Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Au bonheur des dames 409

d'oliveira, 29.08.19

Unknown.jpeg

Coincidências, demasiadas coincidências....

mcr 29.Ago.19

 

O Ministério Público terá anunciado que iria requerer a dissolução do Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas por, na sua Assembleia Constituinte, ter participado uma pessoa que “não é trabalhador por conta de outrem”.

Vale a pena relembrar que o Sindicato está prestes a fazer um ano, que os seus Estatutos foram aprovados por todas as entidades competentes e que, até hoje, tem funcionado sem que a sua legitimidade tenha sido minimamente posta em causa.

Duas greves depois, várias violações governamentais e patronais da lei da greve depois, muito barulho, pouca razão e a brutal constatação de que de facto o salário real (o que conta para efeitos de subsídio de doença e de reforma) é uma vergonha e uma afronta, eis que agora, frente à ameaça de uma nova greve (desta feita ao trabalho extraordinário) marcada para daqui a um par de semanas, é tirada da cartola anti-sindical mais outra repolhuda lebre: o sindicato é ilegal, não está conforme às leis em vigor e padece de vício absoluto pelo que só a sua dissolução pode trazer ao país, ao patronato e ao Governo a tranquilidade necessária e a paz social.

(vá lá que ainda não foi desta que se cercaram os grevistas e se ameaçou liquidar essaescumalha a tiro de canhão ou se prendeu toda essa multidão indisciplinada e se conduziu o bando para os porões dos navios de guerra estacionados no Tejo como em tempos d saudosa e democrática 1ª República ocorreu. O dr Salazar e a sua gente levavam a coisa com mais cuidado: iam prendendo pela madrugada, à hora do leiteiro, os mal pensantes, arreavam-lhes forte e feio, extorquiam as normais condfissões de pertencerem ao partido bolchevista e punham-nos a bom recato numa cadeia por uns anos. Outros tempos, pelos vistos saudosos...)

Desconheço quantas pessoas estariam na Assembleia Constituinte do Sindicato mas, pelos relatos e pelos documentos fotográficos existentes, havia ali gente que chegasse para criar um, dois talvez mesmo três sindicatos. Estar lá ou não alguém exterior ao universo de trabalhadores por conta de outrem só tiraria sentido à reunião se esse ET ou  o seu voto, ou a sua assinatura. fossem essenciais para o acto constitutivo.

Questão mais complexa será a de saber se na Direcção do sindicato cabem membros que não pertençam à profissão protegida. Que isto não é líquido basta o facto de ninguém (Ministério Público incluído – que, aliás, já se tinha pronunciado sobre outras questões legais mormente as relacionadas com a absurda requisição civil preventiva) ter questionado durante todo este empo a presença subversiva e perturbante de um agente do anti sindicalismo e da Constituição da República Portuguesa. Todavia, a presença tão tardiamente constatada dessa alma penada saída do 9º círculo do Inferno de Dante adquire agora o estatuto de ameaça que se atribuía – em vida – ao senhor Bin Laden.

(nota à margem: o mesmo Ministério Público ou o seu Conselho Consultivo demorou um dia para decidir da bondade da aplicação da requisição civil preventiva e já leva um larguíssimo par de semanas para saber se os os negócios de familiares de ministros com o Estado estão ou não dentro da lei... Por este caminho se parecer houver ele só aparecerá depois das eleições. E, mesmo nesse caso, das duas uma: ou é homologado e produz algum efeito ou nem isso. A homologação depende do 1º Ministro de um Governo que, pela voz de vários dos ministros e apoiantes tem qualificado a lei de absurda...)

Sobre a momentosa questão de saber se na Direcção de um sindicato, ou de qualquer outra estrutura sindical, regional ou nacional, pode estar alguém que na prática esteja por completo desligado da actividade, lembraria que são às dúzias, aos quarteirões, os sindicatos representados por sindicalistas cujo único emprego conhecido nos últimos, cinco, dez, vinte anos é o de dirigente sindical. A burocracia sindical das duas grandes confederações existentes está cheia deles e nunca vi alguém questionar estes, de facto, ex-trabalhadores que algumas vezes tem mais anos de actividade sindical do que de trabalho por conta de outrem.

Mas este é um território minado. Quero com isto dizer que, nos tristes tempos que correm, há operários bons e sindicatos bons e operários perversos e sindicatos malignos que só querem o mal de Portugal e dos Portugueses. As organizações patronais acarinham os primeiros, celebram acordos com eles (magros acordos, está bem de ver, mas acordos) e arrepelam-se à simples ideia de se sentarem à mesa com os díscolos, sejam eles enfermeiros, estivadores ou camionistas que transportam matérias perigosas.

Claro que isto não ocorre só no “torrãozinho de açúcar” pastoreado por Costa. Em França a história sindical está pejada de “sindicats-maison” e, muito recentemente nos Estados Unidos, uma empresa de capitais chineses que reergueu das ruínas uma fábrica de componentes auto numa das antigas capitais do automóvel já avisou os seus trabalhadores americanos que não permitirá a “entrada do sindicato”. O senhor Trump, tão defensor da America great again e tão crítico da Chin, está, neste capítulo, mais calado que uma ostra melancólica...

Não me vou atrever a afirmar que no cerne disto tudo está a figura baça do dr. Pardal Henriques que se tornou o espantalho de toda a boa consciência nacional. A criatura não me suscita qualquer espécie de simpatia mas incomoda-me pouco. Todavia, para certos tenores pífios da comunicação social e do “Comentariado” político, o homem é o diabo reencarnado em advogado gordo e óculos. Até o dr. Marques Mendes o elegeu como o “pior da semana” num dos seus melífluos sermões dominicais. Eu bem sei que a opinião de Marques Mendes vale o que vale e influencia quem influencia e pesa o que pesa. (Não é “professor Marcelo” quem quer mas apenas quem pode e Mendes pode muito pouco. Nunca se deve comparar um açor com uma galinha pedrês com vontade de voar).

Eu, quando vejo tantos assanharem-se contra um simples mortal, mesmo gordinho, mesmo de óculos grossos, mesmo atrevidote, desconfio. Quando a sanha parece atingir as instituições que nos deviam proteger e defender, relembro a celebre frase “qui custodiet ipsos custodies?”, que, no caso, se poderia traduzir “quem nos guarda dos nossos guardas?” Estou à vontade neste capítulo porquanto, quando tudo e todos se atiravam ao Ministério Público, eu, por aqui, várias vezes, tomei a sua defesa. Lamento muito, mas agora, a coisa parece-me demasiado política, demasiado inquisitorial para aceitar sem mais este aviso de acção contra um sindicato. Como se isso pretendesse dizer que é na praça pública que estas questões se julgam e que deste princípio de acção já saiu, pelo menos para a opinião pública, a condenação de perverso sindicato e do seu advogado. Convenhamos que para calar 1800 motoristas num universo que engloba mais de 30.000 anda por aqui muito fogo à peça, muito obus, muita metralhadora e muita, mas muita, raiva...

Arre!

*a ilustração: o Inferno de Dante

au bonheur des dames 408

d'oliveira, 26.08.19

Unknown.jpeg

Ai Zeca o que te querem fazer!

( ou: nem depois de morto os vampiros te largam!)

mcr 26.08.19

 

Conheci o Zeca Afonso logo que cheguei à faculdade, ou seja há quase sessenta anos. Na altura ele ainda andava no fado de Coimbra mesmo se já fosse fazendo incursões na balada. Recordo o meu pai, “coimbrinha” assanhado, antigo elemento da “república” Penúria Constante, ex-orfeonista ex-jogador de andebol na AAC, fadista ocasional e poeta oficial do seu curso, maravilhado com a Balada do Outono. Por altura de umas férias de Verão passadas em Moçambique, houve uma reunião dos “antigos estudantes de Coimbra” associação a que o meu pai, a par do bridge, devotava o seu tempo livre e o seu carinho, e eis que ele garganteou, com a sua bela voz de tenor do orfeão académico de Coimbra, a balada. Nesse momento, percebi que a geração mais antiga acolhia o Zeca entre os seus.

Todavia, a primeira vez em que falei a sério com o Zeca foi quando ele mostrou, muito em segredo, a um comum amigo, Jaime Magalhães Lima, e a mim as letras de “Os Vampiros” e (se não erro) “Menino do Bairro Negro”. Quando se é jovem, as amizades surdem com facilidade sobretudo se a admiração as sustenta. A partir dessa altura (1962) passei a encontra-lo com frequência e, depois do regresso dele de Moçambique, fui um dos privilegiados (com António Mendes de Abreu e João Nazaré) a quem ele entregava cópias de canções com receio de as perder ou de não se lembrar das letras quando cantava em Coimbra. (Uma das vezes em que isso sucedeu foi justamente nos jardins da AAC em plena crise de 69 em que ele com a generosidade infinita que o caracterizava apareceu para animar a malta. O António e o João cantaram-lhe o “coro da primavera” e eu murmurava as palavras pois desafino a qualquer velocidade, mesmo entre o dó e o ré. E o Zeca, entusiasmado ia-se recordando e dizia –juro – “ó pá isto não é nada mau!” ) Os seus discos eram por mim (e por muitos mais) comprados logo no dia em que chegavam à Casa Neves (em Coimbra) mercê de um acordo feito com um dos empregados da loja. Havia sempre o risco de serem proibidos e apreendidos. O último encontro importante que tivemos foi quando, em nome da delegação da SEC no Porto, o recebi no Auditório Nacional Carlos Alberto. Foi a primeira vez que um cantor de intervenção actuou num palco nacional (Logo se seguiram outros, obviamente). E lembro como se fosse hoje, uma ácida pergunta de um “progressista” da mesma Secretaria de Estado: “E além de comunistas quem é que vocês convidam mais?”. Na época, mesmo entre os socialistas, havia gente, intelectuais incluídos, que não iam à bola com o Zeca. Não só era um cantor de esquerda, mas, sobretudo, era “popular”.

Agora, que está morto e enterrado, chovem os ditirambos e as ameaças de homenagens. A primeira e mais ridícula é a ideia peregrina de o amortalhar em Santa Engrácia, no Panteão. A família, no caso boa intérprete do pensamento do Zeca, recusa. Quem o conheceu bem, adivinha facilmente primeiro a gargalhada, depois a indignação perante tão insólito sepulcro.

A segunda questão prende-se com o seu fabuloso legado musical e poético. Parece que os “masters” das canções andam perdidos no meio do naufrágio da Movieplay, agora falida mas proprietária deles. O antigo Secretário de Estado Barreto Xavier sustenta, muito acertadamente, que não é preciso encontrar o objecto físico para classificar como património imaterial nacional esse riquíssimo acervo, testemunho exemplar de um tempo obscuro (pela parte que me toca, considero a obra pré-abril 74 muito mais interessante, muito mais inventiva e mais significativa do cancioneiro afonsino. É uma mera opinião, claro.

Portanto, enquanto não aparecerem os negregados masters há que classificar preventivamente a obra. Depois, logo se vê. Quanto à edição, uma nova edição dos seus discos (e ainda há por aí muitos exemplares das anteriores edições), há que precaver o pagamento de direitos e, sobretudo, não dar oportunidade aos vampiros e aos urubus que só querem lucro fácil mesmo que seja “á pala” de um ícone de que não poucos se aproveitaram.

A ver vamos se os burocratas da Ajuda percebem estas coisas tão simples...

E se os embalsamadores profissionais de glórias defuntas largam a ideia de depositarem os humanos restos mortais do cidadão Zeca Afonso naquela mastaba sinistra de Stª Engrácia e os deixam honradamente converter-se em pó no cemitério humilde onde agora está.

 

(nota à margem: surgiu recentemente um disco –livro com duas gravações inéditas de J A . Fiz parte dos que desde o primeiro momento o subscreveram, não pela valia artística da coisa que é (e sou bondoso) medíocre mas porque faço parte dos seus amigos e dos que guardam uma memória fresca e alegre dele. A recolha é fraquinha, não traz nenhuma novidade e o texto que a acompanha também nõ descobre a pólvora. Longo, chato e sem novidade. Felizmente a edição parece ser limitada o que significa que não irá afectar demasiados ouvintes. Sempre é uma triste consolação...)

(2ª nota ainda mais à margem: correu por aí a ideia de medalharem postumamente José Afonso! Credo! Jesus, Maria José! )

 

*a ilustração: capa do disco que contém a "Balada do Outono" que, a meu ver, marca, pelo menos do ponto de vista musical,  o novo rumo da canção de José Afonso. 

 

 

 

A greve que a direita adoptou

José Carlos Pereira, 20.08.19

Resultado de imagem para camião cisterna greve

Espera-se hoje pelo resultado das primeiras conversações mediadas pelo Governo entre a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (ANTRAM) e o Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP), na sequência da suspensão da greve por esta estrutura sindical no passado domingo. Ao fim de uma semana de greve, com custos elevados para o país, que aumentariam exponencialmente se a paragem continuasse, imperou o bom senso entre as partes, que aceitaram voltar a sentar-se à mesa para negociar condições salariais para...2021.

Muito se discutiu sobre quem ganhou e quem perdeu com a greve e com o final da mesma. Creio, no entanto, que o essencial neste momento é pacificar o sector e tranquilizar os portugueses, designadamente os sectores económicos dependentes do transporte rodoviário de mercadorias. Com a greve, todos ficámos a conhecer melhor as práticas laborais e os padrões remuneratórios vigentes e é claro que há muito a rectificar no sector, por muito que isso custe a patrões e trabalhadores. Os horários prolongados, que se tornaram habituais para aumentar o rendimento líquido, acabam por colocar em causa a segurança do transporte e travam a contratação de mais trabalhadores pelas empresas. A prática de vencimento base muito baixo, alavancado por subsídios e mais subsídios, resulta numa subtracção dos impostos devidos por ambas as partes, com prejuízos a jusante para os trabalhadores que se vêem perante a iminência da reforma ou de situações de baixa médica. A mediação do Governo deve ter presente todas estas questões.

Quanto à análise política sobre a forma como Governo, oposição e sindicatos enfrentaram a greve, é justo reconhecer aquilo que foi sendo mencionado pelos comentadores e analistas mais isentos: o Governo fez o que tinha a fazer. Depois do que se passara em Abril, aquando da primeira greve, o executivo não podia correr quaisquer riscos perante uma greve por tempo indeterminado. O mal está na dependência do país perante o transporte rodoviário de mercadorias e matérias perigosas, não está no plano que o Governo desenvolveu para evitar que Portugal ficasse refém de algumas centenas de motoristas. A fixação dos serviços mínimos, a requisição civil e o recurso a militares e agentes de autoridade mostrou um poder político interveniente e activo na defesa do interesse nacional, o que sossegou os portugueses.

A oposição com responsabilidades institucionais, de um modo geral, foi moderada nas suas apreciações à forma como o Governo actuou porque sabia que a forma de responder à greve não poderia ser muito diferente. Mesmo nos partidos mais à esquerda, após a federação sindical ligada à CGTP ter concluído o seu acordo com a ANTRAM, não havia razões para defender uma greve que, no final, já só era mantida pelo SNMMP, uma estrutura sindical independente que mais tem parecido estar ao serviço da estratégia de promoção pessoal do seu advogado e vice-presidente, Pardal Henriques, que aparentemente descobriu o púlpito certo para encetar uma carreira política no partido de Marinho Pinto.

Quem gostou mesmo da greve, quem se bateu por ela, criticando fortemente o Governo e até a "candura" dos partidos da oposição, foi a direita profunda, a direita inorgânica que não se revê no PSD nem no CDS, que se considera incompreendida pelo país e desconfia da capacidade de afirmação dos novos partidos de direita. Essa direita, que inclui por vezes alguns militantes do PSD e do CDS que nunca aceitaram a "geringonça" e verdadeiramente odeiam, é o termo, António Costa e a sua solução de Governo, combate nas redes sociais e em alguma imprensa, mas estão arredados do país real e das suas preocupações. Essa direita adoptou Pardal Henriques e o seu sindicato, mas mais uma vez não obteve ganho de causa.

Au bonheur des dames 407

d'oliveira, 14.08.19

Unknown.jpeg

A silly season lá vai ao tropeções

mcr 14.Ago.19

 

E a greve, idem. Agora, S.ª Ex.ª o Ministro do Ambiente, resolveu fazer doutrina laboral e sindical, a criatura tem, pelos vistos, um largo cabedal de conhecimentos. E disse que, em certos casos, provavelmente neste, os camionistas não podem ater-se ao horário normal de oito horas mas levá-lo até às onze, ou seja fazer 60 horas semanais! Vê-se que S:ª Ex.ª sabe o que é sentar-se ao volante de um camião pesado. Porventura porque senta ela própria o dito cujo nos cadeirões do ministério...

Nisto, parece estar de acordo com o homenzinho da ANTRAM que é mais papista do que o Papa e censura o Governo por não ser ainda mais autoritário. O indivíduo ataca o dr. Pardal Henriques sem perceber que aquele é o seu exacto retrato no espelho. Com a diferença, pequena mas importante de que um é, até prova em contrário, representante de trabalhadores e outro de patrões. Por mais que as coisas estejam diluídas, a luta de classes ainda mexe. E com patrões que impõem a famosa cláusula das duas horas extra diárias (que são sempre mais ao fim de contas) logo se vê quem explora e quem é explorado.

Até o PC que só acha que os únicos grevistas que não são instrumentalizados são os dos “seus” sindicatos (o resto é lumpen enganado por falsos profetas, basta ler o comunicado ou o dr. Domingos Lopes) entende que as coisas foram longe demais. E faz bem, o PC que para a próxima greve da sua gente bem pode recear outra requisição civil agora que o dr. Costa se habiruou e que a sua gente perdeu a vergonha.

Quanto à Direita bem se pode perguntar se alguém a viu ou se anda perdida nas brumas de Agosto, escondida nas areias algarvias, férias são férias, que diabo e no Twiter o pobre RR bem que tenta gracejar. Mas Rio nunca teve piada, o humor não é com ele e a gramática (ou o estilo literário) não o ajuda.

Mudemos de agulha. Agora uma dúzia de senhoras cantoras de ópera, todas mais relativamente desconhecidas umas que as outras, vem queixar-se de Plácido Domingo, cavalheiro com setenta e oito anos feitos e perfeitos. Pelos vistos há quarenta anos, mais dia menos dia, o tenor negociava o seu apoio a troco de uns favores sexuais que elas teráo rejeitado o que teve como consequência a falta de contratos e carreiras no limbo. Demoraram algum tempo a pôr a boca no trombone, mesmo se alguma queixa ainda vá até 2001...

Dantes, contava-se que muitas aspirantes a estrela tentavam um caminho menos duro e mais horizontal, oferecendo-se para ir para a cama de alguém influente a troco de um momento de glória ou de um contrato vantajoso. E citavam-se nomes, muitos nomes. Agora, é a vez das que sem atingirem a fama, atiram as culpas não para alguma eventual falta de talento mas para o apetite insaciável de ogres como Domingo. Porquê agora e não há dez, vinte, trinta anos quando o homem tinha real poder e poderia ser atacado. Nesta altura do campeonato o espanhol já quase não risca, está com os pés para a cova, o nome dele já nada diz às novas gerações.

O “me too” assume muitas vezes um certo toque de requentado e não precisa de provas. Basta uma declaração de uma “vítima” e eis que a “bem-pensância”, os politicamente correctos, os influentes do pret-a-penser na moda, todos juntos num místico casamento entre a hipocrisia e a virtude, saltem para a rua. Eu desconfio, desconfiei sempre, destes ajustes de contas tardios, sobretudo quando as notícias vm de meios onde a promiscuidade é generalizada.

Entretanto, uma notícia consoladora, ainda não foi desta que aquele fulaninho grosseiro e parlapatão que dá por Salvini, levou a água ao seu moinho. O homem é apenas uma caricatura deslavada de Benito Mussolini. Espero que acabe como ele já que não se lhe pode augurar a poética justiça de o ver desaparecer no mar cor de vinho. Arre que este mundo está horrendo. Entre os Putin, os Kim, os Trump, os Maduro, os Boris Johnson, o cavalheiro chinês, os Assad, os Erdogan e mais um largo par de personagens (nas Filipinas, no Brasil na Nicarágua ou na Guiné Equatorial), o planeta bem que está em risco. E em risco bem maior do que a invasão do plástico, o carbono triunfante, e o clima que perdeu a cabeça. Ao pé disto que vale uma greve de 2000 motoristas (800 de um sindicato e 1200 do outro)? Ou a mobilização de 12.000 agentes da autoridade (seis polícias para cada grevista (no caso de todos fazerem greve!) É obra!

* na estampa: rio poluído nas Filipinas

Estes dias que passam 331

d'oliveira, 10.08.19

Unknown.jpeg

Há aqui alguma coisa que não bate certo!

mcr 10.Ago.2019

 

Afinal quanto é que ganha um motorista que transporta matérias perigosas? Anda por aí uma informação que atira para os 1850 euros limpos o salário mensal desses profissionais. Será?

Ora vejamos como é que se chega a tal soma.

Salário base ........ € 600

diversos subsídios.... 400 (perigosidade -200; outros - 200)

ajudas de custo (contra factura ou recibo).... 850

Se assim é, e é assim, temos que para efeitos de subsídio de doença ou reforma o que conta é o salário base. O resto esvai-se com o fim da actividade.

Mas há mais: os miríficos 850 euros referentes a ajudas de custo (comidas e dormidas) são pagos contra recibo ou factura. É verdade que nisto anda genericamente muita marosca. Todos os que podem metem estas despesas para cálculo do IRS e similares. Vejo isso sempre que almoço ou janto com amigos que têm pequenas empresas. Mesmo se o encontro é a título meramente particular o meu almocinho junta-se ao deles para esse efeito nos impostos a pagar.

Mas há mais: essas ajudas de custos pagam-se a todos? E pagam-se dentro ou fora do país? É que uma coisa é almoçar num modesto restaurante cá e outra é fazer o mesmo em qualquer outro país. A mesma coisa ocorre com as dormidas.

E só a quem tem de comer ou dormir fora é que cabem estas abençoadas ajudas de custo ou há o hábito de as dar a todo e qualquer cavalheiro que pegue no volante do camião cisterna? Então para que servem s facturas ou os recibos exigidos?

O uso da soma de 1850 euros parece pois ser mais outra insidiosa arma de arremesso contra estes profissionais grevistas.

Em segundo lugar, sabe-se que para ser qualificado como motorista apto para este tipo de transportes há que fazer uma formação que dura no mínimo 150 horas (norma europeia) e que custa cerca de 700 euros. Quem paga esta formação? O condutor ou a empresa?

Mas, mais uma vez, ainda há mais: o Governo anuncia triunfante que deu uma formação a militares, polícias e guardas republicanos para substituir os eventuais grevistas. Pergunta ociosa: essa formação obedeceu às estrictas regras europeias?

O número de agentes da autoridade adiantado pelo Governo atinge as cinco centenas! Quinhentos? Quinhentos quando em todo o país ao longo de todos estes anos apenas há oitocentos detentores da tal formação?

Os sindicatos e a própria ANTRAM entendem que esta duvidosa e perigosa solução não deve ser utilizada. Sejam quais forem as razões, há a clara desconfiança e o evidente receio de que algo corra mal. Se assim for a quem atribuir as culpas? (a resposta mais óbvia será a de culpar os grevistas, claro mas parece duvidoso que alguém de bom senso a considere)

Uma terceira observação que atinge a argumentação do Governo, do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral e muita luminárias que a tem difundido:

Esta greve prejudica a população. Por isso deve ser limitada a quase nada através do reforço dos serviços mínimos, da requisição civil e da parafernália de argumentos que baseiam a declaração de cris energética

Peregrina opinião! Então as greves beneficiam alguém? Quais são as que não prejudicam ou os patrões (e essas quase só ocorrem no sector privado e são raras) ou a comunidade? Tomemos como exemplo as sempre louvadas greves dos transportes tão comuns que foram durante o anterior governo. Quando não há comboios, metropolitano e transporte rodoviários centenas de milhares de trabalhadores vem-se numa aflição: como chegar aos empregos à hora estipulada? O mesmo sucede com as greves dos transportes fluviais no que toca a Lisboa. Alguém viu os cavalheiros do PS, hoje governantes, a propor medidas eficazes para prevenir os efeitos de uma greve (capitaneada pela CGTP com a normal cumplicidade da UGT) que torna seus reféns os trabalhadores mais humildes e expulsos da cidade para os subúrbios cada vez mais distantes pela desenfreada corrida à especulação imobiliária que permite transformar bairros inteiros em hostels, quartos bnb e outras empresas de alojamento local ?

Então aqui já não há um claro ataque à comunidade, pelo menos a uma esmagadora parte dela, a mais pobre, a mais desfavorecida a mais dependente? Vi, ouvi, (ontem, sexta-feira) brevemente e enojado, um senhor professor de uma dessas múltiplas faculdades de Direito lisboetas a afirmar sem corar essa barbaridade. Uma coisa é a greve contra a comunidade (esta eventual dos motoristas) outra as boas e saudáveis greves que assolaram o país e trouxeram aos que as suportaram um rosário de dificuldades, aflição e sofrimento persistentes.

Eu não gosto do sr. dr. Pardal Henriques. Todavia, não culpo o sindicato por recorrer aos serviços dele. Ao fim e ao cabo, outros e mais poderosos sindicatos tem ao seu serviço poderosas organizações políticas e sindicais pejadas de juristas e com uma imprensa fiel às ordens.

Mas as organizações sindicais clássicas (e correias de transmissão de partidos políticos) são intocáveis. Pelo contrário, esta recente criação de dezenas de sindicatos que fogem a essa lógica político-sindical são olhadas com desconfiança e alvo de todo o género de ataques. Há que abatê-los depressa não vá o exemplo alastrar e mais e mais trabalhadores tomarem o seu destino nas suas mãos. É que em Portugal trabalhador só é aquele que tem o cartãozinho certo e que corresponde à “narrativa” cada vez menos hegemónica dum progressismo serôdio e cada vez mais desviado das suas reais e antigas e boas raízes.

Depois admiram-se de verem proliferar por todo o lado movimentos populistas. E por verem desaparecer os partidos tradicionais da Esquerda (veja-se apenas o que se passa em França onde o PC e o PS são meras pequeníssimas caricaturas do que ainda há uns anos foi um movimento que, com todos os seus defeitos, conseguia levar à Presidência da República o senhor François Mitterrand.

Hoje, e sempre no mesmo país, os antigos bastiões do PC são agora o viveiro farto e viçoso da extrema direita. Vejam onde é que a senhora Le Pen consegue os seus melhores resultados. Vejam e comparem com a geografia eleitoral de há 60, 50 ou 30 anos.

Onde é que andam o poderosíssimo PC italiano (o de Togliatti ou Berlinguer) ou o espanhol mesmo o de Carrillo). Que se passa com o SPD alemão, em queda livre e em risco de ser ultrapassado pela reaccionária “alternativa “ em número de votos?

Dir-se-á que, à falta destes partidos tradicionais, oriundos das IIª e IIIª Internacionais, isto é com mais de cem anos, apareceram os Siriza, os Podemos, o Bloco, ou o patético senhor Melenchon. Aparecer apareceram mas nada mais incerto do que o seu futuro. O Siriza naufragou dilacerado por dentro entre um programa maximalista e a horrenda realidade. Nos destroços ficou, entretanto, o PASOK, partido socialista grego hoje desaparecido em parte incerta, como ficaram também os dois irreconciliáveis inimigos que se disputavam o título PC. O Podemos prosperou onde antes existia o PCE e mantem-se (ainda que perdendo votos) numa Espanha onde os movimentos irredentistas retiram apoio aos partidos históricos. O PSOE é agora o primeiro partido muito graças à fractura que o VOX provocou na Direita clássica que já vinha sendo acossada pelo Ciudadanos. Por cá há muito que o PC estiola e defronta nas cidades grandes uma pequena minoria (sem base autárquica ou sindical) que ganha as simpatias de uma amálgama de movimentos provenientes de antigas dissidências e que, pelos vistos, parece atrair pela “novidade”. Curiosamente, é este partido o único que de forma elíptica e mais do que prudente não condenou os motoristas.

Finalmente, uma última nota: no momento em que escrevo (são dez da manhã) não se sabe se a greve é de manter ou se os plenários de trabalhadores a desconvocam. Seja qual for a decisão, a balança está desequilibrada. O Governo, a Justiça, a opinião pública, todo o patronato e as bos consciências onde se recrutam os famigerados comentadores televisivos já lançaram o seu anátema sobre esta acção. Que não é oportuna, diz-se porque é Verão, as férias no Algarve são sagradas, os emigrantes estão a chegar coitados e cheios de saudades, e há a peregrinação a Fátima (por acaso esta é a menor das três grandes que se realizam -Maio, Agosto e Outubro – Diga-se em boa verdade que Fátima, no que toca a deslocações de fieis, costuma ser notícia pelos milhares de católicos que fazem o caminho a pé. Desta feita devem vir de carro... E há o argumento final dos turistas que, enfeitiçados por Portugal, nos visitam. Lembro, porém, que esses se ficam sobretudo por Lisboa. Algarve, e Porto. Mas dá jeito vê-los a infestar todo o país e a espalhar pardaus por todas as terras de Basto...

*a ilustração: capa do grande (e perseguido) jornal A Batalha durante uma das muitas (e ferozmente reprimidas) greves durante a Iª República. Por essas e por outras razões nem um operário se levantou em armas contra o passeio militar (Braga-Lisboa) de Gomes da Costa a 28 de Maio

 

diário político 221

d'oliveira, 09.08.19

Unknown.jpeg

Não há volta a dar-lhe!

d'Oliveira fecit 9/8/19

 

Mesmo antipatizando com a greve dos camionistas e com o senhor advogado que preside ao sindicato, não posso deixar de me surpreender e, sobretudo, de me indignar com as medidas “robustas” com que o Governo, dito de Esquerda, a pretende combater. Serviços mínimos que andam entre os 50 e os 100%, requisição civil mesmo antes da greve começar e toda uma série de medidas “amarelas” (a polícia e a guarda republicana a serem preparadas para conduzir camiões cisterna, além de estarem a ser psicologicamente preparadas para “malhar” forte e feio nos mais insurrectos) a tropa a ajudar à festa e a torrente de ameaças diariamente bolsadas pelos agentes governamentais e partidários, a começar pela tristíssima figura do ministro Siza Vieira que, qual lebre numa corrida de galgos, já lançou a ideia de revisitar a lei da greve...

A opinião pública foi preparada para o pior, o alarme redobra soprado pelos tenores do PS sob o silêncio (ou quase) constrangido dos outros parceiros da geringonça. E da Oposição!

Se dez por cento do que se prepara para atalhar a greve tivesse ocorrido com Cavaco, Durão Barroso, Santana ou Passos Coelho, antigos primeiros ministros pelo PPD/PSD, oh que vozearia tremenda, medonha se teria ouvido. Que de manifestações, que de barricadas, que de abaixo-assinados!...

Neste Verão invernoso que precede umas eleições próximas e excitantes, soltaram-se todas as vozes populistas saídas da boca de quem se jura anti-populista.

Eu que não passo de um pobre reformista, que fui advogado de sindicatos quando isso era difícil e arriscado que já apanhei com greves de transportes violentas e prejudiciais para a vida de todos quantos trabalham e estão forçados a viver nas periferias, olho para tudo isto com um misto de horror pois adivinho o que aí virá, o que aí vem, com passos de lã. E esse futuro que condicionará a vida de potenciais grevistas não é risonho, bem pelo contrário.

Uma última palavra sobre um parecer da Procuradoria Geral da República que, ao que os jornais referem faz qualquer um pensar que moral, ética e socialmente a coisa é aberrante. Mesmo quando se diz que a greve não tem fundamento actual e apenas diz respeito a anos vindouros. Aliás, alguns dos apoiantes mais entusiastas das medidas anunciadas, desde os patronato hoteleiro algarvio até aos congéneres de outras regiões, os grandes híper mercados, tudo mostra o gato escondido com o rabo de fora. Uma greve traz sempre transtornos, seja a deste punhado de camionistas seja dos funcionários judiciais ou dos registos e notariado.

E falo destas greves quase sempre do sector público e não nas raras que ocorrem no sector privado (e essas, sim, estragam primeiro a vida aos patrões e só depois ao público em geral) porque neste abençoado torrão de açúcar são as que mais amiúde ocorrem.

Nada disto prenuncia o regresso ao fascismo e esse nunca existiu claramente entre nós pese embora a extraordinária descrição ainda vigente em vários círculos da longa noite fascista. Tivemos um regime rural e autoritário, beato e conservador que se construiu à volta da lembrança de dezasseis desastrados e caóticos anos de república assanhada, do falhanço de quase cinquenta governos de curta duração, da ausência de uma classe média que a ter existido era apenas quase só constituída pelo funcionariato público, pela militaragem e por meia dúzia de pseudo industriais que viviam à mercê do regime. O regime de 26 manteve quase intactas as estruturas herdadas da monarquia e praticamente intocadas pela 1ª república que viveu sempre do apoio de uma minoria activista reduzida às duas grandes cidades. O resto, política e socialmente, era paisagem e como tal foi aproveitado pelo Estado Novo que nunca precisou de um partido forte, de um líder fanfarrão, de organizações que enquadrassem realmente a juventude, os trabalhadores. Bastou uma polícia que já vinha de antes, a bufaria que gangrenou boa parte da sociedade, o respeito instintivo quase religioso pela autoridade estabelecida e pela “ordem”, a censura contra os raros meios de informação (jornais e rádio). E os “famigerados safanões dados a tempo”...

Nunca houve milícias do regime a sério (a Legião tornou-se logo nos anos 40 uma anedota, a MP nunca teve qualquer importância).

Portanto, que fique claro: o que se passa, ou parece poder passar-se, é apenas um renovado tique autoritário governamental que apela ao mais descarado populismo. Com a cumplicidade contrita dos partidos à esquerda do PS e o assobiar para o lado da Oposição. E cai em terreno fértil: ai as férias no Algarve, ai o turismo, ai os emigrantes que vem passar duas semanas na aldeia, coitadinhos...

Em boa verdade, os sindicatos que promovem a greve também não perceberam que, depois de uma vitória há meses, deveriam não esticar demasiado a corda. A paciência da opinião pública tem limites e o esforço propagandístico contra esta futura greve ainda por cima de duração indeterminada deveria ter explicado ao inebriado dr. Pardal Henriques a celebre formula jurídica “non bis in idem”. Provavelmente o ensino do Direito é menos severo hoje e latim uma língua cada vez mais morta. Neste momento só me pergunto como é que ele vai descalçar esta bota. onde meteu não só o mimoso pé mas o corpo inteiro. E se, porventura, é verdade que será cabeça de lista no ajuntamento do dr. Marinho e Pinto, então está feito ao bife. Espera-o a curto ou médio prazo a irrelevância total.

Mas os críticos do sindicalismo, dos direitos dos trabalhadores esses podem esperar tempos fastos ou, pelo menos, prometedores. Bem avisava o dr. Siza Vieira que era tempo de repensar estas coisas...

Au bonheur des dames 406

d'oliveira, 08.08.19

Unknown.jpeg

A falsa alternativa & outras observações

mcr 9.08.19

 

Pelos vistos, o Governo indicou a dr.ª Elisa Ferreira e o dr. Pedro Marques para o cargo de comissário na UE.

Eu confesso que ainda não percebi como é que uma criatura como Marques chegou onde chegou, mesmo descontando a fidelidade ao líder supremo. Vi e ouvi, vezes sem conta, demasiadas, aliás, o homenzinho a anunciar maravilhas e autênticos milagres. Tudo redutível à conhecida e contumaz expressão “uita parra e pouca uva”. Quando se tratou de discussão política a coisa ainda foi mais confrangedora. Marques, coitado, não marcava um mero golo. Mais: permitia “frangos” espantosos aos contraditores. Um desastre.

Mesmo assim foi alcandorado ao primeiro lugar nas listas europeias do PS. Para mim, só havia uma conclusão: costa queria livrar-se a todo o custo daquele fiel entre os fieis. Garantir que o via pelas costas durante um par de anos.

Todavia, esta suposição (amigável em relação a Costa) sofre um abalão quando este envia o nome de Marques à sr.ª Von der Leyen. É verdade que ia acompanhado do de Elisa Ferreira o que poderia indiciar que Costa poderia mandar uma mensagem tipo “queres um bombom ou umas gotas de cicuta?

Também, apesar de tudo, não deixa de ser estranho o Governo não avançar com o nome da dr.ª Maria Manuel Leitão Marques. Dir-se-á que não o avançou por ela estas no grupo parlamentar do PE para onde foi eleita imediatamente atrás de Marques. E para não embaraçar a Presidente da Comissão que teria de escolher entre o nº1 e a nº2, coisa sempre ingrata.

Daí o recurso à dr.ª Elisa Ferreira, obviamente uma pessoa infinitamente mais capaz do que Marques. E isto é dito por quem não aprecia demasiadamente a candidata depois da sua prestaçãoo como candidata à Câmara Municipal do Porto. De todo o modo, a doutora (por extenso) Elisa Ferreira tem um currículo impressionante, batendo em todas as áreas possíveis o candidato Marques e isso me chega.

E espero que também chegue para a Presidente da Comissão. A bem da mesma e, sobretudo, do bom nome de Portugal.

 

A propósito de Leonardo Padura e da sua devota leitora Mariana.

Pelos vistos a doutora Mortágua vai de férias carregada de livros. Não posso pronunciar-me sobre dois mas sempre lembrarei que a biografia de Trotsky por Deutscher apesar de ser um clássico está bastante ultrapassada. Trata-se um texto apaixonado, inteligente mas escrito há mais de cinquenta anos. E muita água já passou pelas pontes de Leningrado...

Quanto à outra escolha, “A transparência do Tempo” de Leonardo Padura, recentemente editado, é óbvio, pelo menos para um habitual leitor deste autor cubano, que é seguramente uma boa escolha e, nesta lista de quatro, o mais recente e o mais adequado ao tempo de veraneio. Padura tem uma obra muito interessante, mormente tudo quanto se relaciona com o detective Mario Conde, ou seja com cerca de 90% dos livros deste autor.

Se bem que vivendo em Cuba, Padura, com quem privei durante uns dias há um par de anos, não é exactamente um fiel daquele regime. E aproveitou (muito bem) a ficção policial para nos trazer um retrato pouco favorável daquilo em que se transformou a revolução cubana: uma caricatura amarga e funesta de tudo o que era prometido também há cerca de sessenta anos.

Convenhamos: eu não pediria à doutora Mortágua que lesse (caso já tivesse ouvido falar) Cabrera Infante, Herberto Padilla ou Reinaldo Arenas. Também não esperaria que lesse “cem garrafas numa parede “ da excelente Ena Lucia Portela (um monte de prémios e traduções em vinte líguas). E Ena Lucia também vive em Havana como Padura. E, como ele, retrata a Cuba actual desde dentro. Só que o romance acima referido cobre o período mais negro e cruel da história recente cubana. E vista do ponto de vista de uma mulher, uma dúzia de anos mais velha que Mariana, é verdade, mas uma mulher que vive por escolha própria lá, no meio da tristeza.

(passo de largo pelos enormes, magníficos escritores cubanos desde Lezama Lima a alejo Carpentier. Ninguém é obrigado a ler os melhores, mesmo se cubanos).

Aliás, o que me surpreendeu foi as breves frases de Mortágua sobre este livro. Das duas uma ou já o leu (e o livro é recentíssimo) ou limitou-se a transcrever uma qualquer notícia publicitária sobre a obra. Note-se, finalmente, que ao dispor-se a ler um dos três volumes da biografia escrita por Deutscher, a deputada terá esquecido ou não conhecerá um magnifico livro de Padura exactamente sobre Trotsky “O homem que gostava de cães” cuja publicação em Portugal nos trouxe Padura e a propósito do qual - mão só – tivemos duas longas conversas.

De todo o modo, repetindo, aliás, uma proposta já antiga aqui mesmo feita, vale a pena recomentar todos os livros de Padura. Estão traduzidos em português mesmo se a sua leitura no original espanhol de Cuba valesse (e muito) a pena.

O livro de Ena Lucia foi publicado, em Portugal, pela Ambar (2004) e mais tarde, novamente em português, com a mesma tradução, em Maputo (Moçambique) pela Kutsemba cartão (2010).

* na estampa: Ena Lucia Portela uma autora brilhante que (como Jesus del Campo, "as últimas vontades do cavaleiro Hawkins", Ambar, 2004)   me deu imenso gozo traduzir.  Aí vão dois apertados abraços para dois escritores cheios de imaginação 

o leitor (im)penitente 211

d'oliveira, 08.08.19

Unknown.jpeg

O estado da burocracia e a burocracia do Estado

Ou

Como gastar dinheiro inutilmente

 

Este Agosto vai ser atípico. O calor é moderado, as eleições estão perto, as medidas governamentais atropelam-se umas às outras como se se quisesse mostrar em poucos meses trabalho que deveria ter sido feito em anos. E os fogos, mas isso é já uma triste e persistente tradição do Estio.

E os “casos”. Ah!, os “casos”, as burrices, as tontices e as desculpas de mau pagador. Felizmente, para o dr. Costa, existe um cavalheiro chamado Rui Rio que parece ter sido talhado para ser o anjo da guarda do primeiro ministro.

Vamos então aos “casos”. A ideia peregrina de caracterizar uma compra de lápis, bonés e esferográficas num assunto urgente e imperioso daria para rir não fora o caso de ser sobretudo para chorar.

É difícil não pensar que esta compra traz com ela o cheiro fétido do compadrio mesmo se não for esse o caso. Um comentarista do “Público” avança a hipóteses (que, à luz do que se conhece da funçanata pública, não é assim tão descabida) de a negociata se ter feito apenas para ultrapassar a omnipresente e paralisante burocracia que, neste domínio, rege as compras feitas pelo Estado.

Eu mesmo assisti a compras estapafúrdias feitas por uma instituição em que mais tarde trabalhei. Para não perder umas verbas do orçamento, em fim de ano fizeram-se rapidamente umas compras de estiradores, de uma guilhotina enorme e de mais um par de coisas que não recordo. Os estiradores foram arrumados na cave por absolutamente imprestáveis e desnecessários. A guilhotina (enorme) serviu meia dúzia de vezes, fins a que, pelo preço e tamanho e características, não estava especialmente destinada. Acabou por ser oferecida a uma cooperativa artística...

Tudo isto ocorreu porque, naquele tempo, havia (haverá ainda?) uma regra que estipulava que se as verbas atribuídas não fossem gastas nesse ano civil seriam perdidas a favor do Estado e o orçamento seguinte teria em conta essa menor despesa. Ou seja, se um dirigente poupasse dinheiro era premiado no ano seguinte com um orçamento menor! Mesmo que as necessidades fossem maiores e prementes.

Quando entrei na instituição, consegui que, no último mês do ano civil, se utilizasse o excedente em verbas de equipamento comprando alguns tapetes para as salas do palacete onde estávamos instalados e onde era hábito haver pequenos concertos, exposições e lançamento de livros ou conferencias e colóquios. Ao que sei, quarenta anos depois, os tapetes ainda lá estão, um pouco usados mas úteis e decorativos. Já algumas das obras de arte (nomeadamente pintura e pequena escultura) andam perdidas ou. na extraordinária expressão da senhora Ministra da Cultura, estão em local incerto, por encontrar.

Desconheço quais são, actualmente, as regras que presidem aos orçamentos das instituições públicas que gozam de autonomia financeira. Se foram as mesmas são paralisantes e potencialmente prejudiciais.

Note-se, de resto, que o Estado, o nosso Estado, tem uma notóriadificuldade em lidar com compras e com vendas. Neste cpítulo, boa parte da actividade empresarial do Estado adapta-se mal à concorrenci quando não invade pesadamente a esfera do privado. No capítulo da ediçãoo de livros já aqui descrevi a visão horrenda de pilhas e pilhas de livros sepultados em armazéns repletos, a encherem-se pó, a criarem bicho. Basta recordar as centenas de títulos editados durante as comemorações dos descobrimentos. Quando descobri alguns numa pequena espécie de livraria situada na Torre do Tombo, soube que aquilo era apenas a ponta do iceberg de um gigantesco acervo perdido num armazém (em S João da Talha?). Todavia, mesmo encomendando exemplares dessa abandonada montanha de livros, não se garantia satisfação do pedido. Faltava quem fosse ao armazém e nesse faltavam escadotes ou algo semelhante para alcançar as prateleiras mais altas tão cheias quanto vazias estavam as mais ao alcance da mão do eventual mas rao trabalhador que lá se deslocasse!

Vi, claramente visto, as garagens da SEC no tempo em que esta estava na Avenida de República, pejadas de incontáveis e instáveis pilhas de livros editados com apoio do Estado. O mais extraordinário é que, estando ali, ao alcance de qualquer mão, não eram alvo de pilhagem, roubo, ligeiro desvio. Nada! Estavam ali numa espécie de limbo, afastados de qualquer eventual livraria que os quisesse vender.

Durante anos, frequentei, interesseiro e interessado, uma instituição de inegável interesse científico e editorial, onde fui pescando a preços de saldo de saldos, títulos fundamentais para quem se interessasse pela história portuguesa e, especialmente, pela da expansão colonial. Nos alfarrabistas, os escassos exemplares que se encontravam andavam a preços fulgurantes! Nos leilões a coisa ainda fia mais fino. A CG que critica, com sobrada razão, a invasão desordenada de livros por todo o lado, observou-me que, pelo menos, eu deveria comprar esses títulos em dobro para revenda do segundo exemplar. Todavia, eu (se calhar a exemplo do Estado incapaz) não consigo dedicar-me a tal negócio.

Aliás a nenhum negocio! Culpa minha, claro.

* a estampa: exemplares da revista Oceanos que andam pelos alfarrabistas a preços que uivam. Comprei muitos dos exemplares que me faltavam na Torre do Tombo e ainda consegui várias caixas arquivadoras a preços baixíssimos. Quem, a meu conselho lá foi por mais, bateu com o nariz na porta. Havia mas estavam no fmigerado armazem! 

Estes dias que passam 330

d'oliveira, 01.08.19

Unknown.jpeg

Trapalhadas, trapalhices e trapalhões

mcr 1/8/19

 

Comecemos pelo mimoso caso das golas anti incêndio. Primeiro, falou-se do perigo dessas protecções contra incêndios (melhor dito contra fumo) se incendiarem. O Governo, pela voz daquele cada vez mais surpreendente Ministro da Administração Interna, começou por desvalorizar. Perante a alarmada e desconfiada gritaria, Sª Exª deu um pinote de 180 graus e pediu um inquérito “urgente”. Esta famosa urgência sobretudo em Agosto põe a apresentação do mesmo lá para bem depois das eleições...

Depois, alguém veio afirmar que afinal as golas não se incendiavam. Apenas, e graças o calor, ficavam repletas de buracos. S.ª Ex.ª e apaniguados uivaram de alegria: Estão a ver? Não se incendeiam...

Pois não. Apenas permitem a entrada livre de fumos. Não se morre assado mas sufocado! É outro conforto...

E cmo é que apareceram estas máscaras milagreiras? Pois através de um assessor ministerial que depois de exercer ,supõe-se que meritoriamente, o ofício de padeiro se alçou a assessor. É o elevador social a funcionar a todo o vapor! O homem já foi, provavelmente para outra ocupação igualmente paga. E quem forneceu (sem concurso público!) as golas? Pois o marido de uma senhora autarca socialista. Depois de uma consulta a algumas empresas (duas delas juram a pés juntos que nunca ninguém as consultou...)

E o preço? Como foi uma grande quantidade, o fornecedor disse, sem corar, que isso aumentou o preço unitário!!! Que é superior a quaisquer outras golas não incendiáveis (grave defeito!) também no mercado.

 

2 Uma lei vinda do fundo dos tempos (quem se lembra do sr. Fernando Nogueira herdeiro de Cavaco na era pré Guterres, outro fantasma) proibia a familiares directos (cônjuges, pais, filhos ou irmãos) de membros do Governo fazer negócios com o Estado & assimilados. Pelos vistos, ninguém deu por ela durante estes sumptuosos trinta anos. Agora o Parlamento descobriu a coisa e emendou a mão. A nova lei aplicar-se-á dentro de poucos meses. Entretanto há uns tantos ou quantos familiares (um filho, um marido e não sei quem mais) de governantes que fizeram tais negócios. Se é verdade que uma demissão do governante tem pouco sentido não menos verdade é que o negocio é nulo. Um ilustre jurista, esposo amantíssimo de uma governante disse alto e bom som que se estava nas tintas e que continuaria a fazer os chorudos negócios. Ora toma! E é ele licenciado em Direito e permanente presença nos media sempre a arengar virtudes democráticas!

No meio disto tudo, o dr. Costa primeiríssimo ministro, pediu um parecer ao Conselho Superior de Magistratura. Quando o parecer aparecer já a nova lei estará em vigor. Alguém, por aí, falou em manobra dilatória?

 

O mesmíssimo e primeiríssimo dr. Costa perante o fogo de Mação veio lembrar que compete aos autarcas (aliás, ao autarca ppd de Mação) a primeira responsabilidade. Parece que essas criaturas são os responsáveis locais da protecção civil. Num momento de tragédia, S.ª Ex.ª sacode a água do capote e vira-se contra o único defensor daquela pequena e interiorizada vila. Ainda por cima, o plano de Mação andava pelas gavetas ministeriais à espera de aprovação. E mesmo que já estivesse aprovado, onde é que Mação tem meios, recursos e dinheiro para fazer mais do que faz?

As acções ficam com quem as pratica, sobretudo as feias. E esta nem feia é. É medonha e indecente. E, sobretudo, absoluta, e absurdamente, injustificada.

 

Há muitos, muitos, anos, um autarca chamado Rui Rio queixou-se da imprensa ao dr. Jorge Sampaio, na altura Presidente da República. Ainda hoje, ninguém percebe que é que um alto magistrado como este tem a ver com a Imprensa, os seus direitos e deveres, abusos incluídos. Rio queria uma nova censura?

A partir daí, tirei-lhe a bissectriz, escrevi um texto sobre o assunto (que deve andar publicado neste blog) e nunca mais me ocupei da criatura. Um escriba, mesmo este, tem o direito de não se incomodar nem incomodar os leitores com este tipo de mediocridades. Rio lá foi governando a cidade, um pouco à medida de Centeno. Tudo pelas finanças públicas, pouco pelo resto e quase nada pelo que pomposamente se chama “cultura”. Pelo caminho, zangou-se com Meneses (o tal que bramava contra os sulistas elitistas) e tapou-lhe o caminho para a Câmara do Porto. Às vezes as pequenas sacanices tem bons e inesperados resultados. Meneses perdeu fragorosamente as eleições autárquicas o que foi uma sorte paraos portuenses. Todavia, agora, estas duas luminárias reconciliaram-se numa escolha atabalhoada de candidatos às legislativas. Que pena Santana ter partido a loiça e saído. Com ele ficava completo um trio impossível de imaginar.

Costa pode dormir descansado. Com este adversário não precisa de mais nada. Estou cheio de pena da menina do Bloco e do dançarino de salão do PC. O verdadeiro parceiro de Costa é RR (Rui Rio não Rolls-Royce, claro). Nunca votei no PPD, nunca o apreciei mas custa ver um partido à deriva sem rei nem roque mas com Rui e com Rio. O que finalmte parece ser a mesma (e pouca) coisa.

Serviços públicos

Mocho Atento, 01.08.19

Após uma hora de espera (como prioritário), fui simpaticamente informado de que não era possivel fornecer códigos de certidão predial, porque o sistema estava off. A opção era requerer por via eletrónica, correndo o risco de os dados fornecidos pelo interessado estarem errados. Grata surpresa: o sítio estava funcional. Requerem-se certidões, paga-se, recebem-se códigos. No entanto, de nada servem. Tem de se aguardar validação! Só não se sabe quando tal acontecerá...

E o cidadão tem de se questionar como é possivel que, com tanta automatização, informação, equipamento e programação informática, tudo demore mais do que quando era manualmente executada esta tarefa! Bem sei que, naquela época, se tinha de dar gorjeta, mas, no fim e infelizmente, ficava mais barato e era mais eficaz! O simplex é uma trapalhada!

Estando atento, podia ver-se um senhor que nunca mais conseguia tirar o cartão de cidadão, porque ora a fotografia não estava bem, ora a assinatura não estava alinhada, ora os dados não passavam! Desesperava o homem e desesperavam os que aguardavam vez. É que, às 10 horas da manhã, já não havia senhas, nem para cartão de cidadão, nem para passaporte. Podia ser que, às 14 horas, decidissem atender mais alguém! Explicação da funcionária: tinha que fechar o serviço do automóvel!

Ao lado, uma jovem lamentava-se, precisava do passaporte para viajar para o estrangeiro. Nada feito! O SEF não tinha tempo para enviar para a Casa da Moeda! A solução era ir a Lisboa e pagar taxa de urgência...

Será que não há nenhum responsável neste país que seja capaz de pôr os serviços a funcionar? Os serviços custam uma fortuna aos cidadãos.