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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Dizer a verdade… a mentir

JSC, 30.06.11

 

"Eu já ouvi o primeiro-ministro dizer, infelizmente, que o PSD quer acabar com muitas coisas e também com o 13.º mês, mas nós nunca falámos disso e isso é um disparate", disse Pedro Passos Coelho

DN, 1 de Abril de 2011 (por acaso o dia das mentiras…)

 

As palavras, essa chatice

JSC, 30.06.11

Uma segunda impressão sobre o novo Governo

José Carlos Pereira, 29.06.11

Entregue o programa do XIX Governo para discussão na Assembleia da República e empossados os secretários de Estado, impõe-se uma nova apreciação ao executivo de Passos Coelho.

Relativamente à sua composição, começa a ser unânime a ideia de que o número reduzido de ministros, ainda assim superior ao prometido na campanha eleitoral, cria verdadeiros super-ministérios, como sucede na Economia e Emprego e na Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território, que exigirão um esforço gigantesco. Os jovens ministros dessas pastas, além da coordenação de várias secretarias de Estado, têm a tutela de dezenas de organismos públicos e pertencem a vários Conselhos de Ministros na UE. Entre reuniões, despachos e audiências, vai sobrar pouco tempo para o país real. Esta junção de pastas terá ainda o inconveniente de obrigar à rearrumação de vários ministérios num momento tão crítico como o actual.

Passos Coelho terá reparado tardiamente no seu mapa de encargos e o número de secretários de Estado acabou por aumentar significativamente face ao anunciado. De 25 passaram a 35. Além de incluir vários novos nomes sem actividade política relevante, provenientes sobretudo do mundo académico, o executivo conta com personalidades dos dois partidos da coligação.

Entre as surpresas está o nome de Marco António Costa. O que se terá passado para este vice-presidente do PSD aparecer inopinadamente a secretário de Estado? Num dia lidera a representação do PSD que analisa com o ministro Paulo Portas o Conselho Europeu de 23 de Junho e no dia a seguir é indicado para secretário de Estado de Mota Soares? É governante a prazo para regressar já em 2013 à Câmara de Gaia ou Luís Filipe Menezes arranjou forma de se ver livre do seu número dois, como já sucedera aos seus anteriores vices? Não sei qual seria o pior cenário. De todo o modo, este é um mistério para esclarecer a breve prazo, para o que também contribuirão as eleições do próximo mês na Distrital do Porto e na Concelhia de Gaia do PSD.

Já o caso do ex-futuro-secretário de Estado Bernardo Bairrão ficará para a história entre os episódios caricatos que (quase) sempre envolvem a formação dos governos. Como referi no Facebook, logo no dia em que se tornou conhecida a sua indigitação, além de surpreender a nomeação para a pasta da Administração Interna de uma personalidade sem experiência política e há muitos anos no sector da comunicação social, importava perceber essa indigitação à luz do anunciado processo de privatização da RTP. Terá de ficar para mais tarde…

O programa do XIX Governo procura responder às exigências da troika, por um lado, mas vai ainda mais longe na abertura de vários sectores estratégicos à iniciativa privada, como já se antecipava. Para além da privatização de várias empresas públicas, já prevista no compromisso com a troika, é reforçado o papel dos privados em áreas como a saúde e a segurança social, medidas que podem acentuar as assimetrias entre os portugueses com maiores e menores recursos. Talvez por isso se note no programa um certo pendor assistencialista, que já não se coaduna com os tempos de hoje. Há que estar atento às medidas concretas que hão-de vir, pois para já não conhecemos mais do que princípios gerais. Mas quem votou no PSD não pode estranhar esta situação...

O que é certo é que os portugueses vão pagar mais impostos e que o rendimento disponível vai diminuir. Todos vão ter de se reajustar a estes novos tempos e passar a viver com essa realidade bem presente. Esperemos que o novo Governo saiba encontrar o equilíbrio que permita a distribuição justa dos sacrifícios que vão ser pedidos e, ao mesmo tempo, preparar o país para a recuperação que se exige. A bem da Nação!

Como as coisas mudaram…

O meu olhar, 28.06.11

Não há dúvida que hoje está tudo bem mais calmo, mais positivo. De manhã Mira Amaral explicava ao jornalista da Antena 1 que o Governo deve procurar fazer bem o que se propõe fazer, mas que não será pela sua acção que vamos sair da crise, está tudo dependente do que as autoridades comunitárias decidirem, dizia Mira Amaral. Desde quando é que o Governo não pode resolver a crise? Mira Amaral descobriu esta verdade nas últimas duas semanas? Tanto quanto me lembro há dois meses atrás tudo era da responsabilidade do Governo e tudo dependia das suas decisões.

 

Os jornalistas aceitam estas explicações e até as complementam numa acção de entreajuda. Veja-se o caso da subida das taxas de juro. Quando as taxas andavam pelos 6%, 7%, davam lugar a grandes manchetes e abriam telejornais. Quando se aproximaram dos 8% apareceram os banqueiros e longos debates nas televisões. Agora que as taxas escalam os 12%, 13% aparecem como nota de rodapé nos noticiários e sempre com a causa atrás: “a situação na Grécia”. Então, a renovada confiança nos novos governantes não produziu efeito algum? Não se dizia que os mercados precisavam de ganhar nova confiança e que isso passava pela mudança dos protagonistas? A comunicação social perdeu tão rapidamente a memória?

 

O caso do dia é o da eliminação de Bernardo Bairrão da lista de Secretários de Estado. O homem foi convidado, aceitou e demitiu-se do cargo de administrador da TVI. No dia seguinte o Primeiro Ministro corre com ele e desnomeia-o antes de tomar posse. A tudo isto a comunicação social limita-se a dar a notícia, sem levantar grandes ondas ou questões. E tudo poderia estar certo se o convite a Bernardo Bairrão tivesse partido do primeiro ministro. Acontece, porém, que foi um Ministro que convidou Bernardo Bairrão e foi o mesmo Ministro que o Primeiro Ministro desautorizou na praça pública ao rejeitar o nome que anteriormente aceitara. Se este filme tivesse ocorrido há dois meses atrás a comunicação social não estaria a exigir a demissão do Ministro?

 

Estão a imaginar o barulho que por aí iria se tudo isto se tivesse passado com Sócrates?

 

As coisas mudaram de facto, o país está melhor, mais calmo, apenas lhe faltam os jornalistas de outrora.

 

Um Engenheiro para lidar com as coisas da Justiça

JSC, 28.06.11

Fernando Santo, engenheiro, vai tomar posse como Secretário de Estado Administração Patrimonial e Equipamentos do Ministério da Justiça. A  nomeação de um engenheiro para lidar com coisas da justiça, mesmo que se trate da administração de bens móveis e imóveis, provocou logo a reacção imediata na corporação judiciária, a mostrar que estão atentos às coisas importantes da governação com impacto nos alicerces do edifício judicial.

 

O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público não vislumbra "qualquer problema" em ser um engenheiro a tratar da Administração Patrimonial e Equipamentos do Ministério da Justiça, porque "não necessita de ser um jurista".

 

Por sua vez, o presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais mostra surpresa com a escolha do ex-bastonário da Ordem dos Engenheiros, Fernando Santo, até porque, disse, "nunca ouvi falar dele na área da Justiça”. Ainda não é conhecida a posição da Associação Sindical dos Juízes Portugueses.

 

Interessante é que os protagonistas destas notícias tenham centrado a sua atenção na licenciatura do futuro Secretário de Estado e não tenham cuidado saber do que o mesmo pensará acerca da administração do património adstrito aos Tribunais nem tenham deixado qualquer mensagem para o novel Secretário de Estado. Pelo menos poderiam ter deixado esta questão: Qual a volta que vai dar às PPP que nos últimos anos tomaram conta do património imóvel da justiça? Como sair do buraco financeiro criado com o Campus de Justiça de Lisboa, que absorve mais de 10 milhões de euros em rendas e condomínio que os anteriores edifícios?

Notícias recentes de um mundo estranho

JSC, 27.06.11

Uma fotografia rara de “Billy the Kid” foi leiloada por 2,3 milhões de dólares (1,6 milhões de euros) nos Estados Unidos.

 

O vestido cor de marfim, esvoaçante, que Marilyn Monroe usou no filme “O pecado mora ao lado”, de 1955. Foi leiloado neste sábado e quem ficou com ele pagou 5,6 milhões de dólares (cerca de 3,9 milhões de euros).

 

Um casaco que o cantor norte-americano Michael Jackson usou no teledisco 'Thriller', em 1983, foi leiloado no domingo em Beverlly Hills, Califórnia, por 1,2 milhões de euros, foi esta segunda-feira anunciado.

 

O Programa Alimentar Mundial (PAM) da ONU anunciou hoje que vai cortar a assistência alimentar a mais de três milhões de afegãos em cerca de metade das 34 províncias do país por falta de fundos.

Au Bonheur des Dames 281

d'oliveira, 24.06.11

 Os amigos do povo

 

 

 

Eu tenho um belo grupo de amigos, desses que deram provas (e que provas!) de honra, lealdade, liberdade, sacrifício. É a sina de ser velho ou, pelo menos, antigo, pois parece que a palavra velho agora é um palavrão. Velho, cego, preto, coxo e outras são insultos na nov-língua do politiquês correcto e pronto a usar e deitar fora.

 

Todavia, eu insisto no velho porque seguramente não sou novo, não vou para novo e não quereria ser novo, hoje.

 

Este grupo de amigos (ou grupos pois são vários e os seus elementos desconhecem-se, pelo menos pessoalmente) anda tristonho. Não pelos achaques da idade, pois todos juram ou presumem de uma saúde de ferro, de um vigor incomum, de uma vontade de viver inabalável. Mas pela política.

 

Gente que bebeu a esquerda mais depressa do que a ciência infusa que as faculdades davam em dose indigesta e cavalar no dealbar dos anos sessenta anda assarapantada e desnorteada.

 

Então como é que nos caiu em cima este cataclismo? Que mal fizemos a Deus, ao Progresso, à causa da Humanidade, aos “amanhãs que cantam” ou à razão da História?

 

 Um cristão (é um modo de dizer, mesmo se, na época, a rapaziada solta da família que chegava à universidade ainda vinha carregada de religião) chegava à Porta Férrea e, zás!, aparecia-lhe a política de roldão. Os tempos eram duros, a Universidade agitava-se, Salazar via a Índia fugir-lhe, como lhe fugiam os presos de Peniche e de Caxias, havia raparigas que iam aos cafés, os primeiros turistas entravam pelas praias dentro com notícias da liberdade e pouca roupa.

 

Esta geração de que falo, e onde se recrutam muitos, uma grande maioria, dos meus amigos, mergulhou nessa arriscada e prazenteira vida da recusa aos valores vigentes. Pagaram caro a audácia mas, quase todos, tiveram tempo de assistir à queda do Estado Novo.

 

Viveram os anos setenta e oitenta com paixão e desprendimento material. Queriam ajudar a mudar o país. Depois, descobriram à sua custa que o país mudava pouco, era lerdo e que a espuma revolucionária que adornou ruas, praças, organizações e paredes, disfarçava um velho conservadorismo e uma desconfiança atávica pela liberdade.

 

E que as classes recém chegadas à democracia tratavam por vezes primeiro dos seus interesses imediatos e só depois da comunidade.

 

De tropeção em tropeção, aqui chegámos. Ao pavor de “um governo, uma maioria e um presidente” conotados com a Direita.

 

Eu, mais cândido ou menos inocente, entrado nestas lides mais pela literatura do que pela situação material, desde sempre pouco dado a entusiasmos, achei que, mesmo não gostando, não tinha outro remédio senão aguentar com esta impingem maçadora que me caiu em cima. Provavelmente, valeram-me os tempos (não excessivos mas reais) que penei em celas pouco confortáveis a expensas do Estado do dr. Salazar. Quando se está só e não temos mais do que fazer do que pensar, habituamo-nos a encarar a vida e as suas vicissitudes menos interessantes com algum sangue frio e muita paciência. E uma esperança sólida em melhores dias. E uma pertinaz ideia de que temos de continuar devagar mas com firmeza o velho caminho, reparando as asneiras, pensando as coisas, deitando fora os narizes de cera, os ouropeis e as fantasias, analisando a realidade e os novos tempos, adequando a estratégia e melhorando a táctica que se mostrou frágil ou errada. 

 

“O pau vai e vem” foi a minha divisa nas cadeias para onde me mandaram. Não me surpreendeu, pois, o facto de, tendo já vivido sob maiorias onde Presidente, Parlamento e Governo eram de Esquerda, ser natural que a roda desandasse, sobretudo tendo em linha de conta o desvario destes últimos anos.

 

Os meus amigos sabem isso, compreendem isso, mas não aceitam. Não aceitam de modo algum. E vai daí, deixam cair uma que outra pérola que só o mau perder explica, mesmo que não justifique.

 

Eu bem me esforço por lhes dizer que houve uma eleição, democrática, séria, precedida de um bom mês de avisos, profecias cavernosas, discussões em tudo o que é sítio. Que foi o povo quem escolheu. Que houve uma esmagadora maioria a favor dos partidos que assinaram o memorando da troika. Respondem-me com as abstenções! Como se o facto de uma expressiva quantidade de criaturas se estar total e irremediavelmente nas tintas, retirasse um milímetro de legitimidade ao resultado dos votos de todos os que (e os únicos) se consideram cidadãos!

 

Há mesmo (não entre nós, quand même!) quem diga que foram os “ricos” que votaram! Caramba, tanto rico!

 

Ou que os votantes são uns palermas e votaram o que os bancos lhes mandaram!

 

Hoje, um dizia-me que esta maioria é a mesma dos que gostam de futebol, de fado e de Fátima. E de telenovelas, de iscas de fígado e francezinhas à moda do Porto, retorqui.

 

Claro que o Povo, essa entidade mítica de que todos se servem desservindo-o as mais das vezes, vota mal. Não pensa! Não vê que, tendo a faca e o queijo na mão, corta a mão!

 

O melhor é mandar este Povo ingrato para as Berlengas e importar um melhor, inteiramente novo, nosso, bem pensante e bem votante.

 

Ou acabar com esta chatice da democracia. Para votos mal pensados mais vale haver direito de voto só para intelectuais. Ou ricos. Ou gordos. Ou altos, loiros e de olhos azuis, arianos, numa palavra.

 

O voto representa uma vontade obscena de mandar, de mudar as regras, os hábitos ou as atitudes.

 

Se as pessoas soubessem quanto custa mandar, de certeza que prefeririam obedecer sempre (Salazar).

 

Então, malta?

 

 

 

  

 

 

 

Estes dias que passam 236

d'oliveira, 23.06.11

 

Nem calças nem calções 

 

 

 

Em tempos que já lá vão, nas classes mais abonadas,  a difícil passagem da infância para a adolescência tinha sinais curiosos. Um deles era este: os meninos em chegando a rapazes, digamos aí pelos oito, dez anos, abandonavam os calções curtos e passavam a usar umas calças que acabavam a meio tornozelo num franzido provocado por elásticos que lhes deixavam à mostra as meias. Eram as “calças à golf”.

 

Não faço ideia alguma se os jogadores de golfistas as usam mas, para os parcos leitores que se interessam recomendo-lhes uma pesquisa nos álbuns do Tintin. Este agora duvidoso herói da “bd” usa esse género de calças.

 

Mas por que é que isto vem à baila?

 

Pois por esta curiosa história da polémica Louça- Rui Tavares.

 

Este último, historiador e comentador de última página no “Público”, foi convidado pelo Bloco de Esquerda para integrar a lista do partido para o Parlamento Europeu. A escolha justificava-se: um independente, com uma obra histórica já interessante, um comentador com boa audiência e claramente um homem de Esquerda.

 

Não terá sido ele o responsável pela belíssima votação do Bloco (três eleitos) mas seguramente deu uma bela ajuda. E, depois da eleição, tem sido um comentador interessante, não deixando de manter alguma imparcialidade no que vai escrevendo quando, de algum modo, o tema cai na esfera do Bloco, dos interesses e causas do Bloco.

 

Tavares, terá até mostrado um brando distanciamento da ideia peregrina de não falar com a troika. Mas, mesmo isso, pouco significado tem, na medida em que até Louça veio (sem dúvida acossado pela violenta derrota eleitoral) afirmar que “talvez” tivesse valido a pena falar com os emissários sinistros do capital.

 

Como toda a gente sabe, o BE tem sido alvo de críticas fortíssimas vindas da nebulosa de eleitores independentes que nele viam uma alternativa aos dois tradicionais partidos da Esquerda. Mesmo sem fazer parte desses eleitores (ainda que justamente tenha por uma única e irrepetível vez, votado BE para o Parlamento Europeu (coisa de que, aliás, me não arrependo porquanto estes três deputados têm realizado um excelente trabalho), também eu entendo que, a continuar assim, o BE corre direito para a banalidade e para a irrelevância.

 

Todavia, não é para falar da triste situação do BE e das desgraças futuras que lhe prevejo que estou aqui a escrever.

 

De facto, Louçã, indubitavelmente a primeira figura deste curioso ajuntamento, resolveu ofender-se imenso com uma historieta sem qualquer importância. Ao que parece, alguém terá escrito que nos fundadores da agremiação figuravam Louçã, pelos trotskistas, Fazenda, pelos maoístas da UDP, Portas pelos ex-pc, qualquer coisa XXI, e Daniel Oliveira pelos independentes. Ó blasfémia, ó coisa tremenda e horrível! Logo Oliveira, agora tão critico da direcção do BE. Oliveira em vez de Fernando Rosas, outro historiador, com percurso PC e MRPP!!!

 

Louçã, naquela prosa vagamente jesuítica que é timbre da seita, muito se maravilha com esse infundado boato e deixou escrito no Facebook que tal aleivosia viria de Rui Tavares porquanto as duas fontes que propalavam a tese maldita teriam tido contactos com Tavares. Que “teria querido falsificar a história” (coisa que, como é sabido, ocorreu muito contra Trotsky (mesmo se, também, no campo dos seguidores deste estimável e sacrificado revolucionário, tenha havido forte adoçamento das arestas mais trágicas da história...)

 

Tavares, ao ler a acusação de Louçã, e sabedor por experiência profissional de como em certo sítios se constroem as verdades partidárias, saiu à liça, desmentindo ser origem ou veículo da notícia que mancha a história gloriosa da fundação do Bloco e exigindo públicas desculpas.

 

Louçã não se desculpa mas “regista” a declaração de Tavares. E nisto, neste “registo” vai um inteiro dicionário de má fé e mau perder.

 

Tavares, ofendido, sai do grupo parlamentar e junta-se aos “verdes” no Parlamento europeu. Os seus dois colegas acham “desproporcionada” esta atitude. Resta saber o que entenderão eles por “proporção” mas isso é outra história.

 

A jovem Marisa vai mesmo ao ponto de referir que talvez fosse mais correcto Tavares entregar o lugar ao Partido mas isso, diz ela “é com a consciência dele, Tavares”.  Marisa já aprendeu mais do que devia para a sua tenra idade.

 

Pela parte que me toca, no lugar de Tavares, não sei bem o que faria. Por um lado, o coração diz-me que devia mandar toda aquela gentinha para um lugar feio mas, por outro, a cabecinha pensadora aconselha a remexer a faca na ferida. Isto é a não dar o lugar e faze-los ficar com água na boca, à espera do dia de S Nunca.

 

Agora, e para finalizar: estão a ver em que é que a privilegiada mente de Louçã se ocupa?

 

O seu partido cai para metade dos deputados e, mais grave, dos eleitores. Lá por dentro a discussão está que ferve. O BE não sabe o que fazer. As condições políticas em que se move são más. A sua oposição ao actual Governo é insignificante. Não tem um aparelho sindical ou autárquico que lhe permita criar frentes autónomas de combate. Corre o sério risco de ver debandar mais eleitores e simpatizantes para os baluartes mais seguros do PC ou do P.S. Em suma, é como se não existisse.

 

Mas o problema fundamental do partido é a lista dos fundadores!

 

Eu sempre tive uma fraca opinião de Louça. No seu melhor ângulo parecia-me um catequista jovem e vagamente prometedor. Noutros ângulos menos lisonjeiros, a criatura é uma espécie de tradução em calão envelhecido do pior que a Quarta Internacional produziu em longos longuíssimos anos de actividade política estéril e palavrosa. A herança de Leon Bronstein é parca mas os seus seguidores nem isso mereceram. São uma seita que se finge partido e um partido que se esfarela em outras, cada vez mais pequenas e inoperantes, seitas.

 

O velho leão da Revolução de 17, o tribuno admirável, o escritor de fôlego e o grande organizador do Exército Vermelho (mas também o carrasco de Kronstadt) não viu a ameaça, não percebeu os movimentos dentro do CC do PCb, depois PCUS, não conseguiu reunir adeptos, motivar uma corrente, e acabou miseravelmente expulso, expatriado e finalmente assassinado por um mercenário da NKVD chamado Ramón Mercader. Com um picador de gelo!

 

Espera-se que, do seu túmulo, ele não possa assistir a esta farsa com que se excitam imenso os seus lusos sequazes. Que, aliás, usam, métodos muito do agrado do seu mortal inimigo, Yossip Vissaronovitch Djugatchivili que, no século, se fazia chamar Stalin, o homem de aço...

 

De todo o modo, a imagem mais forte que me me fica de Louçã é mesmo a do rapazola com calças à golf. É que o homem parece não crescer...

 

*a gravura: poster russo de 1918 ou 1919. Trotsky, representado como S Jorge, patrono de Moscovo 

 

 

 

 

Offshores da falta de liberdade

sociodialetica, 23.06.11

1. Estamos numa época de valorização dos produtos nacionais. Muito bem. Sempre fui adepto dessa opção. Somos cidadãos do mundo, porque somos portugueses. Valorizemos esse ponto de partida se queremos que os nossos filhos e netos continuem a ter razão para continuar a habitar este território.

Houve um período em que o “desenvolvimento” passava por substituir importações. Passou-se a outro em que “desenvolvimento” era substituir exportações. Da sobrevalorização do “nós” passou-se à paixão pelo “outro”; do encerramento altista ao mundo passou-se ao altruísmo para com a globalização e os “senhores do mundo”. Talvez o velho filósofo nos recordasse que “no meio é que está a virtude”, mas o problema é de correlação de forças mundial e de quem ganha e quem perde com cada uma destas opções políticas, que têm sempre suporte num “modelo económico”. Modelo construído, por vezes, com alguma argamassa, outras vezes com castelos de faz de conta.

 

2. Mania de lucubrações. O que pretendo dizer é que valorizo a produção nacional (mesmo com capital estrangeiro), mas não valorizo tudo o que é nosso. Não apadrinho nem defendo o “Centro Internacional de Negócios da Madeira”, o “nosso” offshore caseiro.

Muitas são as razões que me impedem de ter uma paixoneta por tal produto nacional. Vão desde ele pertencer à irmandade de Ali Babá e os quarenta ladrões – embora numa época em que a crise obrigava a falar dos malefícios das praças financeiras internacionais o então ministro Teixeira dos Santos nos tivesse lembrado que o Offshore da Madeira era um caso à parte, diferente – às características geo-socio-políticas do território em que se insere. Mas deixemos essas considerações gerais para nos centrarmos em três factos.

 

Comecemos pelas informações avulsas. Estas não são animadoras: grandes empresas exportadoras com lucros fabulosos que pagam muito menos imposto que pequenas empresas instaladas no tradicional território nacional; as suspeitas do Ministério Público de fraude fiscal e branqueamento de capitais; a sua utilização pelos bancos “portugueses” através de empresas participadas. Sobre estas histórias reproduzamos um extracto do livro Revelações, sobre o qual já fizemos uma nota de leitura, para contar uma história completa:

A história começa em Novembro de 1985 quando a governo da Nigéria adjudica a exploração de gás natural a um grupo de três petrolíferas constituído pela Royal Dutch Shell, a francesa Elf e a italiana Agip que se comprometem a explorar uma unidade de gás natural liquefeito em Bonny Island, uma ilha no delta do rio Níger. Segundo o jornal gaulês, a obra avaliada em 6 mil milhões de dólares envolve um complexo esquema de subornos a altos responsáveis nigerianos que, em contrapartida, garantem a assinatura do contrato com o consórcio internacional TSKJ-Serviços de Engenharia Lda., formado por quatro firmas de engenharia: a francesa Technip, a italiana Snamprogetti, a britânica M.W. Kellogg Ltd (uma subsidiaria da KBR controlada pela gigante americana Halliburton, na época dirigida par Dick Cheney) e a nipónica Japan Gasoline Corp. Em 29 de Agosto de 1994, a joint-venturee é registada no Funchal e, em Novembro do mesmo ano, a Madeira vê nascer a LNG-Serviços e Gestão de Projectos Lda., uma sociedade que adopta as iniciais da unidade de gás de Bonny Island, a Liquefied Natural Gas. De acordo com a investigação jornalística do diário francês Le Figaro, a madeirense LNG é uma empresa-fantasma constituída com o objectivo de canalizar fundos para a Tri-Star Investment Limited sediada em Gibraltar, que por sua vez assegura o pagamento de subornos através de contas bancárias secretas no Mónaco e na Suíça. Após um longo processo de investigações, as empresas norte-americanas Halliburton e Kellogg Brown & Root LLC (KBR) aceitam pagar 579 milhões de dólares, depois de se terem declarado culpadas de práticas de corrupção. Um comunicado do Departamento de Justiça dos EUA refere que "durante 10 anos, as sociedades pagaram luvas a responsáveis do governo nigeriano, a fim de obter contratos de construção e de engenharia".

 

Continuemos. Um estudo recentes de alunos finalistas de uma licenciatura em Economia mostra que os impactos do Centro Internacional de Negócios da Maneira traz mais desvantagens para o desenvolvimento regional do arquipélago que vantagens. Desvantagens que também se expandem para o conjunto do território português. Recordemos uma passagem.

podemos realmente concluir que a despesa [isto é, perda] fiscal considerada pelo Estado com as empresas sediadas na Zona Franca da Madeira são de facto assinaláveis, ultrapassando os mil milhões de euros [ano], na sua grande maioria provocadas pelas perdas de IRC.

 

Terminemos com uma pérola de atentado à liberdade.

Um estudioso destas problemáticas resolveu escrever um livro sobre tão internacional e mediático Centro de Negócios. Investiu, com grande seriedade, largos meses de investigação. Analisou com uma editora a sua publicação, o que foi aceite. Acordou-se num determinado prazo de produção. Começou-se a fazer a composição do livro. A meio do trabalho, conhecedores do texto da obra, mexeram-se influências, tomaram-se decisões ao mais alto nível e decidiram recusar a edição do livro e destruir o trabalho de composição já feito. Leia-se que isto se passa hoje, trinta e sete anos depois do 25 de Abril de 1974.

 

3. Produtos nacionais destes nem para a reciclagem.

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