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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

au bonheur des dames 418

d'oliveira, 29.11.19

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Aventuras da Desrazão

 

mcr 29-XI-19

 

Depois da surpreendente teoria do salário mínimo nacional dever ser definido à base do amor (e amor caro, amor a 900 euros mensais...) eis que a deputada Joacine Katar Moreira “contrariando uma das marcas genéticas do LIVRE” se absteve num voto sobre Israel. Notem que a criatura até estava de acordo em condenar. Mas não o fez por ter havido um problema “de comunicação” entre ela e o famigerado grupo de contacto (parece ser este o nome da direcção do partido). Ou seja, além da gaguez física há estoutra gaguez intelectual. Vejamos: se o LIVRE dá (como afirma Rui Tavares) uma grande liberdade aos seus eleitos, se os eleitos são a favor da condenação de Israel (e neste caso da ocupação de territórios árabes exteriores às fronteiras definidas e reconhecidas internacionalmente) por que bulas a conhecida senhora se abstém?

Eu, desde o primeiro dia, entendi que JKM funcionava em roda livre e que se considerava uma diva e pensava ser (mal, mas já lá iremos) a única responsável pelo seu lugar no Parlamento. E da cenografia que marca cada passo que dá nos “passos perdidos”, incluindo os de polícia ao lado para afastar os maldosos jornalistas. Nos meus tempos de menino e moço, falava-se muito da “sociedade do espectáculo” numa adaptação demasiado livre das teses “situacionistas”. “Mal comparado” eis-nos na dita situaçãoo! Credo!

Conviria lembrar à Sr.ª Moreira que ela só senta o dito cujo na AR porque um partido chamado LIVRE a candidatou. Sem ele, ela continuaria feliz e desconhecida do povo português. Passo por alto o curioso sistema interno que alavancou a sua ida para deputada mas, tendo em conta a pequena e divertida história do LIVRE, tudo ali parece possível incluindo até o fazer política.

Também recordaria, se é que a coisa tem alguma importância que, ao contrário do que Joacine afirma, a sua eleição teve os seus pontos mais fortes nos bairros ricos de Lisboa (Belém, por exemplo) e não naqueles onde as minorias “perseguidas” pelo racismo existem e, eventualmente, votam. Os bairros “pobres e problemáticos” deram o lugar ao Sr. Ventura, esse representante (segundo o falecido camarada Dimitrov) da “ditadura terrorista do capital”. (os leitores mais avessos à história do comunismo em geral e do Komintern em particular perdoarão esta minha mania de referir uma história que até o PCP - et pour cause - já esqueceu convenientemente).

Perguntarão as leitoras e leitores (se posso usar imodestamente este plural) que interesse terão a média e alta burguesias lisboetas em catapultar uma “esquerdista” em vez de darem o seu aval às tradicionais forças que as representam (PS, PPD ou CDS). Em poucas palavras diria que para uns o PS se esquerdizou demasiadamente graças à “geringonça”, que o PPD já não sabe a quantas anda com um dirigente vinda da província nortenha e com sotaque tripeiro (oh que horrorrrr!!!) e que o CDS se perdeu num optimismo “crístico” depois de ter obtido um bom resultado nas autárquicas. Num palavra, o CDS parece querer imitar o sapo que inchou demasiadamente sem perceber que lá dentro só havia ar e vento. O LIVRE era pois uma escapatória simpática depois desse lugar já ter sido ocupado pelo BE que, também ele, vai buscar os seus votos à “gente educada” e bem posicionada na vida, na Academia, nas artes e nos costumes.

Tenho por mim, que ninguém esperava uma eleição do LIVRE que, na realidade é mais um epifenómeno a juntar a outros. Dir-me-ão que poderiam ter optado pelos liberais (e também isso ocorreu, aliás). É até provável que para a próxima vez estes aumentem o seu score (como inevitavelmente ocorrerá com a gentinha de Ventura). Basta apenas que mantenham uma posição clara, de bom senso na AR. São os eleitores que pagam os impostos (e que impostos!) que aderirão com mais facilidade às teses da Iniciativa Liberal, como serão os eleitores de menos posses que se sentem ameaçados por comunidades imigrantes e ciganas que aumentarão o espólio do CHEGA. A Direita Extrema (não vou ainda usar a fácil terminologia de “fascista”) existe, sempre existiu mas só agora, como em várias outras geografias europeias, sente um desejo de segurança e um medo, muitas vezes, irracional. O “mainstream” político europeu (social democrata e conservador) não tem sabido ou podido responder às angústias, inquietações ou medos de uma parte da população que começa a descrer da “Europa” e muito mais do multiculturalismo emergente que põe em causa uma herança cultural que não se resume à “igualdade, fraternidade e liberdade” herdadas da Revolução Francesa. O século XX, com o seu tremendo e trágico cortejo de regimes fascistas e comunistas, com o abrandamento económico actual com a decrescente natalidade, com a difícil reintegração das sociedades de leste, parece propício a este fenómeno de abandono de uma certa democracia ocidental, de algum liberalismo temperado por políticas sociais avançadas desenvolvidas pela social democracia (e por alguma democracia cristã com fortes preocupações sociais).

Com a queda da União Soviética minada pelo desastre económico e financeiro, pela escassez de bens de consumo, pelo descrédito em que a sua “nomenclatura” tinha caído, o comunismo deixou de ser uma força actuante na Europa Ocidental (particularmente na França e na Itália onde os pc locais tinham uma fortíssima posição no parlamento, nos sindicatos e nas elites intelectuais ).

Os últimos anos 60 e toda a década seguinte marcaram claramente o fim da influência de Moscovo mesmo se isso tivesse sido mascarado pela irrupção do Maio de 68, pela guerrilha ideológica “pró-chinesa” ou pelos movimentos “anti-autoritários”. A URSS foi substituída no imaginário intelectual de alguma juventude mais aguerrida por Cuba, pela China e pelo Vietnam. Infelizmente nenhum destes modelos durou mais do que um suspiro. Cuba ruiu depois de andar ao colo dos russos durante duas décadas, a China foi sepultada pelos milhões de vítimas da revolução cultural (que acresceu aos desastres das “cem flores” e do “grande salto em frente” e o Vietnam mostrou depois da vitória a sua face menos agradável na relação com o resto dos países da Indochina mas também pela tragédia inominável dos “boat people”.

É deste desabar ideológico que se foi agravando até ao fim do século XX que começam a despontar as variadas novas formulas esquerdistas que, aliás, foram paralelamente acompanhadas pelo renascer mesmo se diferenciado das direitas derrotadas durante a 2ª Grande Guerra.

Portugal não escapou (como escaparia?) a esta nova desordem política. Houve sempre um núcleo de Esquerda radical (inclusive no Parlamento não só com a UDP mas também com pequenas correntes dentro do PS que foram sendo pouco a pouco varridas para o exterior (os sequazes de Manuel Serra ou o POUS) e para a inoperância. A isso, conviria acrescentar as depurações dentro do PC (de onde saíram para o PS e para o BE grupos mais ou menos organizados que no caso do último foram mesmo fundamentais para o crescimento e êxito eleitorais registados nas últimas décadas. O PS devorou mais de meio MES, arregimentou toda uma série de ex-comunistas notórios deixando para o PPD e para o BE a pesca à linha de ex-maoístas, ex- trotskistas e antigos militantes católicos” em ruptura.

Não deixa, aliás, de ser curioso, e sobretudo irónico, que Joacine, imite (ou esteja perto de imitar), talvez sem querer, Rui Tavares que, eleito pelo BE, cedo se desprendeu mas manteve o seu lugar no Parlamento Europeu. Isto ao arrepio daquele mínimo ético que mandaria o eleito em ruptura a abandonar o grupo que o elegeu e o cargo que a ele deve.

Não admira pois que num artigo confuso (no Público) Tavares se embrulhe ao tentar explicar o que se passa entre a estrela que ele ajudou a criar e o partido em que ambos eventualmente militam. Todas as restantes e notórias notícias que vem do pequeno partido são espadeiradas na água e entram ousadamente no ridículo e na crónica bem humorada do “fait divers” Quando não é assim e recorrem a um agente da autoridade para proteger o sacro descanso político e a vacuidade ideológica da deputada fazem prever uns “amanhãs que cantam” demasiado sinistros. Enquanto o deputado Ventura fala aos polícias a senhora deputada já os vai usando para repelir jornalistas curiosos...

Les beaux esprits se rencontrent.

* na estampa:colonato invasor da terra palestiniana cercado por um muro que lembra outros não tão recentes.

 

 

De onde vêm os "sem abrigo"?

JSC, 28.11.19

Às vezes se nos pusermos a pensar sobre o que se vê e ouve podemos correr o risco de estabelecer ligações desfocadas da prática, do concreto imediato. Claro que se não nos pusermos a pensar não corremos tal risco nem outro de natureza afim.

Anda todo o mundo político-comunicacional entusiasmado com a ideia presidencial de, num prazo muito curto, dar uma casa a cada um dos “sem abrigo”. As pessoas tendem a entusiasmarem-se com estas coisas. Aliás, só por si, o verbo ‘dar’ pressupõe coisas bonitas, justas.

As pessoas, incluindo o Presidente, poderiam questionar, De onde vieram os “sem abrigo”? Como nasceram no Intendente? Na Batalha? Como aumentaram de número? De género? As pessoas poderiam pensar essas e outras coisas mesmo correndo risco de lhe responderem, o que é que isso importa agora? Agora, dirão, há que cumprir a senda do Presidente, há que dar uma casa a cada um.

O problema é que no mundo da pobreza nem a história avança nem os pobres mudam. Nos idos anos 80/90 do Século passado os “sem abrigo” de hoje eram os “moradores das barracas”, barracas que proliferavam nos terrenos baldios e nos subúrbios. Então, os poderes públicos desenvolveram um “Plano de Erradicação da Barracas”. Construíram-se milhares de casas para albergarem os sem abrigo de então, previamente identificados.

Vinte anos volvidos o Presidente mobiliza os poderes públicos, para dar casa aos “sem abrigo”. De onde vêm os “sem abrigo”, Senhor Presidente?

E o absentismo? Quem cuida do absentismo senhores jornalistas?

JSC, 21.11.19

O estado de criar a balbúrdia nas Escolas Secundárias prossegue o seu caminho. Por algum lado se consolidou a ideia de gerar o caos no ensino público. Há uma agenda clara, visível, com acções concertadas, dia a dia. Os alunos são o instrumento primordial na acção. A todos, associaçoes de pais incluídos, a comunicação social abre o microfone. Não só abre o microfone como incita ao azedume. E se os entrevistados não são acutilantes, o(a) jornalista tem sempre a pergunta certa para obter a resposta óbvia.


Vejamos, ontem foi o dia da folgança na Escola Daniel Sampaio da Charneca da Caparica e numa Escola de Macedo de Cavaleiros. Nesta fase as razões para fechar as escolas é sempre a mesma: Exigem o reforço do pessoal não docente.


A Jornalista passa a notícia. Escola fecha por falta de pessoal. Depois, pelo meio, diz que a escola tem “16 funcionários sendo que 6 estão de baixa por tempo indeterminado”. A jornalista podia pensar, afinal a Escola tem pessoal, o que acontece é que estão doentes. O que se terá passado na Charneca para, de uma assentada, 37,5% dos funcionários ficarem doentes? Quê epidemia ocorreu por ali? E, já agora, em outros locais onde falta tanta gente por doença.


Esta questão, tão óbvia, bem poderia ser colocada às Direcções das Escolas, às Associações de Pais, dos Alunos, aos entrevistados. Seria curioso conhecer a resposta, as soluções que têm para combater o absentismo. E, já agora, porque não conhecer a opinião do sempre presente presidente bastonário dos médicos. Afinal as baixas são concedidas, penso, pelos senhores doutores em medicina.


Contudo, o que a jornalista quer saber é em que “isso afecta o aproveitamento dos alunos?. Em tudo, dizem. A jornalista insiste, “e a senhora sente algum desgaste na sua saúde?" A resposta óbvia, induzida, “claro que sim”.


Em coerência, a jornalista deveria ter prosseguido e perguntado: “então porque não mete baixa”? Não perguntou, mas deve ter pensado que aquela funcionária é uma palerma, bem poderia ir de baixa para cuidar da sua saúde. Grande oportunidade noticiosa era se fossem todos de baixa. Todos menos os alunos, que ficavam para o filme.

Ainda se ouve uma funcionária, a gente faz falta num lado depois fazemos falta noutro lado e andamos assim a ir de um lado para o outro, cansamo-nos muito. É a deixa para nova questão com resposta óbvia, “e a segurança dos alunos está em causa?” Claro que sim, respondem de pronto.


É chegado o momento da conclusão jornalística, o Governo tem de reforçar o pessoal em todas as escolas.

E o combate ao absentismo, quem cuida disso ou isso não é tema para o jornalismo de folhetim?


Seguiu-se igual reportagem numa Escola de Macedo de Cavaleiros, 3.000 alunos sem aulas durante 3 dias. É uma acção do Sindicato recém-formado que dá pelo nome, bem português, STOP.


Quem e como se conseguirá parar esta agenda destruidora da Escola pública?
E quem cuidará da praga do absentismo?
É legítimo que o Governo – este ou outro – deva dotar as Escolas com mais de um terço dos funcionários para suprir o crónico absentismo? Os contribuintes, jornalistas incluídos, estão disponíveis para pagar?
E o que fazer com esta comunicação social?

 

Diário político 224

d'oliveira, 20.11.19

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Foge cão que te fazem barão.

Mas para onde se me fazem visconde?

d'Oliveira, Nov19

 

Este texto havia de chamar-se “e ele a dar-lhe e a mula a fugir”, ou seja perdi uma oportunidade de ouro para dar nome a uma croniqueta, dure ela o que durar na memória de algum leitor.

O caso é o seguinte

Julgo lembrar-me de uma declaração de Sª. Ex.ª , o Senhor Presidente da República onde, ainda em princípio de mandato, afirmava que neste país havia condecorações mais. E por tudo e por nada!

E, em consequência a nova Presidência seria muito mais cuidadosae atenta a essa chuva de benesses honoríficas.

Um jornal pegou-lhe nas palavras e descobriu que Soares teria sido o mais pródigo, logo seguido de Sampaio. Eanes e Cavaco tinham sido menos generosos ou até, no caso do segundo, forretas.

Contudo, passados estes aos de presidência, beijinhos e “selfies” a esmo (a pontos de o meu amigo K dizer que, mais dia menos dia, seria o único português que não se retratara mão na mão com o Presidente. E isso, essa desconcertante ausência, dar-lhe-ia, vejam bem!, uma infinita notoriedade, quiçá um lugar na história das primeiras décadas deste século.)as condecorações dispararam a um ritmo jamais visto. Pelos vistos aquela prometida acalmia nas comendas foi esquecida, obnubilada pela pertinácia dos portugueses que se terão excedido em acções meritórias obrigando o seu lídimo representante a dar o dito por não dito. 

Agora, na hora da morte do José Mário Branco, eis que S.ª Ex.ª acolhe a ideia de uma condecoração póstuma, caso a família do finado não se oponha. E mais: S.ª Ex.ª recordou que já teria, e por várias vezes, proposto uma comenda ao cantor mas que este, como se esperava, sempre recusara.

Quem conheceu o Zé Mário, desde os seus tempos aventurosos de Coimbra sabe que isto era nele algo de inato. Para o Zé, as honrarias protocolares eram detestáveis.

Agora que o apanham morto e desprevenido, eis que a comenda ameaçadora espreita. Basta a família não se opor!

Ontem, mcr, num post aqui mesmo, já se arreceava de uma panteonização do cantor e compositor. Ainda as suas curtas linhas não se tinham (metaforicamente) secado e lá vinha a palavra do Chefe do Estado que, aliás, e sem se rir, abundava num discurso elogioso sobre um adversário político de sempre. Eu desconhecia que nos idos de 60/70, o jovem estudante de Direito Marcello Rebelo de Sousa pertencia já ao pequeno mas combativo núcleo dos admiradores do autor de FMI e, mais na época, da “ronda do soldadinho”. É sempre bom saber que, nesses tempos de combate incerto, um jovem que tudo empurrava para a Direita, se revelasse um resistente, porventura silencioso mas sempre resistente.

Não fui votante de MRS em nenhuma ocasião. Não fui seu entusiasta enquanto frenético dirigente do PPD/PSD. Ouvi-o, as mais das vezes enfastiado, na sua posição de professor Marcello comentador. E, nessa altura, apostei com um par de amigos que aquele homem, inteligente, astuto, frio e bom explicador dos assuntos que pecsava no seu comentário semanal, tinha a ambição de ser Presidente da República. Os meus amigos acharam-me “exageradote” (sic) e aceitaram todas as apostas que propus. E pagaram, sem amuos mas recusando dar-me o estatuto de pitonisa, os almoços em questão. Já renovei o dsafio mas eles, mais precavidos, ainda não se decidiram. E com o elogio ao JMB duvido que arrisquem.

Nada tenho contra o facto de o Doutor (por extenso) Rebelo de Sousa gostar de ser Presidente tanto quanto gostará de nadar. Não tenho qualquer dúvida que, no caso de se recandidatar, ganhará (sem precisar do meu solitário voto) e por larga maioria. Por um lado isso tornou-se já uma tradição: todos os Presidentes da Democracia bisaram e com inegável êxito. É mesmo provável que o PS (como outrora o PPD na 2ª eleição de Soares) apoie ou, no pior dos casos, recuse dar o aval a uma candidatura hostil a MRS. Lá terá as suas razões.

Portanto, essa futura campanha será um passeio (ainda maior e mais fácil do que o anterior) para o actual inquilino de Belém. Aparecerão, claro, uns aventureiros a disputar-lhe a eleição. Não porque pensem ganhar mas sempre é uma ocasião de se tornarem falados. Na melhor das hipóteses essa corrida ganha à partida será uma espécie de Branca de Neve contra os Sete Anões, sem rainha má, sem maçã envenenada e sem príncipe beijoqueiro e salvador. Não é a melhor história mas é a história possível.

O hino de campanha do actual Presidente poderia muito bem ser “a cantiga é uma arma” mesmo se “FMI” fosse mais promissor. Não serve por ser longo de mais e conter palavrões.

 

(Vai a crónica oferecida a Maria Assis por muitas razões e com um beijo)  

au bonheur des dames 424

d'oliveira, 19.11.19

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Zé Mário

mcr, 19.XI.2019

(52 anos, quase dia por dia, de um concerto entre amigos em Paris. Ai, amigos meus, tão livres que nós éramos...) 

 

Chega-se a uma idade em que as más notícias são a regra e as mortes se acumulam até perderem sentido. Agora, foi o Zé Mário Branco, uma amizade de quase 60 anos, forjada durante a sua curta estadia em Coimbra. Em determinada altura, hospedou-se no meu quarto, já não sei por que motivos. Provavelmente entendia que o seu dinheiro seria mais bem aplicado do que num aluguer. A D Laura, minha (e de muitos outros) generosa hospedeira facilitou um colchãozinho e ele foi meu “cabide” durante umas semanas.

Depois desapareceu, melhor dizendo, fugiu à tropa e à guerra. Sabíamos que a Isabel (Alves Costa) mãe de dois dos seus filhos fora ter com ele a Paris. Em Novembro de 1967, o CITAC, um grupo de teatro estudantil de Coimbra, no qual eu estava integrado, rumou a Paris para,  no âmbito da 5ª Bienal de Paris, apresentar” o “Grande Teatro do Mundo” encenado por Victor Garcia. Foi nessa semana fantástica, a poucos meses do “11 de Março”, que reencontrei o Zé Mário que principiava uma auspiciosa carreira de cantor e músico. Num pequeno bar da margem esquerda ouvimos, em primeira mão, canções como “ronda do soldadinho”. Mais tarde um disco, com o mesmo nome, contrabandeado chegar-nos-ia a Coimbra.  Quando o Zé regressou, logo depois do 25 de Abril, voltámos a encontrar-nos em espectáculos ou simplesmente em Lisboa.

Quando comecei a trabalhar na Delegação Regional de Cultura, no Porto, idealizou-se uma série de concertos de música popular que começaria, nem podia ser de outra maneira, com o Zeca Afonso, outro velho amigo de Coimbra. E com ele, depois dele, vieram o Zé, o Vitorino, o Sérgio e viria, se não morresse abruptamente, o Adriano. Fiz parte da pequeníssima equipa (onde destaco a acção extraordinária e perfeita de Luísa Feijó) que trabalhou arduamente para apresentar estes espectáculos no “Auditório Nacional de Carlos Alberto”. Escusado será dizer que registámos enchente sobre enchente. Foi a DRN quem, primeiro que quaisquer outros, deu uma sala  do Estado à música de intervenção e a uma série impar de cantores de mpp que ainda hoje são escutados e aplaudidos.

Depois, o resto é história, uma que outra vez lá nos encontrávamos e retomávamos uma antiga e quase ininterrupta conversa começada nos anos sessenta em Coimbra à luz fraterna do associativismo estudantil e das lutas que íamos travando com maior ou menos sucesso.

Com a Isabel a relação foi mais continuada pois além dela se instalar no Porto, foi na DRN, e com a DRN, que lançou o Festival Internacional de Marionetas do Porto que dirigiu até, subitamente, morrer. Desses anos de trabalho também já foram, entre outros, o Rui Feijó (primeiro e insubstituível Delegado Regional do Norte) e o Manuel Matos Fernandes, um animador cultural  cultíssimo e com uma invulgar capacidade de trabalho.

Da qualidade musical do Zé, para além do seu enorme talento poético, outros falarão. Da sua generosidade e do seu intenso labor em aproximar músicos, estilos e gerações diferentes haverá seguramente melhores e mais avisados testemunhos. Mas do amigo que trocava sonhos naqueles dias sombrios de Coimbra em que fintávamos a adversidade, a polícia, e o embiocamento provincial e provinciano do país, posso falar sem rebuço. Como uma das suas criações, o Zé era um “Ser Solidário”. E isso vai fazer falta, muita falta.

(Nota à parte: foi noticiado que se estava a preparar uma edição completa e, espero, “raisonée”, da sua obra musical. Esperemos que isso se torne realidade tão depressa quanto possível. E, já agora, por favor não o queiram emparedar no Panteão como vai sendo moda... Isso seria uma segunda morte para ele. E para mortes basta uma e a definitiva

As grandes noticias do dia

JSC, 14.11.19

Um encontro de médicos especialistas da diabetes conclui que estamos mal na prevenção desta maleita. Porque a população está cada vez mais envelhecida, porque os jovens estão cada vez mais obesos. A partir deste saber dito por especialistas, lançam-se fóruns, debates, ouvem-se outros especialistas, convocam-se as diversas associações – de médicos, utentes e outros – que cuidam da diabetes e temos matéria para uns dias de entretenimento público.


De um encontro de médicos especialistas no tratamento do cancro da mama ganha relevo a declaração de uma investigadora. Anuncia, com grande estrondo, há uma política de saúde para ricos e outra para pobres. Porquê? Porque, diz, há um medicamento que poderia dar mais um ano de vida, um ano, o Infarmed ainda não o disponibilizou, acusa. A partir deste nicho de sabedoria, não contraditado, lançam-se fóruns, debates, ouvem-se outros especialistas, convocam-se as diversas associações – de médicos, utentes e outros – que cuidam do cancro da mama e temos matéria para uns dias de entretenimento público.

 

De uma plataforma entre a Fenprof e uma ou duas associações lança-se um desafio ao Ministro da Educação para que apresente uma lista das escolas com amianto nas suas instalações. Este anúncio ganha relevo comunicacional e assume grande urgência pública. A partir deste desafio lançam-se fóruns, debates, ouvem-se especialistas, convocam-se as diversas associações – de professores alunos, pais dos alunos e outros – que interagem com as escolas e temos matéria para uns dias de entretenimento público.


Tanto entretenimento para quê, a favor de quem? Há claramente uma agenda medíocre na comunicação social. É lamentável que o próprio serviço público de comunicação social – RTP/RDP – alinhe e até lidere essa agenda.


Depois, há muitos especialistas, presidentes de associações, a carecerem de visibilidade, que contribuem para essa agenda. Quem ouvir as recentes declarações do Professor/sindicalista Mário Nogueira, a propósito do amianto nas escolas, ficará elucidado sobre o que é um discurso populista, vazio, fulanizado. Conversa que apenas acrescenta ao campo do populismo.


O populismo é o grande beneficiário deste modelo de comunicação assente numa lógica de entretimento público. O problema é que tudo isto apenas aproveita à direita da direita. O resultado das últimas eleições provam-no.

diário político 223

d'oliveira, 14.11.19

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eu comovido a oeste”

d’Oliveira, 14.XI.19

 

Não, não é para recordar esse formidável escritor que foi Vitorino Nemésio (o homem de “mau tempo no canal”, quiçá o melhor romance português do passado século) mas apenas para, roubando-lhe o título de um livro, referir-me à primeira intervenção da senhora deputada Joacine Moreira.

E vou só referir-me ao conteúdo e não ao resto. Disse a senhora deputada que um salário mínimo de 900 euros (a sua proposta) seria um “acto de amor” !(sic).

Vejamos mrlhor. O PS propões, lá para o fim do mandato, 750 euros. O PC (como não podia deixar de ser) contrapõe 850 e o “Livre” atira com 900 euros. Porque não 1000, pergunto eu, já que é um número redondo e mágico?

Mas, para além deste disparatado leilão, há a justificação apresentada: seria um acto de amor! Saímos do campo da política, mais ainda do da economia, e caímos numa novela sentimental do século XIX ou numa imitação pueril e pobre de uma aula de catequese nos anos 40 (altura em que gramei uma senhora bondosa que, a par do “acto de contrição” e do “salve Rainha”. É bem verdade que conseguia escapulir-me para a mata de Soto Maior sempre que a bondosa criatura se distraía mas mesmo assim tive 13 valores –em Buarcos e nessa altura, a catequese tinha valores para podermos aceder à comunhão solene.

Ora, com algumas diferenças de idade, de locução de cor e de alegada ideologia, as duas mulheres assemelham-se num ponto importante: transbordam de amor pelos necessitados, pelos pobrezinhos mesmo se entre a época de uma e hoje haja uns bons setenta anos.

Em teoria, ninguém discute a necessidade de os trabalhadores deverem ter um salário decente que os ponha (a eles e à família) o abrigo das necessidades mais elementares. O problema que, entretanto se põe, é saber qual é a capacidade dos empregadores para pagar seja o que seja. E, já agora (algo de que raramente se fala), da produtividade.

Também é verdade que, em alguns países europeus, o salário mínimo é mais elevado (basta a Espanha aqui ao lado) se bem que noutros (todo o leste) chega a ser metade do que o que cá se paga.

E, mesmo em Portugal, temos patrões a pagar acima do estipulado (permitam-me o meu exemplo: tendo em conta o número de horas pago quase o dobro do futuro SMN e, quando ele chegar, continuarei, suponho, com a mesma distância, respeitando e pagando feriados, férias e subsídios de férias e Natal. Não o faço por amor, era o que faltava, mas por simples ética por respeito com um passado meu e com convicções por que me bato. E porque posso pagar isso sem cair na ruína iminente, convém acrescentar.)

A proposta da senhora deputada é pois, no actual quadro económico e financeiro nacional, um absurdo no qual nem ela provavelmente acredita.

Ou acredita num outro plano que não o político, por exemplo numa óptica do discurso amoroso, em que a paixão obnubila tudo e tudo permite. A senhora deputada ama os desprotegidos tanto ou mais que a finada madre Teresa de Calcutá, ou, mais perto, como a santinha da Ladeira. É uma espécie de missionaria laica o que para uma senhora nascida na Guiné e com dupla nacionalidade é quase um programa de vida.

Não sei se os trabalhadores portugueses, sobretudo os que nem ao salário mínimo actual chegam, apreciaram devidamente esta declaração fervorosa e ternurenta da deputada. De todo o modo, há que reconhecer que estamos no

“...Incrível pais da minha tia

trémulo de bondade e aletria...”

como Alexandre O’ Neil diria se conhecesse a senhora Moreira. Não me atrevo (ou melhor, atrevo-me mesmo) a citar Nemésio que, no livro que dá título à crónica de hoje, diz

“...fechei as pálpebras pesadas

de contradição e poesia...”

Sei que estas citações de dois eminentes poetas que muito estimo são salvas de pólvora seca contra o delírio parlamentar desta original deputada. Que dirão os do “Livre” destas prestações delico-doces da sua representante no areópago parlamentar?

Sorrirão felizes e enlevados com estas tiradas melosas m um tanto ou quanto nefelibatas da sua vistosa deputada?

Cá em casa, a coisa foi saudada com uma saudável mas impertinente gargalhada sobretudo por parte da minha mulher que, recordada da sua juventude perigosamente militante e pró-africana, a secundou com uns resmungos que até o neto do alto dos seus dois anos acabados de fazer, entendeu como reprimenda injusta por estar a tentar destruir o telemóvel da avó complacente.

Eu, limitei-me a comover-me, como em Coimbra quando ouvia os discursos do Teixeira e as tiradas do Tatonas. Ao fim e ao cabo na sua inocência e longe do nosso mundo, também eles mereciam amor. Com algum “pão e fantasia” como recomendava o excelente Comencini, um dos realizadores que marcou a minha juventude cinéfila.

* a estampa: fotograma de "pão amor e fantasia "de Luigi Comencini . E com a espampanante (ai, jesus!) Lolobrigida!

 

 

 

au bonheur des dames 416

d'oliveira, 12.11.19

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À Lagardere

 

mcr 11.11.19

 

Duvido bem que a maioria dos meus leitores tenha algum vez lido Paul Féval, um cavalheiro francês (sec XIX) que, com Ponson du Terrail (outro da mesma nacionalidade e da mesma matriz literária), escreveu romances de capa e espada na senda de Alexandre Dumas. Féval tinha um herói, o jovem Lagardere, espadachim emérito que aliava a coragem, a virtude ee o encanto a um bote secreto com que vencia duelos tremendos.

Depois, sei lá porque razões começou a usar-se a expressão “à Lagardere” para referir ousadia (num primeiro tempo) e excesso de qualquer qualidade, finalmente.

Ora, eu, ainda que sem especial vontade, vou voltar a referir-me uma vez mais à sr.ª dr.ª Joacine Moreira deputada do Livre (ou será o Livre que é o grupo de Moreira?) que tem ocupado excessivamente as páginas dos jornais. E não pelos melhores motivos, convenhamos. A polémica instalou-se pelas más razões, desde a gaguez da personagem até à cor de pele brandida como arma de arremesso pelos seus partidários (a começar pelo sr. dr. Rui Tavares) que carregou nessa tecla juntamente com a da condição de mulher como se isso fosse uma panaceia para o parlamento. Não é o facto de ser mulher, mesmo negra (como ele insistiu e ela se conformou com inegável à vontade ), que faz um bom deputado/a. E nem sequer como símbolo isso parece valioso num país que, com todos os seus defeitos (e são muitos) já elegeu gente de “cor” (pudica expressão para dizer preto que, pelos vistos é muito pior do que negro) e até tem no seu Governo uma mulher negra (ou preta) e um 1º Ministro com sangue indiano.

Portugal mesmo sem recorrermos ao estafado luso-tropicalismo, encheu-se de negros (escravos) desde o século XVI, de mulatos e governou colónias onde estes foram, em quase todos os casos, os executantes subalternos da política colonial e imperial. No Alto Alentejo subsistiram durante centenas de anos grupos fortemente mestiçados para ali levados para os trabalhos agrícolas e se, agora, são menos visíveis foi porque abandonaram a zona e se cruzaram com “brancos” nas zonas de imigração interna para onde se deslocaram.

E onde é que entra a sr.ª deputada Joacine? Entra, precisamente, com uma versão modificada da espadeirada à Lagardere. Ou seja, ganhará sempre todas as discussões recorrendo ao argumento “atacam-me porque sou negra, mulher e gaga”. Perguntam-lhe alhos e ela responde que é negra. Perguntam-lhe bugalhos e retorque que é gaga (“de fala mas não de cabeça”, sic). À questão dos negalhos dirá que só lhe falam disso porque é mulher. E assim, sucessivamente.

Todavia, as questões que se puseram em relação a esta senhora não são assim tão inconvenientes. A gaguez é mesmo um senão, uma barreira à discussão no parlamento. Darem-lhe mais tempo, benefício que não discuto e a que, muito menos, me oponho, pode ser uma prova desagradável de condescendência e não o reconhecimento de um direito. De todo o modo, sozinha como está e com a limitação de direitos que também recai nos outros dois deputados igualmente sós, temos que mais minuto menos minuto em pouco modificará a discussão na AR.

E, já agora, o problema da gaguez não perpassou sequer ao de leve, pelas cabecinhas iluminadas dos dirigentes do Livre? Não acharam (e muito menos entenderam) que, mesmo sem assessor espampanante de saia de pregas e meia verde bandeira, era complicada a sua acção no parlamento?

É que, para um espectador distraído, poderá surgir a tentação de pensar que a cor d pele é apenas um truque para mostrar a “diferença” mesmo se isso não tem cobertura política e/ou ideológica! E se for assim, e bem que o pode ser, impõe-se uma grave conclusão: a cidadã Joacine chega ao parlamento não por ela própria mas pelo sexo, pela cor de pele e, eventualmente, pelo seu problema de locução. Um truque, um expediente uma vigarice (para usar uma expressão posta em moda politicamente pelo sr. deputado Rui Rio).  

Não sei se nisto tudo ela é actriz ou meramente vítima. Seja como for, ha aqui algo que cheira a expediente eleitoral e a uso e abuso de diferenças de sexo, e de cor.

E é pena porquanto uma voz (mais uma) feminina pode sempre tornar o parlamento mais abrangente, mais curioso mais interventivo.

 

 

au bonheur des dames 415

d'oliveira, 10.11.19

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“Lonely Woman”

mcr, 10.11.19

 

Permito-me recordar um belíssimo tema do grande grupo Modern Jazz Quartet (John Lewis, Connie Kay, Percy Heath e Milt Jackson –piano, bateria, contrabaixo e vibrafone). A música, porem deve-se a Ornette Colleman, um saxofonista rebelde mas genial. E tanto ou tão pouco que o álbum do MJQ que contem esta composição intitula-se justamente “lonely woman” e tem uma capa lindíssima que adorna a gravura deste folhetim.

De todo o modo, não é do MJQ que pretendo escrever mas, roubar o título ,para apenas falar da jovem mulher de 22 anos, cabo-verdiana e imigrante, provavelmente pouco alfabetizada que vivia nas ruas de Lisboa como sem abrigo. Junte-se a isso uma gravidez provavelmente indesejada e o abandono do alegado pai da criança.

Não pretendo dizer que a tentativa de homicídio tenha justificação, sou infelizmente um vago jurista não praticante, imbuído todavia dos preceitos inculcados pela Faculdade e pela ética que bebi desde menino.

De todo o modo, se a mulher jovem e ignorante tivesse ido a uma abortadeira (que ainda as há) ou, caso mais difícil, tivesse abortado legalmente num hospital (pressupondo que encontraria um médico que não levantasse a famosa objecção de consciência) onde estava o crime?

Alguém, aí desse lado das leitoras e leitores que, com infinita paciência, me aturam poderá explicar-me?

Eu sei que andam por aí subtis distinções entre feto e recém nascido (que reconheço do alto da minha idade, meio social, classe, cultura e educação mas que não funcionam da mesma maneira para uma jovem, pobre, miserável mesmo, só e abandonada numa terra estrangeira e não tão afável como a propaganda tenta fazer-nos acreditar) mas que quer isso dizer perante o caso concreto?

Temendo irritar-me mais do que me apetece, não li, não ouvi os comentadores jornalísticos e televisivos que, pelos vistos não largam a notícia. Sei, tão só que a rapariga está preventivamente presa o que, dado o seu passado próximo, até pode ser um alívio. Tem um teto e três refeições quente por dia o que, para um sem abrigo em fins de Outono numa Lisboa onde chove que Deus a dá, pode ser um “upgrade” (estamos em época boquiaberta por uma coisa chamada web summit que pelos vistos nos vai pôr no cume do progresso tecnológico e na vanguarda da ciência) de certa importância.

Todavia, apesar da minha pouca atenção aos oráculos que pululam pela tv e um pouco pelos jornais, não tive eco de um pouco de dó, de compreensão, de caridade no caso em apreço. Pelos vistos, todos acham que a pobre criatura é uma homicida fria e desapiedada.

Entretanto, um recém nascido, mesmo mulato parece despertar o interesse de demasiada gente, incluindo (e é melhor aspecto) adoptantes. Um bebé de dias é um must mesmo se andam por aí, e mal, centenas de crianças que hão de crescer em instituições frias longe dos focos da comoção pública. Fosse eu mais novo, mais experiente da coisa jurídica e vivesse em Lisboa, já me teria oferecido para defender essa mulher só, terrivelmente só.

(em tempo: estou obviamente disposto a contribuir com algum dinheiro para ajudar a acusada. Assim eu saiba como e a quem o entregar.

 

 

o leitor (im)penitente 214

d'oliveira, 08.11.19

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Raduan Nassar

 

mcr 8.11.19

 

Correndo o risco de me repetir, pois já, aqui, escrevi duas ou três vezes, sobre Raduan Nassar, volto a insistir.

E faço-o porque para minha grande e grata (oh quão grata!) surpresa, o Público de hoje, no seu suplemento “ípsilon” (pp 18 a 24, inc.) dedica sete (/!!!) página sao autor de três pequenas mas extraordinárias obras primas da literatura escrita em português. Sáo elas “Lavoura Arcaica”, “Um copo de cólera” e “Menina a caminho, todas escritas e publicadas no século passado.

Foram alvo de edição portuguesa mas, se bem recordo, passaram despercebidas a leitores e a “críticos”. Andaram perdidas por feiras de ocasião a preços vis e eu aproveitei para comprar alguns exemplares para oferecer a um par de amigos.

Depois, RN ganhou o “Camões” e isso trouxe-lhe alguma visibilidade por cá. Moderada visibilidade mas que terá servido para o reeditar ou escoar os exemplares já publicados.

Agora, esta sumptuosa recensão do punho de Isabel Lucas (num suplemento onde o literário costuma andar por duas páginas esconsas) talvez desperte mais atenções, curiosidade e leitura. Felizes serão (e bem aventurados) os que se resolverem desbravar esta obra mínima de um autor que “abandonou” a literatura pela criação de coelhos e que nunca se promoveu, bem pelo contrário.

Curiosamente, ou talvez não (decididamente: não!) Chico Buarque, ao ter notícia do seu justíssimo “Camões” (2019) logo referiu com grande nobreza e dignidade aquele seu antecessor no prémio. Nassar, sempre reservado e tímido, não escondeu a satisfação tanto mais que acha Chico Buarque, sic, “um génio”. Por mim, que admiro ambos e que tenho por CB uma forte admiração desde “Morte e Vida Severina” texto de João Cabral de Melo Neto, um dos nomes maiores da poesia brasileira, portuguesa e universal, este texto jornalístico merece destaque. Por várias razões: está bem escrito, fornece pistas bem interessantes sobre o autor e pode servir de convite à leitura dele.

Leitoras e leitores, ao trabalho, melhor dizendo (e citando obliquamente Paul Lafargue) ao prazer!

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