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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

au bonheur des dames 578

d'oliveira, 11.03.23

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Sempre há um poço sem fundo: o da estupidez

mcr, 11-3-23 

 

 

Escrevi aqui que não há poços sem fundo. Referia-me aos dinheiros da cultura que são sempre a fundo perdido mesmo quando não tem essa finalidade. 

Todavia, desta feita, lá termos que referir a nova censura livresca que é um dos pontos altos (eu diria baixos, muito baixos) da nova “cultura” (se é que esta palavra pode ser usada...)

Agora, pelos vistos, as sensibilidades do politicamente correcto, ficam aflitas com alguma expressão lançada num romance. Temem que isso  ofenda uma qualquer minoria. Há uns anos a vítima da nova censura cretina foi “Hukleberry Finn” desse extraordinário Mark Twain. A questão, na altura era a palavra “nigger”, expressão injuriosa que em português, ao contrário do que vi escrito, pode perfeitamente ser traduzida por “escarumba”. Parece que o tradutor português só sabia a palavra “preto” que obviamente não tem a mesma  densidade ofensiva. De todo o modo, Twain usou propositadamente o “nigger” pois só isso traduzia correctamente a situação descrita no Sul. 

Uma luminária americana, seguida por outras de diferentes nacionalidades todas tão supinamente burras quanto a primeira, achou que isso ofendia a minoria negra (agora mais “correctamente” afro-americana!....). Como “cego” é péssimo quando se pode dizer “invisual” (!)

Até há pouco, a coisa não chegava a Portugal nem talvez à Europa. No entanto, a burrice (para citar enviesadamente o Professor Teixeira Ribeiro quando descrevia a  inflação) “alastra como mancha de azeite”. E já aportou ao torrãozinho de açúcar. 

Agora estão na berlinda palavras tão inofensivas como “feio” ou “gordo” usadas por Roald  Dahl. Ao pobrinhas das crianças leitoras ao lerem isso devem sentir arrepios horrendos na espinha ... 

Todavia, os previdentes editores, temerosos da ira de um leitor analfabeto e analfabruto, já “traduziram” esses termos por outros tão neutros como a água destilada que é ou era insípida, inodora e incolor. 

Esta “moda” de cirurgicamente amputar palavras (mas virá o tempo dos períodos, dos capítulos e do resto, não duvidem) faz lembrar em mais hipocritamente o tempo m que os livros eram queimados (nem vale a pena ir mais longe: na Alemanha nazi, estudantes nazis fizeram gigantescas fogueiras só com autores contemporâneos. De todos porque ainda mais surpreendente só vou citar o autor de “Emílio e os Detectives” de seu nome Erich Kastner!)

Por cá a coisa foi menos brutal mas tentou ser igualmente eficaz. A Censura proibia os livros inconvenientes. Em boa verdade, alguns mereceriam o esquecimento do público apenas por mal escritos. Porém a operação censória dirigida por militares reformados e ignorantes não se preocupava com a qualidade, longe disso. 

Claro que, em Portugal, graças ao paupérrimo estado da arte repressiva, havia uma conspiração geral par trocar s voltas à Censura e à polícia. Lembro-me, mesmo de livreiros (e eram bastantes...) que, `à cautela, escondiam grossas quantidades de livros que adivinhavam ser futuramente perseguidos. Aliás o mesmo se passava com os discos do Zeca Afonso e de outros. S vendedores, escondiam largas quantidades e tinham mesmo uma lista de fregueses prontos a comprar o material proibido ou em vias de o ser. 

Ou seja, houve sempre gente que, com maior ou menos êxito, toureava os agentes da repressão intelectual. Direi mesmo que alguns dos meus amigos, e eu próprio, comprávamos qualquer coisa que cheirasse a proibido. Uma pequena editora que, com muitos outros amigos, companheiros e camaradas, fundei nos finais de sessenta (a “Centelha” ((“uma centelha pode incendiar a pradaria”, se é que alguém recorda “o Homem do Lena”)) tinha mesmo uma estrutura paralela de edição e salvamento  de livros produzidos!  

Não éramos os heróis de “Farenheit 451” (do admirável Ray Bradbury) mas, na medida do possível, traduzíamos, editávamos, distribuíamos e escondíamos  os livros que, de resto, se vendiam como pãezinhos.  

A vinheta deste folhetim reproduz um curioso livrinho (382 páginas)  com o esclarecedor título “Romans a lir et romans a proscrire” da autoria de um sr padre  pároco em Sin-le Noble. 

O subtítulo, “ensaio de classificação do ponto de vista moral dos principais romances e romancistas da nossa época (1800-1908) com notas e indicações práticas”. O meu exemplar é da 4ª edição (!!!)  

Traz 1280 autores (perigosos)  e cerca de quatrocentas obras recomendadas (para meninas de 20 a 25 anos; paraos jovnes das “patronages”, para as senhoras mundanas; para os adultos ávidos de emoções ou, pelo menos, de sao realismo; e finalmente para os estudantes e letrados que dtem de estar ao corrente das matérias)

Consta que, numa sessão do parlamento da primeira república, um deputados (que se chamaria  João Camoesas)  este político discursou durante catorze horas ininterruptas porquanto estava-se à espera do comboio do Porto onde viriam deputados suficientes para ganhar uma qualquer votação. Dele alguém disse que podia não se lha admirar a eloquência mas tão só a bexiga.

Do mesmo modo, é mister respeitar este senhor cura que terçou uma tão longa batalha com mil e muitos autores e três ou quatro vezes mais obras .

Em seu abono, apenas posso dizer que ele não propunha a amputação de palavras, parágrafos ou capítulos mesmo se, no íntimo a  criatura ansiasse pelo desaparecimento de tantos autores e obras. De certo modo, o futuro  fez-lhe a vontade. Dos amaldiçoados resta um  par de dúzias. E dos abençoados ainda menos

Sic transit gloria mundi.... 

au bonheur des dames 577

d'oliveira, 10.03.23

Não há poços sem fundo, helas!

mcr, 10-3-23

 

Antes que alguma leitora me vote ao Tinhoso, quero dizer-lhe que o francês é, por razões geracionais, de leitura, de predilecção, de política... Mais de metade, dois terços talvez, da minha biblioteca é em línguas estrangeiras, mormente francês e espanhol.  De qualquer modo, não uso comummente  expressões estrangeiras. 

Curiosamente, e de origem ministerial, estabeleceram-se dois francesismos no falar quotidiano. O “jamais” sobre um aeroporto na margem sul (onde parece que afinal ele ficará, e o actualíssimo “helas” do sr Pinho  que a completo despropósito da narração das suas façanhas fiscais o usou. Que é que terá passado pela cabecinha sonhadora é um mistério que não vale a pena dilucidar. A criatura é pequena, duvido que seja tão competente quanto alguns a pintam e a sua odisseia de prisão domiciliária numa quinta onde o vinho parece não aparecer, também não merece grandes parangonas. Aguardo confiante e ingénuo que uma severa pena de prisão o mande para o calabouço por um bom par de anos mas mesmo isso não é a primeira nem a segunda das minhas preocupações.

O folhetim tem mais a ver com os fundos para as actividades culturais que umas largas dúzias de esforçados e pouco conhecidos agentes levam a cabo. Como não podia deixar de ser, nunca há dinheiro para todos. Não há e nunca haverá mesmo que o país enriqueça  tremendamente. 

Quando digo agentes culturais não refiro nem escritores, tradutores e outra gente do livro nem artistas plásticos. Estas duas categorias navegam no mar encapelado da oferta e da procura, sujeitos à lei do mercado. É duvidoso que os medíocres singrem, vendam se tornem conhecidos. É verdade que no domínio da literatura há autores de nicho, com um fiel e pequeno grupo de leitores que apenas os aguentam à tona e nem sequer lhes permitem viver só do que criam. No caso de pintores e escultores & similares a coisa ainda é mais complicada. A necessidade de ateliers é absoluta e no caso da escultura torna-se ainda mais dificultosa. É verdade que, de longe em longe, o Estado faz umas compras mas, como de costume, também estas sofrem a crítica dos que não abicham. Os júris para o efeito são sempre criticados pelos autores que não conseguem vender uma peça ao Estado. As galerias que “promovem” os artistas levam-lhes somas exorbitantes por catálogos pífios, e publicidade mesquinha. E desaparecem da circulação com quase a mesma velocidade com que morrem as empresas distribuidoras de livros. 

De todo o modo, mesmo sabendo que o gosto do público não ésempre o melhor indicador nem o mais inteligente, nem o mais crítico, a verdade é que nesta área so toca guitarra quem tem unhas. 

No que toca ao teatro, à música e à dança e na generalidade a tudo que posa significar artes do espectáculo, corre a curiosa ideia de que é ao Estado que incumbe velar pela existência e manutençãoo das companhias e grupos. Parte-se de uma afirmação de que o Estado tem a obrigação de proteger, divulgar e manter as estruturas artísticas. Com ou sem espectadores. No caso vertente, a falta de público nunca é da responsabilidade dos criadores que se exibem mas tão só da ignorância néscia das multidões que preferem a telenovela da televisão, o cantor pimba e quejandos às excelências que dominadas pela pulsão artística e pelo génio criador se esforçam por distribuir pérolas a porcos. Além do público distraído e ausente, há os meios de comunicação que não se esforçam suficientemente por propagandear as elites geniais que sobem aos palcos. 

É verdade que, em comparação com o que ocorria há muitos anos, a imprensa dita cultural quase desapareceu. Sou do tempo (a “longa noite...”) em que meia dúzia de revistas pontualmente mensais, sujeitas a uma censura bravia e castradora, viviam das assinaturas dos seus leitores. No meu caso, bastas dificuldades tinha para pagar a “Vértice”, a “Seara Nova” e “O tempo e o modo”, além do jornal diário. Curiosamente, a Direita não aguentava as publicações que ia criando que morriam ao fim de uma ou duas dúzias de meses. Sem leitores mas com ajudas ocultas do Estado. Sem censura, claro que os censores os olhavam com ternura e esperança. 

Do mesmo modo, e sempre nesses tempos temíveis, havia grupos de teatro que sobreviviam a tudo desde o TEP ao Teatro Moderno de Lisboa, Havia associações musicais que viviam das quottas dos seus sócios (lembro e so no Porto, o Círculo de Cultura Musical e o Orpheon Portuense). E havia cineclubes por todo o lado  ou, apesar de tudo, em muitas cidades, também eles autossustentando-se graças aos associados. 

Não vou debruçar-me sobre a sorte macaca que levou estas instituições, todas elas e muitas mais, ao charco. 

Nem vou sustentar  a ideia de que é ao Estado que compete financiar tudo, algo que sempre me pareceu de duvidosa eficácia, de eventual controlo político e partidário, de criação de um gosto “mainstream” (olha outro palavrão vindo das estranjas...). entre outras razões porque a actividade mecenática do estado pelo menos para as artes do espectáculo (teatro, música, dança & adjacências) exigiria fundos que a riqueza do país não tem, além de concentrar os apoios em meia dúzia de cidades grandes onde, provavelmente o público poderia pagar do seu bolso a “cultura” que lhe é proposta. 

Depois, por uma razão simples mas óbvia: a afirmação da qualidade de uma estrutura não é garantida à partida, demora anos a consolidar, e deixa (ou deveria deixar) muitos cadáveres pelo caminho. 

Por razzoes de profissão e de gosto conheci centenas de criaturas habitadas pela hubris cultural. Todavia, o talento, a qualidade (e o eventual sucesso) são doseados com imensa parcimónia. 

Sem se perceber isto, não vale a pena  sequer ler as notícias dos jornais sobre as acções que um grupo de “criadores” e de “estruturas”  arremessou contra o tímido Ministério da Cultura. Até se fala em “providências cautelares”... 

au bonheur des dames 576

d'oliveira, 08.03.23

E querem vender  livros?...

(e já agora o dia da mulher...)

mcr, 8-3-23

 

Uma instituição da Universidade de Coimbra reeditou um excelente livro que é, também, uma obra de referencia internacionalmente reconhecida. 

(Não vou adiantar o nome da obra porque, egoisticamente, sei que já não deverão sobrar muitos exemplares pelo que, apesar de tudo, vou continuar a tentar encontra-lo)

Fui, pois, via internet ao site da instituição e, como acredito no valor de uma conversa preparatória, tentei telefonar antes. 

Primeiro problema: do lado de lá uma voz avisava que o numero não se encontrava atribuído! 

À cautela, liguei para outra instituição da mesma universidade que me parecia ter contacto com a que não respondia e fui informado que, na realidade , a primeira estava em obras ou num processo semelhante. 

Expliquei que pretendia o livro já citado e perguntei se não estaria em funcionamento a loja física ou em linha a que recorrer.

A pessoa que me atendeu (do Museu da Ciência) esclareceu-me que, de facto, havia algo pomposamente chamado  “Turismo da Universidade” que terá uma loja e provavelmente a meia dúzia de produtos da instituição adormecida. E a senhora com quem falei levou a sua simpatia ao ponto de me indicar o número de telefone fo dito “turismo”. 

É verdade que também me avisou que a instituição turismo tem a magna tarefa de preparar visitas quer de particulares quer de escolas pelo que calculava que eu teria alguma dificuldade em estabelecer contacto. 

Munido do preciso telefone lá comecei a ligar. Apareceu-me uma daquelas gravações que dão música e propõem números para facilitar a vida de quem liga.

Esses números eram apenas três e limita(va)m-se a alternativas que nada tinham a ver como meu problema quer era tão só o de chegar à loja.  

E resumiam-se às marcações de visitas e à desmarcação delas. Mais nada. 

Como também não é fornecido um endereço electrónico útil a pesquiza parou logo ali.

Algumas horas mais tarde, resolvi voltar a contactar os serviços universitários, dessa feita ligando para os contactos gerais. Milagrosamente fui atendido por outra funcionária gentil (como a do Museu da Ciência) que depois de saber do meu problema pediu uns minutos e transferiu-me para a Imprensa da Universidade. Terceira funcionária gentil e amadora de livros que me informou que não era a IP a editora do livro mas iria tentar informar-se junto de qualquer coisa que se chama instituto de ciências da vida. Pelos vistos, e depois de falar com quatro pessoas, conseguiu saber que há uma senhora que só está pelas manhãs e que poderá eventualmente resolver o magno problema do fornecimento do livro se é que este está disponível. 

Demorei nestes preparos umas boas dus ou três horas e conversei com quatro mulheres todas mais gentis e interessadas e perseverantes  umas que as outras! Poderiam ter dito que aquilo não era com elas mas não. Procuraram resolver o problema do leitor de longe que as procurava. 

Hoje é o dia internacional da mulher e nada elhor para provar mil coisas do que estes quatro exemplos de pessoas que levam a sério a sua profissão e mais ainda a sua simpatia-

Não me converteram à causa feminina pela simples razão de que há muito me bato pela igualdade de género e que disso aqui faço profissão de fé. Penas me deram uma vez mais, e são antas já!..., a possibilidade de o poder dizer. 

Lateralmente, hoje, via televisão tive oportunidade de ouvir e ver duas mulheres ambas com especiais responsabilidades políticas (a 1ª Ministra da Finlândia e a Presidente da Geórgia)  e sobretudo defendendo posições de grande justeza. Muitas mais há, sem dúvida, mas estas duas políticas confortam a alma de quem as ouviu e viu. 

O presidente Mao dizia, mesmo sem o acreditar, que as mulheres eram metade do céu. Ao mesmo tempo não lhes conferia especiais tarefas políticas ou outras e tinha um partido que da base ao comité central quase não albergava mulheres. Ainda hoje, basta ver as reportagens da última grande assembleia política chinesa, elas são raras. Todavia, a sua famosa frase (para consumo externo...) é um bom princípio de acção política. 

A todas as minhas leitoras aqui deixo um abraço por este dia e o desejo sincero que em vez de um haja 365 dias da mulher (e do homem, Juntos e solidários!)

 

au bonheur des dames 575

d'oliveira, 07.03.23

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Quanto mais se explica

Mais se complica!

ou 

TAPar a verdade com uma peneira

mcr, 7-3-23

 

O subtítulo deveria ser tapar a burrice e não só a verdade. É que isto da TAP é desde a famosa reversão, a acrisolada defesa da companhia de bandeira, Portugal acima de tudo e outro pechisbeque vagamente esquerdista e totalmente patrioteiro, ultrapassa o entendimento.

Vejamos: países como a Bélgica, a Suíça ou a Itália há muito que desistiram das suas famosas companhia nacionais mesmo se qualquer destes países tivesse seguramente uma quota de mercado aeronáutico superior ao nosso. Mais ricos, mais importantes do ponto de vista financeiro e/ou industrial ou comercial, entenderam que não valia a pena o esforço.

Por cá, num arranco de bom senso, lá se descobriu que as sempre mobilizadas diásporas nacionais, os palop e outros destinos chegavam e sobravam para manter uma companhia. 

É bom lembrar que mesmo no tempo do “Império” o transito Portugal África não cobria o prejuízo, o custo de um estrutura intercontinental que nas colónias derivava para companhias de lá que essas sim, dadas as distancias, as deficientes ligações por estrada e o reduzido movimento de cabotagem ainda poderiam explicar o investimento nelas. 

Com o fim das colónias e o consequente surgimento de companhias próprias em Angola e Moçambique nada melhorou. Os restantes destinos (os da diáspora) sempre foram cobertos por companhias europeias maiores e mais baratas para já não referir o “low cost” que se foi impondo nas últimas décadas.

Todavia, uma ideia provinciana da grandeza pátria, directamente herdada do salazarismo, entusiasmou um par de energúmenos ideológicos que logo, por um milagre das rosas eleitoral, se apanharam no poder, entenderam dedicar-se ao verbo reverter. 

Do que tem sido as reversões há por aí exemplos pungentes mas  a história a TAP bate tudo. 

E dez anos depois da heroica façanha nacionalizadora, eis que a brutalidade dos factos, o tsunami da realidade, o peso dos milhares de milhões desperdiçados, reergue a bandeirinha da privatização. Se esta vai ser a 51% a 70%   ou total os cavalheiros que se arrogam de ser os nossos dirigentes nada dizem. Provavelmente, porque nada tem ou podem dizer, muito menos ter a humildade de pedir desculpas a um eleitorado que, pelos vistos em poucos meses se tem dissipado  pelo menos nas sondagens.

No meio disto tudo, o drama de faca e alguidar da senhora Reis, o meio milho de euros pagos à socapa nem sequer é importante. Será revelador, isso sim. Revela, para j,á que no circuito ultra fechado, no bunker governamental   (aparent rari nantes in gurgite vasto...) onde a falta de talentos parece também ela sofrer os efeitos da rarefacção , os sinais da mediocridade e do aparelhismo se reforçam.

No caso desta quase governante a coisa foi ainda caricata porque, uma vez defenestrada da TAP logo poisou na NAV e aí sem aquecer o lugar foi propulsada para o Ministério das Finanças. Tudo em poucos meses! É razão para perguntar onde estaria esse formidável talento, essa especial qualidade para estar sempre no pico das mais diversas ondas, sempre a surfar de sucesso em sucesso.

Agora, a Inspecção Geral das Finanças vem dizer que aquele pagamento foi ilegal, coisa que uma gigantesca maioria de portugueses já sabia ou suspeitava. 

Por isso, o Governo fez rolar cabeças. Duas para ser mais concreto. É caso para dizer que os restantes membros da direcção da TAP ou não riscam nada, ou de nada sabiam. Que raio de casa onde a mão esquerda ignora o que a direita faz. Pior: o ex-secretário de Estado que deu o seu aval ao pagamento não terá dito nada ao Ministro!!! Alguém acredita neste conto de fadas?

À cautela, o dito Ministro entendeu demitir-se, coisa que causou sensação e rendeu um par exíguo de louvores. Que sentido de Estado! 

Alguns portugueses menos entusiastas, e muito menos ingénuo,s apostam na hipótese do Ministro se ter demitido antes que o céu lhe caísse em cima se é que me permitem citar Asterix.

Alguém ouviu falar no sr edro Nuno, o terror das perninhas dos banqueiros alemães? Sequer no seu Secretário de Estado que deu autorização pelo menos tácita para o pagamento? 

Seá que alguém acredita que a srª CEO da TAP despedida “com justa causa” não se irá defender com esta autorização governamental? 

Esta história ainda tem muito caminho pela frente. Aos milhões evaporados juntar-se-ão mais alguns na indemnização. 

O director financeiro da TAP continua de pedra e cal coisa deveras surpreendente. Então nem ele teria obrigação de dizer uma palavrinha ao Ministério das Finanças? 

Quando esta “reversão” ardentemente aplaudida pela esquerda parlamentar, pelo sr Pedro Nuno e e pelo sr António Pedro Vasconcelos e pelos patriotaços do costume, ocorreu houve quem pasmasse. Fiz parte dessa tropa, entre outras razões porque me fartei de viajar pela TAP até me cansar, Pelo serviço, pela comida, pelos atrasos, pelo preço. Agora, pelo menos, pago menos e tenho melhores horários. E espero com curiosidade e alguma ténue esperança, que a Lufthansa peque naquilo. Pior serviço é impossível pelo que há tudo a ganhar por pouco que seja. E se possível sem o Governo português meter o bedelho na estrutura accionista. Assim não haverá afilhados para empregar. Já estou farto de boys. E de girls!   

 

 

 

 

estes dias que passam 782

d'oliveira, 06.03.23

Afinal em que ficamos?

mcr, 6-3-23

 

Nunca fui um adepto da dr.ª Marta Temido como, de resto, se pode ler em textos do tempo em que a senhora parlapateava sobre a saúde. Tive sempre a ideia de que ela era um exemplo lancinante do famoso princípio de Peter que afiança que pessoas que atingiram o seu máximo brilho em certos lugares quando são promovidas caem desabaladamente escada abaixo. 

Durante muito (demasiado) tempo esta criatura foi a paladina mais intransigente  do SNS.  Claro que um/a ministro/ada Saúde não pode andar por aí a ajudar ao bota abaixo deste serviço que aliás tem óbvios méritos e é, isso sim, uma verdadeira conquista de Abril. Porém, razões de vária ordem, incluindo o seu próprio sucesso, tem corroído o bom nome e, sobretudo, a eficácia, do SNS.

Financiamento e meios humanos tem sido a amazelas mais graves (e com mais e piores consequências) que se apontam. Por outro lado há hábitos daninhos (o entupimento das urgências por motivos pouco importantes) que não ajudam a tornar os hospitais públicos mais expeditos. 

Também é verdade que quem tem pressa e meios recorre cada vez mais ao sector privado. Eu mesmo verifiquei isso e nunca me arrependerei de o ter feito. Não que num hospital público não fosse atendido com competência mas apenas porque a ângústia da espera por vez é, de per si, já um sofrimento. Sofrimento que posso, felizmente, evitar graças à ADSE e à possibilidade de desembolsar o preço que me for exigido. 

No entanto, alguns maus amigos do SNS (amigos de Peniche ou, pior ainda, das Berlengas...) nunca perceberam ou, melhor dizenfo, nunca quiseram, por meras razçoes ideológicas (pobremente ideológicas, saliente-se)  usar de bom senso quanto à apreciação do serviço nacional de saúde. Para esses talibans do estatismo a toda a custa, tudo se resume a duas burrices supinas. Combater o execrando “privado” é um dever revolucionário tanto mais que os seus agentes fazem da saúde um negócio! E, depois, aniquilada essa hidra de Lerna tudo seria maravilhoso e os hospitais sobrecarregados com dois ou três milhões de utentes a mais  fariam o milagre do pão e dos peixes!...

Isto significa não perceber que o desenvolvimento do sector privado, além de criar milhares de empregos libert os hospitais de uma medonha pressão de utentes aflitos, permite-lhes respirar.

Claro que, nunca o confessando, também dizem entre dentes que a saúde privada rouba médicos pagando-lhes mais! Ou seja os profissionais (e aqi estão também todos os restantes corpos da saúde) deveriam continuar a receber um salário miserável ou quase (digamos a caminho do que se paga aos professores...)

A dtªª  Temido alinhou durante bastante tempo por este diapasão com uma culpa acrescentada: ela conhecia por dentro o sistema e tinha à mão todas as estatísticas produzidas pelo MS. 

O Governo que integrou deixou morrer três PPP (Loures, Braga e Vila Franca) mesmo se todos os indicadores de gestão apontavam para um notável  serviço às populações , mais rápido do que o público e mais barato.  Agora, poucos anos depois, começam a surdir cada vez mais fortemente críticas a este divórcio. Ests três hospitais funcionam pior, tem mais atrasos e custam mais dinheiro do que no tempo das PPP. Até o Tribunal de Contas (provavelmente um órgão de bloqueio e da “reacção”) já acentuou isso.

O mais extraordinário foi agora, a dr.ª Temido, vir dizer numa entrevista a televisão, que os hospitais privados esses monstros ávidos do sangue e do dinheiro dos cidadãos indefesos, tiveram uma excelente prestação durante a pandemia e que, inclusive, colaboraram melhor do que certos serviços públicos (presume-se que de saúde!!!)

Quem me lê estará lembrado dos anátemas ao “privado” durante esse mesmo período, com acusações de desinteresse, falta de solidariedade e por aí fora. 

Tal campanha teve pelo menos uma ouvinte silenciosa senão interveniente: a dr.ª Temido que, isso sim, nessa altura, poderia ter deitado alguma água na fervura das críticas exaltadas e...  sem sentido. 

Agora que, dizem os mentideros, se prepara para ser candidata do PS à Câmara de Lisboa (ai o princípio de Peter!....) eis que esta senhora muda ostensivamente de registo e lá vai deixando alguns elogios aos “outros” que em tempos não tão distantes combateu encarniçadamente. 

Eu não vou cair na ingenuidade de afirmar que o sector privado da saúde não prossegue o lucro. Claro que investimentos daquela grandeza tem na mira lucros da mesma ou maior dimensão.  Também é verdade que desde sempre paguei a ADSE que, aliás, me pesa na reforma como me pesou no ordenado. Agora que preciso, lá vou indo a um hospital privado, para a consulta do diabetes, para as injecções nos olhos sabendo que se recorresse ao hospital público pagaria menos. O problema porém não está nisso mas apenas na rapidez com que sou atendido. Até agora nunca me adiaram uma consulta, um exame, uma cirurgia (os olhos de 9 em 9 semanas). Nunca! Ainda por cima não sobrecarrego o serviço público  (e comigo dois ou três milhões de utentes!...) E pago os impostos não direi com alegria mas seguramente com resignação sem enganar o fisco como, sicut Pinho, o dos corninhos, é costume generalizado... 

 

(para a próxima, iremos relembrar as aventuras trapalhonas da TAP  a tal que depois de privatizada foi exaltadamente nacionalizada e irá de novo com quatro mil milhões de euros a arejar, passar a mãos privadas e, espera-se, mais capazes)

 

 

au bonheur des dames 574

d'oliveira, 04.03.23

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Pôr-se a jeito

mcr, 4-3-23

 

 

O sr. D José Ornelas  (isto de dom a bispos é que me cheira a velho e relho bem mais do que muitas outras coisas com que se sobrecarrega a Igreja Católica) provou urbe et orbe que lhe falta jeito para ser porta voz. E conhecimentos jurídicos mas disso  há desculpa. 

Eu não sei porque não li o relatório da comissão indagante dos abusos, se a lista fornecida às autoridades eclesiásticas apenas tem nomes sem provas dignas de ser investigadas ou se, pelo contrário, aquilo é um camião de acusações fundadas, testemunhadas, comprovadas . 

Do que fui sabendo já verifiquei que de um determinado pacote de processos enviados à Procuradoria Geral esta já descartou uma quantidade substancial. Falta de provas, prescrição, morte dos acusados sei lá que mais.

Aceito, dada a minha maldita formação  jurídica todos esses argumentos da PGR mas faço notar que no reino de Deus a ideia de prescrição para acções nefandas  é de proscrever. Ou seja, o abuso de menores por padres, freiras, professores de religião e moral & assimilados há de ser analisado com rigor. Com o rigor que o pecado merece, que o não arrependimento exige, seja qual for a posição tíbia, cobarde, cúmplice, sacrílega (é só escolher o adjecto) doe eminentíssimos bispos com dom ou sem ele. 

Nem sequer falo pelo país, menos ainda pela Igreja (a que não pertenço) mas tão só em nome de uma ideia de decência, de civilização e lembrado de milhões de pessoas que acorrem às Igrejas, a Fátima, à extrema unção ou ao baptizado. O catolicismo é um elemento estruturante, indissociável da ideia de Portugal e até por isso merece ser respeitado.

Esta padralhada dissoluta é tudo o que é repugnante na sargeta por onde correm certas práticas indignas contra criaturas absolutamente indefesas. 

Todavia, a ideia de que a simples menção de um nome sem mais possa ter sido transmitida não me diz nada de bom. É evidente que não exijo provas esmagadoras, arrasadoras, definitivas mas pelo menos, e por muito que isso custe, há que arranjar testemunhas, vítimas que estejam dispostas (com todas as salvaguardas possíveis, que as há  e se não houver arranjam-se) a repetir nos tribunais eclesiásticos e nos criminais o que terão testemunhado ou declarado. 

Portanto, e primeiro ponto:  o clamor dos comentadores mais ferozes terá de ser acompanhado pela verdade dos factos. Só assim poderemos ir atrás dos padres pecadores, dos bispos cúmplices e da grande massa de crentes que sabendo ou desconfiando só agora escreve inflamadas cartas à hierarquia religiosa. 

Depois, este combate terá de ser travado nos seusestreitos e especiais limites. Para já trata-se de eliminar a gangrena, a ferida purulenta. Depois, caso as boas consciências o entendam necessário. É que vem a hora de ir aos dogmas, ao celibato, à posição da mulher e a tudo o resto.

Misturar combates nunca foi boa tactica militar e seguramente também não me parece ser útil no capítulo religioso. Claro que digo isto  como agnóstico mas sempre recordando que uma das bases em que assenta a visão do mundo tem muito, quase tudo, a ver com a fé dos meus pais, dos meus familiares, dos meus amigos e da esmagadora maioria dos meus concidadãos.

Ora tudo isto poderia ter sido dito  pelos bispos ou apenas pela referido bispo d. Ornelas.  O modo intelectualmente gaguejante com que o fez estragou muito ou quase tudo. E atiçou os críticos menos interessantes mas mais “interessados”.

De todo o modo, o que, enquanto cidadão deste país especialmente me interessa é a tramitação dos processos crime, das investigações judiciais. Este crime interessa tanto a Deus (ou aos seus representantes) como a César.

Conviria, mais tarde, mas sempre, continuar esta tarefa indo também investigar outras confissões e outras instituições onde é voz corrente terem existido crimes semelhantes. Barrela geral e forte, uma vez por todas!

Onde houver menores em situações que potencialmente são perigosas convém indagar. E seguramente que haverá surpresas se surpresa for a palavra adequada. 

Obviamente, num país onde um ex dirigente político anda há anos a tentar fugir com o dito cujo à seringa, usando de um modo inacreditável de recurso sobre recurso (e perdendo-os a mais de 90%  das vezes!!!) , onde um outro cavalheiro, em prisão domiciliária gem pela falta de “vinho corrente” confessa (tardiamente, em documento legal) que fugiu a obrigações fiscais porque tal era “pratica corrente e generalizada” no meio em que se movimentava, afirmando que essas aventuras eram conhecidas de “toda a gente” e alegremente praticadas ou desculpadas igualmente por “toda a gente”, julgando que essa confissão (tardia e inútil) poderá esconder com maior eficácia outros pecados maiores e mortais como a corrupção  e fazendo de nós todos, boquiabertos, uma récua de criaturas estúpidas, tudo isto , dizia, deixa muitas e sólidas dúvidas sobre a “justiça de César” vulgo portuguesa...

Andei, por três anos em colégios de padres ou com gestão de padres. Nunca vi, ouvi, sequer suspeitei, de práticas atentatórias contra os alunos mais novos pois eu caí por esses locais já crescidote, rebelde e aconselhado sempre a não renovar a matrícula o que era uma maneira “civilizada” de mandar um filho família procurar local mais adequado para dar asas à sua irrequieta adolescência.

Tenho amigos padres e ou profundamente religiosos. Eles tem mais que fazer do que tentar converter-me ou regressar ao rbanho do Senhor e eu não estou para discutir com eles o sexo dos anjos, a história pregressa da Igreja  ou as caves do Vaticano.

E, mesmo sabendo quão perigoso é dizer que desta água não beberei, com a idade (avançada) que levo não me parece que venha a sofrer o famoso e esquecido drama de João Barois se é que algum leitor ainda frequenta esse enorme escritor que foi Roger Martin du Gard. Este romance e “Os Thibault” são imperdíveis.

(também mencionei um livro de André Gide que igualmente merece uma visita ) 

*na vinheta: não resisto a meter um Siné. Vem dos meus vinte anos  que já não voltam...

 

 

Rádio Renascença a tapar o sol com a peneira

José Carlos Pereira, 03.03.23

O jornalismo isento e rigoroso é indispensável para a saúde de um regime democrático. Mas o jornalismo, dos órgãos públicos e privados, seja ele político, económico, desportivo ou de âmbito social, também deve ser escrutinado.
O que dizer do facto de, hoje, as rádios TSF e Antena 1, pelo menos, estarem em directo da conferência de imprensa da Conferência Episcopal Portuguesa, sobre o candente tema dos abusos sexuais de crianças por membros da Igreja, enquanto a Rádio Renascença, emissora católica, emitia publicidade e a seguir o programa desportivo "Bola Branca"? Omitir a discussão do assunto à espera que os devotos esqueçam?!

au bonheur des dames 573

d'oliveira, 03.03.23

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Outro amigo desaparece

(cada vez mais sobrevivente)

mcr, 3-3-23

mcr, 3-3-23

 

O jornal traz a notícia; morreu o Zé Manel Galvão Teles. Éramos amigos desde há mais de cinquenta anos, mesmo se eu já sabia dele pois ele fazia parte de um pequeno mas decidido e corajoso grupo de advogados (e de políticos) que começou a ser (mais) notado a partir das campanhas de fins dos anos sessenta. 

Em 1974, apareceu-nos por cá, no Porto, e convenceu-nos a embarcar na aventura do MES. 

Ele o seu grupo de amigos (melhor dizendo os “sampaístas”) duraram pouco no MES. Em boa verdade, a saída deles tinha toda razão de ser e, estará aí o início de um processo de abandono do Movimento. Dois meses depois, foi a minha vez de bater com a porta. Em boa verdade só não saí com eles por lealdade com o grupo com que (por influência do Zé Manel) aderira ao MES. Acompanhei a aventura do G I S (Grupo de intervenção Socialista) e durante muitos anos fiz parte do grupo de almoçantes no “Florida” melhor dizendo aparecia certíssimo quando estava em Lisboa, o que ocorria duas a três vezes por mês. Desse grupo já desapareceram vários e bem que me temo que não tenha conhecimento de todas as mortes. Claro que isto é malta que anda toda nos oitenta ou muito perto disso. Assim de repente já cá não andam o César Oliveira, o Luís Nunes de Almeida, o Jorge Sampaio, o João Bénard da Costa e o Nuno Brederode. Todos excelentes amigos, lutadores indómitos e inconformados. É uma geração que desaparece sem demasiado ruído mesmo se quase todos tenham tido uma forte intervenção a partir do anos sessenta. 

Alguns estiveram na origem de um pequeno mas interessante movimento (o MAR, movimento de acção revolucionaria) que entretanto estava demasiado à frente do seu tempo e, por isso, fora a “frente cultural” que muito se estribava na colaboração com “O Tempo e o Modo”, e na defesa e auxilio de presos políticos não deixou um rasto especialmente palpável. O mesmo, aliás, ocorreu com o GIS cujos elementos foram depois integrados no PS.

A última vez que nos encontrámos numa acção política foi por ocasião dos “Estados Gerais” (conselho coordenador) do PS que anunciou o fim do cavaquismo e a entrada (frustrante) de Guterres no Governo. A nossa última campanha terá sido a da eleição de Jorge  Sampaio para a Presidência da República. 

Olhando melancolicamente (mas sem ira) para trás, não me arrependo de nenhuma destas batalhas comuns e esse pequeno mas especial grupo de amigos e companheiros continua a parecer-me que fazia parte do sal da vida. 

O Zé Manel  teve uma vida plena, muito bem sucedida tanto política como profissionalmente. Além de brilhante advogado, era um homem culto, bem humorado  e dele poderia dizer-se que era o “amicus certus in re incerta certitur”. Sai de cena com a elegante discrição que era uma das suas (muitas)  mais evidentes qualidades. 

*na vinheta JMG com César de Oliveira, um amigo desde o nosso  comum ano de caloiros (1960-6) em Coimbra

 

 

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