Leituras de fim de semana
mcr, 119-23
Até há meia dúzia de anos, o fim de semana era recheado de leituras de fim de semana frente ao mar na esplanada do Ferreira.
Era uma festa! À uma, tinha os suplementos literários do Monde, do El País e do ABC. E depois, além dos jornais a que eles correspondiam, eu aviava o Expresso e o Público. DE longe em longe, atrevia-me com um par de revista italianas (“Espresso” e “Panorama”), o “La Republica” e o “Paese Sera” (bons tempos”)
De quando em quando, amigos e conhecidos passavam, alguns sentavam-se numa interrupção amável, alegre e bem disposta das tarefas do leitor empedernido.
Entretanto morreu gente e, igualmente, morreram os jornais espanhóis que já cá não chegam ou, pelo menos, os que aparecem vem viúvos das folhas literárias e culturais. Da italinagem nem novas nem mandados, raios me levem!
O mar ainda lá está mas agora ataca-me a preguiça e refugio-me na esplanada de todos os dias, local amável, aqui ao lado, com um jardim à frente, miudagem a correr de mistura com cães que os donos soltam ali (e entre eles um perdigueiro doido que usa lenço de pescoço vermelho...um “compagno!”
Em boa verdade foi o covid que deu cabo dos meus velhos hábitos de leitura na Foz mas, de facto ainda não me recompus dessa obrigatória privação.
Explicado que está o hábito de fazer uma retrospectiva semanal das notícias da semana, eis que caio num artigo sobre o presidente da Câmara de Oeiras. Pelos vistos, esta câmara funciona com geral agrado dos munícipes que reelegem Isaltino com margens quase norte-coreanas. A coisa desagrada a uma criatura comentadora em jornais e activista do BE. Ela conseguiu numa crónica de meia página informar os paroquianos que Isaltino Morais esteve na cadeia. À cautela informa não uma, não duas mas cinco vezes!
Que eu saiba, uma vez cumprida a pena o ex-preso, está com as contas todas feitas com a sociedade. No caso, Isaltino terá lavado uma soma mexeruca de dinheiro através de um familiar motorista de táxi...
O dinheiro lavado não teria sido fruto de roubo ou malversão mas apenas um dinheirinho que à cautela se escondia do fisco cúpido. Pelo menos, não me lembro de nenhuma especial acusação quanto à sua origem. De todo o modo, e caso raro (ou único), a justiça entendeu que Isaltino era bom para servir de exemplo e, pimba, cadeia com ele.
O homem saiu da prisão e candidatou-se de novo à Câmara. E foi eleito. Ao que sei por maiorias substanciais e substanciosas num eleitorado culto, educado onde perpassam figurões muitos do PS e das restantes forças ditas de esquerda.
A comentadora, mais do que perplexa, fica num furoe patológico. E vá de zurzir na criatura não por qualquer má gestão municipal mas porque sim, pronto!
Eu não conheço o homem, duvido que alguma vez nos cruzemos mas, porque passo algumas curtas temporadas em Oeiras, tenho uma pequena ideia da sua obra. Oiço toda a gente a gabar o trabalho camarário e a rapidez com que são atendidas as reclamações dos munícipes.
Ainda há dois dias, o vi mostrar a uma ministra, ou algo que passa por tal, as obras de um conjunto de casas de renda social em finais de construção. Ora aí está mais uma pequena multidão que seguramente votará nele ou em quem, na impossibilidade de se candidatar, ele recomendará.
As aulas começaram. Há100.000 alunos que ainda não tem todos os professores. Mas, pelos vistos, as autoridades acham que tudo corre maravilhosamente.Tout va bien dans le meilleur des mondes, madame la marquise...
Continua a sentir-se uma forte falta de professores no Algarve e em Lisboa região. Os eventuais docentes desertam tais zonas porque as casas não só rareiam mas são caras para quem tem duas residências. Ainda ninguém se lembrou de estudar a hipótese de criar, mesmo por apenas meia dúzia de anos, subsídios especiais de alojamento.
Notem que o mesmo Estado que se diz disposto alugar casas e a subarrendá-las por um preço inferior não pensou nesta hipótese (ou noutras semelhantes)
Os portugueses certamente lembrar-se-ão que o Governo, este, em oito anos apresentou quatro ou cinco projectos tremendos para resolver a falta de casa. Por favor digam-me quantas casas se construíram. E, já agora, onde.
Em Portugal, números oficiais, a media geral das rendas ainda pelos 400 euros. Metade, mais ou menos, do salário mínimo, o que não augura nada de bom. Mas daí a serem excessivas vai um passo de gigante . O que é infame é a existência e baixos, baixíssimos, salários!
De todo o modo, há uns xicos espertos que pretendem pôr um travão de 2% ao eventual aumento das rendas.(a culpa seria da inflação qie, vê-se, não afecta os ricos e sobretudo os senhorios!).
Há mesmo uns alucinados que, pura e simplesmente, querem que, à boa moda de Salazar, se proíba todo e qualquer aumento de renda. Na sombra é de presumir, que haja quem pretenda nacionalizar, confiscar as habitações, as devolutas e as outras, renovando, em pleno século XXI, a frase de Proudhon: a propriedade é um roubo. Claro que valeria a pena saber o que Proudhon hoje diria dada a realidade pungente que se vive.
Esquecem (ou fingem esquecer) os resultados da política habitacional de vários regimes autoritários cujos resultados (maus ou péssimos) ainda hoje se verificam.
O famoso programa das creches para todas as crianças de três ou menos anos foi anunciado e exaltado. Passado um ano faltam lugares para metade dos candidatos.
Quem é rico, melhor dizendo menos pobre, mete os filhos nas creches privadas e paga do seu bolso.
Vê-se que o “fazedor” faz que se farta...
Aquele pomposo e loquaz ministro da saúde não perde meia hora sequer para pensar. Todos os dias, aparece, sorridente, garantindo que os problemas estão a ser resolvidos. Todos os dias os factos o desmentem. Todos os dias os médicos fogem do SNS. Ou deixam os concursos vagos...
Um grupo privado de saúde anuncia um forte investimento para criar mais dois hospitais privados (um numa média cidade do norte e outro no Algarve) Onde é que eles vão encontrar médicos? Pelos vistos não estão nada preocupados.
E, seguramente, não vão importar profissionais cubanos... como o actual Ministro da Saúde já admitiu mesmo sabendo que o Governo desse admirável país fica com a parte de leão do ordenado pago. Para o governante português, essa questão não se põe pois seria imiscuir-se na vida de um país terceiro!!!
A cimeira de Nova Deli não sabe que há uma guerra em curso na Ucrânia!
O senhor Lula da Silva garante que Putin pode ir ao Brasil sem correr qualquer risco de ser preso.
O Brasil assinou a convenção sobre o TPI. Depois de ser peremptório sobre a eventual não prisão de Putitn, Lula lembrou-se que afinal não é o presidene do Brasil que manda ou não prender mas as instancias jurídicas brasileiras que, em princípio, são independentes.
Todavia, o mesmo Lula agora questiona a permanência do Brasil nessa instância. E louva-se nos exemplos da China e da Rússia (e do EUA, também) que nunca aderiram... É um verdadeiro democrata...
Mas a pérola da semana é, sem qualquer dúvida a descoberta de um cavalheiro filipino, cineasta (ou algo que lá passa por isso) que afirma que Fernão de Magalhães foi morto não por um vago chefe tribal mas pela sua esposa amantíssima, uma “guerreira” na feliz expressão do novel historiador. E vai daí, ele ou alguém miraculosamente inspirado nesta trouvaille historiográfica, terá construído uma imensa estátua porta para a Bienal de S Paulo com a figura, a vera figura, da amazona filipina.
Isto mereceu honras de imprensa que, de facto, farta que está do cão que mordeu o homem, encontrou agora a mulher que mordeu o cão navegador.
Espera-se, a todo o transe, que o Oceano Pacífico mude o nome (criado por Magalhães) para o da heroína ora descoberta. Também serve o de Imelda Marcos, que, em seu tempo, deu que falar nesse arquipélago. E se tal não for considerado temos um socialite (natural do mesmo país) agora espanhola que também pode ser uma honorável candidata.
Nota que nada tem a ver com isto:
João Vasconcelos Costa, melhor dizendo Doutor (e por extenso) JVC, médico, “bon vivant,” cozinheiro exímio, divulgador científico, que exerceu altos cargos no campo da actividade científica, ex-blogger que faz falta, escreveu no dia 6 um artigo no Público que toca algumas das fanfarronadas LGBT que urge ler. Claro, conciso, inteligente, ainda não vi resposta e percebe-se a razão. É irrespondível.
Escrevi um pequeno texto logo que li o artigo mas, insondáveis mistérios da internet!..., perdi-lhe o rasto. Não o vou reescrever mas recomendo a todos e cada um uma olhadela ao Público de 6 deste mês.
JVC faz-me o favor de ser meu amigo desde os tempos de Coimbra. Nos anos difíceis deu o corpo às balas e militou contra o Estado Novo com coragem, determinação e inteligência. Solidário como poucos, devo-lhe o facto de ter arriscado muito ao apresentar-se como testemunha de meu irmão (seu amigo e colega) no Tribunal Plenário.
Nos últimos anos, sempre o covid mas também a preguiça, não temos falado. Agora, que ele intrepidamente está a chegar aos “oitentinhas” com a cabeça sã, a palavra clara e o raciocínio sempre agudo, é bom lembrá-lo e recomendar que o leiam. Há textos dele na internet basta procurar.
Saravah, João. Envelheces com a mesma qualidade de alguns tintos demasiado bons ...e demasiado caros. Um abraço
Nota grata: dois leitores, um dos quais é Luís L V., honram-me com palavras demasiado amáveis que calam bem fundo no escriba. Ambos me avisam contra as gralhas com que pontuo as minhas pobres redacções. Eu bem que gostaria de ter um corrector mas parece que o único que há obedece ao aberrante acordo ortográfico.
Haverá mais algum mais antigo, mais “reaccionário”, menos titubeante com o wokismo ortográfico em uso? Se sim, por favor indiquem-mo. Preciso dele como de pão (com manteiga ou, ainda melhor, com queijo de Serpa mas também serve Gorgonzola (ou Roquefort).
E um copinho de vinho tinto, coisa pouca mas decente. À vossa saúde leitores amigos
(ou como diziam os meus amigos catalães: Salut e forza nel canut! Esta é extensível ao JVC, velho e verdinho...)
Nota final demorei um tempo infernal a corrigir gralhas de todo o tipo. Até me esqueci do chá que ficou frio. Arre!