au bonheur des Dames 343
Irão regressar os felizes dias da OPAN?
Uma pessoa não pode estar descansada. Quando não é um novo imposto, é uma medida ad-hoc que vem perturbar o curso vagaroso da sua existência. Quando nada disto ocorre, eis que a província e o resto da província, ou seja Lisboa e o resto do país, estremecem com um jogo de futebol, um escândalo sexual, ou uma declaração do senhor Portas. Se nem isto, que é muito, chega, eis que o BE ou os Verdes resolvem tomar uma iniciativa.
Em casos de autentica catástrofe pública há a hipótese de haver pronunciamentos políticos: do senhor dr. Mário Soares ou do seu sucessor Professor Cavaco Silva.
Desta feita, foram os Verdes. Por razões que se não descortinam, entende este grupo buliçoso que a juventude estudiosa deveria dedicar mais algum tempo ao estudo da Constituição da República. Não se para saber que vivemos em República, que há uma lista de direitos humanos ou apenas para chatear o indígena.
Ao que sei, e que hoje é verificável pelas declarações de professores responsáveis, a Lei fundamental é abordada directa e indirectamente em várias disciplinas e durante alguns anos da escolaridade obrigatória. Mal ou bem, a irrequieta juventude lá apanha aqui e ali umas doses de “constituição” e nõ consta que a ignore de todo em todo. Ou que a ignore em maior grau do que o grupo par(a)lamentar dos Verdes.
Estudar mais “constituição” do que a que já faz parte dos currículos de várias disciplinas (quatro ou cinco, não recordo) de diferentes anos de escolaridade, lembra-me, irresistivelmente, os meus anos de liceu, mais propriamente o 6º e o 7º em que toda a rapaziada tinha uma cadeira quase tão tonta quanto a famigerada “moral” com que nos davam cabo do juízo e da paciência durante os sete anos liceais. Era uma coisa chamada “organização política e administrativa da nação” e, ao contrário da “moral” dava direito a exame e eventual chumbo.
Se bem me lembro, lá se estudava a famigerada “constituição de 33” (a do Salazar), suas origens e mais um par de patacoadas que eram mera perda de tempo. E que de nenhum modo aumentava a consciência cívica, o respeito pelas instituições vigentes, ou o seu activo repúdio. A OPAN era unanimemente detestada da esquerda à direita, ou vice-versa consoante as opiniões de quem me lê e nem a malta que se destinava a Direito lhe reconhecia qualquer bondade.
Isto de “ensino” e de matérias a ensinar tem muito que se lhe diga. Para o aluno é sempre uma obrigação, estude-se matemática ou geografia ou português. Lembro-me de no 5º ano detestar o Camões via “Lusíadas” que nos era enxofrado em dose maciça. Aquilo era um martírio que nem o melhor professor conseguia suavizar. E a gramática a isso associada era mais outro horror. Demorei anos a conseguir voltar ao poema e, mesmo hoje, prefiro-lhe toda a restante obra poética, mormente as “canções”. Ficou-me a cicatriz lusíada, não há dúvida. Colegas e amigos tenho, desses tempos mimosos, que me juram que ainda hoje têm pesadelos com o poema. Não se atrevem a confessar que aquilo os terá curado do vício da leitura mas suspeito que num que outro caso a coisa é exactamente assim.
O país está num alvoroço descoroçoado, os cidadãos deitam as mãos à cabeça e fazem contas cada vez mais difíceis para tentar perceber como é que hão de aturar o Governo e as suas medidas, a Oposição e as suas propostas redentoras, a senhora Merkel e o senhor Hollande, o Papa, a Senhora de Fátima, o senhor Gaspar (que Deus tenha em seu descansado seio), a falta de dinheiro, o desejo de férias, o desemprego infamante e o IRS que aí está pronto a morder.
Todavia, os Verdes, perante tudo isto e o que mais se verá, sai a terreiro com um bramido medonho e formidável: “Mais Constituição”. Toda, do principio ao fim, de trás para a frente, na voz passiva ou, melhor ainda, na perifrástica. Não se sabe o que proporão contra os réprobos que se recusem a aprendê-la, que confundam artigos e parágrafos, direitos humanos e deveres. Perderão o ano? Serão condenados a estudar durante as férias e a escrever no melhor cursivo que conseguirem e por dez vezes a constituição no seu caderno diário (se é que ainda há disso)? Prevê-se censura pública, multa, prisão, trabalhos para a comunidade ou mesmo forçados, máxime o degredo, para os contumazes que apesar de tudo se recusarem a cumprir o meigo desiderato dos cavalheiros verdes, verdíssimos?
E tudo isto suscita comoção, discussão, tumulto no Parlamento, acusações várias e objurgatórias de toda a ordem contra o Governo, sempre ele, a maioria, sempre ela, artigos nos jornais e mesmo este folhetim que se deve tão só à chuva lá fora e à falta de qualquer outra coisa em que meter o dente.
De minibus non curat praetor, mcr!, sussurra-me o grilo mas eu nem assim. Puxa-me a mão escrevinhadora para estes disparates que dizem mais do país e da gentinha que roda por S Bento do que qualquer exercício sobre o futuro Conselho de Estado do qual não espero fumo branco mas apenas, como Pinheiro de Azevedo (quem se lembra dele?) “só fumaça”.
Tenham um bom dia, mesmo com chuva, e um fim de semana com algum sol e alguma praia. Ao menos isso ainda é de borla.