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Incursões

Instância de Retemperação.

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diário Político 186

mcr, 02.08.13

 

 

The good old times


A louvada sentença do Tribunal da Relação do Porto absolvendo e mandando reintegrar um lixeiro despedido nos quadros da empresa que o despedira por trabalhar em evidente estado de bebedeira compreende-se bem sobretudo se atentarmos na história pregressa da pátria lusitana.

Está aí em cima um cartaz da época em que os homens tinham barba na cara e não cediam a essas mariquices modernas sobre o álcool que se ingeria.

Cavalheiro que se prezasse despachava uma litrada por refeição fora os ameaços nos intervalos onde o copo de três se cruzava com uma amêndoa amarga (uma amarguinha!) um café com "cheirinho", um bagaço bem aviado,maxime - mas mais para senhoras!- um ginginha com elas. 

um rapazola bêbado subia na consideração social dos amigalhaços e fazia sorrir ternamente o progenitor que afiançava que "miúdo tinha a quem sair". 

O Estado e a sociedade em geral olhavam com bem humorada condescendência os filhos família aos tombos durante as festas académicas (sobretudo a Queima das Fitas como ainda hoje ocorre com menos inocência e mais propósito - mesmo antes do cortejo arrancar já os celebrantes engurgitam farta dose de cervejame com muitos shots à mistura para depois se arrastarem todos penosamente esganiçando-se em avinhadas elocubraçoes sobre quão bom é ser "doutor") ou outras. Antes isso que ser esquisito. E esquisito era tudo o resto, desde os bebedores de água ou leite até aos "maricas". 

A cruzada, em boa hora, empreendida pelos que entendem que "um grão (ou dois, ou um quarteirão) na asa" só dignifica o trabalhador modesto e "alienado" (não chego ao ponto de afirmr que alguém usou esta expressão hoje tão em desuso ou que, sequer, a conheçam ou a percebam mesmo dentro do colete de forçs marxista) mas ainda o torna mais competente e desembaraçado tem, como se vê, raízes antigas.

eu sei, bastamente sei, que algum leitor me estará a chamar agente do capital e do ultra liberalismo. Insistindo no consumo do álcool como escape para as agruras da vida, alguém dirá, que isso reduz a capacidade de reacção social do proletário escravizado e a sua vontade de se juntar aos cerrados batalhões dos que lutam pela libertação do homem. 

enganam-se esses falsos apóstolos da anti-troika, do progresso e da liberdade. com um copo de vinho (ou dois ou uma dúzia, afinam-se as gargantas e sai mais melodiosa e vibrante a "grandola vila morena" e os gritos de "eleições já!". 

Parece que a Europa se indignou com a apologia do álcool evidenciada pela sentença. Mas quem é essa Europa? Essa gente rica e ociosa que zomba dos pobres e do Sul? Essa multidão que só bebe à sexta e se chateia durante uma inteira semana de trabalho monótono e bem remunerado que leva o seu egoísmo a recusar um pequeno auxílio aos que, pelo menos, sabem gozar a vida e emborcar uma caneça de verde tinto? 

Antes sós que mal acompanhados! (como dizia alguém cujp nome não recordo nem quero recordar)

d'Oliveira fecita 2.8.13

 

 

 

 

2 comentários

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    mcr 04.08.2013

    Tudo o que consegui saber sobre o acórdão me parece extraordinário. De facto, o réu não tinha dado autorização quanto á detecção de álcool no sangue; a empresa poderá - não estou certo - não ter achado necessário um processo disciplinar e, finalmente, a mesma empresa não tinha no seu regulamento interno uma norma quanto ao máximo de alcoolémia permitido.
    todavia, desculpara o caro leitor que, se não estou em erro é um excelente cozinheiro e auto de um não menos excelente livro de culinária, que discorde do bom humor do acórdão.
    que os exmos juizes quiseram ter humor é coisa plausível. que o resultado não foi o que esperavem é uma certeza. Não é Juiz Quintela quem quer mas quem tem unhas.
    E os desembargadores em causa devem lidar dificultosamente com o humor, a ironia enfim a graça, até mesmo, a graçola.
    aliás, no momento em que há - e bem - um claro compromisso contra o abuso (eu digo: o abuso!) do álcool a saída dos senhores juízes parece-me a contra-corrente e, pior do que isso: infeliz para não dizer algo mais grave.
    Não se pode (e raras vezes ocorre) pedir a um juiz que seja Eça, era o que faltava. Pode porém, exigir-se bom senso e esse. a meius míopes olhos, estava ausente.
    Uma sentença judicial não tem que ser carrancuda nem risonha. Tem de ser clara, atempada, séria, simples e escrita num português escorreito. Será pedir muito? Pelos vistos, parece sê-lo.
    A magistratura não sai exaltada deste fait divers e bem preciso seria que as coisas que saem dos tribunais fossem mais interessantes para o povo português que da justiça vai começando a ter uma imagem tragimente negativa: tardia, complicada, incoerente, protectora de ricos e instalados, açoite de pobres etc, etc...
    Agradeço porém e muito o cumprimento do leitor que me toca bastante. E se gosta de livros velhos, faça o favor de mandar que, nesse ponto, com mais um colega aqui do blog, corro por gosto.
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