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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

au bonheur des dames 411

d'oliveira, 31.12.15

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Vai ser um fartote!

 

As leitoras (e os leitores, claro) que me desculpem: isto, ou seja a campanha que se aproxima, vai ser pior ainda do que a que passou. E vai por várias razões todas de peso. A Direita quer ver restabelecida nas urnas a sua vantagem relativa que, no caso, poderá até mostrar-se absoluta, depois da garraiada que se suscitou com o significado da votação popular.

A esquerda parte tão dividida como sempre ou até mais. Por um lado Maria de Belém Roseira, Henrique Neto e uma outra criatura subitamente aparecida, disputam o voto socialista e adjacente. O PCP, cumprindo uma tradição antiga surpreende ao apresentar um padre “defroqué” (a denominação vem dos tempos perturbados da Revolução Francesa e aplica-se aqui inteiramente) que esbraceja mais do que um moinho de vento em dia de tempestade. Lá iremos. O Bloco apresenta uma senhora que nos últimos anos tem sido deputada europeia (uma das vezes com o meu pobre voto) e que tem como actividade mais interessante uma longa carreira na luta contra a doença de Alzheimer (coisa que pessoalmente lhe agradeço profundamente quanto mais não fosse por ter um parente muito querido atingido por essa doença). Fora isso Marisa Matias é professora no CES e foi relatora de temas importantes no Parlamento Europeu.

Depois há uns quantos “espontâneos”, seguramente meritórios mas que dificilmente se farão ouvir ou sequer dar-se a conhecer. A corrida vai ser portanto entre Marcelo, Belém, Nóvoa, Neto, Marisa e o reverendo Edgar. Neste mano a mano a seis, o combate é Marcelo contra todos.

Todavia, convirá apontar que o candidato do PC tem trazido para a soturna luz do dia, um rosário de críticas ao PS que mostram bem o “estado da união” governativa. Aliás, ao que tenho visto, o PS e Marcelo são as únicas vítimas dos sermões do ex-paróco da Madeira. Ele (e os seus camaradas) lá sabe porquê e para quê. Edgar significa lanceiro que defende a sua terra e tem um santo com esse nome. Trata-se de um antigo rei proto-inglês que reinou no Wessex e se chegou a intitular “imperador de Albion”.

Este Edgar madeirense vai usando do chuço para derrear os lombos socialistas e, obviamente, Marcelo. Fora isso é um anónimo membro do CC do PC que nunca perde uma oportunidade de oiro como esta. Um padre mesmo despadrado no Comité central é uma bênção.

Maria de Belém a quem cheguei a dar o meu apoio (que retirei depois do pacto de Cacilhas estabelecido com o senhor Nóvoa) tem uma carreia toda ela na política depois de uns anos na Segurança Social. Sabe do que fala, é católica, tem um longo conhecimento nas áreas em que trabalhou, saúde, segurança social direitos da mulher, e é notoriamente inteligente. Por razões estapafúrdias, Costa prefere-lhe o subitamente nascido para a política Nóvoa, criatura que se perfilou em primeiro lugar conseguindo o surpreendente apoio de três ex-presidentes, vá lá saber-se por que misteriosas razões. A biografia que recentemente lhe dedicaram merecia a leitura de Eça de Queirós tão extraordinariamente ridícula que é. As vezes em que penosamente tive de o ouvir mostraram-me a vacuidade da criatura, o desconhecimento da política e pior do papel de Presidente da República. Não cometerei a desfeita de, como já corre, lhe chamar Sampaio da Nódoa mas convenho que o homem é pior do que as primeiras impressões. Que haja cerca de 10% de portugueses que eventualmente o apoiam mostram bem o estado a que isto chegou. Henrique Neto tem passado político e profissional. Foi do PC quando isso era um risco e um acto de coragem, trabalhou duramente para criar uma fábrica modelar, foi deputado do PS capaz de dizer, no plenário e fora dele, verdades que arrasavam amigos e inimigos, tem ideias claras sobre economia. Sobretudo, ninguém o pode acusar de ter vivido à custa do erário público, bem pelo contrário: criou riqueza, empregos e pôs o país na linha da frente da indústria de moldes. Terá o meu voto.

Finalmente Marcelo.

Ninguém de bom senso nega a este professor catedrático de Direito inteligência e desenvoltura. Também ninguém desconhece o feitio traquinas e a mania das habilidades que o fizeram famoso dentro e fora do PPD. Criador de factos políticos e jornalista astuto e convincente, a sua história está ligada à ala social democrata do partido ou, até e melhor, à sua ala democrata cristã. Marcelo é um católico assumido, tem fama de pessoa despojada: não possui casa nem carro (?), viveu sempre do seu trabalho de professor e sobretudo do chorudo ordenado que a televisão privada lhe pagou pela tarefa de comentador político (tal como Pacheco Pereira, por exemplo) que levou a cabo com grande eficiência e notável clareza de exposição: o “professor” conseguia explicar as coisas mais complicadas com simplicidade, algum humor e uma enorme empatia com o público. Só isso merecia ser muito bem pago. Nunca teve, nem terá (salvo se Jesus descer à terra) o meu voto mas também é verdade que não precisa dele. Há pouco mais de dois anos, apostei contra quatro amigos uma almoçarada de lampreia –vejam bem o risco!- que ele ganharia as eleições e apostei o preço do vinho que seria à primeira volta. Encargo pesado que assumi sem estados de alma. Uma coisa é não gostarmos da pessoa, outra é entrar em estado de negação.

Graças à tola campanha de todos contra Marcelo, este cada vez mais se evidencia e ganha apoio. Se alguém o não conhecia passou a conhecê-lo. Depois, queira ou não, o esforçado Rui Tavares comentador do “Público”, a campanha barata de Marcelo fez mossa nas outras. Se é verdade que não precisa de se apresentar, não menos verdade é que Belém Roseira ou Marisa Matias gozaram pelo facto de serem personalidades públicas de uma intensa pré-pré campanha nos media enquanto Sampaio da Nóvoa justamente porque era novidade teve idêntica sorte. No caso dele, o excepcional e surpreendente apoio de Eanes, Soares e Sampaio, expresso há meses foi igualmente importante. No que toca ao candidato comunista, ser ou não conhecido é igual ao litro. O homem terá, se for às urnas, o voto unânime, ou quase, dos simpatizantes comunistas. Se estes candidatassem o lince da Malcata o resultado era o mesmo. A virtude ou defeito do eleitorado comunista é que este vota como lhe indica o partido. Sem ilusões nem estados de ânimo. (“Assim se vê a força do pc!”).

 

Até ao momento, os candidatos tem opinado sobre tudo ou quase. Sempre com uma correcção política que dói! E, até nesse capítulo, Marcelo sobressai: na sua calculada estratégia de mostrar independência, até consegue dar a mão a Costa. Para melhor a apertar duramente depois? É possível mas basta ver o comentário de desagrado de alguma Direita, para perceber que, ao contrário dos outros candidatos, Marcelo doseia elogios e críticas como nos seus melhores tempos de televisão. E com uma outra vantagem: não responde às críticas dos restantes concorrentes, coisa que os deve enfurecer mas que faz o público sorrir e repara neste católico que quase oferece a outra face.

É evidente que tudo isto é uma calculada e longamente meditada actuação que poderá encobrir uma fúria interior prodigiosa. De todo o modo, para quem assiste ao despique, também isto corre de feição para o candidato Marcelo.

Convirá, porém, realçar que nestas últimas semanas, os candidatos de motu próprio ou por desafio de entrevistadores analfabetos, têm falado de tudo sobretudo, até, de assuntos que nada têm a ver com o cargo que irão disputar. Dir-se-á que os eleitores querem conhecê-los melhor. No entanto, conhecer melhor não é saber pela rama o que pensam suas futuras excelências sobre a questão da queda dos preços da carne de porco ou sobre a falta de médicos ao fim de semana no hospital de S José. Neste caso, aliás, não vi uma única criatura perguntar se a doença em apreço é rara ou não, se o pagamento proposto aos médicos era decente ou não (fala-se de 3 euros à hora...) ou porque razão em Coimbra e no Porto não ocorreram casos fatais visto haver médicos especialistas nessas escalas. Sendo assim, falar na degradação do SNS é uma imbecilidade medonha: o que, eventualmente, se passará é apenas uma miserável falta de organização que deve apenas responsabilizar a administração do hospital ou a ARS de Lisboa cujos responsáveis de resto se demitiram. Por outras palavras: estas mortes foram instrumentalizadas politicamente e nenhuma das respostas adrede manifestadas toca o problema de fundo. Portugal, ao contrário do que algum tolo dirá, tem um extraordinário sistema nacional de saúde e estará num dos dez melhores lugares do mundo. Pode melhorar? Claro que sim e sobretudo em campos que irão exigir fortíssimos investimentos. A questão é saber se se deve realizar tal esforço ou se não é mais eficaz e muitíssimo menos oneroso para a fraca bolsa dos parcos contribuintes portugueses criar acordos internacionais que permitam aos pacientes portugueses (que serão relativamente escassos) recorrer a serviços hospitalares estrangeiros onde o rácio habitante/serviço de saúde permite abordar a situação com êxito e menor preço. Afinal, estamos ou não na União Europeia?

 

Era sobre questões deste teor que convinha (também) ouvir os senhores “presidenciáveis”. Ou seja: onde estamos? Como estamos? Para onde vamos?

Estamos a dois dias do fim do ano. Eis um voto para o próximo: mais verdade. Mais rigor! Menos conversa de chacha! Mais exigência. Mudar de vida! Mudar a vida!

Afinal são seis os meus pedidos e pelo menos dois deles bebidos directamente no surrealismo que foi uma coisa muito séria e uma aventura que há cem anos presenciávamos de longe, mesmo que, por cá, tivesse havido um meteoro chamado “Orpheu”. Mas isso era “futurismo” e o que por cá actualmente se passa é passado, demasiado passado.

Bom ano!

 

O caso BANIF

José Carlos Pereira, 22.12.15

O Governo e a Assembleia da República têm a obrigação de fazer da resolução do BANIF um caso exemplar. O que disse, há um ano, a Comissária Europeia da Concorrência, o que se sabe do modo como o Governo PSD/CDS (não) conduziu o dossier junto da UE, com oito planos de reestruturação rejeitados, as consequências de todo este processo para os contribuintes e para o sistema financeiro exigem isso mesmo.
Do muito que se tem escrito nestes dias sobre o tema, que ocupa legitimamente o centro das atenções nos meios políticos e económicos, permito-me destacar o editorial do "Público" e as opiniões do antigo ministro Bagão Félix e do director-adjunto do "Expresso" João Vieira Pereira.

Para tudo há limites – Marcelo Presidente??

O meu olhar, 16.12.15

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O candidato à Presidência Marcelo Rebelo de Sousa quer passar uma imagem de um político responsável, equilibrado, sensato e conciliador. No entanto, ele é tudo menos isso.

Vejamos um exemplo da verdadeira natureza de Marcelo na resposta à pergunta: porque existe uma inimizade tão forte entre Balsemão e Marcelo?

 

 “Traiu-me várias vezes desde que, em 1972, o chamei para colaborar comigo no ‘Expresso’”, desabafou Pinto Balsemão em entrevista ao “Independente”. 

Balsemão traçou-lhe o perfil na última entrevista que deu ao jornal de que é dono, em 2011. “É uma pessoa superintelegente, mas à procura de tantos esquemas acaba por trair, não apenas os outros mas a ele próprio.”

 Freitas do Amaral conta, nas suas memórias políticas, que “cada conselho nacional do PSD era uma batalha campal, em que a autoridade do líder (Marcelo) era sempre posta em causa”.

O analista político (Marcelo), mesmo dentro do governo da AD, primeiro como secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e depois como ministro dos Assuntos Parlamentares, não deixou de conspirar e, pior que isso, de tornar pública a sua desilusão com tudo o que estava a acontecer. Nas entrevistas, o ministro dos Assuntos Parlamentares admitia que a AD já tinha cometido “erros graves”, apelava a uma remodelação em público e ameaçava bater com a porta. 

Demitiu-se, mas combinou com o primeiro-ministro ( Balsemão) guardar segredo até às autárquicas para não lançar a bomba à porta das eleições.

“Apresentou a demissão quatro dias antes das autárquicas, com a promessa de nada revelar até às eleições, mas no próprio dia ou no dia seguinte a notícia estava no ‘Expresso’”, conta Balsemão, na biografia de Vítor Matos do comentador político. “O episódio marca o ponto final numa amizade de dez anos”, relata o jornalista. 

 

A notícia completa pode ser vista aqui:

http://www.ionline.pt/400912#close

leitor (im)penitente 194

d'oliveira, 16.12.15

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Portugueses, europeus, cosmopolitas e inteligentes

Aproveitando o momento em que se conhece o laureado do Prémio Pessoa deste ano,Rui Chafes escultor reconhecido recordo o premiado do ano passado Henrique Leitão, físico e historiador da Ciência (e excelente comunicador, como tive oportunidade de comprovar via uma entrevista sua na televisão), seria bom lembrar que o nosso pequeno torrão teve (e tem) a sua interessante quota parte em muitos domínios do conhecimento científico mundial. 

Hoje limitar-me-ei a tratar de algo dramaticamente esquecido quer do público quer dos novos patriotas acirrados que em época eleitoral nos caem em cima.

Irei, pois, tratar de cartografia, ciência para a qual em muito contribuíram os nossos maiores.

Sem pretender ser exaustivo e tentando, apesar de tudo, ilustrar o folhetim com obras relativamente acessíveis, deixarei por aqui alguns apontamentos sobre uma prestigiosa contribuição portuguesa a esta ciência.

E começaria pelo mais simples e mais acessível: a colecção de separatas (249 ao todo) publicadas a partir de 1960 pelo Centro de Estudos de História de Cartografia Antiga. Tais publicações ainda hoje se encontram quer em alfarrabistas quer, sobretudo, no notável Instituto de Investigação Científica e Tropical. Demoremo-nos um pouco nesta instituição prestigiosa e prestigiada, herdeira, se não erro, da Junta de Investigações do Ultramar, anteriormente das Colónias. Vale a pena visitar o palácio onde está localizada, quanto mais não seja por ser a continuação natural do belíssimo Jardim Tropical, um jardim botânico especializado ali para os lados de Belém.

E vale muito a pena pesquisar o catálogo de publicações para venda onde qualquer leitor encontrará muito por onde escolher, mesmo se não quiser focar-se apenas nas separatas.

Trata-se de uma colecção notabilíssima a que se associaram os melhores nomes (nacionais e estrangeiros). Cito apenas três já desaparecidos para não cair em falta com os ainda vivos: Teixeira da Mota, Armando Cortesão e Luís de Albuquerque, pessoas que deixaram, para além da sua colaboração no CEHCA, uma vastíssima bibliografia de superior qualidade. Aliás, e já lá iremos, são também eles quem contribuirá em graus diversos para a monumental “Portugaliae Monumenta Cartographica” ou para o curioso e belíssimo “Tabularum Geographicarum Lusitanorum” e até para o mais recente “Portugaliae Monumenta Africana”.

Reza a lenda que Salazar terá sondado o Professor Armando Cortesão para dirigir os “PMC” por razões de patriotismo, sabendo como sabia, que Cortesão era oposicionista. E que Cortesão terá aceitado por isso mesmo vincando, todavia, a sua posição de repúdio do Estado Novo. Se non è vero...

Seja como for, essa primeira e grandiosa compilação (e estudo) da nossa cartografia constitui, ainda hoje, passado meio século, um extraordinário projecto editorial que delicia estudiosos, bibliófilos e curiosos. Mesmo se, e isso ocorre com outra publicações similares, as dimensões dos volumes (6) e, sobretudo, do “álbum” sejam um forte óbice para quem pretende adquirir a obra. O preço também não ajuda (a INCM cota a coisa perto dos 500 euros). No mercado alfarrabista e no de 2ª mão os preços podem descer até cerca de metade. A questão é ter paciência e procurar muito.

O segundo texto que gostaria de referir é o extraordinário Atlas do Visconde de Santarém, nas duas sucessivas edições da segunda metade do século XX. Ambas são fac-similadas da 1ª gloriosa edição custeada pelo Visconde e que deu na europa civilizada da época. O Atlas é acompanhado de um grosso tomo da lavra de Santarém sobre a prioridade dos descobrimentos portugueses na costa ocidental de África.

Como de costume, neste género de publicações, o grande óbice à sua aquisição (maior mesmo que o preço!) é a dimensão do volume (cerca de 75x50 centímetros!). Encontram-se à venda   no mercado alfarrabista exemplares raros da edição portuguesa. No mercado internacional é possível também encontrar uma edição recente, fac-similada, editada em Amsterdão a preço muito mais baixo. O primeiro óbice é que se trata de folhas soltas (mesmo se por um pouco mais de dinheiro se consiga um estojo -cerca de 190€-). Depois os mapas são todos a preto e branco. Finalmente, em vez do texto de Santarém, há um curto mas bom estudo de dois autores ingleses.

Em quarto lugar outro atlas fascinante: É o de Fernão Vaz Dourado, um cartógrafo que nunca terá saído de Goa onde milagrosamente concebeu e produziu esta obra prima. Dimensões um pouco menores (60x30), existe em duas versões. A melhor e mais rara deve-se a outro visconde, desta feita, o notável Visconde da Lagoa, autor emérito de vários excelentes estudos sobre a Expansão Portuguesa. Trata-se de uma edição dos anos quarenta que, posteriormente foi reproduzida pela Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses (neste caso a edição é mais pequena e manuseável e consegue-se, na Torre do Tombo por menos de 100 euros). Há igualmente uma reprodução ultra luxuosa do mesmo atlas, em pergaminho, com acabamentos excepcionais que correspondem a um preço excepcional (quase 5.000 euros!). É a chamada edição de Manuel Moleiro um editor espanhol conhecido pela alta qualidade dos produtos de que é responsável.

A quinta maravilha cartográfica é o Atlas de Lázaro Luís (1536), na edição de Luís de Albuquerque e Catarina Madeira Santos (1990). O meu exemplar vem dentro de uma estojo em pele, e foi adquirido a preço mais que razoável porquanto na internet só vejo referido uma outra edição espanhola com preços à volta dos 1500 euros e acabamentos luxuosos que, todavia, não justificam tal disparate. No pequeno mundo da edição deste tipo de publicações optou-se em muitos casos por fazer quase objectos de colecção com tiragens limitadas e recurso a materiais caríssimos.

Finalmente, refira-se o Atlas do Rey Planeta, da autoria de Pedro Teixeira Albernaz, um dos muitos portugueses que permaneceram em Madrid mesmo depois de 1640. Pedro Teixeira Albernaz e seu irmão João terão sido alunos de João Baptista Lavanha e trabalhado durante muito tempo junto da corte de Filipe IV (III de Portugal). Foi este rei quem encarregou Pedro de uma obra ciclópica: um atlas dos seus reinos peninsulares com a descrição das costas e das mais importantes cidades. A obra levou anos a concluir, fornece deliciosos panoramas de costas e desapareceu durante séculos até ser acidentalmente encontrada em Viena em 2000. Foi publicada poucos anos depois é relativamente fácil encontra-la em Espanha, através da Casa del Libro (cerca de 75 euros). Este cartógrafo é também autor de “Descripicion del reyno de Portugal y de los reynos de Castilla...” de que não consta qualquer publicação, excepção feita ao que dele se reproduz nos Portugaliae Monumenta Cartographica”. Convém salientar que a edição do Atlas em causa não deve seguir as dimensões da obra original, não traz os mapas encarcelados de modo a serem totalmente visíveis e, por isso mesmo, sendo um razoável objecto de estudo não reproduz rigorosamente o original (exactamente como no caso da edição do Atlas FV Dourado feita pela Comissão dos Descobrimentos) e isso repercute-se na facilidade de compreensão das cartas geográficas e da toponímia.

Correm por aí, provenientes do excelente – e caro!!!- editor Manuel Moleiro outros atlas atribuídos a cartógrafos portugueses (atlas Miller) ou seguramente feitos por portugueses (o de Diogo Homem).

Quereria citar, por último, o interessantíssimo “Glossário toponímico da antiga historiografia ultramarina portuguesa”, da autoria do Visconde da Lagoa. Este erudito a quem os estudos sobre a Expansão Portuguesa muito devem, deixou com o título acima indicado , uma obra em três fortes volumes e uma adenda também gordinha, um índice de nomes perdidos ou esquecidos de terras por onde os nossos maiores andaram. A obra curiosamente nuca se completou pois o que está editado corresponde apenas à Parte Iª (Ásia e Oceânia). Ficaram por publicar (ou até por redigir) as partes África e América.

 

Caros leitores

Eu não quero estar aqui a dar-vos cabo da paciência com um monte de livros velhos mas apenas pretendo recordar (ou avisar) que nem só de desgraças está tecido o nosso passado. No capítulo cartografia e conhecimento do mundo cabe-nos uma parte honrosíssima (terão reparado que não falei de conquistas ou “descobertas” mas apenas de ciência ligada às nossas viagens longínquas) no panorama da ciência europeia e mundial (não esquecer os grandes viajantes árabes, chineses e até indianos).

Esta parte da nossa bela herança merecia tratamento digno e condigno. Ora aqui está algo de que um “Ministério da Cultura” poderia ocupar-se. Ainda por cima poderá contar com o apoio generoso e desinteressado de várias instituições (por exemplo a Sociedade de Geografia de Lisboa, casa centenária, editora esforçada com um conhecimento robusto da nossa história colonial). E poderia, talvez, evitar o estilhaçamento do Instituto de Investigação Científica e Tropical e de órgãos anexos (Arquivo Histórico Ultramarino) que ainda por cima não pesam no orçamento e vendem os seus produtos.

Seria bom existir uma espécie de “Biblioteca de Estudos Portugueses” que agrupasse este tipo de edições que, pessoalmente, confiaria a uma editora tipo “Gradiva” para evitar que as publicações morressem (como morrem as da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos) sem ver um freguês interessado. Isto é defesa do nosso património, é barato e prestigiante.

Se deixo esta hipótese é porque a dr.ª Clara Ferreira Alves, numa carta aberta ao dr. João Soares o desafiava para reeditar uma série de clássicos literários recentes (que, na maior parte dos casos ainda se encontram nas livrarias) que ela julga em perigo de esquecimento. Ora se a poesia e a ficção merecem tal desvelo porque não estas velhas e continuadas glórias da nossa cultura?

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d'oliveira, 15.12.15

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Quando o verniz estala

Os meus leitores sabem que não morro de amores pelo dr. Rui Rio. Nunca o votei e nunca me passou pela cbeça dar-lhe o meu voto para PR

Todavia, para espanto meu, ele governou a cidade com alguma isenção (e o arrufo com o PPD mostra-o claramente) e deixou-a melhor do que estava e muito menos endividada. Mesmo a longa querela que o opôs a certos meios culturais não foi toda em seu prejuízo nem, sequer, provou a acusação que lhe fizeram de ser contra a “cultura”, sobretudo alguma que muitas vezes se traduzia na mais abjecta mediocridade.

Essencialmente o dr. Rio ficou conhecido (para além da sua proverbial teimosia) pelo conflito que manteve com o FC Porto a quem negou a varanda dos Paços do Concelho para celebrar os seus triunfos. Segundo o clube, havia uma tradição de ali terminar a carreira triunfal afirmada durante o último quartel do século XX.

Segundo Rio, uma coisa é futebol outra a Câmara Municipal e a dignidade das suas instalações. Um diálogo de surdos, como se vê e, por isso mesmo, um diálogo envenenado.

Pessoalmente, nunca dei razão a nenhum dos contrincantes e se, de certo modo, acho alguma laracha ao sr Pinto da Costa, também não me deixo encantar pelo seu humor grosseiro e, muito menos, pela lenda (ou verdade?) negra que o acompanha.

Pinto da Costa, irmão de um grande e falecido amigo meu desde os tempos de Coimbra, tem um estilo muito próprio e só se distingue dos seus colegas do sul (Benfica e Sporting) pela marcada pronúncia do Norte –que ele aliás exagera propositadamente – e pelo estilo que impôs à direcção do clube. Astuto, hábil, disciplinador, politicamente interventivo, vaidoso, Pinto da Costa não deixa de ser o que é: alguém que é capaz de manipular multidões clubísticas e que provavelmente já deveria ter descalçado as chuteiras. Infelizmente, criou o vazio à sua volta e agora mesmo em clara perda de vigor e de verve não sabe como retirar-se em glória.

Vamos, porém, ao que interessa: Rui Rio já não é presidente da Câmara e ainda não tem um destino político nacional. Falhou a candidatura a Presidente da República depois de verificar que não dispunha dos apoios necessários. É um cidadão tranquilo e lá vai intervindo em diversas iniciativas com maior ou menos fulgor mediático. Justamente, iria intervir na “conferência anual da SIC” a convite dos dirigentes da estação. Tal reunião fora marcada (suponho que há já bastante tempo) para um pavilhão do FC Porto e não se desconhecia quem participava.

Não sei se a cedência do pavilhão era a título gratuito ou oneroso. Sei, isso sim, que, como ocorre em todas as cedências, durante o tempo da reunião, a SIC estava na situação de inquilina e por isso mesmo juridicamente só ela poderia convidar ou impedir alguém de entrar.

Não consta que o FC Porto tivesse imposto qualquer condição especial mormente uma proibição de entrada a quem quer que fosse.

Ao proibir, in extremis, a presença de Rio, fica-se com a ideia de má fé e, sobretudo, de má educação, de rancor vincado e antigo e de vingança mesquinha. Ou, pior ainda, de chantagem pois qualquer pessoa sabe que é difícil mudar a sede de um evento de um dia para o outro.

Pelos vistos a SIC, que tem um poder bem maior do que o FC Porto, sobretudo quando não está à frente do campeonato, pode rapidamente arranjar outro local tão ou mais nobre do que o pavilhão do FC Porto e Rio entrará naturalmente pela porta principal e terá uma reforçada atenção dos media. Até nesse campo a direcção portista sai derrotada.

O que surpreende (sobretudo as pessoas que têm uma alta ideia da inteligência - que não da urbanidade!...- de Pinto da Costa) é que se a conferencia se realizasse no primitivo lugar, sempre poderia o FC Porto afirmar alto, ou num silêncio ainda mais estrepitoso, que sabia dar uma bofetada de luva branca. Não sabe! É com ele.

Lamento muito mas o resultado desta farsa é Rio 1, FC Porto 0.

Não havia necessidade...

(escrito por mcr adepto da Associação Naval 1º de Maio)

O combate à Frente Nacional

José Carlos Pereira, 15.12.15

Os resultados da segunda volta das eleições regionais em França acabaram por travar a ascensão da Frente Nacional (FN), impedindo o partido de extrema-direita de chegar ao poder mesmo nas regiões em que tinha conquistado uma fortíssima votação na primeira volta, com mais de 40% dos votos, e onde se apresentavam a líder Marine Le Pen e a sobrinha Marion Maréchal-Le Pen. Uma maior participação eleitoral e o voto útil, sobretudo dos socialistas, acabaram por dar uma boa notícia a todos os democratas na noite de domingo. Destaca-se aqui a decisão corajosa do Partido Socialista Francês, que preferiu retirar-se da eleição em quase todos os locais em que tinha sido a terceira força política, prescindindo de ter representantes em alguns parlamentos regionais, em benefício do voto útil na direita republicana.
A votação conseguida pela FN, com mais de 6,8 milhões de eleitores, fez triplicar o número de deputados nos parlamentos regionais e disseminar a sua presença pelo país. É uma presença que está para durar no meio político francês e que, aliás, se tem vindo a consolidar com a liderança de Marine Le Pen, que soube amaciar o discurso político em relação ao que praticava o seu pai. A FN quer ganhar legitimidade democrática e os tempos que correm estão propícios para a sua acção: a crise económica e social; o desemprego; a conflitualidade social; os refugiados; os atentados terroristas; a falta de liderança firme em França e na Europa. Este contexto favorece um discurso nacionalista, dirigido aos que perdem o pouco que têm e não vêem os poderes públicos resolverem os seus problemas e os das suas comunidades. Aliás, Sarkozy acabou por vencer as eleições porque se aproximou bastante deste discurso populista.
Os partidos ditos republicanos, com as lideranças fragilizadas de Sarkozy e Hollande e a reputação muito abalada, devem aprender com os erros e colocar os seus olhos mais adiante, pois Marine Le Pen já tem o seu foco nas presidenciais de 2017. Só a regeneração desses partidos e das suas lideranças, centrando-se nos problemas concretos dos franceses e recuperando o papel central que a França já teve na implementação de políticas económicas e sociais na Europa, serve o propósito de travar a ascensão da Frente Nacional. É o que se exige dessas forças políticas no país da liberdade, igualdade e fraternidade.

Mas estes tipos não trabalham?

O meu olhar, 15.12.15

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“Mas estes tipos não trabalham? – era o que me vinha à cabeça quando via  Pedro Passos Coelho, Paulo Portas ou algum dos ministros  ou secretários de Estado nas televisões em “visita oficial” a… não importa o quê nem onde. Eles estavam todos os dias, em todo o lado, em eterna campanha. Neste último ano, então, tínhamos direito a doses avantajadas com vários ministros, secretários de Estado e, claro, a dupla Pedro & Paulo.

E as televisões e rádios sempre presentes em todo lado porque a máquina de comunicação do anterior Governo funcionava na perfeição.

E governar que era aquela coisa para a qual foram eleitos e eram pagos? Nada. O Governo devia estar em piloto automático. Depois admiram-se que o Portugal2020 não avançasse; que o problema do Banif ficasse pendurado; que as últimas privatizações tivessem sido feitas a correr e atabalhoadamente; que os diplomas não apresentassem regulamentação; que algumas leis parecessem ter sido feitas por extraterrestres…

Veio-me esta ideia agora à cabeça porque com o actual Governo passa-se exactamente o contrário: quase não se ouve nem vê um membro do Governo. Onde é que eles andam? Talvez a fazer o que se espera deles, a trabalhar, que a situação não está para passeios!

Todavia, considero que seria útil que o Governo não descuidasse a comunicação para que o espaço na comunicação social não seja só deixado a bocas, boatos e análises. A fonte directa é muito importante.

A condenação (exemplar) de Narciso

José Carlos Pereira, 04.12.15

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Narciso Miranda foi condenado em primeira instância e anunciou que vai recorrer. Mais do que analisar o caso em si e a conduta do antigo autarca de Matosinhos, este episódio permite relevar as divergências entre a Lei e a realidade concreta das candidaturas independentes às autarquias locais.

Os movimentos ditos independentes nunca deixaram de ser um mero instrumento à disposição dos respectivos candidatos, chamassem-se eles Narciso, Valentim, Isaltino ou Avelino. Foram, na prática, movimentos unipessoais em que a estrutura, a logística e as finanças dependeram, em cada momento, da vontade e da decisão do candidato. Alguém duvida que era assim? Alguém pensa que os estatutos “beneficentes” desses movimentos foram cumpridos? E que as receitas apuradas reverteram em prol dos propósitos estatutários desses movimentos? Pode haver uma ou outra excepção no país, mas na esmagadora maioria dos casos os movimentos e os candidatos deram a volta, por completo, à legislação que  enquadrou as respectivas candidaturas.

Aí está uma boa matéria para o novo parlamento tratar, sem pressas, a tempo das eleições autárquicas de 2017.

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