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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Au bonheur des dames 441

d'oliveira, 26.12.17

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Febeapá que assola Portugal 2

(em memória de Stanislaw Ponte Preta)

2º exemplo o Sr. Carlos, e a Autoeuropa

mcr (Dez 2017)

 

O Sr. Arménio Carlos mandante do sindicato que anda a pôr em risco novos empregos na Autoeuropa (se é que não põe em risco a permanência desta cá...) produziu um artigo no “Público” onde, para além das consabidas tomadas de posição sobre o conflito que opõe a empresa e os trabalhadores (ou a CT e os trabalhadores, ou alguns trabalhadores) e que se não referem por serem mais que conhecidas as razões que levam as correias de transmissão do PC a entrar em guerra com a herança de uma CT que foi durante anos um feudo do BE. (Ou seja, o PCP violentamente derrotado nas últimas autárquicas tenta a todo o vapor mostrar que ainda morde no campo sindical e, ao mesmo tempo “descolar” do Governo actual de que foi um dos mais esforçados obreiros depois da derrota do PS frente à Direita. Agora que paira a ameaça de uma eventual maioria absoluta, eis que as tropas de choque do PC saem para a rua entrincheiradas nos habituais bastiões).

DE tudo o que o Sr. Arménio Carlos diz, salva-se, pela originalidade, uma proposta feita mesmo no fim do texto e que é a seguinte, e cito: “é altura do Governo português assegurar as condições necessárias junto da multinacional para que a Autoeuropa seja parte integrante desta nova fase da estratégia produtiva da VW (“substituição de uma parte da produção dos carros com motor a combustão por viaturas com motor eléctrico”... sic).

Poder-se-ia questionar a oportunidade desta proposta conhecida que é a actual conflitualidade na empresa.

O Governo português anda atarantado com esta péssima guerra que estalou na pior altura dados os compromissos com o fabrico do T Roc. A empresa já avisou que o horário será o que indicou e tudo parece levar a crer que a Administração da Autoeuropa dificilmente mudará de opinião. Para já, está suspensa a contratação de 500 trabalhadores o que, aliás, prova que a CGTP apenas defende os trabalhadores empregados e não pensa nos que se amontoam à porta da empregabilidade, sejam desempregados sejam jovens à procura de primeiro emprego.

Não compete ao Governo andar a esmiuçar nesta questão da transição dos motores e, no caso em apreço, na política da VW. Para já, trata-se de salvar o que há e que está estupidamente ameaçado. O Sr. Carlos deveria passar pela Alemanha e falar com os seus colega alemães da VW e da poderosa central sindical a que pertencem. Claro que não o fará que aquela gente leva a sério os interesses da comunidade laboral no seu todo e, desde sempre renegou os princípios da IIIª Internacional, fonte de sofrimento e miséria para todos os trabalhadores e esteio da política “Klasse gegen Klasse” que protegeu o nazismo e, mais tarde, nos dois primeiros anos de guerra, levou a URSS (patética pátria dos trabalhadores) a ajudar fortemente o esforço de guerra de Hitler. Carlos e os seus amigos, sempre saudosos desses gloriosos tempos bem como dos que se lhes seguiram com o seu cortejo de gulags e privações, vem agora chutar para canto com uma proposta a destempo que, aliás, endossa para o Governo e não para os seus apaniguados na Autoeuropa. De facto, porque é que os sindicatos afectos a Carlos não fazem, eles próprios, essa proposta e a atiram para um governo que, actualmente, o PC (de Carlos e de outros) apoda de burguês, conservador e quase reaccionário?

 

* a expressão febeapá criada por Stanislaw Ponte Preta, aliás Sérgio Porto, significou, em tempos de violenta ditadura brasileira, “Festival de besteira que assola o país”. Esses textos imorredoiros estão publicados pela editora Civilização Brasileira e foram editados nos anos 60 e 70 no Brasil

 

Au bonheur des dames 440

d'oliveira, 26.12.17

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Febeapá que assola Portugal

(em memória de Stanislau Ponte Preta)

1º exemplo: A Fitch e a Esquerda

mcr Dez de 2017

 

Como se sabe (e quem não saberia tal foi o foguetório delirante que o Governo soltou?) a agência de rating Fitch subiu o nível de Portugal para BBB, salto de dois graus que põe a dívida portuguesa a esperar juros mais baixos e tira o país do lixo.

A notícia, goste-se ou não das agências de rating (e eu não as estimo dê lá por onde der), é um forte alento para a Geringonça ou, melhor dizendo, para o governo do PS. E tem o resultado de se poder emitir dívida a juros menores para, eventualmente, substituir dívida com juros mais elevados. E os efeitos sentiram-se imediatamente, mesmo se a política despesista que este Governo mantém para contentar os seus apoiantes à esquerda continua. Não é o princípio da via triunfal mas é já o começo do fim do caminho das pedras para citar forçadamente Churchill.

Toda a gente se congratulou ou, melhor, todos menos os do PC e do BE. As declarações da Sr.ª Catarina Martins e do Sr. Jerónimo de Sousa seriam pasmosas e aberrantes não fosse saber-se que não passam de reacções de pânico. De facto, um PS escorado em bons resultados, com um ministro na presidência do Eurogrupo, aureolado pelos lucros do turismo e pelo reforço das exportações, representa um perigo medonho para os seus parceiros menores. É que tem cada vez mais hipóteses de ganhar as legislativas que se aproximam com uma maioria absoluta. Ou pode preferir aliar-se a um renovado PPD, ou buscar apoio num CDS que lá vai fazendo o seu caminho amparado pela Sr.ª Cristas que cada vez consegue melhor imprensa e melhores opiniões.

Claro que muita água vai ainda passar debaixo da ponte mas um governo matreiro consegue nesta última etapa do seu percurso encostar os aliados às cordas tanto mais que tem sempre o argumento de ter cumprido escrupulosamente a sua parte nos acordos celebrados. E pode mesmo recordar aos portugueses que foram o PC e o BE que, numa ansia cega de derrotar a “reacção”, lhe estenderam o tapete vermelho e durante longos meses aquietaram a rua, os sindicatos, calaram os protestos sempre na mira de conseguir mais uma vitória.

É conhecida a frase “de vitória em vitória até à derrota final” e algum prenúncio dela ocorreu com as passadas autárquicas que só deu bónus ao PS e, em menor escala, ao CDS. O PC amargou dez Câmaras a menos e o BE não saiu da cepa torta. Foi, aliás, a partir daí que a “rua” se voltou a animar, com uma parada de greves e de ataques cada vez mais explícitos da banda da Esquerda.

Foi por isso que entenderam silenciar ou menosprezar a pequena (mas apesar de tudo simbólica) eleição de Centeno. Se, de facto, ela é sobretudo simpática, não menos verdade é que, para consumo interno, foi um enorme balão de oxigénio e isso mesmo foi entendido pela opinião pública, pelos media e pelo Sr. Presidente da República que hoje é uma espécie de oráculo. Mais: Centeno no Eurogrupo significa que a deriva despesista não ultrapassará os limites impostos pela Europa, entidade detestada quer pelo PC quer pelo BE como abundantemente já demonstraram.

Todavia, a questão da Fitch é mais grave para estes no-albaneses. Vir, como Jerónimo, afirmar que a Fitch não governa Portugal é uma burrice supina. Já se sabe que não governa. Nem quer. Nem é essa a sua missão. A Fitch apenas é um aconselhador de investimento internacional e se ela disser que Portugal (ou outro qualquer país) não presta, as condições de vida e a as finanças sofrem. Sofrem mesmo muito. Por muito que custe ao Sr. Sousa “as apreciações feitas pelas agências de notação” decidem muito em vez do nada que soltou na companhia do povo, claro, que nisto tudo apenas sofreu as consequências de notações más anteriores. Ninguém pretende que o dirigente do PC seja um génio financeiro (não o é de todo) mas ao menos que se aconselhe com quem sabe. No PC deve haver uma boa alma menos tola e com mais atenção ao real.

Vir, como o BE insinuou, afirmar “que não mudou absolutamente nada” e que deste género de agências “nunca vieram boas notícias” é puro autismo ou então endoidaram definitivamente.

Uma coisa é pensar que as agências de notação podem condicionar políticas e servir interesses de outrem. Não serei eu quem ponha as mãos no fogo por essa gente. Todavia, no estado actual das coisas, uma boa notação é sempre melhor que uma má. Dizer que uma gripe é igual a um cancro do pâncreas é sempre uma burrice que, sobretudo, não “pega” na opinião geral se é que sequer comove os adeptos mais fanáticos.

E seria tão fácil a Catarina e a Jerónimo desvalorizarem sem cair no ridículo a notação da Fitch. Quando a ideologia (e logo esta que deu abundantes provas ao longo do século XX) se substitui à razão e ao discernimento há que temer o pior. E recomendar uma camisa de forças para os que ignoram isto.  

*febeapá significa "festival de besteira que assola o país" e foi uma expressão cunhada por Sérgio Porto ("Stanislaw Ponte Preta" e deu título a alguns livros saídos no Brasil onde se atacavam os pofdres da ditadura brasileira e da sociedade em geral

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d'oliveira, 24.12.17

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 Andavamos pela internet  à procura de uma imagem de natal e saiu-nos esta que, pelo menos, é diferente, do usual. Aproveitámo-la por várias razões sendo a principal esta: mcr passou uns natais nos trópicos, longe da neve, do frio, do bacalhau, do peru e do bolo rei. 

Nestes dias de frio que se sucederam quase sem interrupção aos de calor e de floresta calcinada, de pessoas e bens perdidos, de animais sacrificados, de desleixo e desnorte de quem devia cuidar dos mais pobres, dos mais fracos, dos mais desprotegidos, de soberba e de indiferença de várias criaturas a que o simples cargo político que ocupavam deveria dar mais responsabilidade e obrigar a uma linguagem (para já não falar nas acções) mais cuidadosa, antes isto que um pai natal, um trenó, uns balões numa árvore.

Pudessemos nós e teríamos desenhado um presépio com um menino friorento, uma Senhora amargurada e sem um pai perdido nos fogos, com duas ovelhas "bordaleiras" com pele queimada, um cão com as patas enfaixadas e um burrinho faminto. E, por cercadura, arvores negras e nuas, terras calcinadas, ruínas fumegantes.

Mais longe, porém, uma caravana sem reis magos mas com gente, felizmente muita e boa gente, carregada com os primeiro auxílios, roupa, pão, máquinas, tijolos, cimento, o que fosse.

Que também isso foi este país, esta terra, "mãe pobre de gente pobre" como d'Oliveira citou no seu primeiro texto aqui publicado. 

O Natal, mais do que uma festa de família, é também uma festa de ausentes. Pais, avós, outros familiares, irmãos, raramente um filho, não terão o seu lugar à mesa da alegria. Mas serão recordados, pelo menos por alguns. Esperamos e queremos que, para lá da saudade, da nostalgia, da tristeza, da solidão, os lembrem com alegria. Os nossos mortos ligam-nos ao passado distante e lembram-nos que este é o momento de aproveitar  a noite. Antes que, de nós, também, já só haja uma tímida mas grata recordação.

Antes  que os meninos que, maravilhados, abrirão as suas prendas, sejam, também eles adultos a  olhar embevecidos para outros que no futuro virão.

E que todos, os de hoje, os de ontem e os de amanhã, à falta de ir pelos caminhos frios e escuros à missa do galo, possam nas casa quentes e iluminadas fazer votos por um mundo melhor, por um país melhor e por um povo mais solidário.

E para todos os que nos acompanham, aturam e lêem aqui ficam votos de Festas Felizes e de um Ano Novo melhor em tudo

d'Oliveira

mcr

* (mesmo não sendo  adeptos do Sr. Presidente da República não queremos deixar de saudar a iniciativa de ir passar o Natal com gente de Pedrogão. Honra Lhe seja. )

 

diário político 220

d'oliveira, 24.12.17

Duas cartas fartamente esclarecedoras

(d’Oliveira fecit 24-12-17)

Dois leitores do “Público”, entenderam opinar sobre os resultados das eleições catalãs. É um direito que ninguém, e muito menos eu, lhes retira.

Porém, no seu intenso amor pela Catalunha, dizem coisas que só a demência amorosa poderia justificar. Assim um senhor Mário Pires Miguel vem defender que nenhum país que luta pela independência tem a totalidade da população a seu lado. Mesmo que assim seja, conviria lembrar-lhe que, no caso em apreço, há uma região partida ao meio, coisa que torna muito problemática qualquer causa e bastante próxima a guerra civil. Depois, sempre na mesma onda afirma que “é da história que, para impedir os independentistas de serem dominantes, o poder central usa a emigração para esses territórios para criar forças oponentes à independência” (sic). Perante uma parvoíce deste tamanho qualquer simpatizante da Catalunha fugiria a sete pés. Então será que alguém está a ver os malvados “espanhóis” a empurrar dois milhões e meio de andaluzes, estremenhos, valencianos ou galegos para a “pátria” catalã, com o fito único de desbaratar os legítimos anseios da comunidade local? E que dizer das dezenas de milhares de catalães expatriados na Espanha madrasta? Foram enviados pela Generalitat para submeter a castelhanagem impura ou, pressentindo uma invasão espúria de metecos pobres, fugiram para não serem apanhados na guerra a vir? Mais: a “grande dinâmica da economia da Catalunha”(sic)foi construída por quem e, sobretudo à custa de quem? Ignorará Mário Pires Miguel, alegadamente morador na Catalunha e também ele emigrante (será que Portugal também pretende abichar com uma parte do território? Se assim for, eu gostaria que tomassem S Feliu de Guixols onde passei uns dias inolvidáveis e lúbricos) que a “emigração” na Catalunha (por exemplo o pai de Manuel Vasquez Montalban, galego e proletário)é toda ela ou quase de gente pobre que foi ali vender a sua força de trabalho e enriquecer sobretudo a poderosa burguesia catalã tão bem representada pelos Junqueras e pelos Puigmont na cadeia ou em parte incerta?

Finalmente este pobre Miguel remata que os comentadores “associados aos grandes interesses dos espanhóis” só estragam democracia. Ignorará a tonta criatura que ao falar de grandes interesses está certmente mais perto de interesses da indústria e do grande comércio catalães do que de quaisquer outros na península?

O segundo preopinante, Quintino da Silva de Paredes de Coura, esforçada mente que cita Confúcio e António Gedeão em meia dúzia de frases laboriosas, acha que há uma “chantagem exercida pelas empresas que saíram da Catalunha certamente em conluio com o Governo de Espanha”. E acha até que os votantes se estão “borrifando” para tão indecoroso acto.

As empresas saídas passam já dos três milhares e, apesar de apenas terem transferido as suas sedes sociais, já vão custar uns milhões ao erário da autonomia. Se de todo saírem isso traduzir-se-ia em dezenas ou centenas de milhares de empregos. Se lhes juntarmos a não entrada no mercado europeu como existe nas actuais circunstâncias, logo veremos que a coisa fia fino. E fia tanto mais fino quanto já se sabe que o turismo baixou, que o desemprego já aumentou e que tudo isso já começa a ter reflexos. E eles até já são mensuráveis pela simples comparação dos assentos parlamentares. Do anterior para este parlamento não foi só o PP que perdeu lugares. Foram também os independentistas cuja maioria se tornou mais escassa e mais, muito mais, dependente de alianças cada vez mais estranhas e menos sólidas. Se é que conseguem formar um governo fiável e duradouro, conhecidas que são as divisões entre os dois partidos mais fortes.

Não sei se o Público ao publicar estas duas cartas quis algo mais do que mostrar o ridículo de certos catalanistas e, assim, dar uma mãozinha a Rajoy. Espanta-me, ainda que moderadamente, que sobre esta questão não tenha havido uma, ao menos uma, opinião mais pensada e menos estouvada (uso este adjectivo para não maltratar mais os opinantes. A simples citação das suas frases chega e sobra para os avaliar.

Au bonheur des dames 439

d'oliveira, 24.12.17

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Caro Manuel, estás equivocado

mcr 2.12.17

 

Li com atenção o teu texto “Catalunha, uns séculos depois” onde, por estranho que pareça, defendes a surpreendente tese histórica de que o Conde Duque de Olivares foi derrotado pelos votos dos actuais catalães. Pelos vistos, entendes que a erroneamente apelidada “secessão catalã” era uma guerra idêntica à portuguesa (Restauração) e à holandesa (independência). Ora a verdade verdadeira é que a Catalunha não passava de um peão de brega da política de Richelieu toda focada no enfraquecimento dos Habsburgo. Tudo começou com a invasão do Rossilhão pelos franceses e, seguidamente, da própria Catalunha actual. As tropas espanholas enviadas para conter os franceses (e nelas se deveria incluir um exército português) entraram no território catalão com a mesma brutalidade dos franceses.

É verdade que Olivares defendia uma política centralizadora (tal como também Richelieu e depois Mazarin defenderam para a França...) que acabava com incongruências de todo o tipo dentro dos territórios da coroa espanhola. Nem todas as reformas do Conde Duque eram más e isso facilmente se comprova pela resistência com que se deparou principalmente por parte da Igreja e da grande nobreza, ciosas dos seus privilégios que eram muitos e debilitavam profundamente o país, envolvido em guerras contra quase todas as potências europeias.

Pelos vistos, não perdoas ao último grande valido do último rei filipino de Portugal o facto de este ter tentado defender o que era seguramente o interesse legítimo do seu soberano (Filipe IV de Espanha, III de Portugal).

Aliás, a tua obra sobre o Prior do Crato já indiciava que os “Filipes”, nomeadamente o I de Portugal não eram da tua simpatia. Todavia, convém lembrar que ele era o mais legítimo pretendente ao trono português depois do alucinado Sebastião, um tonto e um péssimo rei, se ter perdido nas areias de Alcácer Quibir, arrastando na sua estúpida morte o melhor da nação portuguesa.

O teu António, prior, poderá parecer (mas não é nem nunca poderia ser) um paladino da liberdade portuguesa, com muito ou pouco (e foi bem pouco) povo ao seu lado. Se é verdade que Filipe afirmou que conquistara e comprara o Reino também não e menos verdade que dizia que o herdara. E herdara-o depois de, em vão, ter tentado que o inconsciente primo não se metesse na aventura africana. Acresce que Portugal se manteve como reino numa monarquia dual e foi sempre governado por portugueses fieis ao Rei. E que Filipe tentou e, em certa medida, conseguiu desenvolver Portugal. Contra ele, apenas podemos apontar a funesta perda da nossa Esquadra destruída mais pela tempestade do que pelos ingleses.

A História é o que é e não poderemos imaginar como seria sob a coroa de Sebastião salvo de África, António ou algum descendente de qualquer deles. Teríamos evitado a perda Ceilão, a ocupação de parte do Brasil, a ocupação de Luanda, a permanente guerra de corso e de piratas fomentada por franceses, ingleses e holandeses em todas as nossas rotas comerciais?

Transpor rancores antigos para a Europa do sec. XXI, tentar ver a sombra medonha de Franco em Rajoy ou exaltar na Catalunha (partida ao meio mais pelo populismo do que pela Razão e pela causa do Progresso e da Liberdade) alguma insólita lembrança da “frente popular republicana” espanhola parece-me pelo menos insólito.

Ver na caótica frente independentista algo de futuro, quando tudo o que se disse a favor da separação tresandava a mentira (a pobre Catalunha “colónia” de Espanha; o apoio da Europa reduzido aos Vivas de um partido fascistóide flamengo, uma história que nunca existiu, um progressismo que a própria natureza política dos adeptos de Puigmont e da Esquerra desmente, para já não falar na contínua negação dos perigos de uma deslocação – que se verifica e poderá mesmo aumentar- das empresas para o resto do país) parece cegueira “anti-castelhana” sobretudo se soubermos que não são as autonomias do centro que mais atacam as reivindicações catalãs.

Citar Rubalcaba, defenestrado e episódico líder do PSOE, quando se sabe que os socialistas espanhóis são tão ou mais “constitucionalistas” que os “populares”, e omitir dezenas de outros dirigentes do mesmo partido que se têm continuamente pronunciado no mesmíssimo “El País”, não é de boa guerra.

Finalmente, parece que achas que o Governo (como todos os outros da UE) e o Presidente da República se “colaram” à Constituição espanhola, como se esta fosse a da Coreia do Norte, e a Rajoy é definitivamente um forte engano. Rajoy é um (episódico) Chefe do Governo actual mas legitimado nas urnas e por duas vezes. Toda a Europa – e muito bem – se pronunciou sobre esta questão. Negar a toda esta gente, ou só aos dirigentes portugueses, uma opção é negares a Ti próprio o direito de deles discordares.

Francamente, Manuel, francamente...

*o artigo de MA foi publicado na p.4 do “Público” na edição de 23 de Dezembro, p.p..

**na gravura "els segadors"   

Au bonheur des dames 438

d'oliveira, 19.12.17

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Lá ganhei um almoço

 

Há uns meses (ou anos?) quando começou um julgamento em que se discutia a violência de género, apostei 3 jantares contra um simples almoço em como o acusado se safava. Tempos depois, outro julgamento com os mesmos intervenientes terminava com uma pesada pena (apesar de suspensa) ao mesmo agressor.

“Vês?”, diziam-me os outros apostadores, “isto nem sempre é como dizes”.

“Esperem-lhe pela volta...” respondi intranquilo não tanto por poder perder a aposta mas por me parecer que os nossos juízes começavam a perceber o mundo em que se movem. E isso, essa audaciosa capacidade de ser sábios, ser justos e ser intolerantes com o mal, com os maus hábitos, com a tradição machista nacional parecia-me demasiado milagroso para ser verdadeiro.

Depois, veio aquela sentença em que uma mulher é atacada por dois cornudos cobardes, a saber um ex-marido e um ex-amante e ouve um juiz (aliás, dois) da Relação dizerem que o adultério (que no caso nem sequer existiu factual e verdadeiramente) é a oitava (e a mais grave e abominável) praga do Egipto.

Nessa sentença notava-se algo de odioso e odiento que ultrapassava inclusive a ignorância da Bíblia e o facto de leis citadas estarem há muito no caixote do lixo da História e da Justiça.

Agora, num segundo julgamento com os mesmos agredida e agressor eis que este, como eu, amarguradamente prevenia, o réu é mandado em paz e a ofendida é menosprezada.

Este julgamento começara mal para não dizer vergonhosamente caricato. Enquanto o réu era respeitosamente tratado por “Senhor Professor”, a vítima tinha direito a um “Bárbara”. Bárbara, como “Bárbara a escrava, sem direito sequer a ser antecedida por “senhora dona”, “dona”, enfim “cidadã”. A meritíssima juíza veio defender-se alegando que até a tratara por “querida”. Na altura, ergueu-se um coro de vozes incluindo a da Associação de Mulheres Juristas, protestando contra o que consideravam como um tratamento profundamente desigual. Houve mesmo um pedido de afastamento da juíza mas, como de (péssimo) costume, não foi atendido por quem de direito. Pelos vistos, entre um senhor professor e uma qualquer bárbara não se percebem diferenças de tratamento.

A sentença deste triste caso não honra a Justiça nem com letra grande nem pequena.

Vejamos. Parece que uma mulher “destemida”, deveria ter desandado porta fora logo ao primeiro conflito, sem curar de saber como poderia defender os filhos. Também parece que a ofendida Bárbara, quando mudou de residência deveria ter ido para léguas de distancia e não para uma casa a algumas centenas de metros da de Carrilho (mais uma vez a juíza verifica que Bárbara é destemida. Mesmo se, numa cidade sujeita a uma forte pressão imobiliária já seja difícil arranjar casa não demasiado longe do meio ambiental em que os filhos foram criado s e que conhecem...)

A opinosa e meritíssima juíza também entende que as mulheres agredidas devem ir imediatamente ao Instituto de Medicina Legal não bastando fotografias de equimoses. Pelos vistos, a meritíssima juíza, desconhece que a avassaladora maioria das mulheres vítimas de violência doméstica desconhecem esse passo. Mesmo as mais cultas e educadas como todos os dias se constata nos constantes relatos de violência de género.

A mesma meritíssima juíza entende que o “senhor professor” é uma “pessoa perfeitamente integrada na sociedade” querido por todos (ou quase) que só tem posturas agressivas no “contexto do conflito” com a ex mulher e apenas “contra um grupo de pessoas circunscrito”.

Para a história:

Carrilho foi condenado (há recurso) por acusar o padrasto de Bárbara por tentativa de violação.

Foi condenado a pagar a um ex-namorado de BG uma forte quantia (50.000+15000 euros)

Foi condenado por um crime de difamação (800+3000 euros)

Foi condenado por ameaça agravada a um amigo da mulher (1800+2500 euros)

Agrediu em pleno tribunal o pedo-psiquiatra Pedro Strecht

 

Foa este brilhante percurso de entusiásticas demonstrações de carinho, respeito e consideração por outrem, Carrilho distinguiu-se ao longo de uma breve vida pública por se envolver em rancorosas polémicas com um punhado de intelectuais que iam de Vasco Graça Moura a Manuel Alegre ou Artur Santos Silva. Cheguei a dizer a este último que os disparatados e verrinosos ataques de Carrilho eram uma bênção. Depois de atacar Alegre e VGM estes ganharam vários prémios prestigiosos, pelo que Artur, mais cedo ou mais tarde. veria a sua boa fama aumentar: meu dito e meu feito: foi eleito Presidente da Gulbenkian. Dir-se-ia que Carrilho sofre de uma espécie anómala do mal de Midas: onde a sua pena empeçonhada à Padre Agostinho de Macedo toca, a vítima alevanta-se grandiosa e mais célebre e respeitada.

Parece que, em julgamento, uma testemunha (por mero acaso, irmã de um colega de Carrilho)afirmou que este até se tentara suicidar e estivera tempos a fio com uma depressão profunda. Entretanto, Bárbara passeava um novo amor...

Do meu longo, e aliás benéfico, convívio com mulheres fiquei com uma forte suspeita: elas só não apreciam mulheres que o vulgo considera “bonitas”, “belas”, “a rebentar de boas”(Desculpem a vulgaridade que é altamente impressiva), enfim mulheres que dão nas vistas sobretudo no público masculino. Cultas ou ignorantes, educadas ou analfabetas, bonitas ou feias, quase todas ou, pelo menos, muitas olhavam de viés as afortunadas em dotes físicos (esta passagem teve o aval de três amigas a quem submeti o texto para saber se não era apenas um exercício de marialvismo. Sai pois, com o beneplácito delas o que se não diminui uma minha eventual culpa, prova que ela se deve mais à ingenuidade do escriba do que à má fé).

Sou um vago, cada vez mais vago, jurista. Escrevi aqui mesmo dezenas de textos contra a violência de género e contra as ainda fortes desigualdades entre sexos. Por isso mesmo, suporto cada vez menos, as sentenças que, de um modo ou de outro, vão buscar as suas raízes mais profundas e subtis a uma cultura tradicional em que a mulher, como filha de Eva, é tudo menos a igual do homem.

Esta sentença é tão má quanto aqueloutra a que já aludi em que dois juízes da Relação mandavam em boa paz dois agressores cornudos e cobardes conluiados. Esses dois magistrados já estão com um processo às costas, mesmo se três ou quatro gatos pingados tenham acorrido em sua defesa.

Esperemos que a Relação desta vez não aceite sem mais o ditame da juíza. 

* na gravura: Daumier 

diário político 219

d'oliveira, 14.12.17

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This land is (also) my land

d’Oliveira fecit 14.12.17

 

Sou um feliz e atento espectador do “The late night show” que passa na SIC radical todas as noites cerca das nove horas. E sou-o não só pelo animador, Stephen Colbert, um actor e apresentador ímpar mas também porque essa é uma das melhores trincheiras anti Trump tanto mais que nunca caiu na esparrela de dizer ámen a tudo o que a senadora Clinton dizia.

Desde há semanas que Colbert, que não perde uma única ocasião para alfinetar o actual Presidente, atacava o ex-juiz Roy Moore candidato ao Senado e denunciado predador sexual (a criatura terá mesmo afirmado que nunca saíra com uma rapariga sem pedir autorização à mãe dela!) porta-voz dos ultramontanos evangélicos e de tudo o que me repugna na América.

Trump, como de costume, entendeu apoiar Moore afirmando que este faria coisas maravilhosas no Senado e votaria com ele (Trump) sempre.

O Alabama é um Estado do Sul, pertenceu aos Confederados e notabilizou-se pela perseguição intensa à minoria negra. Vota sempre (ou quase) à direita e tudo parecia correr bem a Moore, mesmo se a criatura tivesse cada vez mais críticos (mesmo no campo republicano). Todavia, desta feita, os resultados da eleição constituíram uma agradável surpresa:moore foi derrotado por um quase desconhecido candidato democrata. Estará a América a mudar ou isto é apenas um resultado da actual campanha de denúncia dos predadores sexuais. Como se sabe (e saber-se-á ainda mais e nem sempre melhor) agora os Estados Unidos são percorridos por um furacão de denúncias de assédio sexual. Tudo começou em Holywwod no meio do cinema, passou rapidamente ao campo das modelos e atingiu fortemente a política. Já não se contam os políticos que tiveram de se afastar de campanhas, quando não foi do Congresso, do Senado ou de governos e instituições estaduais. Trump, ele próprio tem sido alvo de acusações do mesmo tipo, estribadas é certo em gravações dele mesmo a declarar o que faz(ia) com algumas mulheres que encontra(va). Longe estamos dos tempos de Clinton que, aliás, para afastar as críticas bombardeava o Iraque.

Pessoalmente, preferiria que, a ser alvo de um impeachment, o fosse por manobras e conluios com a Rússia. Apesar de tudo a coisa é mais grave e mais importante por muito que isso custe ao feminismo mais exaltado.

Claro que uma andorinha não faz a primavera e um lugar a menos no Senado ainda não chega. Trump, por muito surpreendente que isso pareça, mantém intactas as suas bases populares nomeadamente entre os brancos pobres, as mulheres e mesmo as minorias étnicas. Mesmo com uma taxa de popularidade baixa e em queda, a geografia eleitoral americana poderia, se houvesse eleições hoje, dar-lhe a maioria dos mandatos mesmo se o total de votos pudesse ser ainda pior do que foi na eleição passada.

De todo o modo, há pequenas alegrias e os comentadores pacientes tiveram ontem um pequeno presente no sapatinho. Uma derrota é sempre uma derrota e saber que Trump se estrampalhou é uma notícia jubilosa. Generosamente, passo-a aos leitores menos atentos.

* estrampalhar: estragar (calão de Buarcos, terra de palavras fortes e sugestivas) 

 

Au bonheur des dames 437

mcr, 13.12.17

Raro? Nem tanto, assim

 

mcr 12/13 Dez 2017

 

Subitamente, uma reportagem televisiva (TVI) alvoroçou os portugueses.

Alvoroçou e perturbou por razões várias que a seguir se exporão.

Parece que a associação “Raríssimas”, uma IPSS (Instituição Privada de Solidariedade Social) funcionava de forma altamente surpreendente. Não negando o interesse (e eventualmente a obra realizada) parece que tinha uma presidente que era generosamente abonada pelos seus serviços: um ordenado de 3.000 euros, ajudas de custo que iam quase até aos 2.000 sem falar de um fundo abonado para aposentação no valor de 800 euros mensais.

No meio disto tudo ainda constavam umas despesas extravagantes (gambas, vestidos, spa, etc...)

Comecemos, porém, pelo ordenado da senhora em causa. Nas IPSS o máximo admissível ronda os 1650 euros ou seja praticamente metade do que a dirigente percebia. Isto não contando os outros pagamentos que, nas minhas contas andam entre 2000 e 2800 euros mensais.

Também, parece certo que a generosa presidente da Raríssimas empregava na instituição familiares directos (pelo menos um marido e um filho) desconhecendo-se quais as competências destes.

Como vai sendo costume no “torrãozinho de açúcar” a instituição convidava políticos de todos os bordos para os órgãos sociais (até o actual ministro Vieira da Silva foi, durante dois ou três anos vice-presidente da Assembleia Geral. A título gratuito, assegura ele coisa de que não duvidamos. Sem saber como a casa era gerida, o que se aceita com alguma dificuldade. A mulher do ministro foi a Agrenska (Suécia) como participante num congresso ou colóquio em 1916 sendo o pagamento da viajem adiantado pela Raríssimas que depois terá sido ressarcida pela organização do evento. Desconhece-se se a senhora dr.ª Sónia Fertuzinhos teria especiais conhecimentos para intervir sendo certo que não é uma especialista em saúde. Aliás, convém lembrar à sr.ª deputada que esta viajem decorreu na altura em que o marido era ministro da tutela e só isso a deveria ter feito pensar duas vezes. Mas, mesmo com singular esforço, acredita-se na ingenuidade da conhecida política. Políticos ingénuos não faltam por aí, mesmo se, na generalidade o grau de ingenuidade não vá tão longe)

A mulher do antigo Presidente da República terá sido madrinha da Associação. De todo o modo, a sr.ª Cavaco Silva deve ter apadrinhado dezenas ou centenas de organizações semelhantes. As primeiras damas adoram esse eminente serviço patriótico e social e não falham uma oportunidade para demonstrarem o seu acrisoladoo amor pelos desprotegidos. O combate feminista para aqui: em sendo primeiras damas estas abnegadas criaturas dedicam-se à caridade ou às artes e letras, ainda que em circuito limitado e desinteressante.

Há um senhor Secretário de Estado que colaborou antes de se governamentalizar com a instituição. Recebia uns pingues 3.000 euros mensais pelo trabalho de consultor. Ignora-se em que o robusto talento deste melhorou a Raríssimas mas não se duvida que deverá ter deixado um rasto forte.

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(razões de vária ordem, interromperam aqui o folhetim que se retoma 24 horas depois)

O aludido Secretário de Estado já não é. Que desperdício! O Sr. Ministro tropeça nas cada vez mais patéticas explicações sobre a sua inacção. Sabe-se agora que as denúncias foram periodicamente enviadas ao Ministério desde Agosto. Devem ter-se perdido no correio ou nalguma gaveta traiçoeira do Ministério: aquilo é tão grande...

Também se compreende (se é que compreender é o verbo adequado) cada vez menos a excursão da amantíssima esposa do Ministro à Suécia.

Fossem estes tempos os de Passos Coelho e já o estrondo protestário teria ululado por todo o país e regiões autónomas. Isto porque já não há colónias senão até de Timor chegariam patrióticos e indignados protestos.

A coisa está tão negra mesmo se tudo se passe sob a imposta surdina da “geringonça” que o próprio PS quer o Ministro no Parlamento!...

Vê-se que os tempos são diferentes e as indignações mais do que moderadas.

De todo o modo, convém relembrar aos mais distraídos duas ou três verdades. A primeira é que sem IPSS o país estaria muito, medonhamente, pior. A segunda é que uma IPSS é algo que fica bem no botão da lapela de um político. A terceira é que em milhares de IPSS milagre seria se, volta e meia, não houvesse escândalo.

Eu próprio acabei a minha carreira na Segurança Social com uma intervenção numa Misericórdia entregue a um Provedor manhoso que a sangrara até ao tutano. Disso haverá um pequeno eco nos primeiros tempos deste blog e, sobretudo nos jornais locais e nacionais da altura. Hoje em dia, confesso que me diverti, mas não deixo de reconhecer que durante três meses enfrentei toda a espécie de dificuldades, faltaram-me apoios e foi preciso algum, bastante, sangue frio para que a minha pequena equipa (uma técnica social, um jurista e uma economista) ganhasse aquela guerra.

(Na semana posterior à nossa vitória, a Câmara Municipal, uma empresa local e um benemérito também local entregaram-me quase três mil contos para recomeçar quase do zero a tarefa para que a Misericórdia fora fundada.

 

Este folhetim vai dedicado à memória do dr. Sílvio Matos, amigo desde Coimbra, meu subordinado durante anos e devotado colaborador nesta campanha que ele abraçou com entusiasmo, abnegação e muita competência.

Não refiro a restante equipa para lhe evitar problemas idênticos aos que, depois, tive com alguns dirigentes da Segurança Social. Há gente que não suporta o sucesso dos outros.  

 

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