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Incursões

Instância de Retemperação.

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“Conto de crianças” começa a fazer caminho

JSC, 09.02.15

O ainda primeiro-ministro Pedro Passos Coelho olha para a nova realidade grega e vê um “conto de crianças”.

Por sua vez, o Chanceler da Áustria, Werner Faymann olha para a mesma realidade e conclui que se tem de “encontrar uma solução entre o enquadramento acordado no passado e os esforços do novo Governo [grego]", porque, diz, "um novo caminho tem de ser encontrado". Aos jornalistas reforçou que ambas as partes têm de ceder nalguns pontos: "Temos de encontrar soluções mutuamente aceitáveis."

Não se pense que o Chanceler é algum esquerdista ou membro de algum grupo anti austeridade. É um social-democrata, provavelmente, da família política do partido a que pertence o grupo liberal liderado por Pedro &Portas. Pelos vistos, o Chanceler pensa pela sua cabeça, capaz de interpretar os malefícios que esta política de austeridade tem produzido, consciente que prosseguir esta política não só empobrece cada vez mais os países devedores, como acabará por destruir o Euro e a própria UE.

Como é imensa a distância entre o olhar do governante austríaco para a Grécia e aquele que a troika pedinte  germanizada – Pedro Passos Coelho /Paulo Portas / Pires de Lima – nos tem passado.

Grécia e Portugal

José Carlos Pereira, 04.02.15

Se há coisa que as recentes eleições na Grécia demonstraram foi que os gregos estavam fartos dos partidos e dos políticos que os governaram nas últimas décadas e em particular nos últimos anos. A vitória do Syriza foi a explosão de um país farto de uma austeridade sem freio e que só trouxe consequências negativas ao povo grego.

Pese embora os erros, que têm de ser assumidos, das políticas e das práticas que ao longo dos anos conduziram a um endividamento brutal da Grécia – mais de 175% do PIB! – a receita decretada pela Europa e pelas instâncias internacionais só agravou a situação. Com efeito, nenhum país pode aguentar por muito tempo uma situação social em que o desemprego atinge mais de 25% da população, os salários de quem manteve o seu posto de trabalho foram reduzidos entre 30% e 40% nos últimos três anos e os impostos aumentaram entre sete e nove vezes. O resultado final foi que cerca de um quarto da população caiu no limiar da pobreza. Por muitos abusos e desvios que tenham sido cometidos anteriormente, nenhum país pode sobreviver incólume a estes indicadores.

A rápida constituição do novo executivo grego – uma lição para muitos países, incluindo Portugal – mostrou que a coligação entretanto formada entre o Syriza e os Gregos Independentes tinha a uni-la sobretudo a vontade de reverter a relação com a Europa e com as instâncias internacionais que aplicaram fortíssimas medidas de austeridade à Grécia. Os últimos dias têm mostrado a vontade dos governantes gregos de negociarem novas condições para a sua dívida e a Europa não pode dizer não a essa possibilidade.

O ministro das Finanças Varoufakis já deixou claro que não pretende solicitar aos parceiros europeus um perdão da dívida, mas sim “um menu de trocas de dívida”, prevendo a constituição de obrigações ligadas ao crescimento do PIB, em troca da dívida detida pelos países da zona euro, e obrigações perpétuas para substituir as que são actualmente detidas pelo Banco Central Europeu. Varoufakis não podia ser mais certeiro na entrevista que ontem deu ao “Financial Times”: “Ajudem-nos a reformar o nosso país e dêem-nos alguma folga orçamental para fazermos isso, senão continuaremos a sufocar e tornar-nos-emos uma Grécia deformada em vez de uma Grécia reformada”.

A ronda negocial prevista para os próximos dias será determinante para perceber como vai a União Europeia reagir às propostas apresentadas e que flexibilidade vai demonstrar perante o executivo grego. O que se torna patético é vermos o Governo português e os partidos da maioria persistirem na tese do “bom aluno, modesto, subserviente, agradecido e de chapéu na mão”, reagindo com total sobranceria às iniciativas do seu congénere grego, que tem a legitimidade acrescida de quem saiu agora de eleições.

De resto, Portugal, assim como a Irlanda, a Itália ou a Espanha, só tem a ganhar com um processo negocial bem-sucedido entre a Grécia e a Europa. Sobre isso não devia haver quaisquer dúvidas. Recorde-se, aliás, que a Grécia, apesar de ser o país com a maior dívida pública tem um custo para o serviço da dívida, proporcionalmente ao PIB, inferior ao suportado por Portugal ou pela Itália. Segundo o Think Tank Bruegel, os encargos com a dívida grega atingiriam os 4,3% do PIB para uma dívida de 175% do PIB, bastante abaixo dos 5% a pagar por Portugal para gerir cerca de 128% de dívida pública e dos 4,7% suportados por Itália para uma dívida também equivalente a 128% do PIB.

Como se tem visto, as medidas tardias que têm sido tomadas no âmbito da zona euro, como a recente decisão do BCE de injectar dinheiro através da compra de dívida pública, durante muito tempo prontamente recusada por Pedro Passos Coelho, resultam sempre em benefício das economias mais expostas e dos países sob programa de ajustamento. Aproveitar a boleia grega para melhorar as condições de pagamento da nossa dívida e aliviar por essa via a austeridade que vitima os cidadãos e as empresas nacionais seria um passo inteligente do Governo PSD/CDS. Mas não devemos contar com tal empenho.

A menos de um ano das eleições legislativas, resta-nos esperar que o PS de António Costa saiba interpretar bem os ventos de mudança que sopram de Atenas até Bruxelas e consiga bater-se, em conjunto com outros aliados, por uma Europa mais solidária, integradora e respeitadora das especificidades nacionais.

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