Au Bonheur des Dames 300
d’Oliveira e mcr vão para um cozido á portuguesa
(uma simpática voluntária do Banco Alimentar que faz o favor de me ler pediu-me um texto parra ajudar. O mail chegou tarde, tardíssimo, culpa dela, mas nem por isso deixo de gostosamente corresponder. O Oliveirinha alinhou pelo que isto, hoje, vai a quatro mãos.)
“então e a greve?”, perguntei ao d’O. “tudo como dantes quartel general em Abrantes”, respondeu o meu velho companheiro de advocacia sindical. “De qualquer modo, ouvir o doutor da Inter afirmar que isto serviu para aumentar a consciência social de quem participou, parece um tanto ou quanto aberrante. As greves para serem levadas a sério, no futuro, para se poderem repetir, necessitam de mais. Há que ter objectivos claros, precisos, com alguma razoável perspectiva de serem alcançados mesmo que não seja no curto prazo. Agora essa peregrina e metafísica ideia do aumento da consciência social, sabe a pouco.”
“Bem, sempre nos resta o Banco Alimentar, já que passámos a idade de fazer greve. Sempre, poderíamos deixar lá o que perderíamos se ainda tivéssemos patrões”.
“E sempre se sossegava a consciência já que os ateus não têm alma para salvar”.
E lá fomos. Agora as coisas estão facilitadas: há uns papelinhos que se compram e que representam diferentes géneros. Nem sequer se tem de encher o diabo do carrinho. O Oliveirinha entusiasmou-se com a novidade e pediu à primeira voluntária do BA “um porradão de vales”. “Olhe, dê-me aí cem euros de vales”. “ai meu Deus!”, suspirou a rapariga. “Tem de ser nas caixas!”
“Já viste, M? Temos que ir para a bicha... Até para dar há bicha...”
Depois de esportularmos os cenzinhos combinados, voltamos a passar pela voluntária que nos sorriu e agradeceu. “Não agradeça que isto não é para si”, resmungou o Oliveira enquanto se ria.
“Achas que podemos ir comer um belo cozido à portuguesa?” perguntei-lhe. “Sempre se matou a fome a algumas pessoas...”
E fomos para o cozidinho que estava, juro-vos, de chupeta.
Hoje, pelas nove e picos da matina, eis que o Oliveirinha ataca telefonicamente: “M., vamos comer uma lampreia?” Avisei o desvairado que estávamos em Novembro, 27 de Novembro, para ser mais preciso e que os simpáticos bichos só aparecem lá para Fevereiro, Março.
O compadre uivou do outro lado do fio que sabia perfeitamente quando era a época das lampreias. Que, finalmente, o que pretendia era ganhar o direito de, daqui a três meses, nos alarvarmos com as bichezas. “Até podíamos cozer as bicharocas com arroz das ditas!” propunha o blandicioso. “Chiça!, Oliveirinha, isso pede mais outra greve geral, pá!” “Nem mais”, riu-se o malandrim, “nem mais”. “Desta vez vamos a outro híper”. E assim foi. Uma senhora da nossa idade aconselhou-nos a comprar vales de azeite, feijão e leite. “O que vocês deviam fazer é ter aqui uma banca para receber cheques...”, sempre o d’O.
“Faça-se benfeitor e assim já não se preocupa”, respondeu-nos a excelente criatura.
Tivemos que lhe explicar que, como bons marxistas, tendência Groucho, éramos incapazes de entrar num clube que tivesse a fraqueza de nos aceitar. E saímos de alma aliviada, bolsa, idem, para ir tomar um café à beira mar.
“Belo dia”, disse o d’ Oliveira. “Ao fim e ao cabo, ainda vamos receber meio subsídio de Natal”.
“Para o ano há mais!”, respondi-lhe. E isso soou-nos como um “ámen” cantado por um grande coro. “Ou pelos gajos do Orfeon”, meteu-se o Oliveira que tem a mania de ter sempre a última palavra. “Ámen!", repeti e, por uma vez sem exemplo, ele ficou calado.
(leitoras e leitores: Nem que seja só um euro! Ganhamos mais nós do que os que estão pior. Até ao fim da semana, a campanha continua.)
d'Oliveira e mcr