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Incursões

Instância de Retemperação.

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Instância de Retemperação.

Assis e Seguro (IV)

José Carlos Pereira, 16.07.11

A análise das moções apresentadas por Francisco Assis e António José Seguro não traz novidades de monta. Também não isso é que se espera de documentos desta natureza. A prática sobrepor-se-á à teoria política.

Num momento de viragem como o PS não vivia há muitos anos, em que é necessário, por um lado, fazer oposição a uma maioria que introduzirá medidas duras com as quais o PS também está comprometido, e, por outro lado, assegurar a sucessão de uma liderança carismática, que nos últimos seis anos esteve mais centrada nos problemas da governação e menos nos do partido, as maiores atenções estarão na forma como os candidatos à liderança se propõem reformar o PS e o espaço da esquerda democrática.

Ambos prometem fazer uma oposição séria e responsável, sem abdicar dos princípios mais caros ao PS, desde logo na defesa da escola pública, do Serviço Nacional de Saúde, dos instrumentos de solidariedade e apoio aos mais desprotegidos e da intervenção do Estado na regulação dos mais relevantes sectores económicos. Também defendem a reforma das leis eleitorais, embora com nuances diferentes, e aqui Francisco Assis não temeu anunciar a vontade de estabelecer contactos à esquerda para as próximas eleições autárquicas. Os dois candidatos são ainda unânimes na defesa de uma Europa mais solidária e com um novo modelo de governação, que contribua para a regulação dos mercados financeiros e para um novo compromisso entre os parceiros europeus.

Entre portas, as diferenças sentem-se não só no estilo. Seguro diz o que militantes, dirigentes intermédios e autarcas querem ouvir. Andou demasiados anos na sombra a tecer cumplicidades que agora chegou a hora de cobrar. A este propósito, não esperava ver um destacado autarca do PS, que muito aprecio, vir dizer que apoia Seguro para honrar um compromisso assumido há muito. Os compromissos não se assumem apenas com base em cumplicidades pessoais e independentemente das circunstâncias.

O comportamento de Seguro, que esteve como deputado todos estes anos sem verdadeiramente estar com a liderança e a governação de José Sócrates, actuando pela calada a preparar o “day after”, não me parece um cartão-de-visita recomendável. Prefiro os que assumem as divergências e desafiam quem está no poder. Prefiro a atitude de quem se distancia, como fez Manuel Alegre, que deixou o parlamento quando entendeu que o devia fazer, mas que nunca quebrou a solidariedade com o PS e o seu líder nos momentos essenciais. Por que razão esteve Seguro calado no recente congresso de Matosinhos?

Assis é diferente na forma e no estilo. Será menos calculista e mais impulsivo, é verdade, mas vejo essas características como qualidades e não como um qualquer handicap. Nunca se coibiu de ir a votos, em circunstâncias nem sempre favoráveis. Deu a cara no parlamento pelas governações de Guterres e Sócrates, identificando-se com os mais longos períodos de governação do PS. Mostrou que não transigia com o populismo e com o caciquismo.

Na sua candidatura denota ousadia e ponderação. Ousadia quando defende a possibilidade de simpatizantes assumidos e declarados do PS, que por razões várias não pretendem inscrever-se como militantes, poderem participar nas decisões que digam respeito a eleições para cargos externos, designadamente para as autarquias. Sei bem que esta proposta choca com os interesses instalados e com o formato mental dos “velhos” militantes, mas este é o caminho que os partidos têm de seguir se quiserem captar o interesse dos votantes que estão fora das sedes partidárias. Quando trinta ou quarenta militantes de uma concelhia decidem sobre uma candidatura autárquica que terá de mobilizar milhares de votantes como se vence esse gap sem abrir o partido à participação de todos os interessados?

Assis revela ponderação quando não proclama sem mais a defesa da regionalização, no momento actual. Sou um regionalista convicto e defendo essa reforma administrativa, mas compreendo que essa está longe de ser uma medida consensual entre nós, pelo que será positivo avançar por pequenos passos, reforçando os instrumentos de desconcentração e descentralização e apostando num novo modelo de governação das áreas metropolitanas, até que a regionalização administrativa se imponha como uma consequência natural.

Não sou militante do PS, mas como seu eleitor habitual não tenho dúvidas em considerar que, no actual quadro, Francisco Assis é quem reúne as melhores condições pessoais e políticas para liderar o PS nesta nova etapa.

 

(fim)

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