au Bonheur des Dames 325
A habitual falta de patriotismo
Pelos vistos, o Governo, os seus mais estrénuos apoiantes e boa parte da opinião pública (e daí não excluo comunistas e bloquistas que, nestas coisas são sempre de um apurado patriotismo) entende que, este ano, as férias devem ser “cá dentro”.
Para não saírem divisas; para darem trabalho aos portugueses ainda empregados na restauração & similares; para darem o exemplo, para aumentar a circulação da moeda; para não agravar a crise, etc., etc....
São tudo razões estimáveis que já foram brandidas um largo par de vezes, desde que a democracia regressou. Recorreram a elas governos de todos os matizes. Amparados pelo coro de virtude indígena e do nacionalismo económico. Anos houve em que racionaram severamente o miserável pecúlio com que um qualquer cidadão saía. Mesmo que fosse para estudar (foi uma vez o meu caso, por alturas de mais uma sessão da Faculdade de Direito Comparado. Só me safei porque a directora do curso, sabedora da confrangedora situação de um par de polacos ainda com menos dinheiro do que eu entendeu oferecer umas bolsas de estadia e alimentação que também me abrangeram) a regra era simples. Saía-se do pais, por dois dias ou dois meses com o mesmíssimo dinheiro.
Entendiam as luminárias governativas da altura que assim evitavam a fuga de capitais. Só um tolo presunçoso poderia imaginar que isso impediria os ricos(os reaccionários, os fascistas, os capitalistas, os ladrões, os corruptos e sei lá quem mais) de fazer evadir os seus capitais. Não impediu, antes excitou muito remediado a pôr o cacauzinho duramente ganho em sítio mais seguro do que a pátria madrasta.
As criaturas, mesmo se de côr política diferente, que hoje se acham incumbidas de nos salvar pensam o mesmo ou quase. E juntando o acto à palavra garantiram que passarão as férias por aí. Pelos Açores, pelo Algarve, pelo Douro, enfim por sítios que para uma imensa maioria de portugueses são caros.
Caros e pouco hospitaleiros. A preços que nos fazem lembrar com saudade os honrados piratas barbarescos que assaltavam as nossas praias, assolavam os nossos portos e faziam mão baixa de tudo o que reluzisse.
A última vez que estive no Algarve paguei um balúrdio por alojamento, comi mal e caro e vim de lá farto da hospitalidade portuguesa, nossa.
Decidi que para o bodo aos gananciosos já tinha dado mais do que o suficiente. E voltei a acolher-me às praias da Galiza onde um apartamento para quatro pessoas à borda da água com um mercado a quinhentos metros, uma mercearia a duzentos r tudo o que eu preciso a menos ainda, se possível me custa 800 euros pela quinzena. Duzentinhos por cabeça! 14 euros por dia.
Como opiparamente numa bela esplanada em cima da praia a preços que desafiam qualquer restaurante nacional, nosso. Melhor, mais barato, com a possibilidade de variar as ementas. Se comparar com os preços dessa última estadia no Algarve, as mesmas quatro pessoas que referi pagam metade do eu e a minha mulher pagámos cá dentro (ou lá dentro porque desconfio que o Alllgarve já deixou de ser nacional...) E comparo preços do ano passado na adorável “Postiña” de que os compadres Coutinho Ribeiro e JCP já são fregueses ( a mim o devem...) satisfeitos, com os preços de há sete ou oito anos em três almoços numa praia algarvia. E nem sequer estou a falar desses restaurantes famosos e badalados...
O patriotismo que nos cominam sai caro. Caríssimo. Quer em alojamento, quer em bares, cafés e restaurantes. Até a gasolina, valha-nos São Gaspar, é mais barata além fronteira!
Pensando bem, até começo a suspeitar que indo para a Galiza, ajudo a economia nacional. Ou pelo menos o sector exportador que encara com preocupação o descalabro que vai pelas terras do senhor Rajoy (mais galego, mais cabeçudo que ele nem a Merkel!) distribuindo pelas terras espanholas uns miseráveis centos de euros, tento, à minha escassa medida reanimar o moribundo que dá emprego dezenas de milhares de emigrantes portugueses e que é o nosso melhor cliente.
Acho que o senhor Passos Coelho (tirado da cartola de quem sabemos, etc., etc...) até me devia agradecer...
E, por favor, guarde o patriotismo para melhor ocasião.
Boas férias, leitoras e leitores que me aturam. E patrióticas, claro! Se tiverem dinheiro e paciência para tal.......
*a fotografia: a praia onde impatrioticamente gastarei as duas próximas semanas.