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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Estes dias que passam 733

d'oliveira, 31.08.22

De Vladimir Ilitch a Mikahil Sergueievitch

Ou

as desventuras do marxismo-leninismo

(com intervalo stalinista num fundo de gulag)

 

mcr, 31 de Agosto, 2022-08-20

 

Corbatchov nasce num dos anos terríveisda história quase sempre terrível da URSS. 1931 é eventualmente o pico da campanha contra os kulaks (camponeses ricos, ou seja camponeses que conseguiam produzir para o seu sustento e colocar o que pouco que sobrava no mercado). Estes, e respectivas famílias foram desapossados dos seus escassos bens e eliminados como classe e individualmente via deportação para outras (piores) regiões da URSS. Estima-se que centenas de milhares pereceram antes de chegar ao local de confinamento.  

A esta primeira campanha seguiram-se duas medidas que acentuaram prolongadamente a crise  agrícola: a obrigatória inscrição dos camponeses em kolkozes e sovkozes, criando uma nova espécie de servos da gleba muito semelhante à que subsistiu durante o Império. Estas medidas conduziram a dois anos de catástrofe absoluta, de  fome que, por du aves terá feito um mínimo de cinco milhões de vítimas na Ucrânia e de mais alguns milhões no resto da URSS.  

A estes anos dramáticos  sucederam os anos de intensa perseguição política a tudo o que se assemelhasse de perto ou de longe (ou mesmo de muito longe) a dissidência. Os processos de Moscovo  onde foi eliminada a maioria dos velhos bolcheviques, os membros das primeiras direcções do PCUS, a quase totalidade dos principais camaradas de Lenin. Foram também liquidados uns largos milhares de membros do Exército Vermelho o que mais tarde, no início da guerra teve desastrosas consequências militares.  

 

Prtanto, e como se pode deduzir, Mikahil Serguievitch é já um puro produto do sistema soviético. Da educação soviética e pode, durante a sua adolescência, conhecer bem os desastres da guerra, o fim (??) do stalinismo, os anos da guerra fria. Tudo isto no interior do sistema partidário e único.  É um militante desde os anos de juventude, passados no Komsomol. Graças a isso, à origem de classe, e ao seu esforço e inteligência, licencia-se e começa a sua actividade dentro do PCUS exercendo cargos políticos de crescente importância. Tem ainda por cima a ajuda de uma mulher inteligente de espírito arejado que mais tarde se tornará um dos trunfos do Gorbatchov dirigente supremo da União Soviética. 

Quando acede ao poder, já é um quase ET na política russa. Também é verdade que sucede a uma série de caáveres políticos, saídos de um mausoléu ainda mais fechado do que o de Lenin. A URSS que herda está esgotada financeiramente, atrasada numa série de campos, com uma população que vegeta entre a indiferença e notória falta de esperança no futuro. À volta os satélites desmoronam-se vagarosamente. É a Polónia com o Solidarnosc, a Tchecoeslovaquia  com a primavera de Praga esmagada mas nõ esquecida, a Hungria que tenta pequenas reformas, uma Roménia onde o Conducator, a Estrela do Danúbio leva a cabo uma política indescritível e se ceva na população assustada. E há a tremenda sombra da derrota no Afeganistão, o slogan “Wir sind das Volk” que ecoa por toda a DDR. Nada corre bem nooriente que se presume de vermelho. Aliás o vermelho que existe é mais de sangue que de amanh\as que cantam.

Junte-se-lhe o cisma sino-soviético ue é algo que rebenta com  internacionalismo proletário e com o movimento comunista internacional.

Convenhamos, Gorbatchov recebe um presente envenenado  salpicado de dissidentes cada vez mais audaciosos, mais numerosos e ...mais escutados. 

Inaugura duas políticas também elas audaciosas sobretudo no deserto de ideias em que caíra o “marxismo-leninismo”. Por um lado tenta reestruturar uma sociedade, uma economia e uma cultura  envelhecidas e sem perspectivas de futuro. Por outro, abre a porta à discussão pública e à troca de opiniões com a glasnost. Não é “uma revolução na revolução” (para citarmos um título importante que analisava outros comunismos, mas é uma violenta reviravolta no conformismo. 

O problema é que, eventualmente, isso teria sido importante nos tempos de Krutschov, vinte anos antes. Nos anos 80 vinha tarde e sabia a pouco. 

Todavia, e pela primeira vez, Gorbatchov teve no Ocidente quem o escutasse e quem se dispusesse a tratar com ele como nunca antes acontecer. E mais um problema: torna-se mais popular fora do que dentro da URSS. 

Os primeiros a aproveitar este novo clima, esta forte distinção política foram os países satélites e, em menor grau (mas com maiores consequências) os países bálticos anexados pela URSS durante os anos da 2ª guerra. 

E é aqui que começa a derrota política de Gorbatchov. A URSS implode minada pela secessão e pela resistência interna e conservadora. 

Até o aliado mais fiel, mais submisso (e também o que mais dependia do Exército russo) cai com estrondo quando o muro abre uma milagrosa brecha. Convirá aqui lembrar que, na DDR as manifestações eram já semanais e multitudinárias. Às sextas feiras era certo: multidões alvoroçadas e cada vez mais ousadas saíam à rua, enfrentavam os Vopos, destratam a Stasi. Outros, e aos milhare,s fugiam para o Ocidente via Hungria e Tchecoslováquia Com a cumplicidade destes governos de países irmãos.

Gorbatchov era vitoriado pelos leste-alemães e o poder via isso com crescente indignação e maior pânico. O “bloco” socialista estava minado. 

É difícil perceber-se Gorbatchov tinha uma clara consciência do peso das seus actos e das suas palavras mas de uma coisa estou certo: ele tinha uma certa ideia de liberdade que honrou até ao fim. Tentou dialogar com os bálticos (há extraordinárias imagens televisivas dele no meio de lituanos se não estou em erro que o enfrentavam. Poderia ter ocorrido um morticínio ( e de facto, na curta marcha para a total independência uma dúzia de cidadãos lituanos pereceram frente à polícia do regime ) mas essa imagem de um homem só que discute  mereceria ser passada por uns bons momentos nas elevisões. 

Gorbatchov caiu não só perante os conservadores russos (que serão os pais dos apoiantes de Putin) mas também perante exaltados modernizadores que, na senda de Yeltsin  queriam mais sem perceber que isso concorria para a desagregação da URSS. 

Provavelmente, as tentações independentistas e autonomistas  sucederiam à mesma mas é quase certo que isso ainda demoraria um bom par de anos. 

No entanto, o que se deve salientar é que, no plano económico a URSS estava em frangalhos. Um desastre absoluto que ainda hoje mostra alguns dos seus mais trágicos aspectos. 

Tirando a China e o Vietname que mantem um partido comunista a dirigir o país e ao mesmo tempo inauguraram um capitalismo de Estado desenfreado e sem regras, o mundo dito socialista desapareceu. Aliás estava morto desde há muito, soque a certidão de óbito demorou anos a ser passada.

A História já se esqueceu de Brejnev, Andropov Ielsin e tutti quanti mas curiosamente Gorbatchov que ontem morreu permanece na memória de todos inclusive na raiva dos seus adversários. 

Ganhou merecidamente o prémio Nobel da Paz. Algum dia, assim o espero, dedicar-lhe-ão uma estátua, uma praça, um jardim um nome de rua no seu país agora envolto nas trevas de uma guerra que ele condenou mesmo se tivesse afirmado a sua concordância com a anexação (e só com esta) da Crimeia, essa região “ensopada em sangue russo” (por acaso em sangue tártaro e ucraniano pois foram esses sobretudo os que combateram  nessa península desde os tempos de Potenkine ou da Carga (estúpida) da Brigada Ligeira)

 

Mikhail Gorbatchov (1931-2022)

José Carlos Pereira, 30.08.22

Morreu Mikhail Gorbatchov, um dos estadistas com maior impacto no mundo nos últimos 40 anos. A minha geração cresceu a acreditar que "glasnost" e "perestroika" eram termos que vinham transformar a União Soviética. E logo depois vieram os acordos com os EUA quanto à proliferação nuclear, a desintegração do bloco de Leste, o fim da União Soviética e do Pacto de Varsóvia. O mundo mudou a partir daí e deve-o em grande parte à acção corajosa de Gorbatchov, que foi sempre mais admirado no ocidente do que no seu próprio país.

estes dias que passam 732

d'oliveira, 30.08.22

Bon debarras! 

mcr, 30-8-22

 

 

A idiomática franciú que dá título ao folhetim significa em tradução libérrima mas fiel, quando même, “até que enfim! “

Até que enfim, a dr.ª Temido entendeu que su presença no Ministério da Saúde não só era desnecessária mas se tornara, e desde há muto, uma inconveniência. 

Estasenhora representa, no pobre panorama sanitário do páis, uma perfeita ilustração, do famoso “princípio de Peter”, ou seja na sua  caminhada para cima ultrapassara o degrau (os degraus, no caso vertente) da competência e entrara noutros mais difíceis da incompetência. 

Isso, esta patética convicção de que se é salvador(a) do rincão pátrio sucede a muitos, acomete, sobretudo os mais arrogantes, os mais pretensiosos e os mais mimados.

Ocorre mais nos boys & girls das jotas ou no compagnon de route que mercê de um par de conhecimentos úteis gravitam como traças à volta da luz do poder. 

Ninguém é obrigado a seguir as regras da prudente humildade que, também como o sal,  devem ser seguidas com peso e medida. 

Todavia, no “torrãozinho de açúcar” (ai Eça que falta fazes!) o que noutros países passa por uma anoalia, é um princípio de carreira. 

Escolhem-se os fieis, munidos ou não dos indispensável cartãozinho partidário, ou das recomendações dos do costume e, pimba”!, aparece-nos um director geral, um secretário de Estado, um Ministro ou um presidente de um poderoso instituto  (a agora de uma alta autoridade, nicho apetecível apropriado a ex-ministros ou consortes).

É verdade que se inventou por í, para inglês ver, uma comissão que escrutina os candidatos a altos cargos. Segundo o seu director ou presidente, tanto faz, o(s) Governo(s) acolhem ou não o parecer segundo as suas não escritas, e menos ainda confessadas, simpatias. No caso de Ministros e restantes governantes nem isso existe nem, aliás, poderia existir. E é assim que muitos preopinantes aparecem sentados à mesa do Conselho de Ministros sem que a opinião pública ou quaisquer cidadãos interessados na res publica percebam a razão.

No caso em análise, nunca ninguém encontrou razões factuais, científicas, profissionais ou de competência para ter saído o primeiro ministro da sau´de do Governo e Costa e ter sido substituído por uma senhora  que se celebrizou pela arrogância, pela pesporrência e pela cerrada oposição aos horrendos privados. Tudo em nome de um SNS a que nunca foram abonados os meios financeiros e, sobretudo, humanos, de que ,sobretudo agora, necessita desesperadamente. 

Pior: nunca percebeu que, sem prescindir da útil, necessária, profícua e forte presença do Estado (para isso pagamos impostos, e que impostos!) o problema da saúde em Portugal (ou em qualquer outro pís no mundo) passa por tentar estabelecer pontes justas e leais com os sectores social e privado que, no caso de várias PPP, mostrou não só ter assinalável êxito como resultou num excelente resultado financeiro para o Estado como foi atestado pelo Tribunal de Contas.

Ou seja, uma postura ideológica de recém convertida ao estatismo mais extremo muito próprio das duas principais pragas do século passado e que, estranhamente se perpetuaram por cá até hoje.

Dpois, e isso acaba por ser surpreendente admiravelmente surpreendente, eis que a senhora Temido viu a luz e se converteu ao socialismo ungida pelo senhor Primeiro Ministro que, num arrebatamento também ele difícil de explica, a converteu numa espécie de delfim juntamente com outras duas ministras e dois ministros. 

Convém perguntar depois do tropeço do aeroporto (segundo João Cravinho, uma absoluta “saloiice”, sobretudo por ser a sul do Tejo), da tentativa de promoção de um sr. Figueiredo a super-ministro (pelo menos do ponto de vista salarial...) como é que foi escolhida esta primeira lista oficiosa de Candidatos.

Algum(a) leitor/a) avançará o argumento de que a luta contra o covid foi vitoriosa. Foi-o, sem dúvida. É bom recordar que os trabalhadores da saúde, médicos, enfermeiros, pessoal sanitário, ou seja a linha da frente, devem receber um fortíssimo elogio de todos nós. Depois, a logística impecável traçada pelo vice-almirante Gouveia e Melo e pelo brioso grupo de militares que, com alto profissionalismo  e brio,o secundaram. 

E já agora, lemremos que Gouveia e Melo foi uma segunda escolha e só acedeu ao cargo depois do desastrado naufrágio de uma criatura de que já esqueci o nome e que provou absolutamente a verdade sobre os boys . Não prestava, não fez nada que se visse e as poucas decisões que terá tido eram desastradas ou apenas medíocres. Deve pairar noutro lugar para que não deve estar preparado mas isso é com quem o atura.

Temos pois, que a dr.ª Temido regressa a quartéis sem glória e no auge de uma crise sem precedentes nas estruturas hospitalares. Até a DGS (!!!) já saiu a terreio afirmando que bastas nuvens negras espreitam o futuro inverno e avisando que a falta de médicos vai ser ainda mais grave.

Não deia saudades mas apenas uma grande interrogação. Que é que deu  a Costa, quando há poucos meses, quando tudo já indicava a catástrofe,  para dar a entender que esta criatura poderia suceder-lhe?  

Responda quem souber.

 

Au bonheur des dames 523

d'oliveira, 29.08.22

Não deve ser fácil ser mulher e poderosa

mcr, 29-8-22

 

Confesso que nunca pensei ter de voltar (se é que ja tratei  o tema) aos temívis trabalhos a que as mulheres políticas se sujeitam. Ou melhor, ao escrutínio minucioso, cerrado,  impiedoso,  a que estão sujeitas.

Aquilo que se perdoa a um figurão torna-se escândalo se praticado por uma mulher. Mulheres políticas houve que, à semelhança de Golda Meir, antiga primeira-ministra de Israel  e ,sem dúvida, a melhor que  o país teve , mereceram uma frase em que o elogio é quase uma injúria (“o único homem no governo de Israel”!!!).

Indira Ghandi, Margaret Tatcher, Angela Merkelou ou Sirimavo Bandaranaike foram destratadas como mulheres e aplaudidas pela pose masculina de deterem o poder.  A senhora Merkel era para Helmuth Kohl, seu padrinho político  “a rapaiga” (sobretudo depois de ela o ter substituído...) mas as restantes sofreram durante toda a sua vida política um tratamento desdenhoso, invejoso e apoucador das suas qualidades. Valha a verdade que elas aguentaram a pé firme as burrices, as trapalhadas e as rasteiras. E deixaram uma imagem indelével e forte das suas capacidades. 

Desta feita, temos mais uma manobra rasca contra uma primeira ministra da Finlândia. Por acaso, ou talvez, não de uma responsável política que dez inflectir a política de neutralidade do país para uma aproximação à NATO, coisa que desagradou  a muita gentinha, mesmo por cá. 

A senhora Sanna Marin  é uma política experiente, competente e, oh escândalo!, jovem e bonita. E, pelos vistos, gosta de coisas normais como dançar e cantar coisas que fará na sua vida privada com a qual nada temos a ver. 

Pois foi justamente por isso, por cantar e dançar, numa festa ente amigos, numa casa privada, que sucedeu a blasfémia: cantou e dançou como qualquer mulher ou homem com 35 anos de idade (eu só dançava – e mal!- pois a partir do dó entro em desafinação aabsoluta) .

Ai Jesus que a pátria se afunda!

E vieram os dichotes, os dedos apontados, os gritos de horror. A criatura dança! E canta! Jesus Maria José! Onde é que já se viu?

Na civilizada, altamente educada, liberal tranquila Finlândia o rumor cresceu mais depressa do que a calúnia de Rossini!

Claro que muita gente, pasmada  com o burburinho entendeu tomar a defesa normal, normalíssima, da ténue desenvoltura de Sana. 

Porém, ainda os clamores iam no auge, eis que novo escândalo surgiu. Um vídeo privado, na piscina privada da residência de Sana mostrou duas mulheres de seios nus a beijarem-se. 

Caíram o Carmo e a Trindade nórdicos e não nórdicos!

Ninguém, pelos vistos, se levantou contra a merda da devassa da vida privada, por vídeos bisbilhoteiros, ilegais! Ninguém!

Perante estas duas sucessivas malfeitorias de Sanna, eis que ela, política que sabe o terreno minado que pisa, veio a terreiro pedir desculpa dos acontecidos, submeter-se a um test inútil de despistagem da cocaína e garantir que nada do que acontecera a impedira de trabalhar eficientemente no que realmente interessa: o governo de uma nação!

 

Ora ocorre, e é este o vero objectivo do folhetim, que, mais uma vez (uma enésima vez!...), uma senhora comentadora num jornal de referência vem condenar a pobre defesa apresentada  por Sana. “Saída não honrosa” (sic), exclama a moralista. A primeira ministra devia fazer peito às balas anónimas e soezes e não tentar desculpar-se. 

 Ora cá está o típico exemplo do mau argumento. Pode ser que a defesa seja fracota mas o que importa salientar nisto é que o(s) ataque(s)  foi/foram canalhices, injustificados e, convenhamos só existiram porque o alvo era uma mulher jovem, inteligente, política que acabar de pisar muitos canlos sobretudo russos e russistas.

Este é que é ponto. Dar crédito político (político, reparem) a uma festa privada, normal e simples; fingir-se ultrajado/a pelo facto de duas criaturas anónimas, mas mulheres, presumivelmente amigas  da mulher criticada, se beijarem, é, para mim que sou um velhadas, educado nos austeros e melífluos princípios morais do Estado Novo onde o escândalo rondava tudo, incluindo o não uso de peitilho nos fatos de banho masculinos,  uma infâmia, um ultraje e uma sacanice. Dos falsos pudibundos para começar, dos julgadores/as  isentos/as que, salomonicamente,  distribuem elogios e criticas   a torto e a direito. Nem sequer desculpo a eventual falta de assunto para encher a crónica que é paga pelo jornal. 

Aqui o que conta é um miserável ataque  e não as desculpas mesmo fracas d wuem é atacdo. aqui o que importa é não aceitar o ataque , defender sem "mas ou meios mas" a pessoa injustamente atacada.  Depois, muito depois, se for necessáriio poderá abrir-se uma esteril discussão sobre os modos como a pessoa agrdida se defendeu.

O cacauzinho dá  imenso jeito mas, que diabo!, est modus in rebus (expressão muito usada por juristas que, no meu tempo em que se aprendia latim, servia para muito  Uma tradução divertida era a expressão ”calma no Brasil que Portugal ainda é  nosso”.) 

sei bem quanto  é aterrorizante  “o chiar das botas do moço da tipografia no corredor à nossa porta” mas o moralismo saloio deveria ainda meter mais pavor ao/à escriba.

O  que não sucedeu! 

estes dias que passam 731

d'oliveira, 28.08.22

Houve cortejo mas não houve povo

mcr,  28-8-22

 

Ou então foram as televisões portuguesas que conspiraram contra a “veneranda” memória de José Eduardo dos Santos e esconderam as multidões de luto e em lágrimas.

Às tantas havia mais polícias e militares integrados no cortejo do que cidadãos angolanos ao longo do percurso.

Isto, em qualquer parte do mundo, diz tudo,  mas é plausível que nos trópicos angolanos apenas signifique  que as multidões, abaladas pelo triste sucesso se tenham deixado ficar em casa para poder chorar mais à vontade.  

 

Deixando esta desolada paisagem fúnebre, tmos que as mesmas televisões e otras internacionais, deram voz a cinco membros da comissão nacional eleitoral ou lá o que é que questionaram de madeira estrondosa a “verdade” das conclusões oficiais que indicavam uma vitória provisória do MPLA.

Logo se verá como é que afinal as coisas ficam mas não deixa de ser curiosa esta clara negação de um duvidoso triunfo eleitoral do partido que sempre esteve no poder. E sobretudo, sabendo-se que em Luanda, onde o escrutínio internacional terá sido maior, a UNITA averba uma incontestável e forte maioria... contra isto, aparecem todas as restantes províncias a votar no MPLA!  Não digo que isto não seja eventualmente possível mas acrescento, à cautela, que parece pouco plausível sobretudo se nos lembrarmos que Luanda e seu termo foi seguramente a zona onde menos se terá sentido a privação que grassa em Angola e que tem origem na corrupção, no roubo, no desprezo dos mais pobres... 

( devo acrescentar que nunca simpatizei com a UNITA, nunca, ao que sei, conheci algum dirigente, militante ou simpatizante desse movimento, exactmente ao contrário do que se passa com o MPLA. Fui (e em alguns casos ainda sou) amigo pessoal de militantes dessa formação, muitos dos quais conhecidos desde Coimbra e mesmo desde a prisão de Caxias que no meu tempo acolheu “democraticamente” portugueses e angolanos sem descriminação de raça, cor, credo religioso ou outro.)

Era justamente por causa desta espectável consequência do acto eleitoral que julguei e julgo indesejável a presença do Presidente da República neste mais que adiado enterro.

estes dias que passam 730

d'oliveira, 27.08.22

 

 

 

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Exéquias oportunas, visitas de Estado menos

Mcr, 27-8-22

 

O insepulto cadáver de José Eduardo dos Santos vai, finalmente, ser sepultado o que é uma excelente ideia porquanto os mortos em atraso não difundem nenhum aroma que valha a pena cheirar.

No caso em apreço, este cadáver é, sem qualquer espécie de contestação, de alguém que só uma evangélica boa vontade e uma ignorância de todo o tamanho, poderiam achar que nãofoi um ditador. Pelo tempo de Governo absoluto (37 anos!) que quase alcançava o recordo do “nosso” finado “Botas”; pela brutalidade que demonstrou, anos e anos a fio, com quaisquer dissidentes, mesmo os mais timoratos e corteses, pela cleptocracia que que instalou, engrandeceu e tornou mais do que endémica, pelo nepotismo que tornou institucional, pela corrupção que semeou e pela família que engrandeceu para além de toda a fama. De antigos potentados (e que já parecia imensa).

Morreu. Longe, a salvo de acusações, minado por uma doença que as dilectas filhas teimaram em prolongar para tentar combater o poder que sucedera ao pai e que elas  entendiam que as prejudicava !!!

Mesmo assim, o poder reinante entendia que, para salvar o arruinado brasão do partido, valeria a pena fazer um enterro de Estado, mobilizando assim algnus populares uma maioria incerta mas comovida, obediente mas despolitizada.

Um enterro espectacular dá sempre jeito em momentos de forte incerteza. A pertinácia dos filhos mais velhos do defunto, todos longe do país que lhes reclama centenas ou milhares de milhões, atirou as cerimónias fúnebres para cima do acto eleitoral . Foi assim que o velório, um velório útil para o MPLA, todas as tendências por uma vez reunidas, se arrastou penosamente duante a semana que ora finda. Amanhã, finalmente, JES  passa ao ventre da terra mãe.

E passa com uma pequena roda de testemunhas internacionais em que se destaca o embaixador da China que, até ontem, nos noticiários de Angola parecia  ser a única personalidade relevante.

O facto de isto tudo ocorrer durante as eleições ou durante a ressaca destas, perante a mais que previsível suspeita de manipulação de voto, deveria ter feito o Sr Presidente da Repbllica pensar duas vezes. De resto, que dibo!, JES não era exactacmente um amigo de Portugal, ou dos portugueses. Só quem padece de memória curta é que não recorda editorais ferozes  dos medias angolanos controlados pelo Governo e pelo Partido.

Um embaixador, quiçá (e mais forçadamente) o Ministro dos Negócios Estrangeiros, chegavam e sobravam para acompanhar o embaixador da China e o Presidente João Lourenço, por esta ordem, no séquito fúnebre de JES.

Diz-me um dos meus velhos amigos, que um enterro é um afrodisíaco (político, claro) para o doutor Marcelo Rebelo de Sousa. Não resiste. Mesmo o de uma personagem que de democrata nada teve nem, aliás, quis ou fingiu ter.

No caso em questão, dado o momento que Angola atravessa, dado o aproveitamento político iniludível que mais do que adivinhado é um facto irrecusável,  a prudência e uma ideia mais abrangente da vida diplomática luso-angolana, exigia maior discreção.

Em política, é bom lembrar, o que parece é. E o Presidente português neste momento delicado lá, mesmo que só vá deitar uma lágrima, duas flores e um punhado de terra no caixão do ex número do MPLA, é tomado por um frete ao partido que acaba de disputar umas eleições e que, sem mais adjectivos, são, foram, especialmente disputadas e cujos resultados serão, para já, alvo de todas as suspeitas.

*ns vinheta: enterro em Nova Orleans.

Não é pelo facto deser uma manifestação da grande cultura popular afro-americana mas apenas por ser algo que, paraalém da excelente música tem um forte valor simbólico. à ida para o cemitéro a banda toca algo de comassado, dolente, triste e, no regresso, coicto todos os assistentes de que finado já está perante o Senhor e livre de todas as penas e tristazas terrestres, a musica adquire um tom vivo alegre e festivo. De certeza que nada disto sucederá no enterr de JES , E tenho por mim que ele também não merecia...

 

estes dias que passam 729

d'oliveira, 26.08.22

Por onde anda o povo? 

E o que quer?

mcr, 26-8-22

 

 

Começando pelo princípio como dizia um imortal professor da Faculdade de Direito da não menos imortal Universidade de Coimbra , minha alma mater ou madrasta: isto da palavra povo tem muito que se lhe diga e, desde há pelo menos duzentos e cinquenta anos, ninguém se entende.

Entre nós, e apenas a partir de 74, a coisa andou muito difícil. Havia o povo unido nunca mais será vencido (expressão importada do desastre chileno e quase votada a destino semelhante) o “bom povo português” com ressábios ao velho regime,  via o almirante cavernícola (não confundir com outro também arcaizante e dado ao consumo de bebidas fortes que também não se notabilizou com feitos guerreiros) e a filme medíocre que presumia de “revolucionário” coisa, aliás, corrente nesse tempo. 

Havia quem falasse do povo de Esquerda ou de um povo e dos trabalhadores, como se estes não fossem povo ou o povo não fosse maioritariamente trabalhador.

Regra geral (aceite até por quem não percebia quão exclusiva se tornava a palavra) o povo era toda a gente menos uma pequena elite de capitalistas e latifundiários , veras sanguessugas do restante povo... 

Depois, e agora, temos que na Rússio povo é uma coisa e os apoiantes de Putin outra. 

Ora ocorre que a criatura que governa no Kremlin tem sido eleita por tremendas maiorias mesmo se talvez valesse a pena verificar como são fabricadas. E se o medo, as prisões, o silenciamento de rádios, televisões e restantes meios de comunicação , não adulteram  os resultados eleitorais. 

De todo o modo (e com todos os cuidados acima enunciados), assistimos, estupefactos, a uma estridente e violenta maioria de populares pró-guerra, digo pró “intervenção armada especial”. Quem fala em guerra ou duvida cautelosamente dos motivos da intervenção ou do seu resultado, “vai dentro”  com uma rapidez que faz, e de que maneira!, recordar os velhos gloriosos tempos soviéticos. 

Ainda anteontem um ex presidente de Câmara (de Ekaterinemburgo , cidade enorme , a quarta da Federação russa) foi preso, será julgado e tudo indica que um tribunal “justo” e “imparcial” o condenará a cinco anos pela prática do crime de descrença na Pátria e nos seus amados dirigentes.  

Por outro lado, e entramos na polémica actual, temos que da Rússia se escapam umas dezenas de milhares de oposicionistas, de “dissidentes”  e, ao mesmo tempo, da mesmíssima gloriosa atacante e ocupante de territórios vizinhos saem, como turistas pacíficos outros muitos milhares de cidadãos animados pela vontade de viajar, de conhecer outras gentes e de se comportarem como se nada de surpreendente ocorresse no seu país. 

Alguns países (Finlândia, Letónia, Estónia, Polónia, República Checa, entre outros normalmente vizinhos e ex-vítimas do expansionismo russo-soviético) começaram a tomar algumas precauções na concessão de vistos de curta duração. Não é que se julgue que, nesta enxurrada de cidadãos ávidos de mundo, haja gente que apenas pretende espiar, informar-se da força dos países onde deambulam, mas apenas se afirma que os cidadãos de um país agressor devem perceber que a sua pátria agride, mata, destrói e ocupa outo país. Que, por isso se estabeleceram sanções que pretendem atingir  e penalizar o agressor, os seus dirigentes, os seus oligarcas, a sua militaragem  e todos quantos comungam da fúria invasora. 

Ou, por outras palavras, é preciso que alguém que, com o seu silencioso apoio à ditadura putinesca, acaba por se tornar cúmplice da invasão, sinta na pele e no desejo veemente de se passear pela Europa que “no está el hornos para bollos”. 

Dir-se-á que estes turistas não trazem armas nem matam civis na Ucrânia. É verdade mas também não se comovem especialmente com o que passa por lá, não exigem dos políticos uma outra atitude que não seja a de lamber a mão e o cu de Putin, que não seja uma resposta mesmo tímida ao novo sonho de uma Rússia Imperial e colonizadora de países limítrofes. 

É preciso que o “povo” russo saiba que há uma guerra e que, queira ou não queira (e o seu exaltado nacionalismo ou o que passa por tal, demonstra) há uma generalizada condenação  de uma agressão que vai no sétimo mês mas que vem, de facto desde 2014)

Aqui não se advoga, longe disso, a teoria que o russo bom é o russo morto, perseguido, insultado e humilhado, mas apenas que é preciso que os russos percebam que algo está podre no reino do Kremlin e zonas anexas. É preciso percebam, como por exemplo, nós portugueses percebíamos, quando nos defrontávamos  por essa europa fora com manifestações anti Portugal que aguentava três guerras em África. Três! 

E que tirante um punhado de resistentes, de combatentes anti-colonialistas, de perseguidos, de encarcerados, de exilados parecia haver no país que viu partir durante treze vergonhosos anos, dezenas de milhar de jovens, carne para canhangulo, rumo às matas africanas.

É verdade que muitos partiram porque não podiam, não sabiam, não conseguiam enfrentar a ideia da recusa e da deserção. O analfabetismo era galopante, aquilo eram pretos ignorantes, Portugal ia do Minho a Timor, enfim tudo o resto. 

Mas mais verdade era que esta desesperada, estúpida, tentativa de fugir aos ventos da história e à vontade dos povos dominados, não tinha futuro (nem presente) e concitava contra nós toda a gente desde Washington até Moscovo, Pequem, Nova-Deli ou Paris. Nem sequer a Espanha franquista prestava qualquer apoio: os fugitivos atravessavam o país vizinho sem que a polícia os incomodasse. 

(sei disto porque durante alguns anos guiei, ajudei, fugitivos e desertores pela fronteira minhota. E ia com ele até bem dentro de Espanha – uma vez até S Sebastian- para os depositar num comboio rumo  à liberdade. Tive uma sorte danada mas também fiz por isso pois agia sempre com extremo cuidado, pelo fugitivo e sobretudo por mim que, como “passador” arriscava ainda mais). Nunca aceitei a ideia (mesmo se a compreendia e não a condenava sem mais) de que se podia ir para o “ultramar” guerrear semeando a boa palavra entre os soldados. ´À uma isso era impossível e depois nem sequer havia grande hipótese de êxito naqueles quartéis no meio do mato que o “inimigo” atacava e que obrigava, quanto mais não fosse, a disparar para salvar o próprio coiro e dos camaradas ao lado.  Só a ingenuidade mais profunda é que acreditava nesta actuação dita política. 

Portanto, e voltando à vaca fria: falar do povo russo como algo diferente da multidão que, pelos vistos, apoia Putin, a guerra e pede mesmo ainda mais, é mera desculpa de mau pagador e, fundamentalmente, uma disfarçada aceitação do status quo de agressão. Ninguém pede, sequer Zelensky, quese persigam os cidadãos russos que batem às nossas fronteiras fugindo daquela situação. Ninguém quer proibir, sem mais, os que vem fazer turismo. Todavia, também não parece ser coerente com uma política de sanções fingir que nada acontece , receber de braços abertos todos quantos por convicção profunda, por oportunismo ou por medo dão a Putin o seu aval a uma infâmia cometida contra um povo que não atacou mas apenas se vai defendendo.

Há nestes habituais “russistas” a ideia de que estamos perante dois contendores com iguais razões e pior: que ao ajudarmos um a defender-se, o estamos a usar como “carne para canhão” ao serviço de obscuros interesses imperialistas dos EUA, da NATO, da Europa..  

E fingir que agressor e agredido são uma e a mesma coisa.

É cobardia moral ou pior: um escondido apoio ao criminoso gesto invasor por obscuras e antigas razões de cumplicidade e amizade com a central dita socialista implodida nos finais do século passado. 

É mais uma vez usar a palavra povo como antídoto à justiça, ao respeito pelos direitos humanos e pelo outro povo que corre todos os riscos e é alvo de todas as agressões. 

estes dias que passam 728

d'oliveira, 25.08.22

vote num;  livre-se de dois!

mcr, 25-8-22

 

Angola foi a votos e as notícias são confusas quanto às previsões à boca das urnas.

Tudo indica que a UNITA se reforça mas não parece seguro que o MPLA seja derrotado. Não que o não mereça tal a degenerescência em que vive o partido . No entanto, a máquina do Estado está toda ao seu serviço, a da propaganda também e mesmo que em Luanda o clima pareça diferente, há dezoito províncias onde os observadores não chegam ou chegam mal e onde todas as trapalhadas podem ocorrer.

Em Lisboa, um “incidente” informático  privou vários eleitores de exercer o seu legítimo direito.  Claro que é plausível mas...

A reportagem televisiva só mostrava adeptos da IUNITA e realçava que não havia militantes do partido no poder a protestar.

As reportagens de vários canais portugueses e estrangeiros também tornavam muito mais visível o partido da oposição. Conspiração mundial contra João Lourenço ou simples realidade? 

Convenhamos que tirando alguns exemplos de fortunas colossais, histórias de corrupção e generalizada pobreza extrema da população o saldo do regime que está no poder desde a independência não merece especial menção e, menos ainda, elogio. 

Para quem viveu anos de antigo regime português, João Lourenço poderá, quanto muito, parecer-se a Marcello Caetano  o bombeiro tardio do Estado Novo. Tardio e ineficaz. E sem propostas mobilizadoras, viáveis, e passíveis de esperança na mudança prometida. 

Um dos mais importantes políticos do MPLA dava ontem uma entrevista onde afirmava certas extraordinárias especificidades da “democracia” angolana e sobretudo os perigos de uma alternância neste momento. O argumentário da criatura cheira que fede mas tem sido replicado noutras latitudes para justificar o injustificável. 

Até entre nós, nos anos de chumbo , se dizia que a liberdade nas colónias poderia ocorrer mas mais tarde porque os pretos não estavam preparados e as regras democráticas não faziam parte das suas tradições políticas...

(conviria acrescentar que nunca o poder colonial se preocupou em inculcar qualquer educação política, menos ainda democrática, no Império. Bem pelo contrário! A ideia de criar elites negras nas colónias era aberrante e anti-patriótica.)

 

Deixemos Angola e olhemos para o Brasil onde começou a  campanha eleitoral abençoada pelas vísceras sagradas do imperador. 

Tudo parece indicar que o combate será entre Lula e Bolsonaro. 

Porém já um terceiro contendor que, pelo menos como slogan eleitoral ganha aos dois. Pelo humor,  claro mas sobretudo pela verdade. Vote num, livre-se de dois promete um brasil bem mais saudável sem a ameaça do putsch e o relento do “mensalão” que, queira-se ou não, manchou absolutamente o PT. Nem sequer mencono o processo que atingiu Lula, ou o desastre governativo da sua sucessora, uma criatura que, muito à frente do seu tempo, “renovou” a desgraçada língua que nos desune. Bastou a pataratice da “Presidenta” para se perceber como a carruagem iria percorrer aquele difícil caminho. 

Desde há muito que se diz que o Brasil é como um barco demasiado grande para poder naufragar. Pelos vistos ninguém se lembra do Titanic...

A verdade é que o Brasil, duzentos anos de independência, não se livrou do pior da herança colonial nem foi capaz de aprender com  as poucas virtudes do colonizador.

Diz-se que o país alimenta o mundo mas tem, no mínimo, cem milhões de cidadãos a  roçar ( ou já laá dentro) a fome, o desemprego, a miséria. As telenovelas chegarão a muitos espectadores mas ninguém repara que as favelas tem muito mais habitantes que as ruas e avenidas das grandes cidades; que o crime violento impera e que, nas prisões, mandam os gangues mais perigosos. 

Não foi o facto de, uma vez, terem elegido Blsonaro. É apenas a possibilidade desta criatura, que já provou cabalmente a sua ignorância crassa, a sua falta de preparação política e sua notória incapacidade governativa, poder ser reeleita. 

Não que não haja precedentes. Os EUA, com um sistema eleitoral duvidoso que questiona muitas vezes a existência de maiorias populares, elegeram Trump. É verdade que este perdeu as eleições seguintes, mas também não deixa de ser verdadeira a ameaça que ainda representa  e o eco que ainda tem em milhões de votantes republicanos.

 

É por isto que, desanimadamente, celebro o slogan de Ciro, o terceiro candidato  pois além de ser uma pequena luz no túnel, pode, eventualmente, criar uma força eleitoral que a longo prazo redima  o país alegadamente irmão, relação familiar que está por provar.

 

 

 

 

estes dias que passam 727

d'oliveira, 24.08.22

 

 

 

 

 

 

 

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Seis meses e trinta e um anos depois

mcr,  24-8-22

 

Celebra-se uma data dupla hoje. Por um lado a Ucrânia é independente há já 31 anos e, por outro,   a invasão russa ocorreu há seis meses.

Estas duas datas, mero acaso do calendário, acabam por tornar o dia importante. É que a denodada resistência à infame invasão veio justificar, reforçar e realçar a independência de três décadas.

Para uma grande maioria de europeus, a Ucrânia era um jovem Estado, desconhecido, cuja história também não despertava curiosidade ou interesse. 

Mesmo o facto de, a partir de 1945, fazer (com a Bielorússia) parte da ONU, não merecia qualquer destaque. Em boa verdade, dada a natureza da URSS, mais parecia que era mais um truque soviético par aumentar o número de votos favoráveis na assembleia geral da referida organização.  E, de certo odo, isso era verdade. Ninguém imagina que algum líder ucraniano pudesse, alguma vez, votar diferentemente. E, que eu saiba, isso nunca aconteceu.

Todavia, a Ucrânia  (a “terra da fronteira”)  tinha uma História mesmo se salpicada de ocupações várias, de revoltas independentistas sangrentas, de uma língua própria, mesmo se semelhante ao russo.

A verdade é que este enorme (para a escala europeia) país viveu quase sempre sob regimes diferentes e controlado por países diversos. Desde a Polónia, a Lituânia e a a federação polaco-lituana até às primeiras tentativas, de resto limitadas, de estabelecimento de populações russas, houve de tudo um pouco . E, paralelamente houve governos “ucranianos” (ou tendencialmente ucranianos autónomos nas regiões centrais do país. A Crimeia, para não ir mais longe, é russa desde a conquista operada pelo valido Potemkin, foi quase sempre território tártaro (é bom lembrar que as últimas dezenas de milhar de tártaros foram deportadas por Stalin que assim acentuou a russificação dessa península. Depois, já em pleno regime soviético, a Crimeia pertenceu à Federação russa de onde saiu por meros motivos de racionalidade económica quando, nos anos sessenta,  Nikita Krutschev a integrou na República Socialista da Ucrânia. E assim se manteve até 2014).

E seria bom lembrar que, durante os temíveis anos de formação da URSS, a Ucrânia foi praticamente independente, derrotou sozinha os exércitos brancos que ocupavam parte do seu território até sofrer uma invasão do Exército Vermelho. E o independentismo ucraniano permaneceu em segundo plano o que originou, entre outras calamidades, uma violentíssima repressão ordenada por Stalin que, como é sabido culminou na grande fome (Holodomor) quando terão morrido entre cinco a sete milhões de ucranianos que foram, de resto, impedidos de sair do seu território para a Rússia e para a Bielorrússia graças a fortes dispositivos armados do Exército e da polícia política.

O sentimento anti soviético foi tão forte que muitos ucranianos receberam os invasores alemães sem hostilidade ou mesmo, em vários casos, colaborando com eles. Paralelamente, a Ucrânia, participou decisivamente na chamada “Grande Guerra Patriótica” e de tal modo se comportou que foi alvo de expressivas homenagens de Moscovo. Como república federada, pagou um altíssimo preço ente mortos e feridos (eventualmente, um terço das baixas totais da URSS) e as tropas ucranianas desempenharam um papel absolutamente vital na vitória final. Tudo isto está mais que retratado na História oficial, reconhecido genericamente. Com o fim da URSS, a Ucrânia, como a Arménia, os países bálticos ou a Geórgia, para só referir alguns, preferiu a independência total  e tal facto foi solenemente reconhecido pela Federação Russa.

Ninguém nega que alguns, pelos vistos mais que minoritários, sectores ucranianos se mantiveram pró russos e que houve forças políticas (também fortemente minoritárias ) que nunca abandonaram a ideia de integrar o país numa união a três (incluindo a Bielorrúsia) . Para  tal  havia dois factores importantes, a religião (e a obediência ao patriarcado de Moscovo) e a língua que era falada por alguns milhões de ucranianos que ou eram bilingues ou apenas russófonos (Zelensky, para não ir mais longe, era russófono...).

 

No entanto, o peso da história pregressa, a atração pelo ocidente, um sentimento global de pertença à Europa, pesaram definitivamente na balança.

Nem muitos ocidentais, nem sobretudo, Putin e os ultra-naciolistas russos  perceberam isso.

Assim, quando a invasão ocorreu (e aqui convem lembrar que apenas os Estados Unidos avisaram com antecipação a iminência de um ataque russo em que nem sequer as autoridades de Kiev acreditavam, mesmo depois da ocupação da Crimeia e da auto-proclamação das “repúblicas populares” do Donetsk e de Lugansk)- de resto absolutamente dependentes do apoio militar russo )

(Vale a pena recordar que num jornal de referencia, um cartoon diário, por varias vezes, retratou um militar americano a desesperar pela tardança de um acto militar russo. A ideia, pelos vistos, era ridicularizar essa opinião mas os factos, sempre eles, provaram que o cartoonista, aliás excelente, também se podia enganar.)

A invasão ocorreu e, mais uma vez, tudo indicava que num par de dias, duas ou três semanas no máximo, a Ucrânia seria vencida, ocupada e o seu Governo substituído por um outro pronto a entrar em funções e estacionado na fronteira.

Para pasmo geral, nada se passou como se previa. Já passaram seis meses. A guerra tirante os mísseis e a aviação russos está para durar. A conquista de Kiev gorou-se em pouco mais de um mês. Nas últimas semanas o frente oriental estabilizou-se e no Sul os ucranianos aumentam a pressão sobre os territórios ocupados e limítrofes da Crimeia.

Dir-se-á que isso é fruto da ajuda europeia e americana. Também é mas tal ajuda que só agora se vai concretizando em força, só ocorreu porque o Exercito e o povo ucranianos (e o Governo) deram provas de uma capacidade de resistência desconhecida, digamos espantosa, formidável e heroica.

Também é verdade que a tropa russa parece mais apta a pilhar e a matar civis do que a combater corpo a corpo. Que o comando militar russo padece de incompetência ao mesmo tempo que a corrupção avassaladora inclusivamente nos domínios da Defesa torna deficiente a logística e mina o moral (baixo, muito baixo) dos soldados russos.

Mas sobre tudo isso, sobre as ajudas militares ou a ineficiência russa, paira o sentimento de pertença a uma nação livre, independente e democrática e a vontade de não se vergar a uma imensa violação do Direito Internacional, a uma   grosseira interpretação da História eslava e a uma mentira orquestrada sobre a essência do poder de um país que está demasiado pero da Rússia e eventualmente muito longe de Deus par usar uma frase conhecida.

Não admira que, hoje, haja motivos, e não são poucos, para saudar um país que, neste momento se defende e, ao fazê-lo defende alguns dos seus vizinhos, desde a Moldávia à  Polónia ou aos Balticos e defende a Europa toda da imprevisibilidade de um poder russo que mantém toda a sua crença numa missão imperial que não só não trouxe prosperidade e bem estar ao seu povo mas foi fautor de profundos desequilíbrios em todo o continente sobretudo ao centro e ao leste europeus.

au bonheur des dames 522

d'oliveira, 23.08.22

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O que resta do maoísmo

mcr, 23-8-22

 

Os leitores que me leem além da eminente generosidade com que me aturam não levarão o titulo especialmente a sério porque o maoísmo mesmo tendo sido um epifenómeno da longa deriva autoritária e acrítica do marxismo (com passagem pela variante marxista-leninista e agravado pelos miasmas do stalinismo) morreu de morte macaca mas, tal como os vírus ,basta-lhe um ventinho (un venticelli como diz a ária) para renascer e sempre em tom de tragédia.

Já poucos se lembram do “grande timoneiro”, dos alucinados guardas vermelhos, do livrinho  vermelho das citações brandido como se fosse uma arma de arremesso (e, de facto, acabou por o ser do modo mais maligno e arrepiante que e pode imaginar).

Aqueles anos que mediaram entre 65 e 75 com epicentro em 68 deixaram um rasto de cartazes como o da gravura e um tsunami de sangue cujo paroxismo foi atingido no Cambodja graças ao pensamento selvático do famoso “camarada nº1”. 

Ainda hoje se desconhece o número exacto de vítimas da “grande revolução cultural e proletária”  (GRPC) que arrasou  regiões inteiras da China, dizimou gerações, sobretudo a dos primeiros companheiros de Mao mas também e de forma brutal a elite cultural e científica que se criara na então jovem “república popular”.

(ainda não se apagaram de todo os ecos desta onda pseudo-revolucionária, desta jacquerie sem camponeses mas com estudantes do secundário e das universidades, pois continuam visíveis desde Tien-An-Men, os múltiplos braços do polvo liberticida. Macau ou Hong-Kong são claros e pungentes exemplos disso, não falando já nos uigunes ou nos tibetanos, sequestrados nos seus próprios territórios originais.) 

A “ revolução cultural” seduziu durante um curto período de tempo, certas elites culturais europeias, sobretudo em França e deu azo a uma pletora de ensaios todos muito assertivos que apenas tinham um pequeno defeito: os seus autores não falavam nem liam chinês, alimentavam-se das agências de informação chinesas e quando visitavam o país estavam à mercê dos guias e intérpretes oficiais que os toureavam à antiga portuguesa. 

Porém, a fina flor da inteligentsia francesa, melhor dizendo parisiense, não só se precipitou alegremente no que julgavam ser uma variante gentil do pesado e estéril ideário do PCF e soviético mas entendia o que se passava na longínqua China como uma pura ressurreição de um Marx temperado por Proudhon. 

Enganavam-se redondamente, claro, e enganaram milhares de leitores, fatalidade a que não escapei mesmo se por (relativamente) pouco tempo. Cinco anos depois, envergonhados, todos estes luminares da crítica, da Tel Quel, alguns romancistas, todos batiam com a mão no peito e juravam não cair noutra. Note-se que nem “Le Monde” um jornal cuidadoso, reflectido, plural, escapou aos hossanas maoístas. A prova provada, se prova fosse preciso, de quão vulneráveis são as elites, mesmo as  mais sofisticadas, às modas culturais.

Deixemos, porém, este cadáverideológico, na fossa comum onde jaz, e vamos à imagem que encima o folhetim. 

Quem viveu esses tempos, ásperos embora exaltantes, recordará sem dificuldade as dezenas, quiçá centenas, de cartazes com que se adornou a propaganda da GRCP. Sempre neste tom triunfal e grandiloquente, quase sempre com amarelos e vermelhos, vendendo juventude combativa por todos os poros. Em Portugal, um pequeno partido,  pouco mais do que uma seita, teve ao seu serviço alguns ilustradores que se inspiraram sem rebuço na iconografia que lhes chegava da China.

Aliás, foram ainda mais longe na imitação servil do modelo oriental. O seu líder era, à semelhança de Mao, “o gande educador da classe operária” mesmo que não conste que as massas trabalhadoras portuguesas, tivessem de algum modo sido fascinadas ou ensinadas pelo estudante de Direito da Universidade Lisboa e fundador do movimento depois partido. 

Coitado do proletariado cuja alegada emancipação depende sempre de intelectuais vindos da classe burguesa, educado nas suas escolas mesmo se posteriormente desavindos com os seus progenitores!...

 

Agora a iconografia revolucionária maoísta encontrou um utilizador menos virulento e muito terra a terra. No Centro Comercial Palmeiras um modesto restaurante (bistro?) chinês ou, eventualmente, coreano utiliza um dos mais famosos cartazes para atrair os clientes.

“La révolution n’est plus ce que ele était!...   

(quem não gostar da citação em francês tem sempre uma latina: o tempora! O mores!...

* nota-se-á na ivinheta  que, no topo onde figura o nome do restaurante, estaria, noutro tempo a imagem de Mao !!!  Sic transitgloria mundi ...

 

 

 

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