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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

au bonheur des dames 438

d'oliveira, 18.11.21

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Lá vai o comboio

mcr, 18-11-21

 

Lá vai o comboio
lá vai a'apitar
Lá vai o comboio
p'ra beira do mar

p'ra beira do mar
p'ra beira do rio
e os passageiros
cheiinhos de frio

cheiinhos de frio
cheios de calor
e os passageiros
a tocar
tambor

 

Eu já andava desconfiado com tanta fartura ferroviária e tanta fanfarra pedro-nunista. Pobre, quando a esmola é grande, desconfia e eu, que sonho com viagens cómodas, esperava que das promessas, das garantias, das juras algo saíssede maravilhoso, vá lá, de interessante, enfim de razoável sobre os carris do nosso descontentamento. A montanha pariu um rato se é que não sairá aborto espontâneo.

Os jornais lá confirmam que as coisas estão de novo adiadas para as calendas gregas mesmo se, uma voz trémula avise que será só dois ou três aninhos.

A culpa que, pelos vistos, e por vergonha, já não é de Passos Coelho, vai ser da Europa, da pandemia, do Orçamento,  do ministro das Finanças, da bitola larga (ou da estreita, tanto faz...) da Direita que não governa, enfim de alguém desde que não se aponte ao mais óbvio.

No primeiro governo gringoncista havia um pobre diabo que tinha o cargo de ministro de qualquer coisa ligada aos comboios que andou quatro anos a prometer uma espécie melhorada de “Expresso do Oriente” aos portugueses, gente mais habituada ao vagão jota e, agora, nem a isso.

A criatura foi promovida a deputado europeu e desapareceu do radar nacional. . Poderiam ter-lhe oferecido um comboio elétrico, um relógio de bolso com a imagem dos comboios (estão à venda na internet por +/ -  € 200) mas não. Mandaram-no representar a pátria dos egrégios avós em Bruxelas. Chama-se a isto dar um pontapé no dito cujo mas para cima. Bizarrias!...

E depois veio o actual, o castigador de perninhas de banqueiros teutónicos!

E a populaça, embevecida, perante esta espécie nova de rapazinho pioneiro do Komsomol dos bons velhos tempos, mas prudentemente socialista, arfou de entusiasmo. “É desta que a coisa vai!...”

Lamento muito: não foi. Fica para a próxima legislatura, para a próxima geração, para o dia  de S. Nunca. Aguentem que é serviço.

 

Há nestas histórias sempre algo que intriga: a capacidade de prometer mundos e fundos é, como se vê, grande, gigantesca. A execução é o que é, melhor diria o que não é. Os comboios em Portugal foram há muito votados ao abandono. O mesmo se passa com a infra-estrutura ferroviárias, cai aos pedaços por tudo o que é sítio.

Eu sou do tempo em que na escola (pouco risonha e menos franca ainda) se aprendiam as linhas todas, a do Norte, a do Sul e Sueste, a do Oeste, a da Beira Alta , a do Douro, a do Minho. E tudo com as estações, se calhar até tínhamos de recitar os apeadeiros. Era chato mas a miudagem tem uma memória prodigiosa e aquilo ia de par com os rios e afluentes, todos, claro e o sistema orográfico. Também por inteiro, claro.  Mal, aquilo não me fez. Bem também não garanto mas o ensino era o que era e nunca um menino confundiu o douro com o Guadiana ou o pôs o rio Mira no Minho. É por isso que, quando se fala na linha do Douro, os meninos sobrevivos do meu tempo sabem do que se trata. E sabem que à contínua queda de população no Alto Douro também corresponde o fim das linhas férreas. Ou seja ainda se tornou o interior mais interior por falta de transporte. Agora quem quer (e pode) chama um táxi e paga três ou quatro vezes mais pelo serviço.

Há uns escassos esses, reinaugurou-se um troço de via entre a Covilhã e qualquer sítio não demasiado distante. Durante três dias foi um alvoroço. E era, raios me partam, era a possibilidade de tranquilamente e depressa se ir por pouco dinheiro de um sítio para o  outro. A avetura, porém, parou ali.

Também foi alvo de dezenas de entrevistas e reportagens a reabertura das oficinas da CP. Com operários antigos e despedidos pela mesma CP. Recuperaram comboios inteiros que agora circulam. Não foi um milagre mas tão só a recuperação de um projecto que andou pelos gabinetes ministeriais camuflado e clandestino. E deu para uns quanto se pavonearem sem se dar conta que tinham sido os seus antecessores e camaradas a dar cabo de estruturas que afinal são úteis...

Desta feita coisas que se deveriam ter iniciado em 2020 vão, na melhor e mais duvidosa das hipóteses, arrancar três/quatro anos depoi. O que assusta qualquer um é a naturalidade com que isto é anunciado. E ninguém é chamado à pedra, censurado, processado, demitido. Ninguém!

Fala-se de ligações a Espanha e à Europa que rola sobre carris. Qual a bitola que se vai usar? E quando?

Mistério insondável! Num mundo em que as viagens de avião até distancias de 600 ou 800 km irão acabar não há ninguém por cá que sequer atenda o telefone.

Lá vai o comboio... lá vai ele a apitar... Vai?

 

 

 

 

 

au bonheur des dames 437

d'oliveira, 17.11.21

Diga ele o que disser

mcr, 17-11-21

 

 

O senhor Ministro da Defesa irá muito proximamente depor na AR. Pelos vistos, até o PS se resolveu a disponibilizar tal ida à Comissão.

Anda por aí, em surdina ou mais aberta e ruidosamente, uma campanha tendente a desculpabilizar o Ministro enquanto, ao mesmo tempo se tenta chamuscar o Presidente da República e o Primeiro Ministro, culpados de reagirem a quente e a destempo.

Jornais e televisão tem destacado tais posições pelo que me abstenho de dizer mais sobre o tema da campanha pró Ministro.

Conviria, porém, realçar dois pequenos pontos.

O primeiro tem a ver com a pronta comunicação às Nações Unidas porque “alguns implicados” tinham feito parte da força que, sob os auspícios internacionais, tinha estado na República Centro Africana, outro Estado fantasma a juntar a uma já longa lista de países africanos incapazes de dirimirem os seus conflitos internos e sempre á mercê de golpes quarteleiros.

O segundo diz respeito aos alegados “pareceres jurídicos” que impediriam o Ministro de informar o seu superior hierárquico e, por via travessa, o Comandante Supremo das Forças Armadas.

Comecemos por aqui: o segredo de justiça diz respeito aos trâmites e ao miolo do processo e nunca ao facto de ele existir. De certeza que nem Costa nem Marcelo iriam pedir pormenores. Para já não falar na turva ideia de que, informados, iriam “pôr a boca no trombone”!...

Depois, pergunta inocente, se apenas havia uma vaga suspeita de malfeitorias (nada de comparável ao que hoje se sabe) a que título vem a excepcional cautela de blindar com os alegados pareceres algo que então não passava de um delito de pouca dimensão?

(nem vou perguntar se , de facto, existiam tais pareceres ou se os que que aparecerem são desse momento ou posteriores, maxime actuais  e feitos numa fervurinha para abalizar o férreo segredo ministerial (não quero sugerir nada mas esta dúvida já corre por aí ,Não tenho razão especial para duvidar do Ministro mas nada, na sua atitude me faz ter nele uma ilimitada confiança. Já me bastou a trapalhada da falhada e tosca substituição do CEM da Armada).

 

Em relação ao primeiro ponto, estranha-se que haja uma comunicação “às Nações Unidas” que seguramente também não teria uma expressão e uma densidade especiais e o mesmo não suceda ao nível interno e sempre , e só, ao Primeiro Ministro.

O que se sabe, e é pouco mas substancial é que um par de mariolas, inteligentes e empreendedores, descobriram uma maneira rápida e eficiente de transladar uns diamantes da RCA para local mais seguro e civilizado, usando aviões da FAP e aeroportos militares nacionais. E que esse primeiro passos, terá desencadeado uma complexa operação logística com mais de sessenta criaturas, dedicada não só ao escoamento das pedras preciosas mas também a toda uma vasta gama de actuações criminais e financeiras em Portugal e no estrangeiro. Tudo obra de dois comandos que nada parecia predestinar para tão altos voos. Vê-se que ,na tropa, o elevador social, funciona com inaudita eficácia...

O sr. Ministro, decerto, explicará o que até este momento tem visos de inexplicável. Ficará sempre, a dúvida sobre a tão cerrada tortuosidade do procedimento e, sobretudo, sobre quem manda no Governo, sobre a autonomia dos ministros. Já se desconfiava que era grande e generosa (basta lembrar as alfinetadas de Pedro Nuno, o das “perninhas bancárias e alemãs”, ou as aventuras de Cabrita ele próprio um repositório de tudo o que um ministro não deve, nem pode, ser.

 

(se algum/a leitor/a  pensar que estou a defender acirradamente Presidente e Primeiro Ministro, logo eu, que costumo “cortar-lhes na esfiapada casaca!, peço que se desiluda. O que acima disse é apenas a defesa das instituições e do seu modo republicano e democrático de funcionamento. No resto, mantenho sobre estes cavalheiros as mesmíssimas ou acrescidas reservas de sempreUnknown.jpeg

hoje a vinheta saiu no fim. Não foi de propósito mas tem algo a ver com a lógica da actuação ministerial. (sinal de que o velho macbook air está a tornar-se cada vez mais humano...)

 

estes dias que passam 601

d'oliveira, 16.11.21

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A morte lenta

mcr, 16-11-21

 

 

O espectáculo infame a que se assiste na fronteira entre a Polónia e Bielorússia carece de palavras suficientemente duras para ser clarificado. Aquilo ultrapassa tudo o que os desacordos políticos possam conter, guerra incluída.

Ao atirar para a “terra de ninguém” alguns milhares de refugiados, melhor dizendo de sobreviventes de uma longa e mortífera marcha que tem por fim escapar à morte pessoas cujo crime foi nascerem em terras onde ninguém respeita ninguém, onde a morte, mais do que o futuro, é o presente de famílias inteiras, o governo bielorusso torna-se passível de crime contra a humanidade, de tantos crimes quantos os retidos naquele inóspito lugar, a que um inverno inclemente já chegou, sobretudo quando se sabe que a maioria dos que ali estão vem de climas quentes.

Não tenho a menor simpatia pela gentinha que governa a Polónia mesmo que entenda que abrir a fronteira será  criar um perigoso precedente numa batalha desigual em que o bielorusso usa escudos humanos.

Não sei, porém, se a presença de vinte mil militares polacos, ou seja quatro a cinco soldados por refugiado, mulheres e crianças incluídas beneficie no que quer que seja a nossa Europa, a civilização que dizemos defender, os direitos humanos...

Sabe-se que já terão morrido, alegadamente de frio oito ou nove pessoas. Calcula-se que este número de prófugos de países instáveis e em guerra, seja apenas uma quota parte dos que partiram mas não sobreviveram para chegar aqui, isto é a nenhures.

Esta fronteira, este campo horrendo entre muros de arame farpado é bem pior do que o Mediterrâneo onde todos os dias se naufraga e se morre- Morte, apesar de tudo mais rápida, mais clemente, se clemência há em morrer desesperado, do que esta aqui à vista de todos, filmada, gravada com som e imagem a cada momento.

Também não entendo por que territórios passaram estes fugitivos. Pela Rússia?. Pela Ucrânia? Decerto não vieram dos países bálticos pois aí o mar banha países acolhedores e decentes. As duas primeiras hipóteses merecem anotações diferentes. A Ucrânia com fronteiras marítimas pode ter sido ponto de entrada. Se assim foi, que espera a União Europeia para a sancionar? A Rússia significaria uma viagem com o dobro da extensão e um território policiado ao extremo, sobretudo nesta zona onde o conflito com a Ucrânia permanece em aberto.

Ninguém acredita que estes milhares de emigrantes tenham chegado de avião, logo agora que um grande número de companhias aéreas abandonou os seus bielorussos.

No meio de tantos mistérios a realidade é esta: milhares de pessoas encurraladas entre a indiferença e a crueldade.    E o frio! e o desespero... 

 

au bonheur des dames 436

d'oliveira, 15.11.21

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Em casa?1...

mcr, 15 –xi-21

 

 

Já por várias vezes aqui deixei bem claro o meu nulo interesse no futebol. Apenas por brincadeira e descargo de consciência costumo dizer que o meu clube é a “associação Naal1º de Maio” (Figueira da Foz) mesmo se desconheça tudo o que por lá se passa, incluindo em que campeonato o clube joga neste momento. 

Ao nível nacional, também nunca me impressionaram as derrotas (e foram muitas) ou as vitórias da “nossa” selecção, mesmo a felicidade de uns tantos passe mais pelos brilharetes do que pelo desenvolvimento do país, pelo bem estar generalizado, pelo avanço civilizacional, cultural e social de Portugal (feitios...).  

Todavia, queira eu ou não, as façanhas futebolísticas (praticamente só essas...) enchem as páginas dos jornais e os noticiários televisivos, pelo que só se fosse surdo e sego é que não estaria ao par dos sucessos e insucessos desportivos. 

Vá lá que já ninguém é convidado a dar provas do seu exacerbado amor à camisola das quinas, pondo à janela uma bandeirinhas nacional! Essa proposta de um treinador brasileiro, por acaso, passou à história e o nacionalismo lusitano agora é ligeiramente mais discreto. 

O jogo de ontem, pelos vistos, era importante. Tratava-se de aceder directamente à lista dos felizes futuros competidores de um campeonato mundial que vai celebrar-se no Quatar, país de indisfarçável e forte tradição futebolística (!!!)

Bastava empatar o jogo e, jgando em casa, a coisa parecia fácil, tanto mais que a Sérvia não é exactamente umgigante do futebol mundial, sequer europeu. 

Na rua, n esplanada, no supermercado ouvi dizer que “isto ia ser um passeio...”

Não foi. A selecção de “todos nós” perdeu acintosamente frente a uma equipa de um país que nem sequer da UE faz parte! 

Uma tragédia que torna Portugal dependente de umas contas complicadas pra conseguir (em “low cost” como diz o jornal, um lugarzinho ao sol daquele deserto de petróleo, pero-dólares e areia.

Na esplanada reinava um luto pesado. E um coro de recriminações que atingiam treinador, jogadores, autoridades federativas e, sobretudo, a malvada Sérvia que nos veio envergonhar dentro da  nossa própria casa.

Eia avante, portugueses! Contra os sérvios marchar, marchar! Vão rolar cabeças, olá se vão. A crise ficou para traz. As futuras eleições não perturbam ninguém, Nem a falta de matérias primas. Nem d automóveis que chegarão a demorar um ano depois de encomendados. Temo bem que a culpa disto tudo seja de Passos Coelho. Ou, na falta dele, de Rui Rio, do Chega. O único que se safa é o Xicãozinho, coitado, que está com um miserável ponto nas intenções de voto. Um ponto, quase o mesmo que o Livre se, como consta, esta agremiação for a votos. 

Anda não vi, nem li, qual a declaração do Sr Presidente da República pois Sª Exª tem por hábito comentar tudo e mais alguma coisa. Estou, até, confesso-o pesarosamente, curioso. Irá sair do palácio vestido de luto? Ou de verde vermelho? Ou normalmente mas penas para ir pagar uma conta ao multibanco? A pátria aguarda  em sobressalto, a declaração do eminente político e comentador. 

Já agora, uma palavrinha sobre o caso dos comandos ajudava... 

Às tantas, a derrota é um castigo divino. Ou, então, foram os malvados banqueiros alemães, sempre eles. Avisem por favor o sr. Pedro Nuno para lhes dar a valente canelada, que eles merecem, nas perninhas.

Isto não pode ficar assim. Nem assim nem sopas! É preciso avisar a malta...Ou cerrar fileiras e cantar, a plenos pulmões e- como sempre – desafinadamente  o “Grândola, vila morena, que do hino nacional já ninguém se lembra da letra (e menos ainda da música...)

Pátria, morremos contigo!  

 

   

 

 

 

au bonheur des dames 435

d'oliveira, 14.11.21

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Esta já está!

mcr, 14-11-21

 

 

Hoje, pela fresquinha, apresentei-me garboso e corajoso no Regimento de Transmissões, para a terceira dose da vacina contra o covid.

Há pouco mais de 15 dias tomara a da gripe, na farmácia do costume. Sei perfeitamente que no Centro de Saúde a vacina não me custaria nada mas, neste capítulo da prevenção, eu não sou nada de dar uma folga. Portanto, logo que a farmácia me avisou que já tinha vacinas disponíveis nem hesitei.

Aliás, na altura nem sabia quando seria chamado e por isso continuo a pensar que fiz bem em me adiantar.

O quartel onde fui é enorme ma, felizmente, permitem a entrada de carros. A mim, provavelmente, não me faria mal, bem pelo contrário uma caminhada de cerca de 900 metros mas para a maioria das pessoas da minha idade, essa caminhada será já uma pequena provação.

Aliás, quando estacionei, acorreram pressurosos dois cidadãos com fatiotas do SNS a perguntar-me “se precisava de ajuda para andar”. A minha resposta só os tranquilizou depois de me verem sair do automóvel e dispor-me a fazer os últimos 199/200 metros.

Mais difícil foi preencher a papelada, nomeadamente tentar ler o meu nº de utente do SNS. Tive de pedir auxílio a um soldado prestável que leu e me recitou lentamente o malfadado número.

Já no átrio da vacina perguntaram-me se eu me importava de apanhar a 3ª dose da “Moderna”. Pelos vistos, havia falta da “Pfeizer”. Claro que o que eu queria era uma vacina, fosse ela qual fosse, desde que adequada.

Lá me picaram o “bracinho” (enfermeira dixit, que aliás me tratou por “amor”. A coisa envelhece qualquer um. Fosse eu um mocetão na flor da idade e do resto seguramente que a rapariga teria mais cuidado...)

 Ao fim, aproveitei o descuido de quem estava na portaria e escapei ao período de observação. O café da manhã atenazava-me as papilas sequiosas e, ainda por cima, já trazia o jornal pronto a ser consumido. Saí “à francesa”, isto é “pirei-me” sem dizer  “água vai”. Numa república coimbrã recheada de malta africana, dizia-se “abrir” ou, cúmulo da sofisticação!, ”lancetar”. Esses meus amigos “lancetaram” todos naquele ano da fuga maciça de mais de cem estudantes das colónias.

Há sobre o tema um livro muito interessante da Dalila Pereira da Costa onde se descreve todo esse complicado processo que teve a ajuda oficial das igrejas americanas e extra-oficial, para a logística da travessia de Espanha, de elementos da CIA. Hoje, há quem pretenda esconder essa embaraçosa intervenção esquecendo que até o Presidente Kennedy era contra a manutenção das colónias portuguesas. É a “história revista pelo politicamente correcto” que se avia por aí.

Portanto aqui estou de peito feito à tempestade, pronto a enfrentar a bicheza covidiana com mais possibilidades do que essa ínfima percentagem de criaturas que acredita em discos voadores, espíritos malignos e teorias várias da conspiração.

 

Vacinem-se caros leitores maiores de 65. Mais vale prevenir do que depois, ter de remediar a negligência, a ignorância e a preguiça.

 

(recado ao meu caro confrade – e amigo – JCP que me criticou sem malícia o meu texto sobre o acesso ao centro de saúde. Pelos vistos, ele acede sem dificuldade, via mail. Provavelmente também eu. Todavia, o meu ponto era o telefone que ninguém atende. Fiz sete tentativas, que diabo. Espaçadas no tempo. A pergunta que se põe é esta: de que serve indicar um telefone (aliás fixo!) se ninguém atende?  Será algo de extraordinário ter um aparelho que guarde as chamadas, as distribua ou permita deixar uma mensagem?

Abraço, JCP e cautelas muitas – e caldos de galinha que também não farão mal – que isto da pandemia ronda por aí)     

au bonheur des dames 434

d'oliveira, 13.11.21

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Feminismo avant la lettre

mcr, 13-11-21

 

 

uma cronista que costumo ler no “Público” afirmava há dias, a propósito do Congresso  da SEDES que era notória a falta de mulheres em tal evento. E, implícita e explicitamente, criticava com alguma veemência tal situação.

Alguém, da SEDES, veio responder, explicando que se era verdade tal facto isso devia-se a que a SEDES na sua constituição (há já algumas décadas) agrupara sobretudo homens, cidadãos interessados no desenvolvimento do país. Isso, de certo modo, perpetuara-se e, reconhecia que ainda hoje em dia era visível o desiquilíbrio não só entre homens e mulheres mas também entre gente mais velha e jovens.

DE todo o modo, o referido dirigente, proclamava que um intenso esforço estava a ser levado a cabo não só no sentido de angariar mulheres mas também no de rejuvenescer a associação.  

Não sei, ou não recordo, se o argumento convenceu ou melhorou a opinião da colunista. Como a questão continuou a suscitar outros comentários, lembrei-me dos meus tempos de estudante e da minha participação no CITAC, um grupo de teatro estudantil profundamente ancorado à Esquerda. As sucessivas Direcções que conheci eram esmagadoramente povoadas por homens, deixando-se uma minguada parte a uma, máxime duas raparigas que quase se diria que estavam ali para enfeitar.

Nos últimos anos da minha vida estudantil e consequente actividade no grupo, propus sem qualquer êxito que a Direcção do Organismo tivesse mais mulheres e, sobretudo, uma Presidente (escrevo presidente e não parvamente presidenta como uma senhora política brasileira propunha. O feminismo quando exacerbado dá para a tolice e, neste caso, para  o desconhecimento da língua).

Baldado intento! E não eram os homens quem mais se opunha. Gaia da parte das minhas amigas, mulheres inteligentes e combativas, uma espécie de fataliesmo negativo que as levava s admitir sequer essa hipótese. Mesmo longínqua!...Os homens, esses com a guerra de África como futuro previsível e rápido caso ultrapassassem as fronteiras que o regime estabelecia até convinham em que uma mulher presidente livraria o organismo dos efeitos, eventualmente devastadores, de uma decapitação da Direcção. O argumento era provavelmente oportunista, seguramente egoísta mas aqui o importante era abrir o precedente, aceitar que a Universidade em finais de 60 tinha quase tantas alunas como alunos. Ou para lá caminhava velozmente...

Não sei quanto tempo demorou essa alteração nos órgãos sociais do CITAC. Mas aconteceu e quando se celebraram os cinquenta anos do grupo, nós, os veteranos, fomos recebidos por uma Presidente. Nem me atrevi a perguntar qual era a percentagem de mulheres na Direcção. Nõ e deve desafiar o diabo. 

Agora as coisas andam um pouco mais depressa. Gá uma Presidente da União Europeia. O BE, o PAN  o CDS e o  PSD  tem ou já tiveram mulheres a dirigir os respectivos partidos. Se no caso dos dois primeiros se trata de pequenos grupos com um número reduzido de militantes já nos dois outros casos (partidos de Direita ou Centro-Direita) a evolução é mais notória e significativa. Deram um passo que nem o PC ou o PS conseguiram dar.

O que prova que não é na Direita que a questão se põe como seria mais espectável. Em todo o caso, o PS já tem uma parlamentar a dirigir a respectiva bancada. 

Na sociedade civil duas fundações, e importantes, são actualmente dirigidas por mulheres (Gulbenkian e Chamaplimaud) e há que eu saiba, ou me lembre, duas Ordens (enfermeiros e Farmacéuticos) com u Bastonária. Bem sei que neste caso a proporção homens  mulheres é de tal modo diversa que se impunha uma mulher.

Nos jornais que leio regularmente há uma percentagem apreciável de mulheres jornalistas, fundistas e comentadoras. 

Ou seja, o caminho faz-se caminhando. E tem de ser as mulheres a darem-se também a esse trabalho. Que, em muitos casos é duro e difícil porquanto é sobre elas que, maioritariamente recai o trabalho de cuidar especialmente dos filhos. Aí são os homens que terão de enfrentar uma clara revolução cultural. 

Todavia, as queixas sobre sub-representação feminina em muitos dos palcos da vida cidadã escondem a ideia de que seria preciso uma lei de quotas que impusesse a presença das mulheres em numero paralelo ao dos homens. Pessoalmente, não vejo que tal obrigatoriedade legal, justamente por o ser, trouxesse a igualdade desejada e desejável de oportunidades. Igualdades artificiais levam sempre a desigualdades reforçada. No caso da SEDES que deu origem a este folhetim, o caminho é simples e está aberto: as mulheres que sintam vontade de intervir devem inscrever-se na associação. Depois, o seu trabalho será provavelmente reconhecido, as suas intervenções apreciadas, o seu peso nos futuros congressos reforçado.    

De fora ninguém racha lenha mesmo se o conhecido provérbio sugere exactamente o oposto. 

 a gravura: uma estampa de Aubrey Bearddsley, autor muito da estima de Manuel Sousa Oereira, um escultor que faz falta. 

 

au bonheur des dames 433

d'oliveira, 12.11.21

 

Em roda livre!

mcr, 12-11-21

uns soldados portugueses em missão na República Centro-Africana descobriram um modo simples, eficaz económico e rápido de traficar diamantes obtidos in loco por preço vil.

Ocultavam as pedras em peças artesanais, metiam-nas em aviões militares e, zás!, chegavam num instante a um aeroporto militar nacional onde, supõe-se, a vigilância deveria ser no estilo de Tancos. 

A partir daí criavam empresas fictícias com nacionais e estrangeiros, e ganhavam folgadamente a sua vida.

A coisa foi descoberta em 2019, chegou ao conhecimento do Ministro da Defesa Nacional que entendeu(!!!) nada dizer ao 1º Ministro de quem dependia e tão pouco ao “Comandante Supremo das Forças Armadas”, isto é ao Presidente da República.

Todavia, a gravidade da questão foi por ele considerada tal que, entendeu (!!!) novamente comunicar o problema às Nações Unidas, usurpando provavelmente as funções do Ministro dos Negócios Estrangeiros que, por sua vez, também entendeu (!!!) que “dentro do Governo não havia deficit de comunicação”. Estarrecedor, caro Watson, estarrecedor...

O Ministro da tropa terá seguido um parecer jurídico que em resumo prevenia que nada daquilo transpirasse para fora do estricto circuito da investigação. 

O famoso “segredo de justiça” impediria que a informação circulasse não fosse haver alguém pronto a badalar... (no caso os srs. Presidente da República e Primeiro Ministro!!!)

Agora o segredo caiu e o país assiste pasmado, eventualmente indignado mas sempre divertido, a esta história que é tonta, absurda, desleal e nos promove, outra vez, à categoria de república bananeira.

Eu não conheço o senhor Ministro de lado nenhum e, desde há tempos, a minha vontade é desconhece-lo absolutamente tantas são as argoladas  com que S.ª Ex.ª vai semeando o percurso de ministro. 

Sou, porém, cidadão português e nada do que diz respeito ao meu país me é alheio. Ministros que se arrogam de omnipotentes irritam-me. Pela arrogância e pela patetice supina que vão revelando ao longo da sua governação.

Cabe lá, na cabeça de alguém que um ministro não reporte ao seu superior hierárquico (que tem o poder de convidar e de o mandar sair pela porta do cavalo) um caso cuja gravidade o leva a dirigir-se à Nações Unidas?

Cabe lá na cabeça de alguém que, depois do fiasco imbecil da substituição do Chefe de Estado Maior da Armada, que volte a repetir a façanha de ignorar o Presidente da República?

Cabe lá na cabeça de alguém que o Presidente da República não tenha já tido uma atitude (se possível pública como publica é a afronta e a asneira) que coloque o Governo em sentido e a escorraçar rapidamente o ministro? 

cabe lá na cabeça de alguém que o Primeiro Ministro ainda não tenha posto ponto final a esta deriva esparvoada do ministro? 

Que mais será preciso ao dr. Costa que, oh estultícia!, afirmou nada saber do assunto, para mandar um recado ao ministro convidando-o, cortês mas firmemente a fazer as malas e desandar para qualquer sítio onde as suas acções não envergonhem o país?

Cabe lá na cabeça de alguém que do PS só venha um cavernoso silêncio que no caso não é de oiro nem prata mas de merda e 

de compadrio?

Sei bem que o Governo está de malas aviadas mas mesmo assim, ou justamente por isso, impunha-se-lhe uma atitude  e um exemplo. Este ministro é imprestável. Corram com ele. Não é preciso chamar a criatura à AR que também está prestes a ir para um adequado e forçoso retiro espiritual.

Ainda ninguém percebeu que esta historieta, indigna sequer 

de uma revista à portuguesa no parque Mayer, faz de nós o palhaço pobre de toda a União Europeia? 

Arre que somos masoquistas!!!

au bonheur des dames 432

d'oliveira, 11.11.21

 

 

Virão o nevoeiro, o frio e a chuva

mcr, 11-11-21

 

 

Virá o inverno mas o vice almirante mostrou-se indisponível para vir resgatar uma operação d que, pelos vistos, não está a correr nem com celeridade nem com grande afluência e interessados.

São muitas as razões que se aduzem: os “sms” do Ministério são confusos, de difícil resposta, dirigiram-se a um publico (maiores de 80 anos, primeiro e de 65, agora) em que é frequente a info-exclusão.

Aliás, mesmo para quem sabe, a resposta era difícil: não bastava escrever sim ou não, era preciso meter o número de utente, antecipa-lo  de SNS, enfim algo não ou mal explicado.

Eu, quando recebi o dito recado tentei, pobre tolo, explicar que não poderia ir à hora e dia marcados  porque, descrente das virtudes do SNS, apressara-me a ir a uma farmácia fazer a vacina contra a gripe. E havia um prazo de quinze dias entre ,a toma de uma e de outra.

Aliás nunca percebi qual a razão desta pausa quando havia a hipóteses de se tomarem no mesmo dia!...

Claro que, perante o crescimento de infecções, começou a ouvir-se muito claramente um clamor a pedir o regresso do almirante. Com ele (e a sua equipa de militares) a coisa tinha andado a toque de caixa. Agora, pelos vistos, isto mais parece um arrastar de pés, um enterro digno e demorado (longe vá o agoiro!), uma marcha lenta de protesto.

Ora, se nada mudou excepto a “task force” então a solução plausível seria pedir o regresso desta.

Gouveia e Melo veio dizer que não estava nos seus projectos regressar. Que isso era, disse-o cm todas a letras, um “sebastianismo”e que quem estava na vacinaçãoo sabia perfeitamente o quefazer.

É possível mas não se vê. Não sei o que emperra a máquina mas o zunzum é geral. Isto faz que anda mas desanda ou não anda ou é frouxo.

Mais uma vez o bom senso prático do vice almirante veio ao de cima. Basta seguir os bons exemplos e as boas práticas. Haja alguém, no Ministério da Saúde, que mande, que saiba mandar.

Provavelmente não há! E não me venham acusar de ser contra a Ministra. Não sou, apenas a acho demasiadamente fala-barato e toscamente ideológica.

E o resultado, à luz do que se ouve, do que se diz, do que se sabe é este: um desconforto!

De há muito, quem me lê com alguma atenção sabe-o desde o primeiro dia, e já lá vai mais de uma dúzia de anos, a minha crítica tenta atingir uma falsa e duvidosa elite, ignorante, inculta, incapaz de perceber qual o interesse público. Esta gente que deveria servir o Estado, serve-se a si mesma. Ou confunde o Estado com o partido em que milita e a “função pública” (no seu vero sentido de poder-dever público) com uma chatice a que não se deve prestar especial atenção.

E isso reflecte-se na opinião pública. É ver o descaso com as eleições, mais de 50% de fuga às urnas, a ideia geral de que eles não governam mas governam-se. Este país, que se ufana de oitocentos anos de existência, vê-se envelhecer, descobre que quem pode, ou quem sabe, prefere emigrar que as listas de deputados são cada vez menos interessantes, recheadas que estão de ineptos, de funcionários, de professores fartos de ensinar, de advogados sem clientela, de gente que aceita tudo para ter um lugar no parlamento e, aí, se limitar a levantar e baixar o cu à ordem da direcção da bancada.

E não é de espantar: os deputados são eleitos à molhada, por junto e em cada lista, conhecem-se dois ou três o resto é gentinha, carne para canhão. Ou seja, os eleitos só respondem perante o aparelho do partido que os escolhe a dedo medindo e aplaudindo o seu grau de subserviência, de docilidade e norma geral a sua pouca cultura geral e política.

Desta gente, assim arregimentada, sai depois um Governo à sua imagem e semelhança. O pobre sr. Cabrita não é uma avis rara, uma excepção, bem pelo contrário. É o retrato fidedigno desse naufrágio da inteligência e da competência. E com ele mais um largo par de luminárias que se pavoneiam pelos noticiários e são conhecidos por viajarem a 200 à hora.

Ora se quem manda é assim, que podemos esperar dos escalões imediatamente inferiores e, no caso em apreço, nas criaturas que estão a comandar um processo que foi bem rodado e bem executado enquanto houve, por lá, quem sabia mandar e mandava?

O inverno, o frio e algum nevoeiro anunciam-se. É a hora dos sebastiõezinhos coisa que Gouveia e Melo persiste em não querer ser. Nem merece.

O problema são as futuras eventuais vítimas desta confusão a que começamos a assistir.

E a procissão ainda vai no adro...

au bonheur des dames 431

d'oliveira, 10.11.21

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Óculos para que vos quero?

mcr, 10-11-21

 

 

Pode ser que eu esteja redondamente enganado  ou seja apenas ainda mais ignorante do que realmente sou (e juro que o sou bastante) mas na renovação da carta de condução há algo que me surpreende.

Eu percebo que a pessoa que quer renovar a carta se submeta a uma inspecção médica sumária. E que quando se tem uma certa idade a renovação da carta ocorra em períodos cada vez mais curtos.

A velhice tem os seus achaques e, mesmo que uma pessoa não note(???) ocorrem sempre transformações no nosso modo de viver, desde andar mais devagar a ouvir pior e por aí fora.

No caso que ora me traz aqui confesso que não entendo bem a inspcção à visão.

 

A grande, imensa, maioria das pessoas perde visão ao longo dos anos. Isto para não falar das que são míopes ou tem desde muito cedo, ou desde sempre, problemas de visão.

 A verdade é que a partir da meia idade, e hoje o conceito é difícil, pois a duração média da vida aumentou, começam os problemas da “vista cansada”, permitam-me que use esta expressão tão pouco científica mas isto é algo que toda a gente entende.

Também eu, que me gabava de ler em qualquer luz comecei a ver que tinha de aumentar a distância entre mim e o livro de tal modo que uma grande e especial amiga, Luísa F., me sentenciou “precisas de ir ao oftalmologista pois estás com a vista cansada”. E lá fui, pois nestas coisas e à vista do problema em questão aquilo parecia-me mais certo que o Evangelho.

O oftalmologista confirmou o diagnóstico da minha amiga e condenou-me a usar óculos. Com o decorrer dos anos havia que os substituir como também é sabido.

Até hoje, aliás ontem, quando fui fazer esse sumaríssimo exame que praticamente se reduziu a pôr-me em frente de um painel de letras de várias dimensões e solicitar-me que as enunciasse.

Tudo isso sem óculos!

Eu não percebo a razão de, tendo obrigatoriamente de os usar (até recordo os atestados que qualquer médico me passava onde se mencionava expressamente “tem de usar óculos” ou algo do mesmo teor e substância) tenho de penar a olho nu diante do tal painel. Claro que não consigo ler mais de metade das letras ou das barras de letras! É por isso que uso óculos. Para poder lê-as todas ou quase todas!

Quando conduzo não tiro os óculos, evidentemente. Mais até unos óculos de sol mando (e pago!) pôr a graduação.

Como no início afirmei, eu não passo de um ignorante em matéria oftalmológica ou similar mas esta coisa de pôr um pobre diabo sem óculos que usa constantemente ler letras de diferentes tamanhos é, convenhamos, pelo menos para um leigo, algo de bizarro.

O mundo dos automóveis está numa enorme mutação. Desde o “eléctrico” muito ecológico e igualmente bem mais caro, até ao uso de avios de toda a espécie, em especial para estacionar ou a denunciar a proximidade de outro veículo ou de pessoas. Fala-se em automóveis sem condutor, enfim é um novo mundo que se aproxima e que provavelmente já não verei, pelo menos em todo o seu esplendor.

E já nem me espantaria se, depois, do exame a olho nu, se fizesse outro já com os óculos. Só para ver qual a diferença e se isso afecta ou não a segurança rodoviária. Mas não, pelos vistos, basta a sumária inspecção a nu.

Será que isto se percebe? 

Como é que fazem com os míopes? Também os põem a ver as letras em tamanhos que eles não conseguem discernir?   

 

 

o leitor (im)penitente 224

d'oliveira, 09.11.21

Weltkronik,_Hartmann_Schedel_(1493),_Colapse_of_Me

 
 

Limpando a biblioteca para o Natal

mcr, 9-11-21

 

 

Durante anos sofri horrores  com a escolha de prendas de Natal. A teoria vigente cá em casa era a das prendas pessoalizadas. Nada de livros, discos ou dvds de filmes.

Havia que entregar a cada criatura algo que lhe dissesse muito ao coração e, eventualmente, à cabecinha pensadora. 

Proibido  de oferecer coisas que eu percebia, foi um martírio encontrar as tais prendas que significassem o meu profundo apreço e ao mesmo tempo agradassem a quem as recebia. O êxito era, apesar da intensa cerebração a que me entregava, relativamente minguado. 

No que a mim tocava, todos se recusavam a dar-me o que eu gosto (exactamente livros, discos ou filmes) Eu bem afirmava que eram prendas baratas, fáceis de encontrar em qualquer fnac, mas nada! Apanhei assim com uma larga dúzia de àguas de colónia, de produtos para depois de fazer a barba, de sofisticados para o duche (logo eu que me forneço no supermercado...). Ou então roupa. Neste capítulo o recordista foi o meu irmão que durante anos me enfiava com um cachecol, chegando ao ponto de os repetir. Quanto a outras roupas, nunca ninguém, mesmo conhecendo-me, me deu algo que eu fosse capaz de vestir. Logo eu que sou do mais clássico possível, digamos mesmo conservador, em vestuário!...

Tentei, sem qualquer êxito, fazer pequenas listas de livros, tendo o cuidado de limitar as ofertas a um preço barato mas nem assim. 

Felizmente, boa parte da família decidiu que, entre adultos deixava de haver prendas. Não foi apenas o alívio financeiro, foi sobretudo o fim de um pesadelo que começava ainda nos inícios de Novembro e durava até ao Natal. 

Agora, os ofertantes são muito menos. Tentei aliás convencê-los a natais mais simples com prendas apenas para a arraia miúda, adolescentes incluídos. Nada feito. A minha enteada quase que considerou insultuosa tal sugestão. Ela adora o Natal e sobretudo o ritual temível das longas horas de distribuição das prendas. “Lá vai isto para X da parte de Z”

Confesso que esta maratona, a que me submeto em nome da harmonia familiar, me deixa num estado quase comatoso e o bacalhau comido revolve-se-me no estômago ou em qualquer outra víscera adjacente de modo revoltante e quase indigno. Quando me despeço e vou recolher-me estou exausto! 

Entretanto, a idade (provecta, lá vai o nariz de cera) tornou-me ousado. E agora já ofereço livros sem medo. Aguentem que é serviço!

E descobri que, algumas vezes, acerto. 

Desta feita, resolvi ir ainda mais longe. A biblioteca que fui acumulando ressente-se de repetições que depois enchem estantes cortando o acesso a livros novos. 

E assim, descobri que para um casal quase familiar havia uma excelente edição da Crónica Universal de 1493, um calhamaço com 1800 ilustrações. Ainda por cima é uma edição (esgotada, creio) da Taschen, em francês (espero que ainda leiam esta língua...) com um livro de estudo acoplado onde se resume a obra de um cavalheiro Hartmann Schedel, cidadão de Nuremberga que gastou uma fortuna e pouco ou nenhum retorno obteve.    

 

Aproveito uma breve consulta à wikipédia para resumir o contudo da obra, aliás curiosíssima, repleta de anedotas históricas, saborosas e reflectindo muito dos saberes, crenças e avanços científicos da época: 

 

A Crónica do Mundo de Schedel, apareceu pela primeira vez em livro no ano de 1493, em Nuremberga, numa versão em alemão e outra em latim.

 

A obra segue a tradição das crónicas medievais, apresentando a história do Mundo dividida em "idades" ou "eras":

1.ª Era do Mundo — desde a Criação ao Dilúvio;

2.ª Era do Mundo — até ao nascimento de Abraão;

3.ª Era do Mundo — até ao reinado do rei David;

4.ª Era do Mundo — até ao Exílio na Babilónia;

5.ª Era do Mundo — até ao Nascimento de Cristo;

6.ª Era do Mundo — do Nascimento de Cristo ao presente (esta era do mundo é a mais completa da Crónica);

7.ª Era do Mundo — antevisão do Apocalipse e do Juízo Final.

 

 

Trata-se, se quem a recebe não tiver pachorra para a desbravar de um quase livro-objecto. Quem for mais curioso, tem com que se entreter.

 

Uma segunda obra foi descoberta acidentalmente depois de me ter desgraçado com a compra da “Enciclopédia...” (a única e irrepetível enciclopédia de Diderot e d’Alembert, na edição fabulosa de FM Ricci, fac-similada com um esmero e amor que enternece). 

Eu sempre defendi que esta enciclopédia, claramente datada, como se imagina, valia actualmente sobretudo pelas estampas que a ilustravam. Centenas, muitas, primorosamente gravadas que nos dão uma ideia clara do conhecimento em finais do século XVIII.

E não é que, já depois de ter encontrado uma edição recente da totalidade dessas estampas (e que já tem como destinatário o leitor JMM, outro maníaco dos livros que conheci através do blog)  descobri também por cá andavam três volumes por mim organizados de um “Recueil  de Planches” que se não comportar todas as gravuras da Enciclopédia anda por lá perto. Ainda por cima com o tamanho original! 

Pimba, mais um casal que vai gramar com as estampas, goste ou não goste (por acaso um dos membros do d casal quase enlouqueceu de satisfação pois, apesar de tudo tive a misericórdia de lhe anunciar a prenda)

Finalmente, descobri, sempre na lista de repetidos, um volume (o 2º) de “À volta do mundo”, uma publicação que, suponho aproveitaria (ou seria mesmo uma adaptação) da francesa “Le tour du monde”  (nouveau jornal de voyages) sec XIX, de que há notícade 52 edições.

Perdi uma colecção quase completa (ou mesmo completa) por um par de dias no Bernardo Trindade. E a um excelente preço. Claro que aquilo enchia um par de estantes mas que maravilha! 

Contento-me com três volumes encontrados nalgum alfarrabista, por 70 euros...(encadernação pobre mas miolo limpo e em bom estado)

Ora o volume que encontrei traz a com o título de “Excertos do livro de viagens do major Serpa Pinto) toda a primeira parte da obra que seria depois publicada em 3volumes. A história desta publicação é simples: comecei por encontra-la tal e qual, bem encadernada. Quando descobri que era apenas um dos volumes pus-me à procura dos restantes ,as só os encontrei completos, pelo que ficou a sobrar esta. Além da viagem, há dezenas de descrições de outros percursos sempre voluptuosamente ilustrados por gravuras excelentes.

 

(Nota: “A volta do mundo” (jornal de viagens e de assumptos geográficos), ilustrado com milhares de gravuras. Diectores literários dr. Theophilo Braga e Abílio Eduardo da Costa Lobo,  desenhos portugueses de Columbano Bordalo Pinheiro e dos melhores artistas , cópias de photographias de Carlos Relvas,  empresa literária Luso Brasileira-Editora, MDCCCKXXXIII )  

*a ilustração "queda da ponte de Masstricht in "Crónica Universal"de Hartman Schelen