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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

missanga a pataco 66

d'oliveira, 18.02.09

O Quixote de sapatilhas...

Há alguns anos um dos meus amigos editores convidou-me para traduzir um livro. Respondi-lhe que a tradução era mal paga e que, se porventura alguma vez me desse a tais tarefas, só traduziria de línguas onde pudesse insultar alguém tão copiosamente como em português e onde pudesse fazer palavras cruzadas. Acordámos, ao fim e ao cabo, que sem especial compromisso de continuidade lhe traduziria originais franceses e espanhóis. Tratava-se de línguas que dominava razoavelmente e que não me dariam grande trabalho. Só assim a tradução é rentável. De repente, ao fim de alguns anos, tenho quase duas dúzias de livros traduzidos. Alguns foram um prazer muitos foram uma provação. Algumas vezes recebi elogios uma fui insultado. O critico não aceitava que um livro notoriamente mau fosse mau por culpa do autor que era um desastre. Preferia atribuir as culpas ao tradutor. A tese deste singular critico era a seguinte: o autor da inverossimilhança era filho de um grande escritor espanhol. logo era bom. Como se sabe o talento herda-se... Se o livro era aquele conjunto de patacoadas decerto que o tradutor era o culpado.
Nesse dia, comecei a pensar largar esta tarefa. Traduzir inanidades é uma perda de tempo e um contínuo desgosto para quem tem de as verter fielmente em português.
Estou a ultimar o que eventualmente será a minha última tradução. Às razões perceptíveis no que acima escrevi junta-se estoutra: os tradutores sérios são pagos pela mesma bitola dos maus. Nem um cêntimo mais.
E se é assim, e é exactamente assim, não vale a pena gastar as meninges. Eu passo bem sem as traduções porque prefiro ler nas línguas originais. Os leitores se quiserem que protestem.
Ontem, numa livraria, abri um livro de recente tradução e de que tinha gostado (no original). Entre outras pérolas, li esta: o pobre D. Quixote usava umas sapatilhas rotas. O tradutor ignorante e ansioso nem sequer sabe que zapatilla também significa chinelo. O que naquele tempo se adequava mais ao cavaleiro da triste figura. É provável que o tradutor nem sequer tivesse lido Cervantes. E até que nem soubesse exactamente de que época se fala quando se fala dele. E sobretudo não sabe suficiente português o que, aliado ao seu mais que deficiente espanhol, dá uma tradução medíocre, indigna.
Aposto que lhe pagaram tanto como me pagam. Que lhe faça bom proveito. Eu que já não tenho pachorra. Como dizia o imortal vocalista dos Ena Pá 2000: se um gajo tem de ser puta que seja puta fina.
E bem paga, acrescento, muito bem paga.

Obras no Tribunal

mochoatento, 18.02.09
O Tribunal de Chaves está em obras. Entra-se pela cave nas traseiras. Acede-se ao 2º piso por uma escada manhosa, estreita, suja e nojenta. O ar é irrespirável, o espaço está cheio de pó, os cheiros são insuportáveis. Respiro com dificuldade. E tenho vontade de me vir embora. A Justiça não é tratada com dignidade. E o Ministério deve ser o mais incompetente serviço público português. É a vida! Paciência!

Os municípios também vão pagar

José Carlos Pereira, 17.02.09
O Programa Pagar a Tempo e Horas e o Programa de Regularização Extraordinária de Dívidas do Estado foram criados pelo Governo com o objectivo de reduzir os prazos de pagamento a fornecedores praticados por entidades públicas, permitindo uma injecção de capital na economia que ajudará as empresas, em particular as PME’s, a ultrapassar as suas actuais dificuldades de tesouraria.

Relativamente aos pagamentos de dívidas a fornecedores por parte dos municípios, no âmbito do Programa de Regularização Extraordinária de Dívidas do Estado, a Direcção-Geral do Tesouro e Finanças recebeu 79 candidaturas de municípios que se candidataram a financiamentos de médio e longo prazo, no valor de cerca de 485 milhões de euros. A lista final das 69 candidaturas aprovadas, num montante global superior a 415 milhões de euros, foi ontem publicada aqui.

SClENTIA IVRIDICA, Tomo LVII - N," 316

mochoatento, 17.02.09
Critica da razão comunicativa: o Direito entre o consenso e o conflito, Túlio Vianna
Os "novos" desafios do Direito Penal no século XXI. André Teixeira dos Santos
Fraude fiscal e branqueamento: prejudicialidade e concurso, Jorge Bravo
A protecção nacional da propriedade industrial (à luz da evolução recente), Luís M. Couto Gonçalves
Nótulas sobre a Sociedade Privada Europeia, Renato Gonçalves
Dois modelos de implantação da mediação familiar, Inmaculada García Presas
Sanção pecuniária compulsória: meios coercitivos -'- modelo português, Lurdes Varregoso Mesquita
Crónica do Tribunal da Relação de Guimarães, António A. R. Ribeiro e José António Barreto Nunes
Crón
Crónica do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (XVIII), Jorge Manuel Lopes de Sousa

Farmácia de Serviço 48

d'oliveira, 16.02.09

É cada vez mais irregular o horário de abertura da “farmácia”. O boticário está velho, esquecido e, aqui para nós, duvida bastante da eficácia das suas receitas. Todavia, e antes de fechar de vez o estaminé, lembrou-se de deixar três apontamentos. Como de costume, só fala do que sabe, só recomenda o que já viu, leu, ouviu. Em muito contados casos, e é o caso da exposição, louva-se em notícias e criticas várias todas concordantes.
E comecemos pela música: setenta discos (70!!!) da inolvidável Callas a menos de € 0,50 cada diz-voa alguma coisa? Não vos desperta a vontade de, por um único e irrepetível momento, mandar a crise dar uma volta ao bilhar grande de mão dada com o senhor inginheiro, e “despilfarrar” uns morabitinos? Que diabo são setenta cd dessa enorme diva. A cerca de 30 euros por junto!
The complete studio recordings of Maria Callas (1949-1969)", EMI. Com o aval do Teatro alla Scala de Milão, ainda por cima. Peçam-nos via amazon.fr. que foi de onde os mandei vir. E depois digam qualquer coisinha...

Escuso de vos recomendar “Ofício Cantante” do Herberto Helder. Ou melhor, recordo-vos que é uma reedição da obra completa, versão 2009. E digo isto porque a aquele mafarrico reelabora constantemente os seus textos pelo que poderão estar certos que muitos dos mais conhecidos poemas aparecem em nova versão. A edição é da Assírio & Alvim e anda pelos quarenta e tal euros. Vale-os absolutamente, claro, tanto mais que o livro vem com encadernação de editor o que o protege mais. Quem quiser encomenda-o ao “Pátio das letras” em Faro. A almirante fluvial Kamikaze terá todo o prazer em vo-lo enviar.

E agora uma novidade, novinha, acabadinha de sair do forno: “la ninfa inconstante” de Guillermo Cabrera Infante, esse cubano prodigioso, desaparecido há cerca de três anos e que nos deu “Tres tristes tigres” e “La Habana para un infante difunto” (acabo de escrever isto e vejo que o mesmo se escreve na contracapa. Raios!, já não se pode ser original). A “ninfa...” é uma obra póstuma. Nem sempre são recomendáveis estas cavadelas no espólio de um escritor desaparecido mas aqui estamos em presença de algo que vos encantará. A edição, bem bonita, corre a cargo da Galáxia Gutenberg/Círculo de Lectores. Anda pelos 20 euros. O Corte Inglês encomenda-a.

Não é uma novidade mas é uma raridade. Ou melhor, é uma reedição facsimilada de uma raridade: “Proverbe”. Proverbe foi uma revista dadaísta dirigida por Éluard que publicou seis números entre Fevereiro de 1920 e Julho de 1921. Os originais, escassos, escassíssimos tem preços estratosféricos, claro. Como tudo o que toca o surrealismo e o dadaísmo. Para mais informação consultem www.editions-dilecta.com ou a velha amazon.fr. não é barato, não senhor: cerca de 23 euros por uns fascículos magrinhos mas excelentes.

E agora um para os soixante-huitards assanhados. Para os que ainda não depuseram as armas. Para os que se divertiram. “Harakiri 1960-1985, les belles images" (Hoebeke). Para quem não saiba, Harakiri (journal bête et méchant) foi uma das melhores e mais agressivas revistas desse tempo prodigioso. Cavanna, Wollinsky, Cabu, Reiser, Delfeil de Ton entre outros colaboraram neste panfleto monumental. A bem-pensância horrorizada criticava-lhe o mau gosto, a ferocidade, a intransigência sei lá que mais. Imperdível. Imperdível sobretudo porque o poder proibia vezes sem conta a revista até que a forçou a mudar de nome. Trata-se de uma sólida edição ilustradíssima de 320 páginas formato grande. Pour lecteurs avertis, como se diz para os filmes ousados... 28 euros!

Quem pode vai a Paris ver o Chirico (Chirico et la fabrique des rêves) ao Musée d’Art Moderne. Impressionante, ao que leio. E Paris é sempre uma festa. E pode aproveitar para ver a exposição Paris capital de la photographie no Jeu de Paume. Ao fim e ao cabo voltamos um pouco ao tempo da publicação de Proverbe. E da invenção do século XX.

E agora, muito à puridade, uma dica: entrou na tipografia, ou no que quer que seja, “Máscaras da Utopia (história do teatro universitário em Portugal, 1938-1975)” de José Oliveira Barata, ex-professor catedrático em Coimbra. Será a Gulbenkian a editar. Já li as primeiras 200 páginas de um total de 370, e roí-me de inveja. Porque raio não fui eu a escrever este livro? O Zé B é um velho amigo e discutimos muito o livro á medida em que o ia escrevendo mas a surpresa da versão final é extraordinária. E a iconografia é simplesmente esplendorosa. Só a Gulbenkian é que poderia atrever-se a um lançamento destes. E o teatro universitário português merecia este belíssimo estudo. E os leitores, vocês, também!

Revolução na Arábia Saudita?

mochoatento, 15.02.09
Noura Al-Fayez, nova vice-ministra da educação para os assuntos das raparigas, tornou-se a primeira mulher a entrar ao governo da Arábia Saudita, um país onde a religião impõe uma estrita separação dos sexos. “É uma fonte de orgulho para todas as mulheres”, considerou a Sra. Al-Fayez na imprensa saudita, saudando a decisão do rei Abdallah como “uma feliz iniciativa”.
“Há muito tempo que temos sofrido que um homem ocupe este posto. A mulher conhece os problemas e os desafios que encontram as suas concidadãs. É uma mudança para uma melhor situação ", explicou Noura Al-Fayez, que fez carreira no sector do ensino. A sua entrada ao governo é entendida como um progresso pelos observadores, que esperam agora ver se outras medidas de promoção das mulheres a postos de responsabilidade se vão seguir.

Notícia dada por Le Monde

A pedra

ex Kamikaze, 15.02.09
É o nome do blog onde escreve o Pedro Afonso, que tenho a sorte de gostar de trabalhar no Pátio de Letras.
O Pedro saía do trabalho às 15h, mas ia voltar pelas 17h, não em serviço mas sim para assitir à sessão de poesia que integrava a apresentação do antologia Os Dias do Amor. Aliás, está representado na antologia e um dos seus poemas foi lido (e que bem lido!) na sessão pelo actor Álvaro Faria - tarefa difícil, que a poesia do Pedro, publicada neste livro, noutros antes e em revistas várias, raras vezes é assim como a que escreveu hoje (certamente de um só fôlego), "por causa" do tal intervalo...

February 14, 2009

não há nada como
aproveitar um intervalo
pequeno no trabalho
para dar a tal voltinha
descer a cidade até às muralhas
beber uma cerveja na tasquinha
e ir até à ponte
donde partem os barcos para a deserta
e cruza o combóio
apanhar um pouco de sol
e observar com todos os sentidos
os peixes nadarem na espuma branca
do esgoto que rebentou
por ter chovido
um bocadinho mais do que o normal
ver os caranguejos rebentarem
bolhas opacas de reflexos lindos
de detergentes óleos e químicos variados
misturados com a habitual gasolina

não há nada como esta
ambiência depressivo-decadente
pseudo-mediterrânica
e olhar a ilha ao fundo
através do bosque de mastros
e bandos de gaivotas
ver bófias passar de bicicleta
armados como na guerra
de pistola e belo capacete
enfiado na tola sedenta de acção

não se passa nada
continuem lá com a vossa gincana
e joguinhos de gang autorizado
enquanto eu volto a subir
a cidade de regresso ao trabalho

alguns miúdos enfeitaram o jardim
com fita magnética de VHS
bonito mais do que as palmeiras importadas


O trabalho no Pátio já quase não deixa tempos livres durante o período de serviço mas, quando assim não era, gostava de saboraer a surpresa de ver, no A Pedra, os poemas que o Pedro por vezes escrevia durante aqueles períodos mais calmos, e que agrupou AQUI. Ficava eu então a imaginar se e que frase estaria ele a escrever no momento em que, quiçá, o abordara para falar daquela ou daqueloutra minudência...


October 20, 2008

vou
sentado ao balcão
do lado de dentro
conduzo o nada pelo vazio
da tarde de sábado
enquanto
provavelmente
os clientes almoçam

tenho na frente uma paragem
a letras verdes
"próximo cliente"
e a parede branca ao fundo

conduzo o tempo
embatendo na suave ondulação
do som ambiente

vou aqui deixando
o meu estar


July 26, 2008

cumprindo o suposto
sem fugas surpreendentes
onde há paredes há chão
cobrindo o abismo constante

é nele que me diluo
sentindo o fresco que resta
da manhã que morre na luz
talvez quase que acorde
antes da absorção derradeira


Há mais poemas, escritos e opinião que vale a pena ler e ter em conta - podem ir lendo AQUI.

Agora que o MCR voltou...

ex Kamikaze, 15.02.09
--- das Correntes d' Escritas, onde já sabemos que reencontrou dezenas (quiçá mesmo centenas) de amigos e que acabo de ler este escrito num blog aqui do SUL, não resisto a deixar-vos o copy-paste. Quem queira aceder ao blog onde foi escrito pode fazê-lo clicando clicando no título abaixo.

Ondjaki, Correntes d'Escritas, Pátio de Letras, Os Dias do Amor, ontem, eu

Ontem: ontem comecei por ter a certeza que nunca seria convidado para as Correntes d'Escritas, pois segundo o Ondjaki esse é um espaço "de reencontro de amigos". Ora, eu, sem amigos na literatura (e ainda com uma pessoa que se arroga de ter uma inimizade comigo, apesar de não me conhecer) como posso esperar ser convidado?

Quando cheguei ao Pátio de Letras esqueci-me do choque da definição de Correntes d'Escritas do Ondjaki e desfrutei de boas leituras de poemas na apresentação da antologia de poesia Os Dias do Amor. Fiquei um pouco vaidoso por terem lido o meu poema "antologia", é verdade, mas também envergonhado quando os muitos presentes olharam para mim. No final, alguém que não conhecia, depois de me ter felicitado pelo poema, pediu-me para escrever algo na página onde ele se encontra. Então escrevi assim "para a Filipa, que a sua vida também seja uma antologia e, de preferência, com muitos poemas".

Fui para Tavira, logo de seguida para uma festa de família, e a declaração do Ondjaki reapareceu na minha cabeça: "As Correntes d'Escritas são um espaço para o reencontro de amigos". Como diria alguém: e esta, hein?

[tn]

Estes dias que passam 143

d'oliveira, 14.02.09

Uma semana igual a tantas outras

S.ª Ex.ª não mentiu. Simplesmente não se lembra. Assinou ou não assinou? Sei lá. Mas está lá a assinaturazinha... Bem, estar, está, mas uma pessoa assina tanto papel... E a maior parte das vezes isso é puramente maquinal. Pensamos estar a dar um autógrafo e pimba, aí vai disto: está a assinar-se um contrato. E S.ª Ex.ª não se lembra... Eu também não. Também, valha a verdade, nunca fui a Porto Rico, bem que teria gostado, aquilo é tudo praias, bancos, loiras e morenas de ressuscitar um morto (e só Deus sabe quanto preciso de ser ressuscitado...). E empresas de informática doentinhas, pálidas, murchas, que hoje valem um balúrdio e amanhã o papel das acções nem para limpar o dito cujo serve. E também não vendi nem comprei empresas mesmo daquelas das que não valem meio pataco. Minto: vendi quando jogava o monopólio. Mas isso foi há tantos anos que o crime, se crime era, prescreveu.
S.ª Ex.ª ao não se lembrar de coisa alguma entra naquela categoria catatónica dos relapsos da memória. Que dia é hoje? Não sei. E ontem? Esqueci-me. E amanhã? O futuro a Deus pertence e quem sou eu para tentar perscrutar os caminhos do Senhor.
S.ª Ex.ª perguntado se é Conselheiro de Estado, conselheiro amoroso ou apenas o Leal Conselheiro abreviado para uso de adolescentes retardados e da Ministra respectiva, respondeu que nada disso, era tão só o concelho de Mortágua... ou (hesitação sorridente) Aigues Mortes. Mais tarde, mais modesto, negou tais palavras e assumiu-se como “freguesia”...
Em suma, tudo como dantes, quartel general em Abrantes.

2
Os jornais noticiam severamente uma forte dissonância entre as previsões do nosso sábio e experiente governo e os resultados da contracção do PIB. Até os mais pessimistas ficaram surpreendidos. Engano, queridas paroquianas. Engano. Eu, que sou um blogger a soldo das potências das trevas, não fiquei surpreendido. Também não fiquei feliz, cabe dizer, mas não fiquei surpreendido e quem me lê fielmente (ora tomem lá!, só leram em diagonal e agora queixam-se) sabe que me gastei até ao tutano em agoirentas predições que agora se mostram horrivelmente reais. Achei, e acho, que as etéreas criaturas que nos (des)governam não merecem mais crédito que o Zandinga. São amadores. Amadores fraquinhos, seja dito. Principiantes, mesmo. E esta gente que quer fazer comboios de alta velocidade e outras bizarrias. Vê-se que em pequenos ninguém lhes fez a caridade de um comboio eléctrico, mesmo dos baratinhos. Agora vingam-se. Ele é TGV para aqui, para acoli e mesmo para Vigo. E Vigo, porquê? Já cá há o El Corte Inglês e vendem-se em qualquer praça os pimentos do Padron (unos pican otros non). Há por aí umas alminhas inocentes que acham que estas e outras despesas trarão para Portugal inumeráveis benefícios. Outras almas mais dadas à libertinagem juram que o tal comboio irá aumentar a predominância das praças espanholas sobre as portuguesas. Ou, por outras palavras: o tal Noroeste peninsular serve para favorecer ainda mais os hermanos espanhóis à custa de uma série de papalvos lusitanos que se julgam inteligentes.
E agora a verificação do erro de previsão. Vão dizer que é a crise, olá se vão. Qual crise qual quê! O tanas e o badanas. A burrice supina é só nossa, muito nossa. Ou melhor, deles, desse estouvado grupo de governantes que, contra todas as probabilidades e a mais elementar prudência, andaram por aí a armar-se ao pingarelho. Cotejem as suas declarações de, por exemplo, há dois meses atrás. Basta ir a uma biblioteca e pedir uma colecção de jornais referente a esse período. E digam-me depois se o que leram não parecia a a história da Branca de Neve travestida em lobo do Capuchinho Vermelho.

3 De repente o país entrou em polvorosa. Um porta-voz da Conferencia Episcopal disse, e isso está gravado, um par de coisas sobre o hipotético casamento dos homossexuais. Aqui para nós, se de facto acreditam no que dizem, já o deveriam ter dito por alturas da proposta do BE há um par de meses. A menos que, e isso é compreensível, não levassem o BE muito a sério. Ou que, e isso é ainda mais compreensível, soubessem que o P.S. entendia que essa proposta era aberrante, redundante ou fracturante (risquem o que não interessar). E de facto o Ps votou contra. Agora, ainda nem seis meses passados, é a favor. Como? Porquè? Pois não se sabe. De repente a proposta derrotada aparece como uma “bandeira” do novo congresso que se avizinha. Parece que o P.S. não dorme condoído com a sorte dos homossexuais impedidos de convolar em justa núpcias diante de um cavalheiro do registo civil. O P.S. viu a luz enquanto entrava no túnel da crise e das próximas eleições. Em momentos deste género, o P.S. “reencontra-se” e encontra milagrosamente o que ele pensa ser os ideais de esquerda. Se é que o casamento dos homossexuais ainda tem essa categoria. Países e parlamentos bem mais à direita do que é suposto ser o nosso partido socrático já há muito que admitem este casamento mesmo que ele se não destine à procriação...
Os senhores bispos já mandaram dizer que não estavam a forçar ninguém e muito menos a pregar uma cruzada contra o P.S.. E nissp foram pressurosamente ajudados por comentadores que asseveram que a Igreja portuguesa reconhece que a César o que é de César. E que, ainda por cima, belo argumento, a Igreja sabia que não tinha força nem capacidade para mobilizar eleitores contra a nefanda medida.
Tem força, claro. Só que, no caso em questão, os paroquianos, ou uma grande parte, esmagadora parte, se está nas tintas. Dois homens ou duas mulheres a tentar viver juntos não suscita grande surpresa e, muito menos, grande reparo. As pessoas têm mais problemas e mais instantes, a resolver. A única coisa estranha é a Igreja ignorar isso. Todavia, um punhado de federações socialistas já veio pedir que a medida seja alvo de referendo. Quando não querem decidir, pimba!, toma lá referendo. Parece que o dr. Mário Soares também se comoveu com esta novidade. Também ele acharia que o casamento é para os heterossexuais. Ou pelo menos, o que é mais crivel, entenderá que Lisboa vale uma missa, o mesmo é dizer que mais vale ter a Igreja por perto do que contra.
O dr. Almeida Santos entretanto arriscou uma palavrinha, modesta e cautelosa, sobre a eutanásia e sobre o reconhecimento do testamento vital. Oh que tumulto! E as pressões não se fizeram esperar. O dr. Santos meteu a viola no saco e as pessoas que querem evitar a si próprias e á família o espectáculo de um fim de vida degradado, sórdido, doloroso que se lixem. Notem bem que não discutir isto é condenar-nos à não vida daquela desgraçada italiana que penou meia vida carregada de isquemias e chagas até há meia dúzia de dias. Ninguém quer matar um inocentinho, como já se dizia no caso do aborto, apenas se exige que deixem morrer com dignidade e sem sofrimento próprio e dos familiares quem isso antecipadamente pede.
Andam por aí uns guardiões de um templo que querem impor a todos os outros a sua Weltanschaung, o seu modo de ver o mundo e participar dele. Se for assim, e é assim, então devemos começar a pronunciar-nos sobre questões de fé e sobre a vida interna da Igreja.
Em Portugal a questão religiosa morreu há um bom par de anos. Morreu primeiro quando o excesso republicano inventou o “delírio religioso”, morreu depois quando uma certa versão do salazarismo mais torpe entendeu defender um Estado nacional-católico. Mas volta e meia ressurge nestas discussões como se subitamente se olhasse para a vizinha Espanha onde a militância religiosa tem amotinado multidões sobre temas tão normais quanto o do ensino da educação cívica. Será assim? Quererão alguns portugueses importar o Monsenhor Rouco Varela e a nova cruzada que ele tenta pôr de pé?

4 Um tribunal da relação deu o golpe de misericórdia na bambochata dos apitos. Lendo os excertos do acordão, fica-se com a penosa ideia de que o Ministério Público meteu os pés pelas mãos, produziu uma prova nula ou tão pobre que mereceu um arraial de bordoada. A violência dos termos do acórdão é aterradora. E faz-nos temer pela nossa segurança e pela garantia de competência que soi atribuir-se ao MP (ou a algum MP) e isso, desculpem que o diga, corrói a própria base do sistema democrático em que vivemos e queremos viver. E faz-nos pensar nesta outra coisa: se em vez de procurar estar continuamente na ribalta mediática algumas personalidades do MP se preocupassem em instruir com seriedade, competência e bom senso os processos que lhes são atribuídos? Perdiam em visibilidade negativa o que todos ganharíamos em boa justiça.