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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Ad perpetuam rei memoriam

Incursões, 25.06.06
A “ criatura” que apareceu no Porto, sem avisar os confrades, apanhando Marcelus “de calças na mão”, é este vosso criado. Então, julgam que o São João é só dos Portuenses não?!

Pois bem, aí cheguei, com a minha legítima, via Alfa Pendular, às 19H de Sexta-Feira, dia do Sagrado Coração de Jesus ( não é só aquele que sabe o calendário litúrgico...). Esperava-nos a Teresinha, no seu potente “BM”, preto como convém ao ser ar (falsamente) circunspecto, na estação de Gaia (dá-lhe mais jeito, visto ela ter “casinha” ali na Foz) e lá partimos para um fim-de-semana portuense.

Fomos, com o sol já a cair para o mar, tomar o “ pulso” à casa de chá do Siza, mas rumámos a Matosinhos, que estava uma loucura! Jantar jantar…longas filas! Acabámos por ir a Leça ver “só” a “paisagem”. Lembrei-me do meu querido Amigo Coutinho e das suas incursões precisamente a…Leça!

Telefono, não telefono, convenço-me, de "bona fides", que deve estar com os seus miúdos no Marco (agora constato, pelo seu postal “A Festa” que me enganei. Estou, pois, deveras contrito. Então não poderia ter jantado com ele na Ribeira? Ora bolas!).

Acabei, pois, por jantar em Leça, numa casinha despretensiosa, o “Alves”, ali na Combatentes da Grande Guerra. Peixinho como convém…

Demos, a minha dona e a Teresinha, uma volta pela “marginal”, ali na Foz, que fervilhava de gente, e onde uma (atrevida) rapariga me “meteu” na cara um alho-porro! Não sei se este “meu olhar” tinha, involuntariamente, recaído na sua graciosidade…

Bem, Sábado de manhã, bem cedinho, saí de casa, deixando as acima mencionadas em vale de lençóis, e entrei, ali junto à Católica, na estação de serviço da BP, onde comprei os jornais e tomei o meu café. Devo dizer que eu e o Coutinho somos “fãs” irredutíveis das estações de serviço…e decidi telefonar a esse que julgo ser um “amicus certus in re incerta”, esse mesmo o “Marcelus”.

Ficou danado de eu não ter avisado na noite anterior! Eu, com esta "personagem", ainda tenho de acertar os carretos da engrenagem…Mas convidei-o (para casa alheia, já se vê) para um cházinho ao fim da tarde…a Teresinha até é toda dada…e lá arranjou uns bolinhos para acompanhar o chá da amizade. Meus amigos, quem ficou a ganhar fui eu e a Teresinha, que o Marcelus não foi de mãos vazias: para que fiquem verdes de inveja (coisa feia, a inveja…) este vosso amigo ficou com um grosso volume do Baltasar Garzón (“Um mundo sem medo”) traduzido pelo….Marcelus, pois está de ver! (e com uma bela dedicatória!!!). E aquela com um belo romance (místico!) sobre a vida de Gaudi. Tudo obra do dito cujo! Não sabia que este tradutor também se dedicava a obras sobre o Transcendente...os amigos surpreendem-nos sempre...

Mas, relativamente ao Garzón, vai ter de esperar: logo que tenha mais disponibilidade (esta semana espera-me uma agenda carregada) vou ler, com (antecipado) gosto, de Manuel Heinzelmann (“topam”?) A pedra no sapato a pata na poça” que, vergonhosamente, ainda não li; mas tenho uma desculpa redentora: aquilo é livro que, para ser bem saboreado, só em férias, com a mente mais livre, para poder beber toda aquela “movida” !

Bem, para a próxima, quando for ao Porto, avisarei com antecedência os meus amigos, portuenses e marcoenses!!



Nota I: estas linhas foram escritas já em Lisboa, e após ter dado uma “oftálmica” ao Incursões.

Nota II: hei-de alinhavar, brevemente, umas linhas acerca desta cidade, que casa tão bem com a minha maneira de ser!
Com saudades...Ab imo pectore! ( do fundo do coração!)

Au Bonheur des Dames nº27

d'oliveira, 24.06.06
Ah estes habitantes da “capital do império”
(carta 2ª à Sílvia que vem até cá no próximo semestre)

Cara Sílvia: diz-me V. que vem até estas inóspitas paragens dentro de alguns meses. Como sei o que fazem “estrangeiros” em país de antepassados presumo que virá espanejar alguns reais em Lisboa a pecadora. Faz bem porque a terra é bonita (nisso até o nosso nortenho JCP está de acordo). Os habitantes, quando estão para aí virados, são hospitaleiros. A dificuldade está em apanhá-los em Lisboa. São piores que alguns portuenses que diziam (ele há tolos para tudo) que a melhor coisa de Lisboa era o comboio para o Porto. Para uma boa parte dos lisboetas e, especialmente para alguns conspícuos (as) frequentadores (as) deste blog, parece que a melhor coisa da cidade é a auto-estrada para o sul (Alentejo e Algarve). Uma pessoa passa a vida a ser convidada por eles, venha até cá homem, vamos a um jantarinho, um almocinho, um diminutivo qualquer desses, é só escolher, não se esqueça, ah que bom que vai ser etc., etc...
A dita cuja pessoa, conta os morabitinos, faz economias na comida durante meia semana (afinal vai comer à borla em Lisboa!...) e anuncia aos quatro ventos que chega em breve à pecaminosa cidade e que até já recusou um convite para almoçar do senhor Presidente da República, do senhor Cardeal Patriarca, ou doutra individualidade na moda, para não perder pitada do convívio com os amigos que o esperam ansiosos.
É nesse mágico momento que o acaso intervém: o piedoso A vai para o Alentejo participar sabe-se lá em quê, em todo o caso não será em práticas religiosas que para isso Lisboa tinha o Santo António e o Corpo de Deus, B, a entusiasta, telefona já do automóvel a caminho do Algarve onde chove a cântaros. Vai para a praia claro, apanhar banhos de lua que ela do sol forte deve ter medo... C, recém-chegado às delicias imperiais, previne: se V cá vier telefone a B (que está em trânsito como já disse) para um jantarinho!.... À cautela, D, E e F ficam mais calados do que uma ostra de Setúbal.
É claro que tudo isto é obra do acaso, havia dois feriados, um à terça e outro à quinta, argumentos mais que suficientes para não ter a maçada de trabalhar à segunda, quarta e sexta... Afinal o verão está perto, o ano foi duro e é preciso desmentir o senhor primeiro ministro e o senhor presidente da república que apelam, mão na mão, à boa vontade laboriosa dos lusitanos e à vitória da equipe nacional de futebol.
Não sei se V tem à mão um mapa da nação imortal e valente: por ele verá que nestes casos de feriado ou de iminente visita de amigos do norte os habitantes de Lisboa têm tendência a escorregar um pouco mais para baixo deixando o Tejo de permeio. Será para fugir ao invasor bárbaro vindo do norte? Será para não lhe oferecer o tal jantarinho, o tal almocinho o tal sei lá o quê? O certo é que cheguei, não vi, nem comi. Ou vi uma cidade deserta, e comi às custas de um irmão generoso, de uma mãe resignada e de mais parentes avulsos menos rápidos no “cavanço” ou mais desprevenidos. E não correu mal a jornada lisboeta, não senhor. A habitual prima Maria Manuel acompanhada pela não menos habitual tia Néné figueirense até à medula, ofereceram uns livrinhos sobre a Figueira da Foz que eu não tinha e que, decerto, não encontraria em parte alguma. Outro tio, peripatético frequentador de alfarrabistas, assistiu divertido ao descobrimento de uma velha edição de “Emílio e os Detectives” de Erich Kästner, autor que viu muitos dos seus livros (este incluído) queimados pelas multidões nazis e ululantes, nos anos trinta. A velha mãe, armada de uma temível bengala provou que ainda é capaz de deitar abaixo um belo par de sardinhas assadas, que lhe fazem muito bem à dieta que segue rigorosamente desde há anos. As sardinhas (e um cozido à portuguesa, bem puxavante, que ela partilhou com a tia Nené, também octogenária e também portadora de bengala....) são excelentes para dar uma chicotada ao estômago, aos intestinos e a várias outras vísceras que não menciono por mera ignorância. Com uma família assim não admira que eu esteja gordo como estou.
Se calhar a súbita ânsia de viajar que deu nos meus colegas lisboetas vem disto, desta barriguinha de sete meses (e estou a ser modesto) que os assustou: ai que o homem nos come a despensa inteira!
E vai daí piraram-se para as províncias mais a sul sem temer a chuva que caiu inclemente. Da próxima vez só aviso quando já estiver dentro de muros. Os lisboetas têm de ser caçados com rede mosquiteira e à má fila. Fica avisada, Sílvia. Depois não se queixe que eles são escorregadios. Cá a espero no Porto. Venha à confiança que eu não fujo. E creio que nisto estou acompanhado pelo JCP pelo Carteiro e pela doce “o meu olhar”: a malta cá, para dar ao dente com uma visita, até adia a morte dos parentes.

PS: isto estava escrito há dias esperando vez para entrar. Entretanto, eu, sempre generoso e misericordioso, tinha avisado um dos citados, que ia apanhar um merecido puxão de orelhas na forma de “postal” (este). Não é que a criatura aparece sem avisar no Porto, para me apanhar desprevenido (“de calças na mão”) para mais tarde poder dizer que também apareceu e... nada! À cautela fica convidado para almoçar (eu pago!) logo que volte a Lisboa.

Outra canção

Sílvia, 24.06.06


O dia amanhece frio e nítido

nos meus olhos.
Saio da casa pisando cuidadosamente
para não acordar os que dormem
como se não estivessem prestes a acordar,
neste sol de outono;
luz e visão semi-adormecida do dia.

Tantos passos
ao longo dos anos,
tantas perguntas.

Caminho à beira mar,
a maresia a umedecer-me o corpo.
O mar responde ondas e ondas
onde há perguntas.
E se repete.
Sempre.

O mar é o mundo, atlântico, no qual vôo,
ou mergulho minha inquietude
e esta falta.

As pessoas correm
a alcançar o tempo.
O menino aturdido
exibe os olhos baços de cola
que mal acordaram para o dia.


Assisto o dia estabelecer-se
em pensamentos vagos.
Passaram-se anos desde o primeiro passeio
de mãos dadas comigo,
os olhos escancarados para a vida.

O tempo nos dá voltas.
Tudo foi ontem,
ou será amanhã ?

O que é feito do tempo,
assobio agudo de menina
a correr pela praia ?
Tanto afeto,
tantas palavras.
São os mesmos homens e mulheres
e seus desacertos afogados entre paredes.
As palavras ásperas ou doces
a reverberarem no domo da cidade.

Caminho os mesmos passos
e uma enormidade de fatos
no lapso entre um e outro movimento dos meus pés.
Nosso tempo não muda,
morremos a cada riso,
a cada gesto amoroso,
a cada palavra irada.

Ando pela praia com os braços cheios de perguntas,
a vida colada aos olhos.
A vida e o poema.
O poema se move como um felino,
de coisa, para coisa,
de ato, para ato,
de pessoa para pessoa.
Sempre o senti, nunca pude escrevê-lo.

Quero a canção viva.
Cantar firmemente
tantos anos depois como fazia antes,
quando ignorava que não só me dirigia à luta,
mas ao encontro silencioso de mim mesma,
do único momento
no qual a vida é absolutamente nossa.
Agora sei.

Quero esta canção completa,
lúcida, vívida!

Silvia Chueire


Amigos, perdoem-me a ausência. Não podia mesmo estar por aqui.O poema aí acima é questionável, mas foi o que me deu vontade de trazer. Gosto de estar de volta. E preparem-se ,vou visitá-los em setembro ou outubro. : )
Abraços a todos. Muitos.

Silvia

telegrama são-joanino

d'oliveira, 23.06.06
Menino João
ao cuidado de Carteiro (extremoso Pai)

Diverte-te pá! Aproveita esta tua primeira saída á noite com o teu Pai. Não te parecerá nada de excepcional mas daqui a muitos anos (que sejam longos, que sejam bons, com os teus pais e os teus amigos) hás-de lembrar-te com ternura e nostalgia desta noite que daqui a pouco começa. Daqui a uns anos, já irás com amigos sem pais nem familiares vigilantes. E encontrarás ranchos de raparigas e...e, porventura, a magia desta noite far-te-á recordar o perfume da madrugada, a fogueira dos sentimentos, uma ousadia, o amanhecer na praia. Sobretudo não uses martelinho de plástico mas um belo alho porro. E cidreira para dar a cheirar ás senhoras e meninas que encontrares. E vê se o teu pai se diverte. E não te zangues se ele olhar muito para um peito de rola que lhe passe ao alcance do lúzio atrevido. É S João!
E dá um abraço aos nossos amigos bloguistas que vivem nestas terras são joaninas. Sobretudo aos do Porto, Braga e Figueira, onde, lá mais para logo, haverá o banho santo. Se eu te dissesse que, com a tua idade, não perdia pitada do tal banho quando as raparigas camponesas de há quarenta, cinquenta anos, vinham de longada para a praia para de madrugada tomarem banho no mar... Mas não digo. Diverte-te joão. E um abraço ao teu Pai.

A festa

Incursões, 23.06.06
Estavam todos cheios de pressa, os telefones estão calados, mandei tudo embora e fiquei a digerir duas boas sentenças que chegaram hoje, e arranjei um tempinho para vir aqui meter conversa, depois de ter estado debruçado na varanda a ver gente que caminha apressada e poucos carros, e a ouvir os primeiros sons dos martelos e a sentir o cheiro vago de mangericos.

É o princípio da noite de S. João. Eu que nem sou tripeiro, nem o tripeiro típico e que até nem tenho sotaque, confesso que o S. João nunca me deslumbrou por aí além. Nunca fiquei muito aborrecido quando me marcavam diligências em comarcas fora do Porto em dia de S. João, creio que no ano passado - podendo - não fui a lado nenhum e, por isso, não vivo muito a festa.

Vai ser diferente este ano. Não só vou ao S. João, com o meu João, como vou mesmo para o centro da festa, com uma troupe que não arranjou coisa melhor que não fosse um restaurante na Ribeira, ali mesmo ao lado do Douro de onde vai saltar o fogo de artifício do Porto e de Gaia que, este ano, Rio e Menezes deixaram-se de coisas e optaram por fazer o espectáculo em conjunto. Lá vou ter de aguentar as marteladas, pois então...

Obras sem planeamento

José Carlos Pereira, 23.06.06
Quem vive no Porto e conhece o nó do Regado da VCI, onde esta via se entronca com a Via Norte, sabe que ali decorreram obras significativas durante largos meses. Ter-se-á gasto naquelas obras vários milhões de euros, com o objectivo de melhorar a circulação automóvel e eliminar erros anteriores que faziam daquele nó um dos pontos negros da VCI.

Numa obra destas exige-se planeamento e rigor na definição do novo traçado. Um trabalho porventura mais complexo do que quando se projecta uma obra nova. Ora, acontece que o resultado conseguido é péssimo. Se o trânsito melhorou em algum sentido, a verdade é que piorou bastante em outros, particularmente no acesso da Via Norte à VCI, sentido Freixo-Arrábida.

Esse acesso começa por ter uma faixa de rodagem, alarga-se em poucos metros para três faixas e estreita-se novamente para uma faixa uns metros adiante para permitir a entrada na VCI. Escusado será dizer que, em hora de ponta matinal, aquilo que fluía mais ou menos bem passou a ser um verdadeiro inferno para os automobilistas.

E agora? A Estradas de Portugal gasta o nosso dinheiro à toa e não apura responsabilidades? Neste país, é normal que assim seja…

Do Diário da República e do Cherne

Incursões, 23.06.06

Ler o Diário da República, para além do seu lado circunspecto e grave, tem também a sua vertente lúdica. Pelo menos, no que diz respeito a algumas matérias, às quais sou alheio…

Já reclinado no (legítimo) leito conjugal, folheando, displicentemente, o Diário da República nº 119 I-B, datado de hoje, quinta-feira, deparo, a fls.4421, com a Portaria nº 587/2006 de 22 Junho, do Ministério da Agricultura (ainda existe?), Do Desenvolvimento Rural E Das Pescas [ainda podemos apanhar o (nosso) peixe?] a qual apresenta uma extensa lista com as denominações comerciais dos peixinhos. E, eis que caio em cima do “CHERNE”!: ora, o nome científico do mesmo é POLYPRION …AMERICANUS!

Ora, cherne cherne, vale dizer…Durão Barroso!

Certamente que nos lembramos todos da esposa de Durão Barroso, Margarida Sousa Uva, ter dedicado publicamente ao marido um excerto do poema "sigamos o cherne" de Alexandre O'Neill.

Pelo nome (científico) daquele, está, assim, explicada, a existência do…AMIGO AMERICANO!

estes dias que passam 30

d'oliveira, 22.06.06
Nem tudo o que luz é ouro

A ler os jornais ou a ouvir a televisão, assalta-nos uma sensação de coisas que se vão compondo, melhorando, como se o fim da primavera fosse justamente a época ideal para arrumar a casa.
De Portugal nem novas nem mandados. O pais está a banhos em Genselkirchen, e enquanto a selecção continuar a ganhar nem o governo chateia nem a malta protesta. Enfim a primeira parte é falsa mas a segunda é verdadeira. A anestesia é geral.
Com uma excepção. Um deputado europeu o senhor Manuel dos Santos a quem sempre se ouviram vulgaridades, resolveu dizer, por uma única e irrepetível vez, uma coisa sensata e chamou ao actual governo comissão liquidatária. Eu que sempre o achei um pobre diabo tenho que concordar que desta vez a criatura tem razão. Isto foi dito numa jantarada do chamado bloco narcisista do Porto. Claro que depois dos aplausos que terão sido muitos e vibrantes, as criaturas jantarantes caíram em si e vieram já, todas ou quase, dizer que as afirmações do cavalheiro dos Santos eram dele e só dele. O mais cómico foi a parte dos deputados domésticos (nunca uma palavra foi tão bem usada) que se solidarizaram com o governo. Entre eles li alguns nomes que já me não surpreendem embora houvesse duas senhoras deputadas que me fazem pensar que os caminhos da entrada da Assembleia da República são como os de Deus: extraordinários!
Lavemos a mão pecadora e passemos a outro tema menos caseiro. Em Espanha, a Catalunha votou um Estatut. Enfim, cerca de 49% dos cidadãos eleitores deram-se à trabalheira de ir depositar um papelinho na urna. Desses esforçados cidadãos, cerca de 75% votou favoravelmente o novo estatuto autonómico o que significou uma derrota estrondosa para o cada vez mais irracional Partido Popular e para uma excrescência política que dá por Esquerra Republicana. Trata-se de uma obsolescência nacionalistóide, retrógrada e anti imigrantes. O seu principal dirigente, o senhor Carod Rovira esteve no governo da Generalitat a acolitar como segunda figura o senhor Pascal Maragall. Conseguiu o impossível: teve de se demitir – foi demitido! – fez campanha contra um Estatut que ultrapassa em muito o que legitimamente se poderia pensar obter do governo central, andou a conversar com a ETA, apesar de estar aliado ao PSOE no Parlamento espanhol, enfim o homem foi, e é, um catavento.
O senhor Maragall ganhou a sua aposta mas, à cautela, demite-se. Foi um fraco governante da Catalunha, suponho que não deixa saudades nem lá nem no PSOE de que é ou parece ser militante.
Um partido português desses que de via reduzida, o do senhor Manuel Monteiro fez um qualquer acordo com outro do mesmo teor mas galego, o Partido Galeguista. Estão bem um para o outro no que toca a nacionalismo rançoso e balofo e a popularidade. Dizem os jornais que os dois partidos prometeram lutar contra o centralismo espanhol. Não mencionando desde logo a elegância do grupúsculo do senhor Manuel Monteiro em se imiscuir na política interna espanhola não deixa de ser risível atacar o governo mais federalista que alguma vez a Espanha teve.
E precisamente esse governo lá entendeu, há uns dias que desta vez a boa fé da ETA é certa (!!!) pelo que se propõe entrar em conversações mais ou menos directas com o bando acossado. Entretanto o PP uiva que a Espanha está a ser traída, esquecendo-se que eles próprios também já tinham tido umas conversas de pé de orelha com a mesmíssima ETA que na altura lhes fuzilava os militantes com heróicos tiros na nuca. O principal dirigente do PP, o senhor Rajoy é galego. Dizem os que o conhecem que, como bom galego, não diz sequer a direcção quando anda no elevador. Será por isso que agora desdiz a política do seu antecessor. Manias...
Entretanto as polícias francesa e espanhola assestaram um duro golpe no organismo financiador da ETA, o tal que mandava umas cartas aborrecidas aos empresários bascos, exigindo-lhes sob pena de um tiro (sempre na nuca) uns dinheirinhos para a causa da liberdade basca. As reacções são no mínimo surpreendentes. O governo basco quer explicações. Não lhe deve bastar o facto de os presos serem alegadamente chantagistas e terroristas. O habitual dirigente da proibida Herri Batasuna, o senhor Otegui, considera estas prisões uma afronta, e uma ameaça à paz e às conversações de paz! Claro que o senhor Otegui não é “etarra”, longe disso, é apenas um cidadão incapaz de condenar o tal tiro na nuca...
Deixemos esta estranha contradança espanhola e regozijemo-nos pelo facto de um canalha chamado Charles Taylor, responsável pelas guerras civis na Libéria e na Serra Leoa e ex-presidente da primeira, ir para a Holanda para ser julgado. Se for condenado, coisa que parece provável (ainda por cima é preto, o que ajuda) será na Inglaterra que cumprirá pena.
Convenhamos que desta única e excepcional vez, Deus olhou para aquele canto de África onde terão morrido cerca de quatrocentas mil pessoas. Eu, que sobre estas sangueiras, já nem sou capaz de me indignar, gostaria que Deus olhasse um pouco para o Darfur, para as fronteiras do Congo e para a Somália. Será pedir muito?
Estou obviamente a citar o Papa Bento XVI que na Polónia, mais concretamente em Auschwitz declarou que Deus não olhara para aquela zona na altura em que judeus, ciganos, russos, polacos, homossexuais e outras criaturas de difícil definição étnica, religiosa ou nacional foram esforçadamente reduzidas a cinza por “um grupo” de criaturas que se terá imposto à sociedade alemã.
Eu que tenho uns vagos antepassados alemães, uns Heinzelmann de Havelberg a 50 quilómetros de Berlim e que gosto da Alemanha, tenho alguma dificuldade em compreender esta curiosa interpretação histórica que condena um grupo e exculpa uma imensa maioria que votou nesse grupo, que o aplaudiu, aos urros, levantando a pata histericamente, heil Hitler! Sieg heil! Que viu irem para os campos primeiro os comunistas e os socialistas, a seguir os homossexuais e os “associais” depois os judeus e os ciganos (para já não referir os dez mil cidadãos negros e mulatos oriundos das antigas colónias africanas), e finalmente os resistentes de vinte países ocupados (Mauthausen foi construído pelos prisioneiros espanhóis refugiados em França depois da guerra civil...), alguns luteranos, outros tantos católicos etc...
Também eu acho que a actual população alemã pouco ou nada tem a ver com isto mas não é por isso que os pais e avós podem agora passar por inocentinhos...
Deixemos esta opinião para outras discussões e lembremos que nestes mesmos dias, morreu um monstro sagrado do non sense, da invenção linguística, da poesia em estado puro, une bête de scéne: Raymond Devos, o maior humorista (?) francês (por acaso belga), autor de livros espantosos e de tiradas extraordinárias, a tiré sa reverence. Por um breve momento, a França oficial, a França cultural e a França popular recolheram-se em uníssono lamentando esta morte. Passou-se o mesmo com a Piaf, com Brassens e mais uns quantos. Poucos. O génio é raro e mal distribuído.
Permitam-me os leitores que lhes deixe um par de aforismos de Devos: acabemos bem o que começámos mal.
Quand j’ai tort, j’ai mes raisons que je ne donne pas. Ce serait reconnaître mes torts!
Je crois a l’immortalité et pourtant je crains bien de mourir avant de la connaitre!
Si ma femme doit être veuve un jour, j’aimerais mieux que ce soit de mon vivant.
Remarquez que si on fait l’amour, c’est pour satisfaire les sens. Et c’est pour l’essence qu’on fait la guerre.
Même avec Dieu, il ne faut pas tenter le Diable.


Os interessados poderão comprar um livro: Matiére à rire (Orban) ou (melhor ainda...) o sublime dvd triplo “80 ans, 80 sketches” Momus, Universel Mercury 063 163 9

PS: os leitores que me aturam estarão como eu: como uns cucos e a razão é simples : o nosso Carteiro regressou ás lides depois de andar ás voltas com um computador avariado...
Como desculpa é fraquinha mas a malta, ao Carteiro, perdoa tudo. Ai quem me dera ter aquela idade...





That’s only football...

José Carlos Pereira, 22.06.06
E pronto. Lá despachámos ontem os mexicanos, depois de já termos feito o mesmo nos confrontos com iranianos e angolanos, que verdadeiramente nunca colocaram em perigo os nossos triunfos. Agora, vêm aí os adversários a doer e vai ser preciso mostrar o valor da equipa nacional.

É sabido que gosto de futebol e que sou frequentador de estádios (mais concretamente do Dragão…), mas já não aguento esta onda de futebol, de festarola, de recreio desportivo, à volta do Mundial. Fujo a sete pés dos infindáveis programas de televisão e de rádio. Já só aguento mesmo os 90 minutos em que a redondinha circula. Para mim, isso é que é o futebol.

E o país e o mundo? Como irão? Não sei muito bem. No Domingo, regressado de umas mini-férias, tive de esperar vinte e dois minutos para ter alguma informação sobre o nosso mundo no Jornal de Domingo da SIC Notícias, que vai para o ar às 23H00. Até aí, foi o reino da futebolândia. E Portugal não jogara sequer nesse dia…

O fio vermelho

Incursões, 22.06.06
Preciso de ir ao médico. Melhor: preciso de ir a vários médicos. Vejo mal ao perto, ando atacado de uma alergia quase permanente que se acentua por este tempo, já ouvi melhor, preciso de fazer análises para medir o colesterol, os pulmões não devem estar muito rosados, as tensões andam um bocado altas. Em suma: não tenho muito por onde se pegue.

Mas há qualquer coisa mais que me preocupa. Num qualquer momento da vida, algo circuitou dentro de mim, assim, como se me tivessem arrancado um fio, o fio por onde circulam os afectos. Não, não são os afectos da amizade, nem do amor que há entre pais e filhos e filhos e pais. Esses continuam por aqui, eu sinto-os, porque continuo a ter uma enorme capacidade de amar os outros e sobretudo uma enorme capacidade para ter compaixão. Acho que o fio arrancado é um fio vermelho, o fio das paixões que duram mais do que o tempo que dura um fósforo aceso.

Ando à procura desse fio, que é vermelho, eu sei que é, embora não saiba por quê, para tentar ligá-lo outra vez, porque só assim se atinge a plenitude.