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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

o leitor (im)penitente 65

d'oliveira, 11.05.11

 

 

 

 

De alguns livros... (e da alegria)

 

O leitor não tem preguiçado, bem pelo contrário, no que toca a leituras. Nem em compra de livros, valha-me Deus, que ainda não percebi que já não conseguirei ler tudo o que vou acumulando nas estantes. Ainda há dias, em Vigo, foi um ver se te avias...  Os diabos dos espanhóis editam cada vez mais e melhor.

Mas fiquemo-nos por cá. E comecemos pelos alfarrabistas, esses alvissareiros vendedores de preciosidades que desapareceram do mercado, às vezes sem ninguém saber porquê. Ainda há pouco tempo, a Sextante editou para a Câmara de Lisboa o catálogo “África, diálogo mestiço” referente à exposição da colecção de arte africana do pintor José de Guimarães.

Como é que não vi, nem sequer me apercebi!..., este livro e esta exposição é mistério doloroso para mim, que às áfricas da minha adolescência me refiro constantemente? Agora ando por aí, desesperado, à caça do livro, encomendando-o em toda a parte e lançando, também, esta garrafa de náufrago ao mar dos leitores. Haverá algum, gentil menina ou cavalheiro conspícuo que me acuda?

Mas voltemos às nossas devoções. Acabei de ler de Dalila MateusA luta pela independência (a formação das elites africanas)” que, curiosamente é –suponho – o primeiro dos quatro ou cinco bons livros que DM dedica ao tem das independências das nossas ex-colónias africanas.

Para quem acompanha de perto esta problemática, as novidades não são assim tantas mas a sua sistematização é útil e poupa imenso tempo, além de fornecer bibliografia exaustiva e pistas interessantes. DM, depois, escreveu sobre o papel da PIDE na guerra colonial, os independentistas moçambicanos (utilíssimo!)  o despontar da guerra em Angola e a crise (raio de eufemismo!) nitista. Trata-se, na generalidade de textos muito bem documentados que não sacrificam à moda piedosa e hagiográfica que ainda percorre muita da literatura produzida sobre o tema e, fundamentalmente, que separam o trigo do joio. Finalmente, aparece quem refere Viriato da Cruz, quem distingue o notável teórico que foi Amílcar Cabral de outros pais fundadores cuja fragilidade ideológica e/ou política era frágil. E quem relembra Mário Pinto de Andrade, animador cultural, ensaísta notável e patriota angolano. Está por fazer a história das conspirações contra estes homens. Mais passons...

E no capítulo novidades? Comecemos pelas importações. A FNAC perdeu a cabeça e importou duas preciosidades a preços mais que decentes. E japoneses! De um lado “Haiku des quatre saisons” com gravuras de Hokusai, o magnífico. Ai o que eu dava por uma gravura dele! A edição  é da Seuil. (+ ou –  20 €).

Outro monstro sagrado, Hiroshige: dele a mesma FNAC apresenta num voluptuoso volume “sur la route du tôkaidô” mais um pequeno estudo de Nelly Delay e um extraordinário (e meço as minhas palavras!) caderno de vistas sobre o mesmo tema que fora editado em 1840 por Sanoki e ilustrado por um pequeno poema (infelizmente em japonês!). Esclareça-se que sob o mesmo nome há cerca de trinta séries de gravuras sempre sobre as mesmas 56 estações.

Aqui chegados, assalta-me uma dúvida. Leitor(es) haverá que se pergunta(m) “e que tenho eu a ver com estas japonices?, mcr esparvoou ou arma-se ao pingarelho?”  Nem endoidei nem me faço fino: trata-se leitor(es) de duas peças únicas, lindíssimas, entusiasmantes, fecundas. Descobri em Berlin, vai para quarenta e tal anos, a gravura japonesa e juro que fiquei estarrecido. Já lhes admirava o cinema, a poesia, a arte da jardinagem mas isto ultrapassa tudo o resto. E tem mais uma característica interessante. A reprodução de pinturas através de uma espécie de xilogravura tornou democrático o acesso à pintura através dos múltiplos. 

Em Matosinhos, durante a edição deste ano do “Literatura em viagem” (evento que os leitores, no caso de terem tempo, nunca deveriam perder) fiquei impressionado com o depoimento de A. Vasconcelos Raposo, um professor universitário, especialista em treino, ex-fusileiro naval especial já no fim das guerras africanas. Acossado pela memória, por muitos anos de noites brancas (ou vermelhas) e pelo dever testimonial, eis que se lançou a escrever um livrinho que modestamente definiu como ficção: “Até ao fim, a última operação” (Sextante). Não é uma ficção, claro, mas o relato quase a par e passo de uma operação de resgate de presos portugueses nos confins do leste angolano. Não é uma lição de estilo mas lê-se sem enfado. É apenas, com alguns nomes camuflados a descrição da missão de um grupo de combate largado no meio de nenhures atrás de um grupo guerrilheiro que leva prisioneiros capturados. A honradez do discurso, a verdade ddos factos, a preocupação do comandante pela vida dos seus homens, uns escassos vinte militares se não erro, o reconhecimento da dignidade do inimigo (é verdade: também houve disso nas guerras que travámos entre sessenta e setenta e quatro), pertencentes a uma força de elite mal conhecida entre nós (que vivemos sempre a ouvir contar proezas de comandos e de paraquedistas) os que seguiram os acontecimentos com paixão e comprometimento (e risco, já agora). Não vou contar a trama desta escassa centena de páginas mas aconselho vivamente todos quantos querem ainda saber a comprar e ler o livro. Desde já previno algum arganaz mal intencionado que com isto não pretendo branquear nada. Para mim (e para o autor) aquela guerra cheirou mal desde o primeiro dia, Muitos, ou não tanto, tomámos partido, quase todos pagaram duramente essa posição que ia contra (é preciso que isto fique muito claro) a opinião dominante quer a nível popular quer entre as elites políticas de todos os quadrantes. Todavia, a verdade, a dignidade e a honra merecem mais do que a repetição de meros slogans com que durante muito tempo se intoxicou a opinião pública. Os portugueses foram todos implicados durante catorze anos nesta guerra. Mais de um milhão de homens serviu nas colónias. Outro milhão estava lá, lutou lá. As famílias e isso leva-nos para um número enorme, sofreram com a ausência, com os cuidados, com o dia a dia da tropa perdida por aqueles sertões, com os ferimentos e com a morte dos seus. Ainda hoje são centenas ou milhares (ou dezenas de milhares) os que padecem de perturbações de todo o tipo, mormente psiquiátricas, devido aos anos de chumbo. Todos, mesmo os que não tinham ainda nascido, têm direito a saber e este livro, não sendo A Resposta, é seguramente parte dela.

 

(a propósito: a tv a que temos direito(??) passou no domingo, a desoras um filme Le Passeur, realizado pela Filipa César em que dois incursionistas (Simas Santos e eu mesmo) colaboraram juntamente com Cândida Alves e José Teixeira Gomes. Nessa peça relatávamos como, sem ligação a qualquer central política, sem fazer escolhas entre os diferentes grupos da esquerda, constituímos um grupo informal de passagem de fronteira. Entre 71 e 74 rara terá sido a semana em que não se fizesse um transporte ou, pelo menos, se planeassem tarefas ligadas a isso. Não pretendendo ficar conhecido ou disputar os focos da fama com os actores de telenovelas nacionais, os jogadores de futebol, as tias cascalhudas que enchem as páginas da Gente ou os cómicos e os políticos, Deus me livre! Porém, passar este filme, que obteve o prémio BES FOTO,  a horas mortas é condená-lo ao desconhecimento. Exactamente ao contrario do que tem sucedido em vários países onde a Filipa tem sido alvo de homenagens, de retrospectivas e de prémios. Já o vídeo idiota e errado sobre Portugal para finlandês ver, passa a todo o momento para vergonha de todos quantos sabem distinguir entre o special one e Fernão de Magalhães, o navegador, claro, e não a maquineta inspirada noutra estrangeira e que é vendida como a sétima maravilha do mundo...)

 

*na gravura: uma das estações do Tôkaidô

 

As águas turvas do programa do PSD

O meu olhar, 11.05.11

A intenção do PSD, caso ganhe as eleições, em diminuir a Taxa Social Única é um presente envenenado para a grande maioria dos portugueses e não consegue sequer o suposto objectivo de aumentar a competitividade, já que todos sabemos o que uma boa parte dos empresários portugueses faria com estas “poupanças”: torná-las num proveito próprio. A consequência desta medida seria uma redução brutal no orçamento da Segurança Social, com o consequente risco de insustentabilidade do sistema. A contrapartida para a redução da receita seria o aumento do IVA tanto mais que Cartoga assegurou que não haveria redução das receitas totais. Assim sendo, esta medida favoreceria os empresários e poria todos os portugueses a pagar a factura. Isto é tanto mais grave quanto todos sabemos que o imposto sobre o consumo é um imposto cego: todos pagam o mesmo, dos mais ricos aos mais pobres, pelo que seriam estes últimos as verdadeiras vítimas. Por isso, espanta-me que o candidato presidencial do PSD, que ganhou as eleições, venha apoiar esta medida dando-lhe um cariz técnico quando sabemos que tem, sobretudo, um cariz político. Espanta-me também que o candidato do PSD que ganhou as eleições presidenciais tenha estado tanto tempo calado, num silêncio que atravessou momentos importantes da nossa história recente, mas tenha resolvido opinar sobre medidas do seu partido, para as apoiar. Brilhante campanha de apoio presidencial: começa no discurso de tomada de posse, passa pela gestão do silêncio, e agora faz slogans de apoio “técnico”.

E se o PS ganhar?

J.M. Coutinho Ribeiro, 10.05.11

Uma sondagem da "Intercampus", publicada hoje no "Público", dá o PS a subir e o PSD a descer, relativamente a outra pesquisa feita dias antes. Neste momento, é de apenas 0,8% a vantagem do PSD. Uma margem curtíssima e uma tendência de crescimento socialista que tem vindo a ser confirmada em todos os estudos de opinião. Temos, assim, que uma vitória do PS em 5 de Junho - que há uns meses era uma verdadeira improbabilidade - é um cenário possível.

Se tal vier a acontecer, poderá criar-se uma situação inédita em Portugal. Não sendo previsível que o PS, ganhando, obtenha maioria absoluta, estará criado o impasse. Por um lado, porque não se vislumbra que o PR possa aceitar um governo sem apoio maioritário no Parlamento (embora de Cavaco já se possa esperar tudo); por outro lado, porque, a avaliar pelos mais recentes indícios, o PS não terá com quem negociar um acordo pós-eleitoral que garanta uma maioria parlamentar estável, uma vez que PSD e CDS já recusaram o "tango". Quanto ao BE e ao PCP, julgo que a hipótese nem se coloca: como juntar num mesmo projecto quem apoiou o resgate e quem é contra ele?

Temos, assim, que uma saída para ultrapassar o impasse pode passar por chamar o segundo partido mais votado - o PSD, no caso - a formar governo com o CDS. Ficando toda a esquerda na oposição. Será difícil governar assim. E será difícil conseguir uma estabilidade duradoura. E será de antever uma enorme instabilidade social, quando as medidas da troika se abaterem sobre os portugueses. Ou me engano muito, ou estarão criadas as condições para a ingovernabilidade. E tudo voltará à estaca zero.

Portugal depois da troika

José Carlos Pereira, 09.05.11

A última semana ficou marcada pelos desenvolvimentos relacionados com o acordo celebrado entre o Governo português e a troika FMI/UE/BCE. Sócrates dirigiu-se ao país para “tranquilizar” os portugueses, uma vez que não se confirmavam as medidas mais gravosas que a comunicação social e alguns partidos da oposição foram propagandeando. Teixeira dos Santos esteve ao lado de Sócrates e enunciou as principais medidas do acordo e, para desilusão de uns tantos, não criticou o primeiro-ministro, nem deu ares de grande incomodidade. A troika desdobrou-se em contactos com a comunicação social e deu os seus trabalhos por encerrados, nesta fase. Cavaco falou aos portugueses para dizer o óbvio.

E o país real, como recebeu o acordo com as instâncias internacionais? À boa maneira portuguesa, as pessoas mostram-se preocupadas com o que aí vem, mais à frente, mas para já congratulam-se com o facto de não haver cortes imediatos nos salários, nos subsídios e nas pensões mais baixas e de não haver um plano de despedimentos forçados na função pública, por exemplo. Tenham ou não estado no pensamento dos membros da troika, a verdade é que, por força de tanta insistência nessas medidas por parte dos profetas da desgraça, o facto de não constarem do plano de acção foi bem recebido pelas populações.

Todavia, é bom não esquecer que vêm aí tempos difíceis. Não há “almoços grátis”, como sabemos, e temos de provar aos parceiros europeus que viabilizam o acordo que somos um país governado por gente de palavra e cumpridora das suas obrigações. No fundo, a troika veio impor um conjunto de medidas sobre as quais já muito se reflectira, mas que nunca tiveram uma cabal aplicação. Na saúde, na justiça, nas forças armadas, na tributação sobre o imobiliário, na redução dos custos do Estado e do sector empresarial do Estado, na reforma da legislação laboral, na reorganização administrativa do país, nunca faltaram diagnósticos e soluções. O que sempre faltou foi a capacidade de vencer os lobbies e de levar à prática as políticas na sua globalidade. Umas vezes por falta de uma maioria parlamentar, outras vezes por falta de condições económicas e sociais.

É certo que vão aumentar os impostos, que alguns subsídios e indemnizações vão diminuir, que vai ser preciso privatizar empresas públicas, que os preços de alguns serviços públicos vão aumentar, que os salários vão estagnar nos próximos anos e que a liquidez dos portugueses vai diminuir, sobretudo a partir de 2012. Mas nem tudo foi mau e o alargamento para 2013 da meta do cumprimento do défice, por pressão do FMI, ao que parece, permitiu suavizar algumas medidas.

Este acordo é muito mais abrangente e estruturante do que o PEC IV rejeitado pelo Parlamento, pelo que não faz muito sentido compará-los. O PEC IV foi delineado tendo como objectivo responder às exigências dos mecanismos europeus então em vigor, à espera da introdução das novas regras de financiamento intracomunitário. O acordo da troika foi muito mais longe e debruçou-se sobre a própria organização dos diversos sectores do Estado (a propósito da diminuição de municípios e freguesias recordo o artigo que publiquei em Junho de 2010 no “Repórter do Marão”).

Estes dias de grande efervescência terminaram com a apresentação do programa do PSD, guardado no forno à espera do plano da troika. Afinal, os sociais-democratas, apertados pelas incómodas sondagens que estão longe de garantir a vitória anunciada, querem ir ainda mais longe que a troika, querem ser mais “radicais”, segundo o omnisciente Catroga. No que dizem e no que escondem. Novos impostos para compensar a perda de 1,5 mil milhões de euros com a redução da taxa social única, mais privatizações no sector público, maior precariedade no mercado laboral, medidas dissimuladas na saúde e na educação, com as portas escancaradas aos privados. Ainda assim, é mais aquilo que se antevê do que o que fica explicitado nessas linhas programáticas.

Por outro lado, quando as instâncias internacionais e os principais responsáveis políticos apelam à capacidade de união dos principais partidos, de modo a implementar as medidas que viabilizem o empréstimo de 78 mil milhões de euros, Passos Coelho proclama unilateralmente que, no caso de vencer as eleições sem maioria, não quer ter o PS como parceiro de Governo. Melhor indicador da vontade em cooperar não podia haver…

o leitor (im)penitente 64

d'oliveira, 09.05.11

 

 

Os leitores que gostam de poesia não podem perder isto! 

 

Em 1989, ofereci a mim próprio como prenda de anos a belíssima edição de "Il canzoniere" (toda a obra poética de Saba) da Einaudi. A coisa ficou-me na "Leitura" do grande Fernando Fernandes por 9.900$00 que foram pagos em duas prestações que aquilo era dinheiro, muito dinheiro. Suponho que esta edição era a 5ª e definitiva e o meu exemplar (capa dura, caixa de protecção e mais de seiscentas páginas) tinha o nº 000608.

Acho que parte ( oresto devo-o ao cinema que já não vemos) do meu atrevido e mal mascavado italiano se deve às constantes releituras que nestes 22 felizes anos fui fazendo.

Fiquem com este poema datado de Trieste, 24 de Julho de 1948:  

In questo libro tredici poesie,

che il nome hanno dalll'ultima,

sono, me vivo, mie.

Poi lo avró scritte come l'altro invano,

per gli uccelli e un amico, al tempo triste,

nel mio triste italiano. 

Nem me atrevo a traduzir grosseiramente porque sei  que com um ligeiro esforço todos vós, leitores, a sentirão como vossa. 

Não deixem fugir este livro ainda por cima bilingue! 

Estados reféns dos bancos

sociodialetica, 09.05.11

Tivemos oportunidade de chamar a atenção para a tendência registada em muitos países, entre os quais se inclui Portugal, para o Estado-nação (Estado associado à realização de um projecto colectivo) se transformar num Estado-mercado (Estado sem projecto, respondendo às solicitações do sacrossanto mercado)1.

Um artigo publicado no Le Monde Diplomatique – edição portuguesa, Maio 2011 (“Quatro anos depois…”) chama a atenção para a importância assumida pela dívida pública no processo político anteriormente referido. Dívida pública que ameaça a democracia pelo seu montante, pela grandeza dos juros a pagar, pelo pagamento da dívida através de nova dívida e pelos canais utilizados para a sua obtenção. Dívida pública que é financiada, em última instância, mesmo quando tem a intermediação das instituições europeias ou do FMI, pelo sistema bancário, que foi o pólo dinamizador da crise e que ficou intoxicado por “lixo financeiro”.

A dívida faz com que o Estado esteja capturado pelo sistema bancário. Alguns factos demonstrativos:

  • “no ano a seguir à crise do subprime os governos (…) [atribuíram] mais dinheiro para apoiar os bancos e as instituições financeiras do que o mundo gastou, em meio século, para ajudar os países pobres!”
  • “No fim da década de 1980, a seguir à falência fraudulenta das caixas de poupança americanas, foram levados aos tribunais 800 banqueiros.” Nesta crise “os bancos Goldman Sachs, Morgan Stanley e JP Morgan apostaram no colapso dos investimentos de risco que se apressavam a recomendar aos clientes ... [e] o pior que os espera são multas, mas na maioria dos casos serão bónus”. Mais, “os próximos candidatos à Casa Branca, a começar por Barack Obama, estão já a mendigar as contribuições do Goldman Sachs para a sua campanha”.
  • “o director do BNP Paribas não hesita em ameaçar os governos europeus com a crise do crédito no caso de estes regularem seriamente os bancos”.
  • “a agência de notação Standard & Poor, apesar de ter atribuído a melhor nota (AAA) à Enron, ao Lehman Brothers, ao Bear Sterns e a todo o tipo de obrigações especulativas (junk bonds) , projecta retirar a classificação à potência norte-americana se esta não reduzir mais depressa as despesas públicas”.
  • “As praças financeiras internacionais, os offshores, continuam imunes a qualquer modificação do seu modo de financiamento”.

Esta situação não deixa de provocar tensões que se traduzem nas vertentes económica e política:

  1. Falta de confiança no sector bancário, aspecto muito importante do funcionamento da economia
  2. Desconfiança em relação às formas actuais de funcionamento da democracia e abstenção eleitoral.

 

NOTAS:

1. Ver “Da Democracia-nação à Democracia-mercado”, 1 de Abril de 2011

a varapau 16

mcr, 03.05.11

Já que o ridículo não mata...

O dr Pedro Lomba entendeu fazer uma pequena biografia de Osama Bin Laden para depois desenvolver um texto com o sugestivo título (não entre aspas) “Não passarão”, slogan, como se sabe da autoria da famosa Pasionaria, estrela maior da Espanha Republicana.

Todavia, diz que o homem tinha 54 filhos e um número incalculável e não canónico de mulheres. Azar dele. Os cinquenta e quatro infantes foram gerados pelo pai, nas quatro esposas legítimas e nas inumeráveis escravas que o cavalheiro foi filhando.

Nada disto seria importante se não constituísse a primeira parte de um texto que demolia o terrorista. Dá o flanco, quando nestas coisas convém ter o maior dos cuidados na documentação para não se correr o risco de, ao ser desmentido em pormenores de pouco peso, se perca a razão no essencial. Aconselha-se ao jovem cronista mais reflexão e menos conhecimento avulso colhido em fontes duvidosas.

 

O Partido Comunista português entendeu dizer que condena o terrorismo. Muito bem! E, na passada, avisa o Presodente dos EUA (que deve estar raladíssimo!...) que “sob o pretexto de combate ao terrorismo não se devem ocupar países”. Muito bem, ou não tanto: afinal o mesmíssimo PCP que, agora, se preocupa tanto com o Afeganistão, bateu palmas e palminhas entusiásticas á invasão do Afeganistão pelas tropas da falecida União Soviética. Na altura, se bem recordo, essa invasão não o era. Tratava-se apenas de uma pequena ajuda ao legítimo governo do invadido país que, por mero acaso, resultava de um golpe de estado sangrento levado a cabo por uma das duas facções em que se dividia o pequeno Partido Comunista do Afeganistão.

Os afegãos não perceberam, desataram numa guerra de guerrilhas que obrigou as tropas soviéticas a abandonar o território com pesadas baixas. E, mesmo que não tenha sido a causa principal, essa derrota do exército do pais irmão e fraternamente invasor, também contribuiu para o desaparecimento da URSS.

Às vezes o PCP deve pensar que somos todos parvos ou desmemoriados. Ou as duas coisas... 

 

O porta voz do Hamas chamou guerreiro santo a Bin Laden, Depois admiram-se da falta de solidariedade do Ocidente....

 

As explicações do “”acordo” entre a troika e Portugal foram tudo menos claras. Sócrates deu-nos uma visão idílica do futuro que nos espera. Catroga veio dizer (em bicos de pés!...) que foi o PPD quem tornou possível o idílio. Louçã não disse nada e o PCP, bem o PCP, exagerou. Depois de ouvir estas criaturas, mais a drª do CDS fiquei com a sensação que este último defende os pobres, que o PC entende que conseguiríamos, qual Cuba heróica e faminta dos anos 90, subsistir  sem os prometidos 90 mil milhões que o pais entrou no declive fatal que nos conduzirá (segundo Louçã) ao desaparecimento. Os do centrão acham que tudo está bem e que cumpriram a sua missão histórica.

Como os pormenores do acordo ainda estão no segredo dos deuses vou esperar pela leitura da imprensa internacional para saber o que se passou no meu país.

 

 

 

 

 

 

diário Político 166

mcr, 02.05.11

 

 

Exercício de imaginação?

 

Imaginemos o seguinte texto, absolutamente plausível, se é que não está já a ser redigido e/ou difundido:

Um comando de choque ao serviço do capitalismo selvagem, do imperialismo yankee e dos mais sórdidos interesses monopolistas assassinou friamente Osama bin Laden, guerrilheiro muçulmano, ao serviço da Ressurreição Árabe e da luta de libertação nacional do Afeganistão.

Os mercenários do capitalismo, confortados pelo seu imenso poder de fogo e pela superioridade tecnológica posta ao seu serviço graças aos milhões de dólares que o imperialismo retira aos pobres para reforçar a sua defesa, impuseram-se ao reduzido grupo de combatentes que defendia o seu carismático líder. Para evitar os embaraços decorrentes de um julgamento público em que a defesa poderia pôr a nu a mesquinha teia de interesses e cumplicidades que rodeava o confronto, os comandos americanos tinham ordens expressas para matar o guerrilheiro, para o calar para sempre.

E terminando: nem o cadáver foi devolvido à família para poder ter na morte a tranquilidade que lhe regatearam em vida. Supõe-se que o corpo foi atirado ao mar para evitar as evidentes manifestações de simpatia e respeito que a luta de David contra Golias suscitava entre as massas exploradas e oprimidas do terceiro mundo.

 

Admiram-se? Não acreditam? Pois basta recuar um punhado de anos para ler prosas ainda mais espantosas do que esta. A glorificação dos terroristas, recheada de brocardos piedosos (diz-se violento do rio que tudo arrasa à sua passagem mas ninguém fala das margens que o oprimem –sicut Brecht) e a manifestação de acusações ao sistema monstruoso centrado na plutocracia ocidental foram moeda corrente.

O terror foi uma arma de muitos movimentos revolucionários e por isso exaltado. Quando, por sua vez, a “reacção” o usava, eis que se erguiam vozes autorizadas a denunciá-lo. Todas as polícias do mundo o usaram em maior ou menor grau, com mais ou menos sofisticação, desde as razzias da Okrana, da Gestapo ou da Tcheka – sob as suas múltiplas formas – até aos safanões dados a tempo pela eficaz PIDE.

Muitos (ou pelo menos os suficientes) movimentos revolucionários entenderam dever defender-se à custa de repressão cega e ilimitada arguindo da falta de tempo e da impossibilidade prática de identificar calmamente os “inimigos do povo”.

A morte de Bin Laden era esperada há muito. A América não costuma esquecer-se dos seus inimigos e o assassínio colectivo das Torres Gémeas a que devem somar-se as centenas de mortes dos passageiros dos aviões usados como bombas pesavam dramaticamente no imaginário americano. A escalada da Al Qaeda no Afeganistão, no Médio Oriente e até em território europeu (o 11 M de Madrid) mantiveram acesa a colaboração de serviços de inteligência de meio mundo pelo que a questão era apenas uma: quando é que os americanos encontravam o terrorista?

Não deixa de ser irónico saber-se que Bin Laden se hospedava numa mansão enorme, bem protegida a escassas dezenas de quilómetros de Islamabad, capital do Paquistão. Os guerrilheiros, os homens de acção perdidos pelas montanhas, no djebel magrbino, nas ruelas esconsas de meia dúzia de cidades do Médio Oriente esses não tinham tal protecção. Mulheres e crianças engordados com detonadores e explosivo faziam-se matar em miseráveis soukhs árabes e Bin Laden atrás de muros altos de cinco metros, numa “mansão” que decerto veremos dentro em pouco, a idealizar a sua particular guerra santa...

Laden é morto! Felizmente! Com a sua morte, talvez a ideia heróica do terror cego se dilua um pouco. Haverá protestos, claro. Explosões de raiva, não se duvide. Mas a ideia da intangibilidade dos criminosos, estejam eles no interior da floresta ou num palácio, fica mais enfraquecida.

A actual “revolução” árabe que dia a dia vai colhendo apoios e vendo multiplicarem-se as vítimas inocentes devido à repressão dos regimes no poder (Síria, Líbia, Yémen, Bahrein...) está livre desta funesta companhia que era a Al Qaeda, usada como argumento por sírios e líbios. A sua visibilidade pode vir a ser outra e quer os opressores locais quer os inimigos externos (a quem a existência da Al Qaeda servia também de álibi, e penso em Israel, mas não só) perdem um argumento que mesmo sendo falso era suficientemente atraente, pese a sua ambiguidade, para as simpatias e alguma solidariedade de alguns intelectuais ocidentais que, à míngua de aventura e de risco pessoal nas suas insossas vidas (e temos por cá muitos!...) se imaginam robespierres de salão ou estalines de secretaria (não se esquecem nesta rubrica os hitlerzinhos bigodudos e os mussolinis de pata no ar mas esses são unanimente – e bem! – considerados meros gangsters). Vamos ver, dentro em breve, algumas criaturas destas a carpir como crocodilos a falta de fair play dos americanos. Deixem-nos falar sozinhos.

O dia de hoje é de festa! E de justiça! E de mais possibilidades de liberdade!

 

Em tempo: a Direita americana, o Tea Party, as minorias ultra-religiosas, os adeptos da teoria da supremacia branca e outras abominações devem estar de monco caído. Foi Obama, o negro, e não Bush o atleta que se escapou da guerra, quem conseguiu esta vitória.

 

d’Oliveira fecit 2.Maio.2011