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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

estes dias que passam 330

d'oliveira, 27.02.20

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Pedro Baptista Joaquim Pina Moura

(uma geração que desaparece)

We few, we happy few band of brothersShakespeare, “Henry V”

mcr (Fevereiro 2020)

 

Os leitores que me desculpem. E duplamente. Uso o masculino apenas por economia e não por não prezar as leitoras, bem pelo contrário. De facto, estou farto de ceder ao politicamente correcto que geralmente não passa de prova de tolice.

Depois, por falar em geração, a propósito do Joaquim Pu+ina Moura e do Pedro Baptista. É que, de facto, eles, com tantos outros já desaparecidos e com alguns que ainda andam por aí, são claros exemplos de uma geração bem minoritária que .se bateu corajosamente contra o Estado Novo.

Agora, anda por aí muito boa gente a presumir de “esquerda” e a fanforronar sobre ideias “fraturantes”. Há mesmo uma compita para se ver quem é que fratura mais e mais depressa. Lamentavelmente, parecem desconhecer que o que se arroja pela janela entra, logo seguir e a correr muito, pela porta. A História, sempre essa maçada, está carregada de exemplos de pequenos, pequeníssimos robespierres de pacotilha que uivam por um eventual “terror” e se afogam numa pocinha de água da chuva...

Não é o caso dos dois camaradas que acabo de perder mesmo se o termo camarada, num sentido estricto e historicamente desaparecido seja um exagero. Nos tempos obscuros em que que vivemos e lutámos, havia uma boa dúzia de pequenos grupos que identificavam os seus escassos militantes com  a anteposição da palavra “camarada”. . Isso e a “Internacional” cantada a plenos pulmões ainda que fragmentariamente, identificavam algo que em seu tempo se chamou Esquerda e que fazia pender sobre a cabeça dos que dela se reivindicavam uma boa dose de riscos todos penosos. A coisa ia desde os espancamentos nas manifestações até à prisão e depois à proibição de empregos públicos. E tudo isso, nnuma desoladora solidão pobremente partilhada. No Portugal desses anos, e agora refiro-me apenas aos “sessenta”, a rebeldia tinha um preço que muito poucos estavam dispostos a pagar.

O “povo estava sereno”, como mais tarde afirmaria Pinheiro de Azevedo, o medo guardava a vinha, a bufaria imperava e pouco ou nada acontecia.

Durante uma boa década, nem a guerra colonial, nem a sangria da emigração económica, perturbaram significativamente algum, fraco mas real, desenvolvimento ou o crescimento do PIB.

Portugal, “orgulhosamente só”, aguentava-se graças às remessas dos emigrantes, ao crescimento do turismo e da economia interna, o mercado do trabalho ia-se tornando mais feminino (o esforço de guerra mantinha longe cerca de duzentos mil homens) e até um proto “Estado Social” ia emergindo.

Só uns milhares de “díscolos”, perturbavam a harmonia do “país triste” e ensimesmado. Para esses a polícia usava a mão dura enquanto para o resto bastaram os famosos “safanões dados a tempo”.

Joaquim Pina Moura, militante do PCP desde muito novo, e Pedro Baptista, pertencente à segunda geração maoísta faziam parte do “movimento” estudantil.

Conheci-os, se bem me recordo, entre 68 e 69, entre a crise de Coimbra e o Congresso Republicano de Aveiro. Na altura não me atrevo a dizer que estávamos próximos porque não estávamos. O PCP apelidava todos os que não comungavam do seu ideário fortemente pro-soviético, de “esquerdelhos” e o resto da malta chamava aos do PC, “revisas”, "social-fascistas" e outros mimos que, aliás eram tradicionais na conturbada história do socialismo europeu desde quase a sua fundação.

E essa História estava presente em tudo, basta lembrar os nomes dos jornais partidários, desde o “Avante” (do russo Vperiod, órgão central da fracção bolchevique sediada na Suiça, Genebra) ao “Grito do Povo”, cuja primeira versão apareceu durante a Comuna sob a batuta de Jules Vallés – "Le cri du peuple" – e depois corporizou um infame jornal colaboracionista de Jacques Doriot. Na Esquerda maoísta apareceu durante o PREC um jornal, “A Verdade”, tradução literal do russo “Pravda” o que não deixa de ser irónico dado este ser o principal órgão do poder soviético que os da “Verdade” portuguesa detestavam...

E por aí fora...

De todo o modo, estando ou não de acordo, é este punhado de jovens quem durante aquele período (1962-1974) tenta, com grande risco e duras consequências, profissionais e pessoais, combater o poder instituído e sacudir o conformismo da sociedade portuguesa. Não foi o único bastião resistente mas foi dos mais generosos e influenciou decisivamente a juventude portuguesa mormente a universitária e boa parte daquela que participou na guerra colonial incluindo os que a recusaram desertando ou tornando-se refractários. Fiz parte desta última frente animando com três amigos uma rede de passagem de fronteira que funcionou muito bem graças ao facto de sermos apenas quatro e de tomarmos todas as precauções e cuidados que essa tarefa exigia.

E não foi pequena façanha pois a juventude de muitos era má conselheira e permitia largos descuidos e riscos desnecessários que muitas vezes tiveram os resultados esperados e funestos.

A minha relação com ambos foi diferente. Com Joaquim Pina Moura só privei mais tarde por altura dos “Estados Gerais” de Guterres já ele teria saído do PC.

Com o Pedro Baptista tive mais relações também elas quase sempre posteriores à sua saída da OCMLP. Em boa verdade, fui advogado de muitos militantes estudantis de "O Grito do Povo". Com os “Estados Gerais” tornamo-nos bastante mais próximos e, posteriormente, ao longo de todos estes anos, fomo-nos encontrando esporadicamente e tendo um bom número de conversas que pouco a pouco foram derivando para o campo da cultura, sobretudo da literatura. O Pedro começou a escrever e eu fui seu leitor sobretudo de “Sporá”. Não o acompanhei nos seus delírios regionalistas e muito menos no seu “portismo” a outrance mas admirei-lhe sempre o entusiasmo e a entrega que punha em todas as causas que abraçava.

Ambos são excelentes testemunhos dos humores do século e dos azares da História. E testemunhas, também pois viveram por dentro muitas das convulsões do último e mais exacerbado “socialismo radical”. Divergi deles desde cedo, a começar pela questão checa até ao culto de Stalin que estava “vivo no nosso (deles) coração”. Também nunca vi na URSS o sal e o sol da terra. O fim pouco glorioso da União Soviética, o desmoronar da “cortina de ferro”, a abrupta queda do muro de Berlim, o desastre absoluto da “Revolução Cultural” a patética gesticulação com o “livrinho vermelho”, um aberrante conjunto de máximas do venerado “Grande Timoneiro” que seria ridícula se não tivesse sido dramática e tremendamente mortífera, nunca me apanharam a jeito e muito menos me comoveram ou entristeceram. Às vezes (poucas vezes) a História está do nosso lado, do lado da liberdade.

Em boa verdade, qualquer deles percebeu a tempo a fundura do atoleiro moral, ético e político para que caminhavam e arrepiaram com coragem (e eventual angústia) o seu caminho. Saíram do armário ideológico e foram à sua vida. À vida. Simplesmente.

Cada vez mais me vou sentindo um sobrevivente tanto mais que era mais velho do que eles uma boa meia dúzia de anos. E cada um que morre é menos um testemunho, visto que, até à data, poucas são as “memórias” deixadas por escrito. Pior: algumas das raras publicadas não passam de desculpas de mau pagador por ter havido comportamentos menos gloriosos nas enxovias da polícia. Já, e há muito tempo, me referi aqui a esses tema a que não quero voltar por demasiado nauseabundo. Na “hora de verdade” e perante a sombria perspectiva dos interrogatórios policiais, houve quem não se tivesse comportado com a mais elementar decência. Nada tenho contra aqueles e aquelas que confessaram os seus “crimes” mas não suporto quem, além disso, levasse a falta de vergonha até à denúncia de companheiros e amigos. Isto para não falar de criaturas que não só diziam tudo e mais alguma coisa mas inventavam ainda mais crimes atribuídos a outrem. Não faz muito tempo, narrei aqui mesmo, a bizarra denúncia da minha presença num encontro conspirativo em Cantanhede, terra que de todo em todo desconheço, onde eu me teria gabado de bombista, coisa que sempre detestei e sempre condenei. A história viria de uma tal “Catarina” pseudónimo de uma “bufa” da pide. Pelos vistos nem a polícia acreditou na alarve acusação mesmo se, apesar de tudo, isso conste de um dos meus catorze processos (aliás treze porquanto um deles dá-me como médico em África, pelo que deduzi sempre que se referia a meu pai que, embora solidário com os filhos, nunca partilhou as nossas convicções políticas. Os informadores e os agentes nem sempre eram suficientemente profissionais: num outro processo instruído no Porto, o agente aponta-me como elemento da corrente ”leninista-marxista” – sic! – com “grossa actividade política” não especificada! – sic novamente ...).

Verifico que falar destes dois antigos companheiros foi também falar de mim. Ao fim e ao cabo, cada um à sua maneira e na situação concreta em que viveu ou vive, foi um modesto actor que não limitou a ver a peça mas quis, mal ou bem, nela intervir. Citando Brecht, sempre direi:

“Vós que haveis de surgir das

cheias

em que nos afundámos

....

pensai em nós

com indulgência “

* a gravura é da série da crise académica de coimbra.Eles não eram de lá, não podiam estar lá mas foram solidários com tudo o que lá se passou. Isso me basta e, decerto também basta à malta coimbrã que naquela altura bem apreciou toda a solidariedade possível. E o Joaquim ou o Pedro estiveram sempre, sempre, solidários.

 

 

o leitor (im)penitente 216

d'oliveira, 27.02.20

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Indomável!

 

Vasco Pulido Valente

(“Não o teres derrubado ídolos mas tê-los derrubado em ti eis a tua vitória” – Nietzsche)

mcr (Fevereiro de 2020)

Conheci-o durante a crise académica de 62. Eu e o Carlos Bravo fôramos encarregados pela Direcção Geral da Associação Académica de fazer de correios entre Coimbra e Lisboa e isso permitiu-me conhecer muita gente na Universidade de Lisboa incluindo, grata lembrança, a extraordinária Noémia de Sousa, poetisa moçambicana que estará entre as três melhores vozes poéticas de toda a África lusófona desses anos terríveis. A Noémia não era estudante mas aparecia muito pela cantina do Técnico, vizinha com a Casa dos Estudantes do Império.

Todavia, deixemos para outra ocasião uma incursão na literatura africana de expressão portuguesa e voltemos ao tema fundamental: Vasco Pulido Valente.

Vi-o pela primeira vez numa assembleia geral na faculdade de letras onde era aluno. Fiquei nessa altura muito bem impressionado pelo seu tom, a sua vivacidade e a sua clareza. Eu vinha de Coimbra onde se cultivava ainda, à sombra de Antero, uma eloquência muito século XIX. VPV usava frases curtas, argumentava com uma pitada de humor e não apelava ao sentimento mas sobretudo, já nessa época, à razão. Em boa verdade, eu talvez já o conhecesse dado que ele pertenceu à equipa fabulosa que fez o “Almanaque” (Outono de 1959 – Verão de 1961, 18 números) onde pontificavam alguns dos melhores desde o José Cardoso Pires, a José Cutileiro e, Luís de Stau Monteiro, Pertencer a este clube já dizia muito de um rapaz que nem 18 anos ainda tinha.

Depois, li-o em “O tempo e o modo” que, na sua primeira e melhor fase, também não arregimentava medíocres, sofríveis ou sequer bonzinhos. Desapareceu-me do radar leitor provavelmente por ter ido para Oxford onde se doutorou.

E é a partir de 1974 que VPV se torna um cronista que raramente perdi de vista. Um cronista e um escritor pois vejo agora que é de 1974, o primeiro dos (17) livros que tenho dele. Era um pequeno ensaio com o título “As duas tácticas da monarquia perante a revolução” (edições D Quixote, 1974). Em poucas frases, num estilo já inconfundível (ele dizia “pimpão”) explicava algo que muitos colegas e confrades demoravam duzentas páginas...

A obra escrita divide-se em dois campos: os ensaios de História e as recolhas de crónicas publicadas ao longo de quase cinquenta anos. No primeiro aparecem obviamente os textos que melhor mostram a sua profunda erudição (desde “O Poder e o povo” até ao – para mim – excepcional “Ir para o Maneta” sem esquecer “Glória”ou “Um herói português”.

No campo dos segundos coligem-se crónicas publicadas quase ininterruptamente durante o mesmo período. Trata-se de escolhas (não constam todas as que escreveu) e nelas perpassa não só um a funda ironia, alguma causticidade mas sobretudo um conhecimento profundo do país e dos seus desastres. Tudo servido por um estilo cintilante mesclado com algum (bastante) humor e ancorado numa língua segura. Limpa e usada com grande mestria.

Costuma dizer-se que um estilo claro dá imenso trabalho e é prova de uma cabeça muito bem organizada. VPV foi, no ultimo quarto do sec XX e primeiro do XX!, um claro e o melhor exemplo disso. Não há nestes quase cinquenta anos nenhum outro cronista (exceptuando Manuel António Pina, num registo profundamente diferente, aliás) que se lhe assemelhe e, sobretudo, que tenha durado tanto tempo com o favor de inúmeros leitores. E os jornais bem sabiam isso: VPV nunca mendigou uma coluna jornalística, bem pelo contrário.

Uma tão grande carreira cronística implica obviamente não só a criação de uma legião de admiradores mas outra, também robusta, de adversários, na generalidade políticos paroquiais que se persignavam metaforicamente a cada passo: que VPV era um adepto do “bota-abaixismo”, “petulante”, ”amargo”, “pessimista” sei lá mais o quê. Mas liam-no a cada passo, havia mesmo os que tentavam responder e até apareceu um pobre diabo que tolamente prometeu umas bofetadas! Em boa hora o fez porquanto o escândalo foi tal que lhe retiraram um cargo ministerial para o qual lhe faltava tudo desde conhecimentos até habilidade, inteligência e competência.

O grande problema de quase todos os criticados era que a frechada de VPV acertava fundo e não vinha inquinada de vã maledicência mas obrigava a pensar.

Fora deste foro de literatura e de combate jornalístico, fica o homem que nunca vergou e tão pouco se acomodou. Mesmo não dando grande importância ao adolescente que foi mandado para um colégio interno (e só quem, como eu, os frequentou naqueles tempos é que sabe que género de prisão aquilo era...) há o estudante universitário que “faz” 62, o jovem que milita no M.A.R. (Movimento de Acção Revolucionária) onde participaram Jorge Sampaio, João Cravinho, Nuno Brederode entre outros (e só nomeio estes pela proximidade à crise de 62) o Secretário de Estado da Cultura de Sá Carneiro que suscitou uma feroz resistência entre muito intelectual ligado aos meios artísticos e sobretudo à mediocridade artística que imperou (e impera) naqueles anos difíceis em que o talento, a criatividade e a inteligência eram postergados por tonitruantes posturas políticas que pretendiam – mesmo sem o conhecer –salvar o “Povo” de que desconheciam tudo. Durou pouco o seu consulado e menos ainda durou como deputado. À primeira advertência sobre a obrigação de votar de certa maneira numa questão menor, saiu batendo com a porta.

Todavia, esta liberdade aumentada (uma vez alijada a sinecura parlamentar) não modificou em nada o seu percurso de cronista ou seu “cursus honorum” académico. Ficaram pelo caminho alguns projectos e eu lamento muito uma biografia de Eça que ele terá pensado levar a cabo. De todo o modo aí estão os dezassete livros (creio que haverá mais um mas não tenho a certeza) quase todos esgotados (o que também prova o interesse dos leitores).

Na hora da sua morte, sucedem-se as homenagens (algumas surpreendentes) e também um que outro desabafo escondido com o rabo de fora. O homem morreu mas as pequenas raivas ainda ficaram por aí.

Como leitor assíduo foram muitas as vezes em que discordei, me agastei mas nunca perdi de vista o estilo notabilíssimo e o desafio que o que ele defendia (ou atacava) me impunha. Estou-lhe grato por essa conversa à distância não só porque me permitiu perceber s razões da minha desconformidade como como alguns dos seus argumentos e conhecimento melhoraram a minha visão do mundo.

E é curioso notar que VPV conseguia desagradar a alguma (alegada) Esquerda que se sentia desconfortável com as suas análises mas também a uma forte fatia da Direita que não lhe tolerava a liberdade e a crítica impiedosa a grande parte dos mitos fundadores de que se alimenta(va).  

VPV, como acima disse, colaborou no notabilíssimo “Almanaque”. Num dos seus números havia uma ilustração e uma frase a condizer “para onde apontam estes monumentos? – Para sua própria monumentalidade!” (cito de memória com preguiça de subir até à estante onde jaz a minha colecção).

VPV foi um “empecheur de tourner en rond” ele que me desculpe este francesismo aplicado a alguém tão imbuído duma sã cultura anglo-saxónica!) e nunca foi à bola com os “monumentos” indígenas. Em boa hora!...

*na imagem: escriba (Egipto) ou de como e por muitas vezes, a função de escrever foi honrada.

 

 

Eutanásia - Sim à despenalização

José Carlos Pereira, 21.02.20

As questões que envolvem a despenalização da eutanásia não são simples. Mexem com valores profundos e com a consciência de cada um. Não é matéria de esquerda ou de direita, como aliás se tem visto pelo posicionamento de alguns partidos e dirigentes.

Posto isto, merece um aplauso a forma como os partidos se apresentaram neste processo e como o discutiram serenamente na Assembleia da República, independentemente das posições defendidas. Os cinco projectos que estavam a votação foram aprovados na generalidade e segue-se agora o processo legislativo na especialidade, que se espera também ele sereno.

Quem, como eu, viveu de muito perto, na juventude e adolescência, o processo de degradação física e mental de familiares próximos percebe como é difícil lidar com situações terminais. Cada caso é um caso e creio que ninguém está em condições de impor soluções a outrem, mas fico confortável ao ver despenalizada a eutanásia para aqueles que, de forma consciente e acompanhada por profissionais especializados, pretendem colocar termo ao sofrimento incomportável e à doença irreversível. Pôr fim à vida nessas circunstâncias é um acto simultaneamente de desespero e de consciência plena. De dor infinda. Mas que não pode ser crime para quem opta por esse caminho.

SOBRE JUAN GUAIDÓ ANDRÉ VENTURA

JSC, 18.02.20

I
O Governo venezuelano suspendeu a TAP de voar para Caracas. O Governo português, pela voz de Santos Silva, reagiu, de imediato, considerando “um ato inamistoso para Portugal”, que “não merece esta atitude” por parte do governo venezuelano.


Santos Silva disse, ainda, que “mal soube da notícia foram desencadeadas as diligências necessárias para usarmos todos os meios diplomáticos para procurar que esta decisão das autoridades venezuelanas seja alterada e que a TAP possa retomar os seus voos”.


Parece-me bem. Diligencie Sr. Ministro, diligencie. Contudo, Santos Silva não esclareceu se tais “diligências” estão a ser feitas junto do Governo da Venezuela, do Presidente Maduro, ou junto de Mr Guaidó, que o Governo português reconhece como Presidente da Venezuela…


Entretanto, o autoproclamado presidente Guaidó e seus apoiantes prosseguem o apelo à mobilização dos povos contra o “ditador” Maduro. Por tudo isso e pelo tempo que tudo isto dura e ainda pelo que se vê e lê, só podemos concluir que mesmo como “ditador”, Maduro é um “ditador” muito incompetente…


II
Em direto ou em deferido costumo ver o telejornal da TVI às Segundas. É quando Miguel Sousa Tavares aparece a opinar/debater sobre a espuma dos dias.

Ontem, para grande surpresa minha, apareceu acompanhado pelo agora institucional André Ventura.

Não sei qual foi a ideia. Mas se Miguel Sousa Tavares pensava que ia desmascarar o populista, a coisa saiu-lhe muito mal.

André Ventura atropelou o MST, deixou-o na valeta e prosseguiu com o seu discurso trauliteiro.

Como não alcanço do interesse de MST em debater com tal personagem será que os patrões da CMTV já ordenaram que a (sua) nova TVI abrisse o microfone ao André Ventura?

Au bonheur des dames 410

d'oliveira, 10.02.20

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Jogos malabares

mcr 10-02-2020

 

Rui Tavares não desiste. Hoje, segunda feira, no “Público” manifesta-se a favor de uma candidatura à presidência da República por parte de Ana Gomes.

Esta, entretanto, já tinha feito saber que não era candidata. Entre outras e mais curiosas razões apontava o facto de estar reformada.

Não me vou debruçar sobre as alegadas virtudes da dr.ª Ana Gomes que, pessoalmente, me parece um pouco impertinente (no verdadeiro sentido da palavra). Não lhe nego o fervor anti corrupção mesmo se isso é, para qualquer cidadão normal um imperativo democrático. Todavia, a sua exacerbada cruzada a favor de um pequeno hacker guloso e a tentativa de o fazer passar por uma espécie de Robin dos Bosques justiceiro arrepia-me o pouco Direito que, contrafeito, aprendi. Tornar a bufaria executora da justiça, lembra-me umas boas dúzias de criaturas detestáveis que, em seu tempo, e durante muitos anos, informavam a polícia sobre os meus passos, as minhas ideias não hesitando, aliás, em carregar nas tintas: Uma “Catarina” (pseudónimo usado) chegou a situar-me numa reunião clandestina em Cantanhede, terra que só dez anos depois conheci, a afirmar-me como bombista! Nem o pide confidente a levou a sério ...

Os “bufos” os “patriotas” informadores da PIDE, contavam-se por milhares e chego a supor que eram mais eles do que nós, os poucos oposionistas que se declaravam (e agiam) como tal. Portugal não foi o campeão dos bufos, isso é mais para a República Democrática Alemã, onde decentemente e felizmente, qualquer cidadão pode ir consultar o seu processo e saber quem o denunciava. Por cá é o que se sabe. Um véu legal pesado e espesso e imoral impede de ver “quem era quem” nesses tempos odiosos e infames.

Mas, voltemos, ao manifesto de Tavares. Este colunista, historiador e fundador do “LIVRE”, considera interessante o facto de pouco ou nada importar a futura eleição se o Doutor Rebelo de Sousa se recandidatar. De facto, se isso ocorrer, e eu sou dos que apostam que sim, a campanha será uma passeata ainda mais monótona do que a precedente. O populismo “bcbg” do actual Presidente da República, as selfies, a continua ocupação do espaço áudio-visual, a saturante corrente de opiniões sobre tudo e sobre nada, tornam-no invencível.

Tavares sabe isso, como sabe (ele o diz) que as candidaturas do PCP e do BE são “para inglês ver” e apenas servem para marcar um difícil território ideológico e partidário. Não são, como Tavares agudamente pressente, para levar a sério.

Entretanto, perante a anunciada candidatura do Doutor André Ventura, outro populista que marca pontos cada vez que lhe retiram a palavra na AR, Tavares entende que a intervenção de Ana Gomes permitiria “remeter” o homenzinho da Direita “para o lugar que lhe compete”. Para que não se corresse o risco de à falta de candidatos “credíveis” de Esquerda, a oposição a Rebelo de Sousa se refugiasse na Direita pura e dura!

De resta, sustenta Tavares, Ana Gomes não corre o risco de ser eleita e com isso de perder sua liberdade. Perderia seguramente as eleições mas “marcaria o campo da esquerda ecológica, europeísta, verdadeiramente democrática bem como permitir a Portugal recuperar uma “visão sobre o seu modelo de desenvolvimento e a forma de preservar o seu estado social”

Magna tarefa, pois. Tremenda, mesmo. Com um pequeno problema: se a candidatura for varrida pela onda marcelista isso não será um duro golpe neste tão extenso feixe de ambições.

Eu não votei no Doutor Rebelo de Sousa, nem aliás em outros doutores por extenso. Preferi-lhes Henrique Neto, um velho mas sólido socialista com provas dadas destes os tempos obscuros do Estado Novo. Também nunca dei um voto à Direita sequer ao Centro-Direita. Quando não tive candidato capaz, abstive-me ostensivamente metendo o papelinho em branco na urna. Nunca falhei uma eleição a começar pela única nos tempos da outra senhora em que fui delegado da CDE sabendo que, uma vez mais, isso me levaria, como levou, às enxovias do regime. Uma vez chegada a Liberdade, jurei que jamais faltaria a um acto eleitoral mesmo que tivesse de votar com uma mão no nariz (como bem disse o dr. Álvaro Cunhal ao apoiar, contrafeito a eleição do dr. Mário Soares.

E, já agora: sendo o Doutor Rui Tavares um político, fundador de um partido, ex-parlamentar europeu (como Ana Gomes) porque é que não se candidata ele. Não corre riscos, como já disse. É conhecido como comentador político e ex-parlamentar. Dirigiu o LIVRE, valha isso o que valer (e que é muito pouco). E poderia explicitar tudo o que no artigo de hoje expõe sem mandar o recado a ninguém.

(em boa verdade, o que me faz pensar é o facto de o referido senhor propor com frequência outros – outras, sobretudo – para a frente de batalha. Os resultados que se conhecem com a recém independente deputada Joacine deveriam fazê-lo reflectir nessa sua ânsia de delegar em outrem uma actuação perfeitamente ao seu alcance.