (não de bolas). Regra geral, os resultados são decepcionantes quando não claramente medíocres. Mesmo quando (e há o caso de Laborinho Lúcio que agora as está a pagar bem pagas..., ele que disse – e era verdade! – que para fazer o que julgava dever fazer tanto lhe servia o P.S. como o PSD) desempenham os lugares com um mínimo de qualidade os resultados não eliminam esta minha repugnância. Estes magistrados de topo deveriam reservar as suas opiniões políticas para quando estivessem libertos da grandeur et servitude judiciaire. Desculpem se usei um termo aplicado aos militares mas dá-se o caso de as situações terem alguma parecença.
O Dr Lopes da Mota foi Secretario de Estado. Não é pecado, sequer pecado venial mas isso torna a análise mais complicada. Agora está no estrangeiro no “Eurojust” . desconheço se isso se deve às suas altas qualidades de magistrado, se foi eleito pelos seus pares, ou se obteve o lugar que não há-de ser mal pago apenas por ter servido num governo. Não sei, e estou a falar com a mais absoluta seriedade. Claro que eu preferiria que ele tivesse sido nomeado , digamos, pelo governo Barroso ou por Santana Lopes (às vezes os Lopes são solidários...) mas cheira-me que não. Que foi este governo que o indicou, se é que é ao governo que compete indicar as personalidades para as instituições internacionais. Se foi, por exemplo, o Conselho superior da Magistratura ou o do MP, retiro tudo o que disse.
E porque é que digo isto? Porque o Dr. Lopes da Mota, a ter sido nomeado pelo Governo, arrisca-se a ser tomado como um homem da confiança deste, como um homem de partido. Se assim for, qualquer intervenção sua pode permitir a quem o ouve as mais dispares motivações.
O Dr. Lopes da Mota nega que tenha pressionado os dois procuradores do caso “Freeport”. Não quero duvidar da sua palavra.
Os dois procuradores do caso dizem que foram claramente avisados, pressionados se é que a pressão não foi mesmo uma ameaça ao seu futuro profissional. Não tenho motivo algum para duvidar da palavra deles.
Aqui chegados, que é que nos resta? Um belo “estardilho”. Haja o que houver nada será como antes. Para nenhum dos intervenientes.
Resta agora, o resto. E o resto é o CSM e o curioso deputado que pretende salomonicamente castigar uns ou outro. Como? Vai utilizar o detector de mentiras? O soro da verdade? Ou vai atirar uma moeda ao ar? É que numa conversa a três só há três testemunhas. E como não se aceitam vídeos ou gravações de teor semelhante está tudo perdido. Eu continuo a achar que um vídeo pode ser considerado meio de prova. Depois é só ver se foi ou não traficado, se foi ou não falsificado e se o que nele se diz é ou não provado. Nisto estou com os ingleses que não gostam, não gostam mesmo nada, de aldrabões. Aliás, seria curioso ver no que daria um processo em Inglaterra metendo toda aquela boa gente do fripór ao barulho. E se fossem todos condenados? Ou simplesmente acusados? É que agora há o costume perverso de julgar num local coisas passadas noutro, sob outras legislações e contextos. Estão a ver o sarilho, não estão?
Eu ainda esperei que o dr Lopes da Mota viesse a terreiro dizer que talvez tivesse sido imprudente e que um conselho mal interpretado pudesse ter ferido a exagerada sensibilidade dos dois outros procuradores. E que estes dissessem que talvez isso tivesse ocorrido. Ao fim e ao cabo há o stress de um processo tão mediático, não é? Mas não. Nem uns nem o outro cederam um milímetro. Celebremos, uma vez sem exemplo, a frontalidade destes senhores mas meditemos nos resultados. Também me pareceu estranha a reunião proposta pelo senhor Procurador Geral. Era isto o que ele pretendia? Ou não?
Devo dizer que nada tenho contra o senhor Procurador Geral mas de quando em quando não consigo perceber as suas declarações e comunicados. Será defeito meu mas há momentos em que parece que ele diz tudo e o seu exacto contrario. É decerto defeito meu.
Também, e finalmente, nada tenho contra (ou a favor) o Sindicato dos Magistrados do MP. Aliás, ressalvo: sou a favor dos sindicatos, mesmo deste. Sem sindicatos as coisas seriam ainda piores. Percebo que o sindicato julgue que se esgotou o tempo do senhor Procurador Geral. Ao que oiço, e tenho bom ouvido, este Procurador Geral não agrada a gregos nem a troianos. Vem da Judicatura e ainda não percebeu a complexidade do mundo do MP. Mas muitos juízes também o não entendem e, menos ainda, o defendem.
Por último, o anterior Procurador Geral da República veio a terreiro dizendo que pressões são o pão nosso de cada dia sempre que o alvo é um primeiro ministro. Sabe-se que está ainda aborrecido com o que se passou no seu (pouco eficaz e discreto) mandato. E aí não estava contra um primeiro ministro mas apenas contra um Secretário Geral de um partido na oposição...
Digamos que a sua intervenção está de acordo com a sua anterior actuação. É apenas óleo sobre as chamas...
Neste ponto, os leitores perguntam-se: e então?
Lamento desapontar esses esforçados leitores: não tenho respostas mas tão só perguntas. Como esta: ainda não perceberam no que nos estamos a tornar?
d'Oliveira fecit