Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

estes dias que passam 670

d'oliveira, 23.03.22

Unilateral, dizem eles...

mcr, 23-03-22 

 

Dedico pouco tempo aos noticiários televisivos portugueses. Em boa verdade limito-me, fundamentalmente aos da noite (SIC ou RTP2) 

Com isso ganho tempo para Euronews, a RAI, a TVE, a TV5, o Sky e, de longe em longe, algum canal alemão. E também nestes devo dizer que os não vejo a todos mas que vario consoante os dias e que me calha no zapping. 

 Tenho-me, por isso como razoavelmente informado e, certamente, muito mais informado do que a esmagadora maioria dos portugueses. Consumo e pago, como já aqui indiquei vários jornais e revistas de vários países e de um leque ideológico, social e político alargado.

Sobre esta miserável e infame guerra que está a ocorrer creio-me tão informado quanto possível, quanto mais não seja porque sobre os contendores e sobre os seus vizinhos tive, ao longo de uma já longa vida, tempo, pachorra e curiosidade (muita) para me informar, para lhes conhecer a história de sempre e sobretudo a recente , a do século passado e deste. 

Esta é uma das inestimáveis vantagens de saber línguas, pelo menos ao nível da informação mais fácil (a televisiva). Todavia, não falo, não leio e muito menos aprendi rudimentos das línguas eslavas, ou das escandinavas para não ir mais longe. Fora da Europa apenas conheço duas ou três centenas de palavras todas dos léxicos vernáculos de Moçambique, aliás só de dois o makua e o changane, um do norte, outro do sul. 

Devo, também, acrescentar que o não saber russo, árabe ou chinês é uma característica que partilho com centenas de autores que andaram por essas geografias e escreveram abundantemente sobre elas e, pelos vistos, ainda hoje, são autoridade citada(!!!...)

Portanto, como qualquer jornalista dos muitos que conheço, tenho alguma dificuldade em distinguir os limites da veracidade dos mais insidiosos da propaganda.

Ora, ontem, por mero acaso, passei uns minutos na RTP 1 onde numa mesa redonda um jornalista (de que ocultarei o nome porque foram poucas as palavras que lhe ouvi) a afirmar do alto da sua experiência que nesta guerra entre um agredido e um agressor (esta pequena distinção é absolutamente fundamental) quase só (ou mesmo só!...) se tinha a visão de um dos lados o que, segundo  o ilustre preopinante limitava o espectador, impedia um justo conhecimento das coisas (pelos vistos os cadáveres espalhados nas ruas, as filas de refugiados, as bombas a devastar prédios civis, seriam mais do que imagens verídicas – ele não negava a veracidade, suponho- imagens que serviam a propaganda dos ucranianos. Isto, aliás, sem contar com as reportagens in loco de uma boa dúzia de jornalistas portugueses que de Odessa, Kiev ou Lviv nos vão entrando todas as noites em casa. E sem contar com a centena de jornalistas estrangeiros. Incluindo os dois últimos da AP que, ontem,  abandonaram Mariupol!

Eu pasmo. Parece que o reputado jornalista ainda não reparou num pequeno inútil insignificante pormenor: as tropas tussas no terreno não trazem jornalistas consigo, nem russos nem de qualquer outra origem. Na Rússia, é proibido por lei (e sujeito a penas gravíssimas) o simples facto de chamar guerra à guerra. De “divulgar notícias” da frente de combate que não passem pelo filtro “democrático” do ministério da defesa.

Portanto, e para começar, não há, não pode haver informação fidedigna, sujeita a controlo das fontes e contraditório. O pouco que há, e é cada vez menos dado o controlo e apagamento de redes sociais é o que a televisão estatal transmite. Foi assim que vimos um estádio cheio de gente e bandeiras onde um Putin jovial dizia que era preciso “purificar” a pátria dos maus elementos. Vimos tropas russas em territórios alegadamente libertados mas não identificados a distribuir por meia dúzia de mulheres todas idosas, de resto, pacotes de comida, ou pelo menos era isso que eles diziam. Vimos duas mulheres agradecer aos seus benévolos libertadores mas nem sabemos se são ucranianas ou russas, ou russófonas, nada! Vimos filmagens de drone com alvos ucranianos a ser abatidos. Vimos o régulo a Bielorrúsia a abraçar Putin e a garantir, sem se rir, que a Ucrânia iria invadir o seu país vassalo o que só não ocorreu porque os russos atacaram primeiro! Claro que também vimos, mas passada aos direitos, imagens de gente a ser presa por protestar contra a guerra, uma idoso em S. Petersburgo com um cartaz anti guerra e, ó céus!, uma audaciosa jornalista a interromper o noticiário do 1º canal russo. E vamos vendo o senhor Lavrov, um clone quase perfeito de Molotov, a dizer coisas sobre os encontros entre russos e ucranianos. Não vemos algumas pequenas televisões russas independentes porque foram encerradas, não temos acesso a pequennos órgãos de informação russos porque foram fechados, auto-suspenderam-se ou estão sob ameaça.

Ah, é verdade: dois canais de propaganda do governo russo foram proibidos na europa. Não por serem canais noticiosos mas apenas por serem conhecidos desde sempre por por meros instrumentos de propaganda. As almas piedosa e mesmo outras entenderam que isso era um ataque à liberdade de iinformação. Poderia ser mas tudo o que se conhece dessas dois r2respeitaveis” canais não abona a informação de que seriam informativos e mais que acentua a ideia de que eram meios de propaganda disfarçados. Provavelmente, a sua interdição foi um erro, aliás replicado (e nalgumas vezes antecipado) na Rússia pela proibição de rádios e televisões estrangeira. Queiram os russos ou não, há sobre esse imenso país um black-out quase total de notícias vindas do resto do mundo (exceptua-se a da televisão bielorussa suponho).

Falar de propaganda, de notícias só de um lado, é apenas pornográfico ou, melhor, é apenas um truque disfarçado dos relativistas. Eles não querem ser informados. Eles querem claramente que uma das partes ganhe e não é a agredida. Eles acham, e dizem-no, até na AR que é a NATO, a Europa e os EUS quem está a puxar os cordelinhos desta guerra imposta à Rússia, coitada, que apenas quer viver tranquilamente, tocar balalaika, beber os seus copinho de vodka, e deixar em paz os seus desventurados oligarcas a quem uns miseráveis querem roubar os apartamentos, os clubes de futebol, os iates, as colecções de automóveis... 

Eu não sei se o senhor jornalista que ouvi a queixar-se de só ter notícias de um lado, abundou nessa afirmação e noutra  com o mesmo fim claro e objectivo. Por isso oculto-lhe o nome  não vá o homem depois ter dito coisas sérias, razoáveis naturais. 

Todavia, há outros comentadores na praça (hoje uma comentadora já se atreveu a dizer que afinal havia agressão russa! Até que enfim!)  que à falta de outro qualificativo são filhos de Putin.

Quanto a esse governante que pretende calçar as chinelas de Ivan o Terrível, Pedro e Catarina ambos grandes, Lenin e Stalin, o pai dos povos,  apenas lhe desejo a sorte  de Nicolau II, o último Romanov.  E depressa, muito depressa, para ontem se fosse possível. 

(uma última nota: os filhos de Putin estão sempre a agitar o facto de na Uccrânia     existir um partido (ou mais mas sem representação parlamentar – 1 deputado) de extrema direita. Pelos vistos nada disso existe na Rússia(!!!...) nem nos nossos países ocidentais onde essa praga prospera nos exactos territórios que estiveram durante décadas nas mãos da Esquerda (Portugal incluído). Começo a temer que os russos, logo que resolvida a intervenção especial na Ucrânia, ocupada a Moldávia, protegidas definitivamente as populações russas da Letónia e da Estónia, entrem por aí fora e nos venham libertar do Chega. Quiçá da Iniciativa Liberal, com jeito do PSD e mesmo do PS que, como afirmam o comunistas mas não só, tem tiques de direita e veleidades de  a associar ao pode... Francamente!...  

 

 

au bonheur des dames 474

d'oliveira, 22.03.22

Provincias_de_la_Hispania_Romana_(Diocleciano)-pt.

Comunicação de Paco Putiñez, generalíssimo

De Espanha, pela graça de Deus e força das armas 

mcr, fugitivo em parte incerta a 22-03-22 (ou em data futura se...)

 

 

O Reino de Espanha com trono agora vacante por período indeterminado dada a notória e manifesta falta de patriotismo do último Rei é um exemplo de paz e prosperidade admirado em too o mundo. 

Não temos ambições territoriais de qualquer espécie, tirando  o Sahara Ocidental, a Guiné Equatorial e as colónias americanas do Norte que incluem territórios ocupados e roubados por potências estrangeiras hostis (Florisa, Texas, Novo México e California que a seu tempo regressarão  à pátria mae e imperial). Igualmente está na nossa modesta e pacífica intenção recuperar os vice-reinados das Américas do Sul e Central incluindo a província do México árdua e gloriosamente conquistada pelos caballeros de Hernan cortez ao serviço dos Reis Católicos e seus descendentes. 

No que toca à chamada “fronteira ocidental” que também se denomina Portugal ou mais seriamente Condado Portucalense, será bom estudar a História da Península para perceber que esses territórios que se estendem da margem esquerdo do, rio Miño até às portas do mediterrâneo e à margem direita do rio Guadiana, são desde os tempos do Império romano, espanhóis. 

Sempre todos estes territórios peninsulares foram conhecidos por Hspania; 

A alegada província dita da Lusitânia sempre teve a sua capital entre o Reino de Leao e a Estremadura: 

O território entre os rios Miño e Duero sempre, desde os romanos foram conhecido por Galécia, isto é Galiza, conjunto de quatro províncias espanholas desde sempre cuja língua o galego (corruptela do castelhano) originou o dialecto português. 

De  resto, 

O alegado primeiro rei português era filho de um feuratário do Rei de Leão e isso mesmo teve de reconhecer quando se apresentou a este pedindo clemência pela sua rebeldia;

A chamada corte portuguesa usou sempre o galaico português como língua de cultura incluindo-se o alegado rei Dionísio que, aproveitando um momento de fraqueza da corte castelhano-leonesa impôs a esta última um tratado “injusto” em Alcañices, usurpando vasto território na região de Egitania ou Idanha ou, mais verdadeiramente Idaña;

Por diferentes vezes os alegados reis portugueses vieram lutar ao lado dos seus irmãos espanhóis contra os mouros hereges;

Nos finais do século XIV, o próprio “rei” Fernando reconheceu a autoridade Espanha e deu a sua filha Beatriz, herdeira legítima do “trono” português , em casamento ao rei Juan de Castela;

Só a miserável traição de um bastardo (Juan de Aviz) e de um seu cúmplice (Juan de las Regls) e o serviço de um mercenário (Nuno Alvarez Pereira) conseguiram graças à doença do Rei Juan de Castela vencer um recontro em Aljubarrota e em sucessivas guerras conseguir furtar-se à natural autoridade dos reis de Espanha.

Aliás, os “reis” portugueses por várias veze tentaram conquistar os reino espanhois, tendo sido sucessivamente derrotados nesse intento (“reis” Alfonso V, o “africano” , seu filho João Ii que depois de derrotado em Toro reivindicou para si a vitória por ter guardado o campo de batalha durante três dias;

O “rei”  Manuel tentou ardilosamente casar com a herdeira do trono de Espanha, vendeu a sua honra ao expulsar os judeus para melhor levar a cabo a sua empresa conjugal mas nada conseguiu. O seu neto Sebastião um “loco de atar” perdeu-se nas areias de Marrocos contra o benevolente conselho do Rei Filipe II que foi obrigado a reinar em Portugal (aliás o rei Filipe, deixou claro que tinha herdado, comprado e conquistado esse reino que, todavia, e aproveitando a rebelião da Catalunha se tornou independente da pátria mãe escondendo-se atrás da aliança inglesa  que o transformou num protetorado.

O Governo de Espanha foi por diversas vezes instado a intervir em questões portuguesas internas, mormente durante as guerras civis do sec XIX.

Mesmo nos períodos que os portugueses consideram de maior esplendor cultural, sempre a língua espanhola foi usada literariamente e no teatro (cfr Gil Vicente).

A própria linguagem popular e as tradições ancestrais portuguesas, remetem constantemente para Espanha 

“Arriba, arriba gajeiro

arriba ao mastro real 

vê se avistas terra de Espanha

areias de Portugal”

Alguns dos mais considerados espíritos portugueses defender, sem sucesso mas com inteligência, a teoria iberista que considerava imprescindível, além de natural, a união dos dois países da península.

As nossas economias estão profundamente imbricadas uma na outra;

 é graças aos nosso rios que Portugal tem ´água, sejam eles o Minho, o Douro, o Tejo e o Guadiana.

Temos tudo desde a história à geografia, sem esquecer as línguas, o amor pelas touradas, uma fé pagã mas vistosa, para ser irmãos. E os irmãos (tirando o desgraçado caso de Caiem e Abel) querem juntos, unidos como os dedos da mão. E sob o mesmo telhado.

Nesse sentido, a fim de repor a ordem natural das coisas, ordenarei que as nossas tropas entrem nesse território para, a exemplo de Filipe II, eu poder comprar, ocupar e de novo herdar uma terra irridente que se desconhece a si própria e não tem a noção da sua grandeza.

 

 

 

A Justiça aos tropeções (mais uma vez...)

José Carlos Pereira, 21.03.22

O recurso anunciado pelo Ministério Público mostra que o bom senso e a clarividência parecem não estar totalmente ausentes dos meios judiciais. Permitir que Mário Machado deixe de cumprir as apresentações periódicas obrigatórias perante as autoridades, de modo a poder combater em milícias da extrema-direita na Ucrânia, é um disparate absolutamente incompreensível. E o juiz ter invocado que Machado ia prestar "ajuda humanitária" é fantástico...

o leitor (im)penitente 231

d'oliveira, 21.03.22

Unknown.jpeg

Um morto a anunciar a primavera

mcr,  21-03-22

 

Éramos da mesma idade mas, que eu saiba, nunca nos  cruzámos.  E, apesar de mais de uma dúzia de livros dele, lidos com algum afinco, muitos deles tardiamente, foi sempre para mim um estranho. Não que os seus poemas fossem obscuros ou de difícil leitura mas porque GC não obstante a sua colaboração em jornais e revistas, era, para mim, pelo menos, um quase desconhecido.

De resto foi esse mesmo quase desconhecimento que me aproximou da poesia dele, quando em 1961/2, apareceu, ou me apareceu, o escandaloso “Poesia 61”. Em Coimbra ainda se vivia no rasto do neo-realismo, veiculado entre os estudantes pela “Vertice” e pela “Via Latina” o jornal da Associação Académica.

Acusava-se o grupo de poetas (todos estudantes na universidade de Lisboa) de falta de compromisso político e de mais um par de heresias que todas se reconduziam a uma visão muito provinciana de poesia especialmente e de literatura em geral.

Eu ainda nem começara a frequentar a poesia surrealista pelo que ainda mesmo antes de ler esses “lisboetas” já os olhava turvamente.

Entretanto, por um desses felizes acasos, numa ida a Lisboa (por altura do dia do Estudante de 63) alguém me albergou num apartamento pois a coisa desandara para o torto como se previa. Indo eu “fardado” de capa e batina (erro que nunca mais cometi) instalei-me naquela casa acolhedora enquanto alguém me tentava encontrar um casaco para poder passar despercebido. A espera foi longa e numa mesa descobri os caderninhos de Poesia 61. A curiosidade espicaçou-me e aviei o primeiro, precisamente do Gastão Cruz.

Não vou agora afirmar que fiz uma volta de 180 graus na minha visão da poesia que cá se fazia. Mas foram, isso sim, uns bons 90º . Aquilo seduziu-me e prometi a mim mesmo procurar aquela edição logo que fosse possível e os morabitinos ajudassem.

Passaram-se vários anos, em boa verdade. A poesia, mesmo naquele tempo, vivia de pequenas edições, os livros esgotavam-se ou as livrarias não os encomendavam. E quando voltei aquele grupo de poetas foi através da Luísa Neto Jorge e do Casimiro de Brito. Acasos absolutos, não houve sequer escolha, Vi os livros e comprei-os e por aqui andam. Da mesa onde escrevo esta crónica vejo ou adivinho, o maravilhoso “O ciclópico acto” da Luísa Neto Jorge com ilustração de Jorge Martins, uma produção da Galeria 111 que me ofereci como prenda de anos nos idos de 89. Só o facto de fazer anos me fez desembolsar dez brasas que, na altura, era muito, mas muito dinheiro.   Agora, num alfarrabista, descubro que vale dez vezes mais!.. (se houver quem o compre, claro...)

Suponho que o mesmo sucederá, falo de cotações, aos caderninhos de Poesia 61, pois noutro alfarrabista, anunciam-se com a nota (mais que esclarecedora!) de “preço sob consulta”.

Alguns dos poetas do grupo, Gastão, Luísa e Fiama (justamente os que já por cá não andam)tornaram-se grandes referencias e os seus livros mais antigos aoarecem raramente nos leilões e sempre a preços relativamente elevados. O que prova que não é o poeta ou o editor que ganham dinheiro mas quem os guardou anos e anos e ao desfazer-se deles percebeu que valiam um pancadão de dinheiro.

E, neste capítulo de valorizações, as “vanguardas” são sempre as que melhor se cotam num mercado tão incerto quanto o livreiro. Agora que o Gastão já é uma saudade, vai ser um corrupio tanto mais que grande parte dos seus títulos aparecem como esgotados nas plataformas on line de venda de livros.

Os leitores mais avisados e prudentes deverão pôr a caminho, comprar o que sobra antes que algum vivaço lhes deite a mão e se ponha a especular. Com essa precaução ganhamos todos, nós os leitores, a cultura em geral e o respeito que um poeta inteiro e excelente merece. E perdem os filisteus...que também já é tempo.

 

estes dias que passam 669

d'oliveira, 20.03.22

 

 

images.jpeg

Uma pessoa surpreende-se todos os dias

mcr, 20-03-22

 

 

toda a gente, ou quase toda (excepçao feita de alguns encobertos neutrais que dão  Putin um estatuto idêntico ao de Zelensky e que pedem em alta grita reflexão e calma a quem se indigna com uma agressão militar caracterizada, brutal e fora de todas as regras do convívio internacional, calma, ponderação, equilíbrio, sensatez tudo se resumindo a não condenar a Rússia antes de ouvir as suas “razões”) sabe como Putin e o seu governo ajudaram monetariamente grupos de extrema direita na Europa; como tudo fizeram para ajudar Trump a ganhar as eleições americanas. Vem daí a “compreensão” de Trump perante o pidesco tenente coronel (ou coronel) do antigo KGB, digno sucessor da “Tcheka” dos primeiros anos de revolução e da NKVD dos sanguinolentos anos de Stalin.

Aetrema direita europeia e mundial nunca se preocupou com os antecedentes “revolucionários” deste conspícuo cavalheiro o que, aliás, tem o seu quê de natural, dados muitos dos antecedentes de colaboração estreita entre o poder soviético e o nazi. Ao fim e ao cabo eram dois regimes que se assemelhavam, ambos se anunciavam como defensores de trabalhadores (o vero nome do partido de Hitlers é partido nacional socialista dos trabalhadores alemãoes (em alemão NSDAP, Nationalsozialistiche Deuttsche Arbeiterpartei), ambos se declaravam adeptos da ditadura, ambos proibiam outros partidos, ambos levaram ao mais completo delírio a admiração pelos chefes, ambos criaram vastíssimas redes de campos ditos de “trabalho” (de te trabalho que constrói a liberdade...)--- E por aí fora. Que se tivessem batido nas ruas é verdade. Mas que também se bateram e com maior ferocidade se possível contra partidos irmãos não restam quaisquer dúvidas. Ambos usaram da proibição de livros, com a subtil diferença que uns os quimavam em grandes arraiais públicos enquanto outros os destruíam mais em sigilo. No capítulo das artes plásticas foam ambos implacáveis contra o que no caso alemão se alcunhou de arte degenerada e no russo mais simpaticamente de arte contra-revolucionária. E é especialmente interessante verificar que no domínio da pintura e da escultura se assemelharem de tal modo que é quase impossível distinguir uma obra de autor nazi de outra de um verdadeiro e leal artista do povo.

Felizmente, mesmo inimigos da democracia liberal, desentenderam-se e tentaram aniquilar-se mutualente. Os soviéticos ganharam graças à aliança com as democracias ocidentais (Grã Bretanha e Estados Unidos)

 

É por isso  que não deixa de cusar alguma estranheza a opção de um expoente da extrema direita portuguesa se propor ir combater os russos de Putin, piedoso protector  de “camaradas” europeus do português.

 Não é caso único ao que se diz na medida em que no leste ucraniano se terá formado uma milícia de extrema direita para combater os separatistas russofonos.E digo isto, porque, no parlamento ucraniano apenas consta um deputado eleito vindo da extrema direita local (cá num país com quatro ou cinco vezes menos população elegeu-se uma dúzia; a menos que o luso “chega” não seja suficientemente nacionalista quanto a norma europeia exige!...)

 

De todo o modo, uma criatura de apelido Machado que se encontrava a aguardar julgamento e com medidas restritivas de liberdade terá sido autorizado pela senhora juíza do processo a passar-se para A Ucrânia para lá efectuar tarefas “humanitárias”. Consta que o mesmíssimo Machado declarou que ia armado. Se já partiu ou não, não sei.

A mim, o que me surpreende, se é que um bom par de decisões judiciais já deixaram de me surpreender, é o facto dea um acusado se permitir desandar daqui para fora, correndo o risco de nunca mais voltar furtando-se assim ao julgamento. Não foi o primeiro a pirar-se não será o último pelos vistos, pelo menos enquanto houver decisores judiciais que acham humanitário ir participar numa guerra. Ou ir para um território em guerra o que pode ser quase o mesmo...

Por mim, velho e cínico q.b., sempre me resta a esperança que uma misericordiosa bala russa o leve desta para melhor pois sempre se poupava a despesa de um julgamento. Ou que a tropa russa o apanhasse e, dado o seu estatuo de “mercenário” o destinasse a um daqueles gélidos destinos turísticos em que a Rússia, e antes dela a URSS, e antes ainda o Império,  eram useiros e vezeiros.

Claro que os comentadores neutrais, aquele “que em tempos de grande rise ((nmral)) a quem Dante na “Comédia” destina “os lugares mais quentes do Inferno”, juntando-os aos cobardes e que se amontoam antes do primeiro círculo, aproveitam esta viagem (eu mais diria esta arteira fuga) para uma e outra vez, virem proclamar que agressor e agredido é quase a mesma coisa, que o que interessa é o “diálogo” mesmo durante o fragor das armas, durante os bombardeamentos com o seu cortejo de mortos e feridos.

Estes indiferentes (ou neutrais)acreditam, ou fingem acreditar, que se os russos não se tivessem antecipado, seriam os ucranianos que invadiriam não só a Rússia mas, como o fantoche da Bielorússia afirmou sem se rir este segundo país...

Deixemos Machado e passemos a quem o deixa partir. Eu, respeitosamente, gostaria de saber que artigo da lei permite esta viajem humanitária. Que circunstâncias? Que credibilidade se pode atribuir a uma criatura que anda nas bocas do mundo há vinte anos, acusada sempre das mesmas malfeitorias?

* na vinheta: Ilustração da "divina Comédia"

 

 

estes dias que passam 668

d'oliveira, 18.03.22

images.jpeg

Unknown.jpeg

 

 

Desconversando...

mcr, 17-o3-22

 

os amigos do profeta da “purificação da Rússia” (sic) à falta de melhores argumentos vem agora, pela calada, sorrateiramente reerir o facto de os refugiados (já passam dos três milhões!...) da Ucania estarem a ser alvo de atenções que se recusaram a outros que também vieram bater às portas do Ocidente.

É verdade e percebe-se bem o porquê: para já fogem de uma guerra que não poupa ninguém e a que assistimos pela televisão quase em directo. Depois são vizinhos, partilham valores, religião e civilização comuns ou muito próximas. É verdade que são brancos, melhor dizendo são brancas na medida em que 90% doas entradas são de mulheres e crianças. Polacos, checos, eslovacos e moldavos são ou eslavos ou fortemente aparentados com estes refugiados. Línguas próximas, quase mais próximas do que o português e o  espanhol. 

Aliás, e nos países fronteiriços com a Ucrânia (Roménia exceptuada) nem sequer havia a tradição de aceitar emigrantes mas estes, actuais, tem uma longa tradição de vida  em comum, desde os tempos da federação polaco-lituana que abrangia grande parte da Ucrânia ocidental, até ao facto, piedosamente esquecido (ou maldosamente ocultado) de terem durante quatro décadas partilhado o duplo peso do socialismo à maneira de Stalin e o pacto de Varsóvia que permitia às tropas russas intervir (como sempre o fizeram nesses anos de “felicidade socialista”) a todo o momento nas nações colonizadas e satélites da URSS.

Em terceiro lugar, por exemplo em Portugal, existe desde à muito uma forte colónia ucraniana, perfeitamente integrada, que chegou a ter oitenta mil membros. Em Espanha, o número era muito maior mas a convivência e aboa reputação eram iguais.

Em quarto lugar, e à diferença dos refugiados do Médio Oriente, de certos países africanos islamizados ou do Afeganistão, não são de temer fanáticos islamistas  que deixaram nos países de acolhimento um rasto de violência que nem Portugal escapou como estarão lembrados.

De todo o modo, só para referir Portugal, este país tem sido ponto de chegada e de acolhimento de dezenas de milhares de africanos sobretudo, mas não só, dos PALOP. Seria interessante lembrar que, inclusive, se acolheram a Portugal, vários antigos líderes independentistas mormente de Angola e da Guiné. Que Portugal tem uma forte colónia indiana que não vem só dos antigos territórioso coloniais mas também de zonas limítrofes. Que muitos desses residentes são de confissão muçulmana e tem demonstrado por múltiplas maneiras integrarem-se bem.

A grande diferença entre muitos emigrantes africanos e asiáticos e os prófugos dos ex-países de leste está, para além da religião e da cor, na educação e na escolaridade. E na facilidade de aprendizagem da língua portuguesa. Basta ouvir os porta-vozes da comunidade ucraniana para o perceber.

Portanto a acrisolada defesa que ora se faz de gentes vindas de outros horizontes não tem especial sentido nem sequer permite criticar os mais recentes chegados. Não tenho quaisquer dúvidas que os europeus ocidentais se sentem muito mais à vontade com emigrantes que partilham religião, história e cultura com eles mas seria bom chamar à colação as enormes comunidades muçulmanas de França, a turca na Alemanha, os provenientes de certas zonas de África em Itália ou a fortíssima concentração de gente vinda do antigo império britânico na Inglaterra. 

Eu, aliás, gostaria de saber se algum dos recentíssimos críticos teve alguma vez qualquer relação (já nem falo de amizade) com emigrantes anteriores mormente africanos ou asiáticos. Se a imensa maioria dos “amigos de África” (ou de Peniche...) sabe qualquer coisa sobre esse continente que muitos portugueses palmilharam desde há séculos. Se sabem das línguas, da cultura, da história, da música ou da literatura africanas. Não receio afirmar que 90% dessas agora caridosas almas são incapazes sequer de estabelecer com alguma qualidade as actuais fronteiras herdadas do tempo colonial. Quanto ao que foram os antigos impérios (onde existiram) africanos aposto que a percentagem é de 99%:

Todavia, essa ignorância crassa das realidades africanas de ontem e de hoje, não impediu um punhado de alminhas  de tentarem recriar por c´s alguns dos logans e imitar algumas das acções que a televisão lhes fornecia direamente da América.  Não é caso único, infelizmente. As modas e as pseudo-modas culturais externas encontram terreno adubado num país onde pequenos grupos urbanos tentam iluminar um dia a dia cinzento  com uma imitação do que se passa “lá fora”.  Foi assim que se vandalizou a estátua do Padre António Vieira, defensor de índios e de humildes, perseguido pela inquisição, justamente a mesma ou parecida com a que séculos depois o condenava por colonialista! Idêntica manobra foi tentada a propósito de uma representação cultural onde a decisão de um júri independente (que o Estado já percebeu que meter-se nesses trabalhos só lhe traria chatices)  foi vilipendiada por não ter em linha de conta o sexo e a cor de uma concorrente que não foi a escolhida!!!

Nos “bons velhos tempos” havia gentinha (e não era pouca) que tentava chamar a atenção da polícia, de certa polícia, para as acrividades ou a s postura ou as opiniões  de pessoas que invejavam ou de quem não gostavam. E a polícia lá ia arquivando minuciosamente essas “informações” quase sempre anónimas em processos que mais tarde poderiam ou não ser usados contra os mal pensantes. Estão na Torre do tombo ainda inacessíveis aos visados graças a uma lei iníqua  que, em nome dos brandos costumes e da tolerância permitiu aos denunciantes escapar impunes às consequências das suas canalhadas. Quando os arquivos forem abertos (se o forem) já os denunciados estão mortos e enterrados como aliás os denunciantes que, entretanto gozaram de uma fama de bons e leais portugueses obviamente resistentes ao salazarismo quando não com um toque de perseguidos políticos!

 Anda por aí muito figurão que, no dia 26 de Abril de 1974, virou a casaca e exigiu em alta grita um lugarzinho  ao lado dos escassos milhares de portugueses que nunca pactuaram com a anterior “situação”.

É tudo farinha do mesmo saco...

 

Na vinheta: duas imagens de crianças refugiadas. Origens e cor diferentes mas a mesma tragédia.  

 

 

 

 

diário político 259

d'oliveira, 17.03.22

200px-WhiteArmyPropagandaPosterOfTrotsky.jpg

O rapaz e o lobo mau

ou o cerco contínuo

ou a cassete do costume

d’Oliveira fecit nos idos de Março

 

O partido comunista português herdou todos os defeitos dos seus semelhantes ocidentais (e já falecidos) sem, porém receber, como contrapeso, o que estes tinham de bom, ou de menos mau.

O PCP vê-se a si próprio como uma eterna vítima. Há cem anos que se considera como mísero e mesquinho, ameaçado por todos, encurralado, cercado, defendendo-se heroicamente do imperialismo, do capitalismo, dos monopólios, da burguesia, dos traidores, dos falsos amigos, da chuva, da seca da imprensa ao serviço de obscuros interesses, eu sei lá do que mais.

Tudo isto tem uma história, obviamente. A revolução russa (a boa, claro, a segunda, a chamada de Outubro mesmo que realmente tenha ocorrido em Novembro, pois a anterior não foi mais do qe um ensaio, com os seus mortos, os seus sindicatos, os seus sovietes, a Duma pluripartidária.

Portanto, a tomada do palácio de Inverno defendido por um pobre grupo de mulheres, o congresso interrompido dos sindicatos, a substituição dos sovietes pluripartidários por algo com o mesmo nome e completamente diferente. A guerra civil que se seguiu entre as tropas de Trotsky e os generais brancos, as intervenções canhestras de um par de corpos militares estrangeiros, mesmo não tendo sido um passeio foi seguramente mais do que a contenda entre dois bandos. A sacrificada população russa, os mujiques, a intelectualidade antes perseguida (e depois também, anote-se) os operários em armas foram obrigados a escolher. E preferiram o que lhes parecia ser o futuro, algo de novo contra as estruturas da autocracia dos Romanov apoiadas pela aristocracia proprietária das terras e a recente burguesia urbana quese dividiu entre vermelhos e brancos.

Quem porventura for ler o famoso panfleto “os dez dias que abalaram o mundo” de John Reed, um jornalista americano, sepultado na Praça Vermelha. Reed não era, ele próprio sempre o declarou, uma testemunha imparcial, bem pelo contrário. Era um activista de sempre, com um passado de lutas sociais e de guerras (a do México, por exemplo ) incansável propagandista do socialismo e, mais tarde, do comunismo. Todavia, a sua incansável curiosidade fê-lo testemunhar (maravilhado) boa parte, senão a principal parte dos acontecimentos de Petrogrado e da tomada do poder por Lenin.   Ler este livro é imperioso porque depois confronando-o com as centenas ou melhares de obras sobre a “Revolução de Outubro” percebe-se  o percurso de uma tomada do poder que ficaria como modelo. Claro que onde Reed vê sindicatos contra-revolucionários agora percebe-se que estes apenas se tentavam defender do controlo dos bolcheviques que aliás eram minoritários. Onde Reed vê a consagração dos sovietes agora percebe-se como eles foram dessangrados  tornados simples partes de um aparelho tentacular (basta lembrar o mote dos marinheiros de Kronstadt a favor da reanimação dos sovietes e das eleições livres dentro deles). E por aí fora.

Vem desta altura , época da guerra civil e do “comunismo de guerra, das intervenções estrangeiras, das manifestações gigantesas nas grandes cidades contra o poder recente, da proibição dos partidos anarquista e socialista revolucionário, da prisão de dezenas de milhares de opositores mencheviques, bolcheviques e outros militantes de Esquerda, a teoria do cerco imperialista ao jovem Estado. A revolução mundial tinha falhado em toda a linha, o seu triunfo na Russia era, segundo a ortodoxia marxista, uma espécie de “fenómeno do Entroncamento” tanto era visível a “falta de preparação das massas”, a ausência de um proletariado organizados como no Ocidente, a oposição clara de uma grande parte dos dirigentes da 2ª  Internacional ( e mesmo a menos visível dos antigos aliados de Lenin, sobretudo de Rosa Luxemburgo). É aqui que começa a teoria do cerco, do isolamento, da construção do socialismo num só país, da obrigatoriedade de defesa a outrance da pátria do comunismo imposta expressamente à novel 3ª Internacional que reunia os novos partidos comunistas, os dirigia graças aos enviados do Komintern (que eram a verdadeira direcção secreta destes partidos).

É esta sentida sensação de solidão revolucionária que alimenta entre outras a medonha teoria da “classe contra classe” que na Alemanha teve a sua mais dramática expressão. Enquanto os nazis subiam nas sondagens o pc alemão considerava o partido socialista o seu principal e pior adversário.  

Depois, já tarde e a más horas, apareceram as frentes populares, as tentativas de federar a Esquerda e a guerra que começou por ser declarada uma contenda entre imperialismos e só mais tarde, dois anos depois, graças à invaão da URSS se tornou uma guerra contra o fascismo, aliando Reino Unido, Estados Unidos e URSS. Esta aliança durou enquanto durou a guerra mas, depois da vitória, como disse Churchil, “entre Stettin no Báltico e Triesteno Adriático caiu uma cortina de ferro” ao mesmo tempo que se instalava, duradoura, a guerra fria.

Os poderosos partidos comunistas da França e da Itália tiveram importantes votações mas nunca as suficientes para conquistar o poder o, mesmo, entrar no arco de governação. Competiam com outros partidos que estavam legitimados pela Resistência em qualquer dos dois países. Na Alemanha, graças à mão férrea e ocupante da URSS, na zona oriental estabeleceu-se um governo “democrático” dirigido por um alegado “partido socialista unificado” que, na realidade escondia o antigo partido comunista e uma pequeníssima franja de alegados socialistas forçados à “unificação”.

Em Espanha, o pc que varrera da cena política os trotskistas do POUM e os anarquistas da FAI tornou-se o arauto da resistência a Franco e o mais importante polo aglutinador da oposição democrática a Franco. Em concorrência com ele o PSOE manteve uma pequena presença sobretudo entre os exilados e, mais tarde, foi ganhando adeptos no “interior” mesmo que a luta anti-franquista se revestisse mais das resistências nacionalistas (País Basco e Catalunha, muito menos a da Galiza mantida viva na América Laina). 

Em Portugal, a falência da 1ª República deixou um rasto de divisões na oposição dita democrática que provavelmente esteve na origem dos sucessivos falhanços “revolucionários “ contra o Estado Novo. O pc não teve actuação especialmente visível até às vésperas da guerra. Posteriormente, foi ganhando importância na luta operária  masnunca foi um partido de massas justamente porque a clandestinidade forçada e prudente em que vivia o não permitia. Há, porém, que reconhecer que a partir de 45 (MUD) até a Abril de 74 foi o eixo mais dinâmico da oposição. É verdade que esta conseguiu sempre (e sobretudo com Humberto Delgado) parecer visível pelo menos em períodos eleitorais mas o pc e a sua estricta e disciplinada organização eram muito mais atraentes pelo menos para os grupos mais disponíveis para se manifestarem contra o regime. A partir de meados dos anos 60, o pc viu surgir à sua esquerda diferentes mas pequenos grupos esquerdistas que no capítulo estudantil o tentavam e muitas vezes conseguiam suplanta-lo. .Juntamente com estes começaram a aparecer militantes católicos e, já nos anos 70, os socialistas ressurgiram  com a criação do PS.  Ants dessa altura, os seus militantes confundiam-se com a “oposição democrática e republicana”

De todo o modo, e voltando ao exemplo soviético (agora curiosamente ressuscitado por Putin que acaba de fazer o elogio do “antes só que mal acompanhado” para caracterizar como traidores os opositores e os novos exilados que, segundo as suas palavras a Rússia “cospe” para o exterior, engrandecendo-se assim, mais pura e forte) a propaganda comunista sempre exaltou a ficção do cerco que tentava destruir a revolução, o partido e a pátria. Durante toda a sua história, a URSS, o PCUs, os países satélites e os respectivos partidos, sempre recorreram aos expurgos, violentos onde era possível, ou denunciados pejorativamente quando o sistema não permitia solução mais radical.

O leit-motiv era sempre o mesmo. O Partido estava rodeado de inimigos, defendia-se corajosamente, pirgava-se com inusitada frequência para mesmo mais magro ressurgir mais forte. Quem não estava com ele era, no mínimo anti-comunista (primário se possível). Há todo um catálogo de expressões furibundas contra críticos, dissidentes ou desviantes que valeria a pena elencar como um pequeno dicionário do frenesi partidário.

Claro que qualquer opção política, qualquer acção “inconveniente”, qualquer opinião que fugisse à norma era sempre rotulada de anti-comunismo.

Em Portugal, o PC usou e abusou (aliás usa e abusa) esta acusação. A pontos de se ter estabelecido, em franjas intelectuais a expressão anti-comunismo “primário, secundário e universitário” para dar ênfase à caricatura.

Neste momento, passada a geringonça (de que o PC foi o impulsionador) volta a vaga de alusões ao anti comunismo que grassa em toda a parte e tenta perturbar a triunfante marcha do socialismo (na versal pc) para os amanhãs que cantam.

É bem verdade que o profundo e doloroso sentimento de orfandade nascido com a implosão da URSS, a queda constante de votos e mandatos autárquicos ou legislativos, que o partido regista desde há largos anos, a solidão gigantesca a que foi condenado a propósito da invasão da Ucrânia, dão azo a que os dirigentes do pcp renovem as suas acusações, a sua lamentação, a injustiça de que se sentem vítimas.

Há um velho dito que reza assim: quando o dedo aponta a lua, o tolo só olha para o dedo.

No caso concreto, o pc não vê os tanques, as bombas, os três milhões de  refugiados, os mortos nas ruas, os aviões em voo picado contra populações indefesas. Nada disso. Vê, não se sabe com que óculos, a NATO, a Europa e os Estados Unidos, em permanente conspiração contra a paz (dele, pc), vê batalhões de nazis ucranianos  a invadir a ex-pátria da revolução onde um fantasmático partido comunista totalmente controlado por Putin que o deixa vegetar veio propor o reconhecimento da independência dos cantões sublevados do leste ucraniano. E com isso legitimar as operações especiais  muito ao jeito de outras mais ou menos sangrentas em que o glorioso Exército Vermelho se meteu na Checoslováquia, na Hungria ou no Afeganistão. Era bem lembrar que, nestes três casos, o pc português não tugiu nem mugiu ou, melhor dizendo, acatou, aceitou, porventura aplaudiu a fraterna intervenção contra uns desmiolados nacionalistas burgueses e óbvios anti-comunistas.

Pelo andar da carruagem vamos ter um tsunami (ou vários) anti-comunista nos tempos mais próximos. Pelo menos aos olhos do pc...

*na vinheta: Nem trotsky (parece-me ele) escapou à acusação.

estes dias que passam 667

d'oliveira, 16.03.22

 

A vez dos russos

mcr, 16-03-22

 

Da Finlândia à Turquia, da Arménia à Geórgia, sem falar nos satélites asiáticos mas que, de momento, parecem abrigos razoáveis, há uma diáspora russa, de elite, jovem e altamente educada que já abandonou o seu país. Fogem de uma eventual lei marcial, da falta de muitos produtos, em protesto contra a guerra e conta o cerceamento cada vez maior das liberdades  mais óbvias.Estimando por baixo terão sido cerca de cem mil os que entretanto partiram. Metade terá usado a fronteira finlandesa, um quinto a Geórgia , oa aviões para Istambul estão desde há vários dias completamente lotados.

A recepção destes deslocados pela guerra não é especialmente simpática, sobretudo na Geórgia, et pour cause1  Os georgianos ainda recordam as “intervenções especiais” que lhes retiraram a Abkásia e a Ossétia do Sul. Pelos vistos muitos senhorios recusam arrendar casas a russos mesmo quando estes estão dispostos a pagar bem.

No resto da Europa, o sentimento anti-russo aumenta inclusive contra russos que já lá viviam há muitos anos. Efeitos conjugados da memória da guerra fria e da acção de Putin e da clique governante russa. Também, neste capítulo, o erro de apreciação terá sido colossal e ninguém percebe como é que nenhum dos numerosos serviços de “inteligência” russos não previu estas reacções. Claro que num regime autocrático, o autismo das chefias contamina tudo. O medo de desagradar idem, aspas, aspas.

Sabe-se isto, desde, pelo menos, os tempos da segunda guerra mundial. Nenhum general alemão se atrevia a contrariar Hitler que, até ao fim da guerra, numa Berlim cercada, ainda mandava avançar exércitos inexistentes para a frente de batalha. E ninguém, sequer os companheiros da primeira hora se atrevia a avisar que essas tropas não existiam. Aliás, a tradição de ouvir e calar vinha de longe, do tempo em que as vitórias a ocidente (graças ao facto de não se temer um ataque de leste devido ao ignominioso  pacto com a URSS. A operação Barba Ruiva começou tardiamente contra a opinião de especialista que temiam o “general Inverno”. A isso Hitler terá contraposto com a garantia de que em escassas semanas teria a invasão bem sucedida, Moscovo, Leningrado e Stalingrado conquistadas, os campos petrolíferos ocupados e Stalin morto ou prisioneiro E os sub-humanos escravizados. Nada disto aconteceu, como é sabido. A invasão foi parada ao centro, Leningrado resistiu ao cerco durante mil dias e Stalingrado foi o cemitério do temível 6º Exército. E um marechal (Von Paulus) aprisionado em vez de se suicidar!

Nesta guerra que presenciamos, parece que nada saiu como se previa. O “actor”, o “cómico” (como uma senhoreca universitária o referiu) agigantou-se e, pelos vistos, tem-se mostrado à altura. Vários parlamentos europeus e o canadiano ovacionaram-no de pé. Mesmo descontando o que isto tem de propagandístico, de desculpa de mau pagador, o homem está lá, não fugiu, não aceitou a boleia nem (e isso é um risco) retirou a família de Kiev.

Ontem, três primeiros ministros deslocaram-se à cidade para falar com ele. Também esses políticos, todos das ex-colónias soviéticas, é bom lembrar, arriscaram a pele, por muito segredo que guardassem. Vê-se que os serviços secretos de que Putin foi alto funcionário, são menos bons do que, à partida se esperaria.

Nada disto garante, sequer permite pensar numa vitória ucraniana. Eu, pelo menos, duvido que tal possa acontecer. Tudo faz pensar numa derrota dos invadidos mesmo que estes vendam caro a vida. Faltam-lhes as armas, o céu protegido, os mísseis, os tanques. Os exércitos russos limitam-se a cercar e a bombardear. Admito que alguns dos alvos civis não estivessem nas intenções doa atacantes mas também já se começa a verificar que a máquina de guerra russa tem fortes deficiências, usa recrutas sem experiência. A isto há quem contraponha que guerra é guerra e que todos os meios serão usados (até uma extraordinária decisão de pôr em prevenção o dispositivo nuclear. Purin poderá ser arrogante, mesmo alucinado, mas sabe que isso, o uso de armas nucleares reduziria a Rússia e quiçá o mundo a cinzas. Eu faço parte das pessoas que não o acham louco mas tão só perigoso, muito perigoso, falho de escrúpulos de qualquer ordem e mal, muito mal, aconselhado.

Há, neste momento, uma corrida contra o tempo: o resultado das sanções é demorado e o da guerra, desta guerra de agressão, pode ser mais rápido. A direcção política ucraniana está a tentar um acordo, já aceitou deixar cair a NATO, poderá deixar de reivindicar a Crimeia e aceitar perder os territórios entretanto “rebelados” graças ao apoio russo, às armas russas, aos “voluntários” russos.

O senhor marquês de Pombal, um herói de muitos portugueses (que se esqueceram do seu temível autoritarismo, da perseguição política por ele movida contra muita gente e nem sempre reaccionária) terá, certo dia, respondido a uma ameaça de um embaixador espanhol que lhe garantia ter um forte e bem apetrechado exército na fronteira pronto a entrar por Portugal adentro: “Saiba Vossa Excelência que mesmo morto um homem são precisos quatro para o tirarem de casa”

 

(Desconheço se a citação está corecta, isto vem da escola primária, ou mesmo se existiu tal conversa. De todo o modo “se non è vero è bene trovato”...)Todavia, e para voltar quase ao princípio, a desproporção de forças é tal que só uma enlouqucida esperança e um desmeurado sentido de justiça permitem pensar num final feliz para a Ucrânia. O mesmo é dizer para a Europa pois se Putin ganha esta vasa quererá como qualquer jogador empedernido, continuar a jogar.

É bom que nós todos, portugueses e europeus, percebamos isto. E tiremos as necessárias consequências. É a nossa liberdade que está (também) em risco.      

 

au bonheur des dames 473

d'oliveira, 15.03.22

Morte, onde está a tua vitória?

mcr, 15-03-22

 

 

Conheci o Jorge Silva Melo em 68, se não erro. Na altura, havia uma tentativa de criar entre os diferentes grupos de teatro universitário, uma rede de entre-ajuda, de organizaçãoo à semelhança das R.I.A. (reuniões inter-associações) de Lisboa, e também, ainda que muito veladamente, uma espéie de apoio a uma UNEP (União Nacional dos Estudantes Portugueses). A coisa era liderada pelo CITAC (Centro de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra) e contava com o apoio do TEUC (Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra) , do TUP (Teatro Universitário do Porto e do Teatro da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

O CITAC liderava o projeco por razões simples: era o organizaor desde há mais de uma dúzia de anos de um “ciclo de Teatro” que juntava em Coimbra o que melhor se fazia no domínio do teatro profissional e agregava sempre os grupos universitários existentes. Depois, era o grupo de teatro quem à época mais experiencia internacional tinha mesmo se o tEUC pudesse apresentar ytambém um excelente currículo baseado todavia apenas na participação em “Delfíadeas, festivais dedicados normalmente aos grupos estudantis que trabalhavam na área do teatro clássico. 

Por razões que não interessam, coube-me a mim, enquanto elemento do CITAC, a coordenação deste projecto. 

Em certo dia, aparecem de surpresa na reunião três jovens da Faculdade de Letras de Lisboa que, com a ousadia dos recém chegados declararam que tinham acabado de fundar um grupo de teatro na sua faculdade. 

Eram eles, Jorge Silva Melo, Luis Miguel Cintra e Maria José Carvalho. Nos primeiros momentos ficámos espantados, depois começamos  perguntar como era a estrutura que pensavam montar, coisas burocráticas a que aquelas três almas não sabiam responder. Por junto queriam fazer teatro, ponto, parágrafo e siga a rusga. Do lado dos já membro aquilo parecia demasiado imatura mas, se não erro, e penso que não, eu terei insistido na admissão imediata daquele novo grupo. 

Meses depois, já eles vinham ao “ciclo anual de teatro, que nós (CITAC) organizávamos. E vinham com o “Anfitrião”, algo de muto bem encenado, imaginativo, bem desempenhado. Foi um trinfo. A encenação devia-se ao Jorge e ao Luís Miguel que, aliás, também actuava.  Alguém nessa noite deu os parabéns e disse que eu acertara em cheio. Nem ele (e muito menos eu) sabíamos quanto se tinha acertado!

A Cornucópia veio já como grupo profissional e a partir desse início doa anos stenta a aventura continuou. Em certo momento a dupla Jorge. Luís Miguel desfez-se e o Jorge partiu para outra e variadas experiências, desde colaboraçãoo com grandes encenadores estrangeiros, à realização cinematográfica e a uma intensa actividade escrita de que já aqui, neste blog falei e celebrei. Depois com o seu regresso definitivo a Portugal apareceram os “Artistas Unidos” de que ele foi a alma e o encenador. 

Nem vale a pena dizer, pois é vox publica, quanto o Jorge valia como encenador, dramaturgo, animador, folhetinista e sei lá que mais. Em tudo , ou quase, ono que se meteu deixou um rasto brilhante que se lhe granfeou admiradores também lhe deve ter criado um bom par de adversários invejosos.  Disso não falarei: de minibus non curat praetor.

Durante anos lá nos íamos encontrando, um pouco ao acaso, durante as minhas idas a Lisboa. Isto de viver na “província” não dá grande azo amanter uma proximidade e uma conversa em dia, constante como deveria. Acompanhei de longe a carreira dele, foi lendo o que ele escrevia, comprei os livros que ia publicando e disso, como acima disse, dei  conta.

Relembro, muito especialmente, um brilhante exercício literário e cultural no mais nobre sentido da palavra: Fala da criada dos Noailles que, no fim de contas, vamos descobrir chamar-se também Séverine, numa noite de inverno de 1975 em Hyeres” (Cotovia ed)

 

A última vez que nos encontramos foi na “feira dos alfarrabistas” em Lisboa e recordo que o terei convencido a comprar a colecção completa da revista “Almanaque  (também já aqui devidamente celebrada) que um livreiro distraído oferecia por cem euros e pronto a fazer mais um desconto. Depois de folhear um dos exemplares, o Jorge lá se decidiu, agradeceu-me o conselho e comprou a revista em colecção completa e muito bom estado. Despedimo-nos com um até breve que afinal foi até hoje e já não tem qualquer sentido

Vai esta para Maria José Carvalho, que também foi minha cunhada, é minha amiga e correu mundo como professora universitária a espalhar sabedoria, alegria generosifade ent alunos e amigos. Agora anda metida no estudo do persa. Talvez me ajude nalgum passo mais difícil da leitura do grande HAfiz. Valeu, Zé? Um beijo do

M.

au bonheur des dames 472

d'oliveira, 15.03.22

Requiem por um quase filho

mcr. 15-02-22

 

 

Há cinquenta e três anos (um pouco menos) estava eu em Paris com o meu grupo de teatro para actuarmos no Theatre de l’Odeon  no âmbiato da FIAC

Ainda não era Março, o Março da revolução, mas era um tempo de esperança. De luta, de alegria e solidariedade. 

Connosco vieram ter A Luísa e o Octávio, exilados na Suiça. Traziam com eles o filho recém nascido, o Pedro que, depois e ao longo de mutos anos fui vendo crescer, perguntar, maravilhar-se com a vida e com o mundo.

Via-o constantemente dada a enorme amizade que me ligava primeiro aos pais e depois a ele  e à irmã.

Não foi sempre de rosas o nosso convívio mas agora isso já não importa. 

O Pedro acaba de morrer, fulminado por uma pancratite que, subitamente, degenerou. As suas cinzas, diz-me agora uma Luísa desamparada, já estão junto às do avô, o meu querido e sempre lembrado Rui Feijó.

Morrer o filho de amigos antes da nossa vez é algo que me perturba profundamente. Não está certo, não é justo, obriga-nos a pensar nos desencontros da vida e da morte e, sobretudo a pensar que tudo isto carece de sentido.

Se eu fosse religioso, poderia rezar, encomendar-me a Deus, pensar o Pedro numa outra vida, longe disto, dos azares de agora, do espantalho da guerra que mata, ao longe, muitos mais novos ainda do que ele.  

Mas para um velho descrente apenas resta a tristeza, a solidão, saber da solidão da mãe dele, da mãe do seu menino de oiro. E recomendar-lhe maior atenção ainda (!)  à filha, aos dois netos que estão prestes a entrar na vida activa e, quem sabe, a trazer-lhe algum bisneto irrequieto, curioso, inteligente como o Pedro foi. 

Quem eventualmente me leia, perguntará a que vem esta crónica mas que querem, isto que vou aqui diariamente deitando ao éter é uma espécie de diário, um diário pobre, recheado ainda de emoções, indignações, raras alegrias como ocorre quando se é já um velho homem que sabe que a morte, a sua morte, está também ao virar da esquina. 

Decerto que me perdoarão o desabafo. É que o simples facto de dizer isto me alivia , me torna menos penosa esta sensação de ver o deserto avançar. O deserto e a guerra, a dor pelos que já não são e a memória de outra(s) vida(s) que me coube(ram) em sorte.