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Incursões

Instância de Retemperação.

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Um simples número nas estatísticas do SNS

O meu olhar, 29.03.12

Uma amiga minha muito especial, doente oncológica, enviou a carta que abaixo transcrevo, a um conjunto de entidades ligadas ao sector da saúde.

Para o Ministério da Saúde e para o Governo ela é apenas um número que integra as estatísticas. No entanto, ela é mais que isso, é uma pessoa com um problema de saúde cujo apoio do SNS para a boa evolução do mesmo não se compadece com decisões cegas de gabinete.

Fica aqui a carta, para reflexão:

 

  

Exmos. Senhores

Ministro da Saúde

Presidente do Conselho de Administração do Hospital de Santa Maria

Director Clínico do Hospital de Santa Maria

Presidente da Comissão de Coordenação Oncológica

Director do Serviço de Oncologia Médica do Hospital de Santa Maria

  

1. Sou doente oncológica há vários anos, actualmente seguida no Serviço de Oncologia do Hospital de Santa Maria;

2. Na sequência de uma recaída da minha doença, iniciei quimioterapia em Agosto de 2011;

3. Dados os maus resultados revelados pelas análises clínicas, em 26 de Outubro de 2011, o meu médico optou pela suspensão da quimio e prescreveu TAC abdominal, pélvica e torácica, para uma mais completa avaliação da situação e selecção de tratamento mais adequado; estas TAC foram pedidas com urgência, desejavelmente num prazo máximo de 15 dias;

4. Fui informada que, por força das restrições em vigor, determinadas pelo Ministério da Saúde, os exames tinham obrigatoriamente de ser feitos no Hospital de Santa Maria, não sendo possível a sua requisição ao exterior, como era habitual;

5. Na ausência de um contacto do Hospital de Santa Maria nas semanas seguintes, dirigi-me aos serviços de imagiologia deste hospital; aí, fui informada da impossibilidade de previsão exacta da calendarização das TAC, e de que era extremamente improvável que as mesmas pudessem concretizar-se a curto prazo;

6. Preocupada com as consequências do adiamento dos exames, decidi recorrer aos serviços de uma empresa privada, a IMI, onde realizei as TAC, em 16 de Novembro de 2011, pagando 350 €;

7. O relatório da IMI  veio confirmar o agravamento da doença já sugerido pelas análises clínicas e, em 22 de Novembro, o meu médico oncologista prescreveu-me um novo tratamento de quimioterapia, que iniciei em 5 de Dezembro de 2011;

8. Na tarde de 30 de Dezembro de 2011 (2 meses depois da data da requisição das TAC e decorridos já 2 ciclos da nova quimio), recebi um telefonema do Hospital da Cruz Vermelha, informando-me que seria neste hospital que iriam concretizar-se os exames requisitados em Outubro no Hospital de Santa Maria e propondo-me marcação das TAC para Janeiro de 2012; devido à minha argumentação e à boa compreensão da pessoa com quem falei, consegui que os exames fossem antes marcados para o final de Março, altura em que, na opinião do meu médico oncologista, seria útil fazer uma nova avaliação da eficácia da quimioterapia em curso. Em 28 de Março de 2012, fiz as TAC, no Hospital da Cruz Vermelha.

 

Gostaria de expressar aqui a minha profunda insatisfação com a não realização atempada do meu exame através do SNS.

Gostaria ainda de alertar para as graves consequências que esta situação poderia ter tido para a minha saúde, caso eu não tivesse optado pela realização do exame numa empresa privada, assegurando o pagamento de 350 € não reembolsáveis.

 

Concluo, deixando ainda as seguintes interrogações:

 

- O que acontece aos doentes que confiam cegamente no sistema de saúde e concluem que a falta de contacto do hospital numa situação como esta significa que o diagnóstico e inicio de novos tratamentos não são urgentes?

 

- E aos que, não conseguindo reunir as somas avultadas cobradas pelas empresas privadas e não passíveis de reembolso, não realizam os exames com a rapidez necessária?

 

- O que me teria acontecido a mim, se não tivesse feito a TAC por minha conta e, após 3 meses sem tratamento e iniciando mais tardiamente um tratamento novo, a minha doença se tivesse agravado de forma irreversível?

 

- O que poupou o SNS e o país com esta situação, se afinal a TAC foi realizada no Hospital da Cruz Vermelha, um hospital privado, com a agravante de se vir a concretizar, no mínimo, com 3 meses de atraso em relação à data recomendada para o exame?

 

- O que pouparia o SNS se eu tivesse aceite passivamente a realização da TAC na data que me foi proposta (Janeiro) - demasiado tarde para o objectivo à data em que foi prescrita, demasiado cedo para fazer uma nova avaliação - resultando, portanto, num custo desnecessário?

 

Espero que esta reclamação e reflexões possam contribuir para uma maior ponderação do impacto na saúde dos doentes das decisões que estão a ser tomadas na área da Saúde pelo Governo e Ministério da Saúde.

 

 

Nota final minha:

Todos sabemos o que está por detrás dessa decisão de não marcação de exames em entidades privadas no final do ano: a execução orçamental de 2011. Em Janeiro de 2012 essa medida já não se aplicou, como vimos neste caso, porque já não influenciava os dados da Execução orçamental de 2011.

 

"Custe o que custar". Foram estas as palavras que usou, não é assim sr. primeiro ministro?

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