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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Diário Político 167

mcr, 05.07.11

Este é o mundo em que vivemos

 

 

 

O dr Nobre arreou! Desistiu! Está farto da ingratidão dos portugueses. Está farto de (não) estar no Parlamento num obscuro lugar da bancada pletórica do PPD!

 

Vai continuar a ser útil ao povo, à nação valente e imortal e à Humanidade (sic) naquela cópia fraquinha dos Médicos sem Fronteiras e dos seus émulos Médicos do Mundo.

 

Vai continuar, rodeado de familiares ao comando da sua (e nunca o possessivo foi tão bem empregado!...) AMI onde, nos quadros dirigentes, mais depressa se vê um camelo a entrar numa agulha do que alguém que não lhe esteja ligado por laços familiares.

 

Eu ainda não percebi se a criatura é mesmo um caso de desvairada e incontinente vaidade ou apenas um mero problema de inteligência (ou falta dela).

 

Bem sei que uns caridosos cavalheiros vagamente “socialistas” lhe murmuraram ao ouvido uma canção de embalar tão frouxa que nem um menino da primária nela cairia. Bem sei que essas ocultas ccriaturas apenas queriam fazer o Manuel alegre morder o pó. Depois largavam o triste Nobre (que fora apoiante de Cavaco anos, poucos, antes) na primeira esquina. O que aconteceu.

 

Que Passos, o iluminado, tenha pensado que aqueles votos lhe faziam jeito, não duvido. Passos, a meu ver, não prima pelo discernimento. Que o desatento Nobre não tenha perdido um simples minuto a pensar que estaria a ser novamente utilizado, também já não me surpreende. O homenzinho estava perdido de amores pela ideia que fazia de si próprio sem perceber que o espelho deformante onde se mirava era uma armadilha. Que levasse a sua inocência ao ponto de afirmar que se não fosse eleito Presidente do Parlamento se ia embora só prova que a politica torna louco o mais são.

 

Que depois da derrota, tenha vindo dizer que iria ser deputado “enquanto se sentisse útil” foi outra tolice. Antes tivesse mantido a anterior palavra. Sairia mal mas não como sendeiro. O que agora aconteceu.

 

2 Dominique Strauss Khan meteu-se (ou foi metido) com uma senhora que “ocasionalmente se prostituía”, que num telefonema para o clandestino marido, preso numa cadeia do Arizona por tráfico de droga, dizia que “ o tipo está cheio de dinheiro, não te preocupes que eu sei o que estou a fazer”, mãe de um filho que afinal era de outrem, violada e desviolada por militares inexistentes num brumoso pais africano (etc, etc, cfr “le Monde” últimas edições) está agora a braços com uma queixa de uma evanescente criatura que afirma ter sido alvo de uma tentativa de acosso sexual por parte dele, que, no fundo, se resumiu a um soutien meio arrancado.

 

Passemos aos factos.

 

Em 2003, uma jovem jornalista pede repetidamente a DSK uma entrevista. Este finalmente concede-lha numa sala ou quarto da Assembleia Nacional francesa. Será nesse local, obviamente sem testemunhas que DSK se teria lançado qual leão da Metro sobre a jeune fille en fleur. Sem êxito.

 

E sem consequências! Durante quatro anos nem uma palavra transpirou sobre o nefando caso. Todavia, em 2007 a criatura disse numa entrevidta televisiva que fora alvo de um gesto libidinoso de DSK. Que a credibilidade dela seria parca, atesta-o o fato de a cadeia televisiva ter cortado o nome do autor do ataque e dos media alertados para o facto terem achado que aquilo não passava de uma tentativa de promoção pessoal de uma aspirante a escritora de um medíocre livrinho. 

 

Que só há dois meses, a mesma criatura, moída por atroz sentimento de dor e humilhação, tenha aproveitado a boleia do caso nova-iorquino para, num remake tardio vir de novo à estacada, também eu, também eu, fede a inventona.

 

Que só depois do desenlace deste fim de semana, venha agora já de advogado constituído fazer a competente queixa, cheia a esturro (para não dizer fossa).

 

DSK pode ser flor que não se cheire. Mas era um temido e elogiado directo do FMI. Era, todos o afirmam, e ainda há momentos a TV5 numa mesa redonda o repetia a várias vozes, o mais bem colocado político de esquerda para derrotar Sarkozy.

 

A ideia de uma conspiração parece-me monstruosa e absurda. Mas, como dizem os espanhóis, no creo em brujas pero que las hay, las hay.

 

Não vivemos na idade média mas nos anos dois mil. Que uma mulher jovem, diplomada e independente, se deixe manusear por um politico não me surpreende. Que seja manuseada contra vontade sem dar um grito, sem tentar fugir, sem se queixar logo de seguida, já me custa, e muito, a crer, que deixe o caso durante quatro longos anos no limbo é pasmoso. Que o refira, en passant, num programa de televisão, e depois não aja, começa a pôr-me nervoso. Que, enfim, em cinco ou seis semanas o volte inopinadamente a referir em circunstâncias tão anómalas quando aliás se previa que umas dezenas ou centenas de milhares de dólares calariam a criada do hotel (possuidora, ela mesma de cem mil dólares! As criadas pretas na América estão pela hora da morte!) é algo que me relembra a pior literatura policial que em anos de vício impune e misógino fui lendo. 

 

O mundo em que vivemos é de facto feioso! Arre!

 

 

D’Oliveira aos cinco dias do mês de Julho, festa de Santo António Maria Zacarias, SS Marino e Teodoto e de santo Agatão, conforme o calendário zaragozano.

 

Para os devotos patafísicos festeja-se hoje, 5 de Gidouille, S. Speculum confessor (os leitores que se juntam no “ninho da Águia” ainda não deram provas suficientes para poderem entrar nesta ordem, encore un effort!...) 

 

*a gravura: fabulosa fotografia de Gonçalo Lemos! 

 

Leituras (3)

sociodialetica, 03.07.11

 

Fonseca-Statter, Guilherme da. 2011. O Preço das Coisas. Conversas à volta de um café... Lisboa: Página a Página. 287 pag.

 

1. Estamos perante um livro de Economia.

A sua temática pode criar, desde logo, uma desconfiança pois é afirmação frequente “se há dois economistas há duas opiniões”. Comecemos por falar um pouco sobre este assunto, interrogando-nos sobre o seu significado.

Em todas as ciências existem diversos paradigmas alternativos, diferentes maneiras de pensar cientificamente os problemas, sobretudo quando estes são novos, ainda mal estudados. Se se fala mais das divergências entre economistas é, em primeiro lugar, porque os meios comunicação − aquela instituição que molda a nossa maneira de ver o mundo e de nos comportarmos − nos conduzem a isso. Se assistíssemos com intensidade (frequência e interesse) a debates na televisão sobre o big bang e a criação do universo, sobre os buracos negros, sobre a inversão do tempo cosmológico, sobre a  evolução das espécies ou sobre o aparecimento de novos vírus, facilmente constataríamos que a diversidade de opiniões sobre um mesmo assunto manifestar-se-iam de uma forma generalizada.

Temos que reconhecer que nas ciências sociais, incluindo a Economia, pode haver maior diversidade de posições: porque, embora essas ciências sejam maduras, são jovens; porque as interpretações dos factos estão associadas a interesses de grupos. Interesses defendidos como “vendilhões do templo” ou, o que provavelmente é mais frequente, como resultado da “consciência possível” dos diferentes economistas.

Além disso há uma razão fundamental para as diferenças entre economistas: Economia não é o que os economistas fazem, mesmo no exercício da sua profissão.

O economista pode, tradicionalmente, exercer diferentes funções: cientista (contribuir para o progresso do conhecimento), conselheiro (encontrar a melhor solução para quem o contrata), advogado de uma causa (a verdade esfuma-se na procura dos argumentos aceitáveis por terceiros), perito (dissecar um fenómenos em todas as suas vertentes explicativas e operacionais), vulgarizador do saber (partir da verdade científica para passar a informação, mesmo que isso imponha simplificações). Grande parte dos economistas que os “incautos” ouvem nos comentários de ocasião ou são “conselheiros” ou “advogados”.

A estas funções dos economistas ainda se podem associar duas outras, fora da utilização da Economia, mas socialmente relevantes: apaziguadores de consciências, guardiões do poder. Servem para dizer às pessoas que “não se preocupem porque tudo vai ser resolvido”, para repetir que “a decisão do Estado era a única alternativa” e, ainda, para tentar explicar como aumentar o desemprego cria emprego, diminuir a produção aumenta as exportações e outros absurdos lógicos.

O que é que tudo isto tem a ver com o livro acima referenciado?

O autor rejeita espontaneamente diversas destas funções, centrando-se na do professor (transmissor de conhecimentos económicos) sempre apegado ao do cientista (procura da verdade, assumindo que é a teoria que deve reflectir a realidade e não é o contrário – o que frequentemente é feito por economistas “engenheiros” e políticos”.

Aliás a forma como este livro nasceu reflecte o que aqui dizemos. Autodidacta com uma longa experiência da vida resolveu frequentar um doutoramento sobre a complexidade, para aprender, mas também para encontrar colegas doutras formações científicas que pudessem estar interessados em trabalhar em conjunto na modelização do sistema económico contemporâneo. Para conseguir o que pretendia teve não só que frequentar o doutoramento como conversar com os colegas de outras disciplinas sobre “as coisas económicas”. Este livro resulta, como o nome indica, dessas conversas à volta de um café.

 

2. Antes ainda de falar mais directamente do livro teçamos algumas considerações em torno de um filósofo: Gaston Bachelard.

É um autor essencial para o “saber fazer ciência” e separar o que é ciência e o que é, tão-somente, conhecimento corrente. Um filósofo forjado no estudo da Química que soube articular magistralmente o rigor da ciência com o encanto da poesia e do sonho.

Em alguma parte da sua obra diz alguma coisa como “as primeiras evidências são importantes… para serem deitadas fora”. Por outras palavras, quando nos defrontamos com factos novos e pretendemos descrevê-los ou explicá-los muito provavelmente temos tendência para encontrar um conjunto de explicações, que são lógicas, plausíveis e que estão de acordo com a nossa maneira de ver e estar na vida, o que é psicologicamente reconfortante. Contudo, se nessa primeira leitura encontro evidências é porque utilizei a minha opinião, os meus conhecimentos sobre outras realidades. Se assim é estamos ao nível do conhecimento corrente, ao nível do que já sabíamos, o que é um contra-senso na construção da ciência.

Fazer ciência é descobrir o que é novo, o que está para além do conhecimento corrente. Fazer ciência é não só descrever mas também interpretar. É não só reconhecer as relações mas explicitar a hierarquia dessas relações segundo diversos critérios, é encontrar as relações de causalidade.

Se fazer ciência é descobrir o novo que está para além do conhecimento corrente, do que já é conhecido, não pode haver, no início do processo, evidências. É preciso destruí-las através do “corte epistemológico”, através da descoberta dos instrumentos e metodologias que nos permitam captar o desconhecido, que nos permitam ultrapassar a análise “sensorial” dos fenómenos. É preciso uma análise metafenomenológica. É preciso construir modelos (utilizando a nossa linguagem corrente ou outra) explicativos e interpretativos, testá-los no sistemático processo de concretização e abstracção, de abstracção e concretização, elaborar teorias.

O que é que este livro tem a ver com tudo isto?

Algumas das preocupações de Bachelard estão presentes neste livro. Parte dos fenómenos económicos, dos acontecimentos do dia a dia. A partir desses fenómenos faz uma análise para além da mera descrição, para além do imediatamente visível, remetendo para “outro nível” de análise, para utilizar as palavras do autor. Depois dessa abstracção volta ao concreto, volta ao dia a dia, mas nessa altura os acontecimentos de que partiu deixaram de ser meros factos para passarem a ser partes de um todo explicativo.

 

3. Do que ficou dito é fácil concluir que é um livro que recomendamos vivamente. Recomendamos às pessoas que não sabem nada de Economia e que certamente aprenderão muito com a sua leitura. Recomendamos às pessoas que julgam saber de Economia porque habitualmente ouvem os comentadores na televisão e que precisam de um processo de desintoxicação da intelectual-dependência (ressalvem-se algumas poucas e honrosas excepções de comentadores, normalmente não “oficiais”). Recomenda-se aos estudante de Economia porque muitos deles começam a estudar essa ciência sem saber nada da realidade social e, por isso mesmo, acabam por não saber distinguir a realidade da sua leitura da realidade, filtrada pelos modelos que decoraram. Recomenda-se aos economistas para reflectirem e repensarem.

 

4. De facto, se quer saber porque é que ao comprar o livro paga um certo montante de euros, se pretende compreender porque há tanto desemprego, se intenta esclarecer-se sobre o que é a globalização, se ainda não lhe é inteligível a actual dívida dos Estados, encontrará contributos de explicação neste livro, que deseja apenas conversar, e que dá uma resposta lúcida a muitas das nossas questões quotidianas.

Lucidez que resulta de agarrar os factos e a descrição dos factos pelo que é essencial, enfrentando as dificuldades, expressando uma leitura integrada e coerentes de contributos de diversos economistas e de diversas ciências. Uma leitura de vários economistas que não é ecléctica mas integrada em torno do conceito de “valor”. Uma leitura de várias ciências que redunda numa leitura económica e interdisciplinar dos factos e uma correspondente construção dos conceitos.

Um desatar da complexidade social de uma forma simples.




Au Bonheur des Dames 288

d'oliveira, 03.07.11

Em demanda de um Joaquim

 

Joaquim, quem quer que seja!, uma senhora que eu não conheço, pede-me num comentário a um pobre texto meu, que o avise que lhe deixou  um desafio cujo conteúdo desconheço. De todo o modo, Joaquim, seja V. quem for, um desafio feminino tem sempre o seu encanto. O que será o que não será?

 

A mim, com esta idade, já não há mulher que me desafie. Nem a rainha má da Branca de Neve me faz a caridade duvidosa de uma maçã envenenada.

 

Note, desconhecido Joaquim, que a maçã de que falo não é a refalsadíssima fruta da sabedoria com que Eva, a capitosa, teria baralhado o pobre Adão.  Só o finado Saramago é que baralhou esta história antiga e difícil do Génesis e se pasmou com uma, para ele desconhecida outra mulher, celebrada por serpentes, símbolos da terra e dos antigos poderes femininos que antecederam, ó saudade!, o cavernícola panteão masculino, presidido por deuses que nada percebiam da Criação, das dores do parto, da subtileza feminil. Lembremos, apenas para escarmento da macharia, a triste história de Saturno a devorar os filhos, tão brutal e estupidamente que nem uma pedra escapou ao seu apetite. Ele é que não escapou àpedra e deixou o lugar para Zeus o que se transformava em cisne ou em chuva.

 

Mas deixemos estes difíceis temas mitológicos e continuemos a explorar essoutro assunto, o recado de uma Teresa Ribeiro (será parente minha?, se for ninguém lhe chama Tété ou Teresinha, podem estar certos, cá a Teresa é uma certeza!) que por meu intermédio (oh escárnio!, agora que já estou mais para lá do que para cá, vem uma mulher que não tenho o prazer de conhecer e encarrega-me de ir em busca de um Joaquim, que ela pensa que eu conheço, para lhe dar um recado!).

 

Eis-me no papel de “entremetteur” malgré moi! Será para, como diz a definição do Petit Larousse, uma intriga galante?

 

Ai que sorte, Joaquim, quem quer se oculte sob esse nome antigo e semítico!

 

Um desafio! Uma desconhecida e intrigante Teresa avisa-o que algures por aí, em algo que ela qualifica (ou nomeia?) “delito de opinião” há um repto! Para si!, Joaquim, cidadão que eu deveria conhecer mas que, por mais que force as pobres “pequenas células cinzentas”, sou incapaz de identificar.

 

Eis o azar dos nomes populares (e Joaquim, com Manuel, é – ou era – o mais comum dos nomes portugueses): são uma multidão, e como em todas as multidões  vê-se a floresta mas não se distingue a árvore!

 

Ao passo que Marcelo, tirante o Caetano de aborrecida memoria, os heróis de telenovela brasileira, apenas há um punhado, quase todos ilustres e reconhecíveis, desde o Proust ao Mastroianni, desde  oherói mítico da Eneida (tu, Marcellus eris!) até ao Cerdan, pugilista famoso que perdeu de amores a magnífica Piaf!

 

Fraca consolação, dirá, V., Joaquim desconhecido mas desafiado, impante com o misterioso repto lançado por uma igualmente misteriosa Teresa que, por força, sabe que existo, mesmo sob a trindade pobre de três letras minúsculas, mcr, todas pertencentes ao meu nome de baptismo (escrevi baptismo porque não vou na treta do acordo luso brasileiro da ortografia sem história nem mistério...), fraca consolação!

 

À falta de luva, guante, contra mim atirada, aproveitei o recado e, à falta de melhor, durante um fim de tarde feio e cinzento, trago esta a “carta a Garcia”, digo a Joaquim, um desconhecido requestado por outra desconhecida, comigo no meio a fazer de “go between”, destino tristonho para quem já foi, em seu tempo, desafiado e, obviamente, derrotado que contra mulheres, Joaquim, a vitória é sempre incerta, se é que vitória sequer se pode falar. Por minha parte, já o escrevi: com mulheres, só “gloriosos naufrágios”, uma pequena sub-série do meu “au bonheur des dames”, como, eventualmente , alguma leitora mais atenta me fará a mercê de recordar.

 

(na companhia da gata Kiki de Montparnasse que dorme o sono antigo dos gatos, deitada praticamente em cima das minhas mãos, abençoada seja!, entre as 19 e as 20 horas de um domingo sem história).  

 

 

*na gravura: ilustração francesa de "O gato das botas de sete léguas", deliciosa história "infantil" bem mais interessante do que as merdices harrypotterianas com que pais acéfalos destroem a imaginação das criancinhas que pariram

 

 

Au Bonheur des Dames 287

d'oliveira, 02.07.11

Prova de vida

 

Um leitor e amigo que me apanha vezes sem conta na esplanada, á hora da segunda bica da manhã, intimou-me a escrever sobre o actual Governo. “Andaste p’r’aí a mandar vir contra o Sócrates e agora calas-te?”

 

E nesta dúzia de palavras, ecoava um toque acusatório. O meu interlocutor acha que estou de acordo com os novos senhores do poder.

 

Lamento muito, pá, mas não.  Nem de acordo nem em desacordo. Estes primeiros dias são para os fulanos aterrarem na espessa realidade que os vai tentar comer vivos. Até agora, limitaram-se a dizer ao que vinham e a ouvir o silêncio estrondoso da oposição. De toda a oposição! Desde o histerismo repetitivo de Louçã, “para onde foi o dinheiro senhor Primeiro Ministro?”, como se fosse o pobre Passos a poder responder pelo outro aventureiro de má memória, até à mansidão do derrotado PS que ainda anda a tentar colar os cacos em que ficou depois de se ter entregue a um tolinho trovejante e claramente de Direita mesmo se travestido de “esquerda post-moderna” e trapalhona.

 

Todavia, registo com satisfação a ideia de “exigência” na Educação, o fim dos “adjuntos nas direcções distritais de segurança Social” (um punhado de boys sem competência nem funções específicas e geralmente sem passado que lhes permitisse estar onde estavam) e o facto de me parecer haver uma cuidadosa (e encenada?) atitude de descrispação no discurso governamental.

 

E registo, sem surpresa, com imensa mágoa, a falta de qualquer proposta interessante nas franjas de comentadores ditos de Esquerda. Andam aturdidos, não sabem a que santo se devem votar, não apresentam alternativas claras e convincentes às politicas prosseguidas na Europa, como se o mundo lhes tivesse caído em cima. E caiu mesmo. A menos que continuem a usar os Chavez, o adiado cadáver de Cuba, o mortífero guia da Coreia do Norte ou a ditadura tecno-sectária que se apelida, vá lá saber-se porquê, Partido comunista chinês.

 

Ah, esquecia-me dos indignados de Madrid e Barcelona, da meia dúzia de imitadores indigenas ou do degradante espectáculo grego em que uma Direita ressabiada e nunca desfascistizada (nem julgada por crimes contra o povo) se une a uma Esquerda que também nunca soube analisar as causas da derrota na guerra civil (de onde também não saíram de mãos limpas de sangue inocente).

 

Mas da Esquerda (desta esquerda fatigada e renunciante e sem imaginação) falaremos mais tarde que, por enquanto, a sua não presença e a sua desastrada nov-língua não permitem sequer que a levemos muito a sério.

 

Tenho quanto a este Governo uma expectativa baixa. O que só me vai dar alegrias, se acaso, uma que outra vez, fizerem coisa que se veja. No entanto, e fora dos “troikismos” a que estão obrigados, e que foram, queiram os meus amigos ou não, sufragados por uma fortíssima maioria de cidadãos eleitores portugueses, tudo o que vier á rede como sinal de descompressão, de responsabilização cidadã, de exigência e de rigor será bem-vindo tanto mais que esse deveria ter sido o programa da Esquerda. Não me sufoca (mesmo se me dói, e de que maneira!) a ideia de nos irem (mais uma vez...) ao bolso no subsídio de Natal. Acho apenas que a coisa deveria ter diferentes escalões mas admito que isso seria dificilmente exequível (será?). Verifiquei que, no toca aos pensionistas, apenas cerca de 20 a 25% serão penalizados pelo novo tributo. O meu IRS aumentou este ano quase 20% sem que os meus proventos, aliás magros, tenham aumentado sequer 5% (por junto recebi a paga de uma tradução mas tive mais despesas obrigatórias que agora não são deductíveis!). Não gosto mas basta-me olhar em volta e ver gente desempregada para, irritado mas conformado, achar que devo pagar mais essa parcela de solidariedade. Reclamo, apenas, que o dinheiro seja bem gasto, e isso está por se provar.

 

Faço parte do numeroso grupo de portugueses que andaram a dizer que as coisas não iam bem (os meus leitores recordar-se-ão que não é de ontem que o digo, mas desde 2006: é só ir aos textos antigos, aí ao lado). Combati, com as armas que tinha, o triunfalismo, o despesismo e a irresponsabilidade dominantes. Continuo a pensar que quem é pobre não tem vícios. Eu também gostaria de ir de férias para sítios exóticos (ao menos rever Moçambique!....), de mudar de carro de cinco em cinco anos, de, de, de.... Mas, primeiro, penso que tenho de pagar as minhas poucas dívidas, de manter as despesas dentro dos limites do meu rendimento disponível, de prever o futuro (mesmo que quanto a aforro estejamos conversados). Só os livros me perdem.

 

E tenho sobretudo a convicção de que vivo melhor do que 90% dos meus compatriotas, mesmo sem me endividar nem recorrer ao crédito para carro, casa, férias, electrodomésticos ou o que quer que seja. Eu, aos bancos, e à sua terna e insinuante publicidade, digo não. E não. E não dou para o peditório dos desgraçadinhos que não resistem à publicidade.

 

Andamos há demasiado tempo a exercer de súbditos, de tutelados pelo Estado. Criámos, com a nossa aquiescência (mesmo silenciosa), com a nossa sofreguidão, com a nossa inveja dos europeus ricos, um monstro gigantesco que nos governa desde antes do berço até depois da morte. Esse monstro é um fim em si próprio e gasta o melhor das suas energias em se perpetuar, sustentar e travar a iniciativa e a liberdade cidadãs.

 

Só uma alucinada percepção da realidade pode fazer-nos crer que isso é o Estado Social, a Europa ou o futuro resplandecente do Povo trabalhador e soberano. Não é. É antes uma herança mesquinha e prepotente do velho regime, das loucuras maximalistas, da resignação perante o Estado Novo que morreu de velhice, carcomido e cadaveroso com dois tiros contra uma parede. E é fruto do fogo de palha do PREC, da tontice rasoirante que assolou a sociedade portuguesa e deitou fora, com a água do banho, a criança que pensava estar a lavar.

 

Interpretámos mal, e em calão, a frase magnífica do velho hino “du passé faisons table rase”,que cito no original porque, por cá, nunca a leram bem. E menos ainda a perceberam.

 

É por isso que não me precipito a julgar sumariamente as criaturas governantes.

 

Percebeste, ó mal humorado compadre? Deixa-os poisar...

 

(e já agora algo que nada tem a ver com isto. Escrevi por aí que o caso DSK não me parecia tão, tão, claro como foi apresentado. Agora é o próprio Procurador do Estado de Nova Iorque que propõe a liberdade sem caução e se faz eco das dúvidas quanto á credibilidade da “vítima” uma negra africana, coitadinha, violada por soldados que afinal não a violaram, mãe de um filho que é doutra pessoa mas que ela apresentou para se escapar aos impostos, indefesa mulher que depois do ataque miserável de um homem nu ainda teve tempo de arrumar o quarto ao lado e o do crime antes de, numa arrebatada corrida se ir queixar...

 

E, entretanto, alguém viu sair do FMI uma criatura que incomodava e da corrida à Presidência da França um candidato ganhador em todas as frentes. Os caminhos de Deus – ou do diabo – são insondáveis!....)

 

 

 

 

“E para onde irá tanto dinheiro?”

JSC, 01.07.11

«… Com o corte de 50% dos subsídios de Natal, o novo Governo tenciona obter 800 milhões de euros, saídos (na verdade nem lá chegarão a entrar) dos bolsos de trabalhadores e reformados.

 

E para onde irá tanto dinheiro? Com mais 800 milhões poupados em "acomodações" na despesa do Estado que "o senhor ministro das Finanças detalhará nas próximas semanas" (preparemo-nos para o pior, designadamente para mais cortes nos apoios sociais e na saúde), servirá para compensar os 1 600 ilhões que o Estado deixará de cobrar com a redução de 4% da TSU das empresas. O que é o mesmo que dizer que 50% dos subsídios de Natal dos trabalhadores e reformados, mais as "acomodações" ainda a anunciar, irão parar às contas bancárias dos empresários. Será reconfortante ver passar um Ferrari (pelo menos em regiões deprimidas como a do Vale do Ave) e imaginar que talvez uma porca de um daqueles pneus seja o nosso subsídio de Natal.»

 

Manuel António Pina, JN

Qual é a pressa?

O meu olhar, 01.07.11

Sabemos que a troika não inscreveu nas suas exigências este imposto extraordinário que dizem ser sobre o subsídio de Natal mas que, afinal, é bem mais gravoso que isso. “A medida que foi anunciada relativamente ao agravamento do IRS não se limita ao rendimento dos trabalhadores, engloba todo o rendimento que é coberto e sujeito a englobamento no IRS” disse o actual ministro das Finanças.


Ficamos a saber, no final de Junho, que no primeiro trimestre o valor do défice era de 7,7%. É sabido que o primeiro trimestre não é representativo, pelo que há que aguardar pela execução do primeiro semetre que... acabou ontem. Em quinze dias teriam informação mais actuallizada e representativa.


A 20 de Junho do corrente ano ficamos a saber que o défice público diminui quase 90 por cento nos primeiros cinco meses de 2011 relativamente a igual período do ano passado. De acordo com o relatório da execução orçamental, o saldo negativo da Administração Pública era no final de Maio de 285 milhões de euros contra 2600 milhões registados há um ano.

 

Com toda esta informação como se explica esta decisão, nesta altura, deste imposto extraordinário? Não seria normal que estas mentes brilhantes aguardassem e só recorressem a um imposto extraordinário depois de esgotadas todas as alternativas de consolidação orçamental pelo lado da despesa? Que, aliás, foi o que andaram a propagandear durante a campanha.

 

Vejo tudo a ser feito com muita pressa, sofregamente. Será que querem aproveitar a conjuntura política partidária e o período de férias para impor sacrifícios bem maiores que aqueles que estavam contidos no famoso PEC IV, que Passos Coelho se recusou a aprovar ?

 

Ali Baba e os 40 ladrões

JSC, 01.07.11

Há muito, muito tempo, numa cidade lá para os lados do Oriente, vivia Ali Babá, que ganhava a vida falando e vendendo sonhos nas aldeias próximas à sua. Assim foi crescendo e amealhando uma grande fortuna. O problema surgiu quando os aldeões verificaram que Ali Babá tinha uma gruta, do género off shore, onde caíam vários depósitos, sem impostos nem registos que se visse. Então, Ali Babá reuniu o bando e partiu para parte incerta, antes que algum aldeão lhe lançasse um pode de azeite a ferver.

 

Ainda hoje não se conhece o paradeiro de Ali Baba nem dos quarenta ladrões, havendo, contudo, quem acredite que estão sempre por muito perto, mas como ele tem uma palavra mágica, ilude e confunde sempre os aldeões, que o tomam sempre por ser quem não é. E é assim que a vida dos aldeões fica
cada vez mais complicada enquanto que o bando de Ali Baba desfruta de grutas luminosas, com sabores excêntricos, a fazer inveja aos deuses.

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