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Bota Abaixo? Bota e já!
Sessenta milhardas foi quanto custou o estádio de Aveiro!
Agora de quinze em quinze dias aparecem por lá cerca de dois mil espectadores para ver a equipa da casa jogar contra um outro clube,
Há notícia que aquilo, mesmo sem abrir portas, custa um balúrdio por dia. Abrindo, paradoxalmente, ainda custa mais apesar dos dois mil quinzenais frequentadores.
Uma das ideias, peregrinas, claro, é investir mais uns largos milhões para, eventualmente, rentabilizar aquilo. Enfim, para tentar rentabilizar.
Conhecendo, como conheço estas agoirentas criaturas do salto mortal para a frente, prevejo, sem grande dor de cabeça, que alguém quer chuchar com o pagode, fazer a malta pagar ainda mais, para depois gastar ainda mais na manutenção daquela manada de elefantes brancos.
Um cidadão, louco mas atinado, propôs implodir aquela aberração. Gastar por gastar, ia tudo para o maneta e, dos terrenos livres, fazia-se coisa mais conforme à pequenez da terra e ao futebol que por lá se pratica. Acontece que a criatura, cuja sensatez parece evidente, é responsável de um partido politico, sinal de que ainda há esperanças para todos quantos teimam em viver em democracia partidária.
Claro que os do outro partido, ausente da condução dos negócios municipais, uivaram de indignação. Que não, que era um crime deitar abaixo os inúteis sessenta milhões lá gastos. Que com mais alguns milhões a coisa tinha futuro... E dava trabalho a alguns desempregados durante as obras. E algum a ganhar aos empresários locais. E mais não sei quê.
Eu, quando, há anos, assisti ao desparrame de despesas com os estádios dei gritos. De indignação, claro. E, aqui mesmo, fui dizendo que os tais campeonatos de futebol não trazem aos países periféricos como Portugal tanto dinheiro que dê para cobrir sequer uma parcela significativa dos gastos feitos naquelas mastabas de cimento.
Não fui morto, há que reconhecê-lo. Chamaram-me alguns nomes, seguramente, mais uma vez o meu patriotismo foi posto em dúvida, mas ninguém me veio aquecer os lombos com uma dúzia de bengaladas. Como eu, eventualmente, mereceria por me opor ao progresso do betão e do país. Agora temos que Aveiro, Coimbra, Leiria e Faro têm umas enormidades que custaram o que se sabe, que custam o que ninguém sabe, que não servem sequer para o tal mundial de futebol com que nos querem crucificar num futuro próximo e por isso exigem mais obras (todos os estádios ou quase não estão dentro da bitola do tal mundial que é, parece, de oitenta mil espectadores) que por sua vez acarretarão mais despesa de manutenção no futuro e assim sucessivamente.
Eu duvido até que os estádios dos três grandes e o do semi-grande (Braga) não sejam deficitários. Mas suponhamos que não. Que aquilo dá para as despesas.
Por que raio hão-de ser os cidadãos a pagar o gozo de uma pequena parte dos adeptos do futebol, isto é dos que, além do emblema e do cachecol, se dão ao trabalho de irem ao estádio em vez de ficarem avacalhados no sofá diante da tv sport com meia dúzia de latas de cerveja e um quilo de pipocas?
Será que na Inglaterra, na Alemanha, na Espanha aqui tão perto, os estádios são pagos pelo Estado? Não me consta mas, já agora, se algum leitor tiver notícia diferente por favor escreva um comentário que aqui não se faz censura.
No mesmo dia em que alguém sensatamente propõe medidas radicais contra o esbanjamento, uma empresa pública ou quase, fecha cinco linhas de caminho de ferro enquanto durarem as obras de reparação da via. Durante mais de cem anos as obras sempre se fizeram mantendo o tráfego ininterrupto. Agora, na democracia, um punhado de luminárias entende que os usuários (mesmo se poucos) podem muito bem deslocar-se de táxi ou ao pé coxinho porque as obras (que ainda nem sequer terão começado) não permitem a passagem das composições. Essa mesma gentinha vai sonhando com altas velocidades, para aqui, para ali, para acolá e para o raio que a parta numa desbúrdia de milhares de milhões. Mas para os gastos da casa, coisa comezinha e insignificante, toma lá que já bebes. Isto se, de facto, há a vontade de refazer essas linhas ora fechadas, coisa que não teria nada de surpreendente conhecendo-se como se conhece o auto-estradismo dos que se repimpam à mesa farta do orçamento.
(é bom que se saiba que, até á data, a alta velocidade não passa de Madrid e ainda não se sabe bem se há ou não transporte de mercadorias associado. Sabe-se outrossim que o transporte previsto de passageiros mesmo no melhor cenário, no da Hollywood caseira, no que nunca sucede, não pagará o investimento, sequer a despesa corrente.)
*A horrenda gravura arrobiolacada representa o tal estádio. Se o bom gosto mandasse aquilo ia abaixo por ofensa ao mero senso estético. Quando lá passo - e agora passo duas vezes por mês - pergunto-me se aquilo é o carnaval de Veneza ou o fantasma da ópera em Tecnicolor lusitano. Pode-se não gostar da simpática cidade de Aveiro mas quem fez aquilo queria-lhe mesmo mal. Muito!