O estado “sucial”
mcr, 15-1-23
Não leitoras perspicazes e leitores atentos, não me enganei de vogal na segunda parte do título. Escrevi “sucial” porque me lembrei da palavra sucia.
E é isso que temos no que toca à saúde e à educação. Profissionais tratados como se não passassem de uma súcia de incapazes negligentes, feios porcos e maus, que obram diariamente contra a pátria e contra o socialismo ou ao algo que por aí corre com o mesmo nome.
Já por várias vezes referi o caso da saúde que, mesmo com outro ministro, menos impante do que a anterior, mais conhecedor porque médico, pouco pode fazer além da promessa de estudar os dossiers pendentes e, honra lhe seja!, de aceitar sem sobranceria parva que o estado de coisas é mau.
Diga-se que isto já é um progresso em relação à criaturinha que adejou sobre o sector anos e anos e deixou tudo pior do que quando entrou no Ministério.
Hoje, a questão é a dos professores. Todos os professores sem excepção. Todavia, o acento tónico há de recair sobre aqueles que vão tentando levar a cabo a sua (já de si) espinhosa tarefa. Comecemos pelo óbvio: são miseravelmente pagos. E digo miseravelmente porque andam pelas escolas aos trancos e solavancos, sem saber (pelo menos uma fortíssima percentagem...) se no ano seguinte lá estarão. Log temos uma instabilidade que não faz qualquer bem, e muito menos qualquer sentido. São os professores que vivem sob a ameaça de no ano seguinte serem colocados a distâncias absurdas do local de residência e por isso começam logo a iniciar as suas tarefas sob o signo da incerteza. E, é bom lembrar, que para os alunos a coisa também tem consequências pois isto de mudar de professor todos os anos prejudica todos.
A precariedade é, neste caso, e de per si, uma infâmia pois trata toda a gente por igual e mal. Ninguém de bom senso pode aguentar um perpétuo estado de emprego sujeito a um jogo de contingências ameaçadoras que além do mais, prejudicam qualquer projecto de vida familiar decente.
Depois, os “inteligentes” do Ministério da Educação, emboscados nos seus gabinetes, nem sequer sabem como é que as aulas se processam e, muito menos, se preocupam com a carga de tarefas extra-lectivas com que azucrinam a vida dos docentes. Essa camarilha do “eduquês” produz conclusões delirantes, fala de uma realidade virtual, desconhece opaís, as regiões, a dificuldade de encontrar alojamento digno e decente para quem está deslocado. Duvido que sequer saiba o preço do combustível, o esforço de horas ao volante, o desgaste psicológico de quem anda com a mala, a trouxa, às costas.
Não tenho a mínima simpatia pelo cavalheiro tonitruante da Fenprof que anda há uns bons vinte anos a cumprir uma agenda que se não é partidária é irmã gémea disso. Todavia, no meio de parlapatices várias, o homenzinho tem razão: aquilo, a vida de um professor é uma montanha russa absoluta e mal paga. Depois, temos que a progressão nas carreiras é um mistério para todos, sobretudo para os professores. Aliás, mesmo com um enquadramento férreo, houve, já muitos que se rebelaram e engrossaram as fileiras do STOP, o “sindicato de todos os professores” que quase sem organização, muito menos experiência, conseguiu mostrar ao que vem. São poucos mas paralisam escolas, desesperam pais (que muitas vezes usam a escola dos filhos mais como depósito enquanto vão trabalhar do que como meio para educar as crianças e adolescentes).
Agora, um artista, a passar por videirinho, vem com passinhos de lã investigar como é que funciona o fundo de greve, ameaçar os professores afirmando que estes pagam aos funcionário das escolas que, também eles!..., são poucos, tem quadros desfalcados e são miseravelmente pagos.
Notem que estas pequenas canalhices não vem da Direita anti trabalhador mas de uma gentinha que jura ser de Esquerda desonrando uma palavra e uma ideologia nobres, tentando assustar e ameaçar quem protesta.
Depois, temos que há regiões onde desde há anos faltam professores como faltam médicos e outros profissionais de saúde. Não há casas a preço módico para quem é deslocado. Neste capítulo poderia co alguma facilidade encontrar solução quer mobilizando hotéis quer construindo conjuntos de apartamentos dedicados exclusivamente ao arrendamento para profissionais de saúde e educação deslocados. Ou, encontrando uma fórmula de subsídios de alojamento autenticada pela direcção da escola do hospital ou do centro de saúde.
Eu até proporia umasolução drástica; deslocar a camarilha do eduquês & assimilados para, por exemplo Bragança, Beja e Guarda. (reparem que só indico capitais de distrito que eu não condeno ninguém para o degredo das pequenas e desertificadas vilas e aldeias desses territórios).
Ontem, parece, que houve uma manifestação gigantesca. Mesmo que fossem só os trinta ou quarenta mil indicados pela polícia e pelo poder.
O mesmo já sucedeu no longínquo ano de 2008 (espero não me ter enganado... ) quando uma incompetentíssima política estacionou no ME. Catorze anos depois, tudo como dantes, quartel general em Abrantes. Os professores continuam a ser considerados cidadãos de segunda (ou terceira) e a serem pagos como se fossem empregadas domésticas.
Além do mais, nem as escolas tem todas as condições exigidas para tornar o ensino mais interessante nem sequer garantem a segurança dos profissionais porquanto as histórias de agressão cresceram desmesuradamente nos últimos anos- A saída dos estabelecimentos de ensino começa perigosamente a parecer-se com as dos estádios de clubes com claque violentas.
É provável que já tenham sido julgados alguns agressores de professores mas ou os jornais se desinteressam dessas notícias ou as penas foram de tal modo inócuas que não desarmam os agressores.
Eu lembraria que, uma forte percentagem do pessoal docente era, nos anos iniciais da Democracia , um viveiro de votantes de Esquerda, mormente do PS. Será que ainda é assim? Haverá uma tão forte percentagem de masoquistas na classe? Será que ao apanharem uma bolachada na face esquerda oferecem de seguida e prazenteiramente a bochecha direita?
Aqui para nós, o azar dos professores, comparando-os com os profissionais da saúde, é que não tem a escapatória da emigração. Estão condenados, pelas características próprias da profissão a serem exilados no próprio país onde nasceram, cresceram estudaram e candidataram-se a uma profissão desvalorizada. “Habituem-se” parece ser a resposta de um poder que começa a ser periclitante mas que vai ainda durar o tempo suficiente para desgraçar de vez uma geração de pessoas que pensaram a educação como um ofício digno. “Habituem-se..”