Diário Político 161
Le nouveau Candide
O abaixo-assinado esteve fora durante a finda semana. Foi arejar a cabeça e alguns parcos euros para Paris.
Não acompanhou, portanto, a discussão sobre a geração à rasca mas, teimoso e cartesiano que é, recusa-se a condenar os que agora desfilam denunciando um estado de coisas que é, usemos o termo, aviltante para os jovens, indigno para os idosos, displicente para os políticos e, sobretudo, mostra a que extremos se chega por desatenção, incúria e incapacidade.
Vai o abaixo assinado ler com atraso os jornais, inquirir os amigos e tentar perceber o que acontece.
Todavia, importa responder a meia dúzia de perguntas de algibeira.
A situação actual é boa?
Os jovens são todos fils a papa, com casa, comida, diversão à borla a dinheiro de bolso ainda por cima?
São só os ricos que protestam?
Não haverá nos protestantes uma maioria fortíssima de gente verdadeiramente à rasca?
É porventura obrigatório fazer política apenas por mediação dos partidos existentes?
Têm os partidos políticos e as suas subservientes jotas tido uma intervenção compreensível, inovadora, inteligente, eficaz no que toca a boa parte das situações descritas e criticadas no tal manifesto dos à rasca? Manifestar incomodidade é reaccionário?
(Por outras palavras, para provocar um inteligente amigo meu: Maio de 68 foi uma mania, uma moda, uma inconsequência, uma tolice, um orgasmo ou algo mais fundo e mais sentido?)
Sexta feira, em Paris, boul mich acima, uma manifestação de jovens educadoras e auxiliares de educação infantis marchava a bom ritmo protestando contra uma tentativa de sobrepovoar as creches e diminuir a percentagem de pessoal devidamente qualificado. O abaixo assinado, qui a en vu d’autres, viu-as passar com emoção e respeito. Elas defendiam seguramente os seus direitos mas também, e isso via-se pelos numerosos pais e mães com os respectivos bebés que as acompanhavam, os direitos dos meninos e a tranquilidade dos pais.
A seu lado, a dona da livraria Le petit prince (alguns dos melhores saldos da zona) acenava com a mão para as manifestantes. "Il faut se defendre sinon..." E nestes três pontos ia toda uma longa história de resistência contra a prepotência, o descaso e a ignorância de quem manda.
E é isso que interessa e é nisso que devemos fundar o nosso juízo sobre as coisas.
*a gravura: manifestação acima mencionada
d'Oliveira 14.03.2011