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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Manhã de domingo

Sílvia, 30.06.06

A manhã nublada do domingo e suas ruas quietas. A casa descansa um descanso que não é meu. Azaléas caladas na varanda, um latido ao longe, a obra na rua parada ao meio. Tudo parece ainda no resto de sono matinal.


Olho detalhadamente as coisas - casa, rua, jardim, árvores, varanda, montanhas ao longe, cão perambulando - à procura do reconforto da visão pacífica de tudo. Sorrio da minha própria ingenuidade. Pacíficas as coisas, inquieta a pessoa. Não me movo, distendendo o entendimento da inevitabilidade dos fatos. Ainda assim sem paz. Ainda assim pergunto sempre.
Jazer ali, talvez, feito coisa, apenas um objeto impensante a mais na natureza passageira de tudo.


Ou feito gato que vai passando em passos lentos; esguio, todo atenção. Essa atenção esquiva, própria, enigmática, que não pergunta, mas tem propósitos. Jazer, nem um pensamento a atormentar-me com porquês.

Reunir-me à buganvília , toda silêncio e espinhos, a usufruir o sol.
E nem uma palavra.



Silvia Chueire

Au Bonheur des Dames nº 28

d'oliveira, 28.06.06
Herr Emmanuelchen hat Geburtstag
ou
El cumpleaños del señor Manolito
ou
Le baccio le manni Don Emmanellino
ou
o Senhor Manuelzinho faz anos


“Fottiamci, anima mia,fottiamci presto,
poiché tutti per fotter nati siamo”
Aretino, "Sonetti lussuriosi"


“cetera lascivis donavit poma puellis
mentula custodis luxuriosa dei.”
Marco Valerio Marcial, a Juvenal
acompa
nhando umas nozes pelas Saturnais

Mimosa e desprevenida leitora que percorres saltitante estas pobres páginas ao som das concertinas que animam as fogueiras dos Santos populares e te afogueias mais com os olhares atrevidos do rapazio do que com o calor do brasido, acaso, alguma vez, te perguntaste da razão de ser destas duas semanas quase ininterruptas de festa?

E se porventura o fizeste será que te responderam com a habitual balivérnia dos três santos, António, João e Pedro? E tu acreditaste que um sábio franciscano, Doutor da Igreja, um severo profeta que não cedeu ao lascivo apelo de Salomé e um pescador que de Shimon passou a Pedro, príncipe dos Apóstolos e primeira pedra da Igreja poderiam, mesmo juntos, criar à sua volta um frenesi tão carnal, tão mundano que transformasse os seus dias de culto numa longa rusga de enredos e suspiros, brandos queixumes à beira mar e à beira pecado, numa festa de corpos (por um único e irrepetível momento) em flor?


Ou disseram-te do solstício antiquíssimo, dos dias que se alongam perfumados e quentes, das noites que não conseguem, pesem embora as orvalhadas, adormecer os corpos e baixar a maré alta do coração? E tu, veias a latejar, riso a explodir do ventre até à boca, acreditaste?

Não? Pois fizeste bem que a história verdadeira desta súbita e doce convulsão que nos chega, pelos idos de Junho, com as últimas cerejas, é outra e diversa.

Tudo isto, este brando mas prolongado incêndio de aromas e olhos brilhantes, esta dúzia de "dias de vinho e rosas" vem de outras paragens mais próximas e terrenas embora, como o cometa de Halley, se venha repetindo desde os dias iniciais. Terá começado no dia em que o poderoso Zeus se converteu em fina chuva de ouro para cobrir Danae?

Ou nesse outro carregado de glória em que, pela manhã, a Sulamita levou o amado à vinha para ver "se florescem as vides se se abre a flor, se já brotam as romeiras?"

Ou, mais certamente, como narra nosso comum mestre Alcofibras, abstractor de quinta essência, em "La vie trés horrifique du grand Gargantua père de Pantagruel" quando, aos cinco anos feitos, ce petit paillard pelotait toujours ses gouvernantes, sens dessus dessous, sens devant derrière, hardi bourricot. Et il commençait déjà à essayer sa braguette E elas, descaradas, passavam o seu tempo a la faire revenir entre leur doigts comme un bâtonet d'emplâtre, et puis elles s'esclaffaient quand elle dressait les oreilles comme si le jeu leur avait plu ?

Estás confusa leitora paciente e gentil? Estás confusa mas demasiadamente curiosa para abandonares este dificultoso périplo pela ciência complexa do tempo e dos seus efeitos. Não consegues escolher, dentre as três oferecidas, a hipótese verdadeira como se todas, finalmente, fossem, como canta o poeta escamas de cristal (...da) cebolla, luminosa redoma...redonda rosa de agua/sobre/ la mesa/de las pobres gentes. Algo na descrição das travessuras do jovem gigante despertou em ti memórias antigas e pouco inocentes desse varão piedoso, pilar da instituição familiar, baluarte dos direitos civil, penal e canónico, exemplar chefe de família, pai extremoso e marido amantíssimo que, no século, é conhecido por Senhor Manuelzinho. E reforça-se essa tua íntima convicção ao saberes que o impoluto cavalheiro viu a duvidosa luz do dia num já longínquo dia 29 de Junho em que se festejam além de Pedro outros santos também muito úteis e milagreiros a saber S Marcelo (tinha que ser!...), mártir, S Ciro e S Cásio, bispos conforme reza o Calendário Zaragozano o el firmamento para toda España el calendario de mayor circulacion, dirigido por don Mariano Castillo y Ocsiero pedidos Egartorre - Mirlo, 23 (campamento) 28024 Madrid, 100 pesetas.

E a verdade mostra-se resplendente sobre a cíclica visita deste amável desvario que soe aparecer-nos nesta época em que uma primavera demasiado opulenta se rompe em primeira espuma de verão. E, por um momento miraculoso, a fadiga esquece-nos e a velhice também.

E eis que o mistério se desfaz como se desfaziam as bolas de sabão que o Johnny Mikter caçava à pazada pela cozinha da casa velha de Moledo nos dias raríssimos em que a água nos era concedida pelo senhor José da dita, o Matraquilho gemia amores, mágoas, e excertos de Strangers in the night, bidubidu bidu, a Laurindinha varria e arrumava o irremediável e o inarrumável e o cronista filósofo comparava o lento passar dos dias à rapidez com que desaparecia o chouriço "Revilla" para já não falar do "Valor almendrado especial" o único chocolate espanhol que não sabia a mofo (sic). Deus era grande e a noite menina.

Bebamos pois ó velidas soo aquestas avelaneiras frolidas em honra do aniversariante e de todos os seus e isso inclui-nos a nós também pois que bebemos do seu vinho e comemos do seu pão o número de vezes suficiente para, acabando em catalão que é língua de gente, dizer

Diverses són les parles i diversos els homes
i convindran molt noms a un sol amor

E é disso que se trata.


29 de Junho de1995


Vai esta barcarola até ao robusto talento jurídico, seu final porto de atracação, cumprindo uma singular rota que conta com Vila do Conde por primeira aguada. Não é a ilha da voluptuosa que Camões terá cantado e onde, como nas epígrafes fartamente se sugere (no fundo vai a tradução que esta gente de italiano niente e de latim menos) mas consta que por estes tempos também por lá o cometa de Eros tem passado disparando já não só flechas amáveis, mas dardos orgásticos, zagaias erotómanas enfim uma pandemia de objectos de arremesso lúbrico que até terá feito nascer cabelo ao edil local.
Aí será abastecida pelo Manuel local, carenada como se deve, cheia até à coberta de víveres frescos e, por este prático de navegação costeira, pilotada até à Calecut do samorim Manuel Monguinho. Não a envia o rei Manuel o venturoso mas um pobre plebeu que ousou em livro próximo futuro assinar-se Manuel Heinzelmann, o que também pode ser uma homenagem .


* façamos amor, alma minha, façamo-lo já
que todos para o fazer nascidos fomos

**as outras frutas dei-as às raparigas
que o deus lascivo descarou


obviamente este texto antigo que, consta, nunca chegou ao destinatário pretende celebrar o aniversário do nosso confrade Simas Santos que, valha a verdade, se esquece muito de publicar aqui qualquer coisinha. De todo o modo, parabéns, Manel!

antes que me esqueça: os textos em citação e não identificados por autor são, respectivamente, de Rabelais, Neruda, Airas Nunes e Salvador Espriu, uma boa companhia para o aniversariante.

O figurão

José Carlos Pereira, 28.06.06
Lê-se estas declarações do presidente da Associação Nacional dos Municípios Portugueses e quase não se acredita, tal é o despautério. O senhor já veio hoje dizer que foram afirmações proferidas “em sentido figurado”. Que grande figurão saiu este Fernando Ruas!

Já diz o povo que pela aragem se vê quem vai na carruagem (das autarquias, neste caso...).

Portugal: do sonho ao fim sem grandeza

Incursões, 26.06.06




“Fomos descobrir o mundo em caravelas e regressámos dele em traineiras. A fanfarronice de uns, a incapacidade de outros e a irresponsabilidade de todos deu este resultado: o fim sem grandeza de uma grande aventura. Metade de Portugal a ser o remorso da outra metade.”


Miguel Torga

outra rapidinha: à 3ª foi de vez!

d'oliveira, 26.06.06
Apesar do futebol, apesar do Verão, apesar da histeria do senhor Berlusconi, os eleitores italianos não hesitaram em voltar às urnas pela terceira vez confirmando (e de que maneira!!!) as escolhas políticas anteriores que tinham escolhido a esquerda para governar. Relembremos que Prodi foi eleito com uma pequena maioria, que essa maioria se fortaleceu nas eleições regionais e comunais (onde Berlusconi jurava que seria o início da derrota da esquerda...) e que ontem e hoje, num referendo vital as propostas federalistas da direita sofreram uma derrota espetacular: 63% contra 37%.
Mais importante é o facto de nem sequer no Norte a direita vencer. Perdeu por 47,5% contra 52,5%. Mais ainda: Veneza ou Milão votaram contra a direita, o que não é despiciendo. Claro que nass restantes regiões ( Centro 67%; Sul 77%; Ilhas 71% a favor da esquerda e da frente do Não) a vitória da nova maioria política foi esmagadora. E o caso não era para dadas as propostas insolidárias em jogo.
Conviria finalmente fazer notar que nete referendo houve uma afluência de 53% que é a mior registada nos ultimos anos. Ou seja: os cidadãos mobilizaram-se para enterrar (espera-se que definitivamente) o senhor Berlusconi.

rapidinha

Incursões, 26.06.06
Tenho lido. Não tenho escrito. Continuo sem computador em casa e aqui, no escritório, o tempo não sobra. O João agradece, MCR. O DLM até se sentiria mais jovem com aquele grupo de sub-40 com quem estive no S. João... O fogo de artifício foi espectacular. Mas, decididamente, não tenho muita vocação para tanto aperto.

...

d'oliveira, 26.06.06
Jacques Dutronc
Il est 5 heures, Paris s'éveille


Je suis l'dauphin d'la place Dauphine
Et la place Blanche a mauvaise mine
Les camions sont pleins de lait
Les balayeurs sont pleins d'balais

Il est cinq heures
Paris s'éveille
Paris s'éveille

Les travestis vont se raser
Les stripteaseuses sont rhabillées
Les traversins sont écrasés
Les amoureux sont fatigués

Il est cinq heures
Paris s'éveille
Paris s'éveille

Le café est dans les tasses
Les cafés nettoient leurs glaces
Et sur le boulevard Montparnasse
La gare n'est plus qu'une carcasse

Il est cinq heures
Paris s'éveille
Paris s'éveille

La tour Eiffel a froid aux pieds
L'Arc de Triomphe est ranimé
Et l'Obélisque est bien dressé
Entre la nuit et la journée

Il est cinq heures
Paris s'éveille
Paris s'éveille

Les banlieusards sont dans les gares
A la Villette on tranche le lard
Paris by night, regagne les cars
Les boulangers font des bâtards

Il est cinq heures
Paris s'éveille
Paris s'éveille

Les journaux sont imprimés
Les ouvriers sont déprimés
Les gens se lèvent, ils sont brimés
C'est l'heure où je vais me coucher

Il est cinq heures
Paris se lève
Il est cinq heures
Je n'ai pas sommeil

letra de Jacques Lanzman

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