A falência da democracia
A Grécia esteve durante vários meses sem um governo eleito. O governo não era mais que um grupo de interlocutores que procuravam executar as políticas da Troika que lhes calhou em sorte. É óbvio que a classe dominante que governou a Grécia nos últimos 30 anos criou as condições que levaram à situação actual. Mas também é verdade que as autoridades europeias pactuaram com os sucessivos governos gregos e, por sua vez, os países que dominam economicamente a UE também facturaram a lucraram com a Grécia e continuam a lucrar com o descalabro financeiro que a Grécia vive.
Finalmente a Grécia foi a eleições. O povo votou e o resultado final não permitiu uma solução governativa estável. Para complicar as coisas, na perspectiva dos mercados, o partido que mais cresceu é tido por radical, pouco do agrado dos mandantes das bolsas, da banca e do mercado.
Face à crise política, incapacidade para formar governo, a Grécia vai de novo a eleições. O tal partido, de que os mercados não gostam, parece crescer nas intenções de voto, o que deixa os mercados ainda mais nervosos. É neste quadro que nos dizem que o “BCE fecha torneira a bancos gregos”. Ou seja, o BCE, que até financiou a Grécia quando esta não tinha um governo eleito, agora que a Grécia vai a eleições e que pode vir a ter um governo legítimo, chantageia o povo grego, mostrando que se votarem no tal partido correm o risco de perder os financiamentos.
Mas o BCE não está sozinho nesta batalha dos mercados contra a Grécia. Por mera coincidência, o Fundo Monetário Internacional indicou que suspende os contactos com a Grécia até às eleições legislativas de 17 de junho próximo, o que na prática significa suspender o programa de financiamento que vinha sendo aplicado pela EU e pelo FMI.
Como não podia deixar de ter sucedido, as posições do BCE e do FMI foram precedidas pela atitude da Alemanha que anunciou rejeitar a renegociação da “ajuda” à Grécia, sendo que na base desta posição alemã está o mesmo problema e a incerteza quanto ao resultado das próximas eleições gregas.
As posições agressivas do BCE, do FMI e da Alemanha tiveram como consequência a corrida dos gregos aos bancos, agravando a já frágil situação financeira do país e criando as condições para o colapso final.
Não deixa de ser espantoso que a Grécia, berço da democracia, esteja a ser chantageada por instituições que se tinham por credíveis, que deveriam estar acima e até supervisionar os mercados. Hoje a vontade dos eleitores de pouco vale. As eleições são apenas o simulacro para dar o ar formal de democracia à expressão da vontade dos mercados.