Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

estes dias que passam 956

mcr, 30.12.24

Populistas de todo o mundo, unam-se!

mcr, 30-12-24

 

Uma criatura, de seu nome Rosalino vai ocupar um lugar mais ou menos governamental, onde auferirá um salário superior ao do 1º Ministro e mesmo ao do Presidente da República.

A coisa anda pelos 15.000euros o que, mesmo num país pobrete mas alegrete como Portugal, nao é uma fortuna. Todavia, o salário mínimo é o que é e e a classe média só mesmo cá é que por tontice ancestral se pode chamar média.  Isso acirrou os ânimos de muita e tonta gente que nem sequer se deu ao trabalho de ir saber a razão dessa fortuna salarial.

Ora, a criatura que irá receber esse cacauzinho já o recebia antes no Banco de Portugal  (onde de resto há outros salários bem maiores... que ninguém pelos vistos contesta). 

Convenhamos que ir ocupar um lugar para ganhar menos só poderia ocorrer por abnegada tolice ou estupidez natural...

Portanto, o homenzinho apenas vai receber um montante igual ao que já auferia. Dito isto, percebe-se mal o "escândalo"  medonho e o uivo insano de umas dúzias de criaturas, quase todas políticas, que pelos vistos entenderam horrorizar-se e protestar.

Uma senhora jornalista entendeu mesmo escrever que "Rosalino cortou-nos o pão e come brioches no Governo". A frase inspira-se num duvidoso dito da decapitada rainha Maria Antonieta que ao ouvir falar na fome popular e na falta de pão teria proposto que a populaça insurrecta passasse ao regime mais requintado do brioche.  Não terá sido por esta parva frase que a austríaca foi parar à guilhotina mas , na época, deu jeito recordá-la. 

Em 2024,  a jornalista   assaca a Rosalino boa parte das culpas do desastre da política de Passos Coelho, como se esta tivesse nascido do nada e não fosse toda provocada pelo governo anterior de um certo Sócrates que não só não bebeu a cicuta mas nos deu a tofos a provár.

Fala-se muito da troika e pouco ou nada de quem provocou a sua vinda.  Rosalino rerá proposto um par de medidas que o Tribunal Constitucional chumbou  (e bem!) mas isso não o impediu de estar há largos anos no BP (onde também está o "genial" Centeno e outros cavalheiros de igual calibre que sempre souberam como passar por entre as gotas da chuva  para chegar ao fim do arco-íris)

A questão aqui não devia ser a do salário mas apenas esta:  será Rosalino competente? Poderá, de facto, criar economias à governação? 

a lamúria sobre o salário é apenas um aspecto do actual woquismo populista que afecta a opinião pública portuguesa e  do provincianismo alarve com que se brandem as quinze milhardas (que depois dos impostos se reduzirão a metade). A jornalista (misericordiosamente oculto-lhe o nome) e os protestatários tem a indignação fácil e esquecem despudoradamente a quantidade de boys and girls que os sucessivos Governos empregaram sem que dái resultasse qualquer utilidade para o Estado, o País e o Povo em geral. 

 

(nota necessária: durante o consulado de Passos Coelho, escrevi aqui violentas críticas, algumas provavelmente injustas contra o homem.  Não conheço nem espero vir a conhecer o sr Rosalino. Acho que a classe  política em Portugal é pessimamente paga o que tem como efeito esta horda de pobres diabos que inçam o parlamento,  o Governo e a alta administração pública. Com ovos destes nunca se fizeram omeletas boas, sequer razoáveis. O mesmo se diga de muito do jornalismo de opinião que raras vezes sai da mediocridade. 

E não se vê que o novo ano que aí vem modifique este triste panorama. O sr Ventura tem discípulos/as em toda a parte. Mesmo entre  quem diz combatê-lo)  

De  todo o modo, cerrando punhose desafiando o destino eis-me a desejar a quem me atura a bílis, um bom, um óptimo ano de 2025- Com dizia o naufrago do Miserer de Rouault, "Demain il fera beau"

Assim seja!

   

estes dias que passam 955

mcr, 27.12.24

thumbnail_IMG_1635.jpg

Moçambique à deriva 

mcr, 27-12-24

 

"a gente gosta de viver!

(mulher moçambicana na ressaca de mais um desastre)

 

Vivi em Moçambique do 3º ao 5º ano de liceu. Depois só lá voltei em férias (para os estudantes do "ultramar - já não havia colónias!-  em férias havia um despacho a adiar os exames de Outubro para Janeiro)

Foram três anos suplementares de férias  longas e, sobretudo, de percepção do que era o colonialismo e dos meios usados para tentar manter uma soberania com tardias medidas : mais escola, mais protecção (?) social, menos abusos . Vi Nampula ter um presidente de Câmara negro (Pedro Baessa, se bem recordo) e vi pela primeira e incrédula vez dezenas e logo depois de estudantes já no secundário. 

 Todavia já tudo era em vão, não pela força da guerrilha mas, sobretudo, pela lassidão dos militares e de uma parte dos  "colonos".

 Os "ventos da História," desencadedos pelas sucessivas descolonizações de territórios africanos (do Ghana ao Congo, da Nigéria ao Quénia e  Tanzânia...)  ditavam um futuro atribulado para o Portugal do Minho aTimor.

Em 1965 deixei de ir de férias. Sete anos depois, desencorajados, os meus pais regressaram. Amigos militares preveniram que "aquilo já duraria pouco, meia dúzia de anos talvez" O 25 de Abril apressou as coisas.

E Moçambique tornou-se independente ao mesmo tempo que um governo inepto, autocrático e tonto conseguia perder todos os técnicos portugueses que la tinha (os leitores interessado poderão ler as memórias de Eugénio Lisboa ("Acta est fabula")  ou, em mais triste, Luís Carlos Patrqaquim ("A cainção de Zefanias Sforza). Uma guerra civil e um governo totalmente incompetente mas radical fizeram o resto. Da já longa lista de presidentes da república salva-se Joaquim Chissano, uma excepção, quase a ´única em toda a África sub-sahariana. 

Em boa verdade, também a mãe natureza foi madrasta um par de vezes, mas o grande desastre pode atribuir-se à péssima governação, à guerra civil e ao generalizado uso e abuso do poder por parte da FRELIMO, que nem sequer sabe defender condignamente o país, basta pensar em Cabo Delgado  que só ainda está sob o vago controlo moçambicano graças a exércitos estrangeiros.

Desta feita, e à vista de todos, houve mais uma "chapelada" eleitoral  qe anteontem foi confirmada por um "Conselho  Constitucional"  em que ninguém acredita. Nas ruas das cidades os adeptos do candidato Mondlane manifestam-se há vários dias e já contabilizam mais de 250 mortos.

Cereja amarga no bolo: ontem 1500 presos numa cadeia de alta segurança evadiram-se. A dita cadeia teria mais de 3000 prisioneiros  em condições de tal modo infames que a revolta era de prever.  Em Maputo, já faltam abastecimentos porque as lojas ou foram assaltadas ou fechara m para não ser saqueadas.

No Norte, mais um ciclone deixou um rasto de vítimas e milhares de casas destruídas. A fome, a miséria e as doenças ameaçam e o futuro, nestes próximos meses, ou anos, é incerto, melhor dizendo, catastrófico.  O povo habituado a desgraças tenta sobreviver porque, a exemplo de uma mulher acima citada, diz"a gente gosta de viver!. "

Aquilo ainda não é a Somália, a Eritreia ou o Sudão mas vai a caminho. E com crescente velocidade...

*na vinheta parte dos meus livros sobre Moçambique

 

 

 

estes dias que passam 954

mcr, 26.12.24

images.jpeg

 

Natal Nostalgia

mcr, 26-12-24

Naquele tempo, oh há quanto tempo!..., o Natal era (como a escola...) franco e risonho

O avô Alcini com um avental sobre o colete e a gravata) preparava com mestria e agilidade as rabanadas. usando para o efeito  um "porto" velho e de grande qualidade  da sua lavra (melhor do seu armazém de exportador ). A avó Beatriz e a minha mãe coadjuvavam-no e punha, as criadas em trabalhos. Os dois meninos, eu e o meu irmão, iam para o quintal munidos de martelos para partir as nozes, comer os bocadinhos pequenos, roubar um outro maior, aplicados na taref e sonhando com a manhã do dia seguinte (o dia 25) para descobrir os pequenos tesouros no sapatinho. Madrugada alta  já estávamos acordados esperando que algum adulto se fizesse ouvir para numa correria irmos até à árvore de natal ver o que o menino Jesus bos enviara.

Curiosamente, só me lembro de uma prenda por volta dos meus 8 ou 9 anos: era um livro de Júlio Verne, "Da terra à lua". quando ao fim da tarde fui pedir mais outro aos grandes, ninguém acreditava que eu já  lera. Tive de recitar toda a primeira página para se verificar que não só lera mas que, no entusiasmo, decorara pelo menos a primeira página (ainda, tantos anos depois) consigo recordar algumas frases...) 

No ano seguinte, o Avô trouxe, entre outros coisas, uma antologia  de textos portugueses se Mendes dos Remédios onde, suponho vinha "A morte do lobo" de Camilo Castelo Branco. Terá começado aí a minha sina de leitor empedernido. 

Anos mais tarde, fui assistindo à alegria da Maria Manuel, do Quim, depois dos sobrinhos e agora dos sobrinhos netos e do neto ("o melhor do mundo são as crianças" dizia Pessoa de quem pelos meus 17 ou 18 anos recebi o primeiro livro. A infecção benigna pessoana nunca mais me abandonou, Deus seja louvado -se é que um agnóstico o pode sizer...-

Mas o Natal é também uma mesa repleta de ausências, avós, pai, tios, ainda há dias foi a tia Néné com 97 anos bem medidos e que, tmbém ela, é responsável pelos descaminhos deste leitor (im)penitente pois com os mesmos nove anos me levou à Biblioteca Pública Municipal  Fernandes Tomás e me entregou aos cuidados do senhor Santos que generosamente me deixava andar pelo labirinto das estantes à pesca se algum Salgari, dos Tarzan de Edgar Ric  Burroughs (saudosa Editora Terramarear, de que ainda procuro uma boa meia dúzia de volumes que provavelmente nunca lerei) dos Ponson du Terrail   e Paul Féval (viva Lagardére!) .

O Natal para este velho paroquiano é uma saudade pungente mesmo diante dos gritos de entusiasmo da pequenada.

Junte-se-lhe um raio de emissora que entendeu durante três ou cinco dias só passar musica natalícia, coisa que põe qualquer um a opodiar as m

úsicas de Natal pois há nesse conjunto para ládo Stille Nacht,   do Jingle bells, do O Tannenbaun ou do White Christmas, centena d bombalhices natalícias que os esforçados locutores dessa emisspra atiram contra os ouvintes. Um desastre que faz lembrar os antigos merceeiros que, no primeiro dia de trabalho enfartavam os jovens marçanos de doçaria para eles enjoarem definitivamente qualquer caramelo. 

Este ano corri toda a gente a livros. Durante uma boa década pedi que não se preocupassem com a minha velha carcaça e, caso insistissem em me presentear que me bartava um cheque da fnac de 15 euros para livros. Nada feito. 

"ai ele é isso? pois vão levar livros achem ou não que é presente   personalizado..."

Até  o Nuno Maria (para além de brinquedos) levou com um voluminho delicioso dos Peanuts  (e o raio do  petiz ficou entusiasmado!...)

Ontem pelas cinco da tarde, fechei o Natal, dormi uma soneca, jantei uma soptinh e ma rabanada  e levei parte do serão diante da televisão a ouvir boa música no "internezzo". Oh que stillle Nacht, heilige Nacht...

E perdoei ao camafeu que nos meus viçosos 16 aninhos me ensinou um vago alemão e me fez conhecer esta melodia e a sua história

Para ucranianos ou para sudaneses (de que ninguém se lembra) não vale a pena desejar-lhes um feliz e santo Natal.

Mesmo sem bombas, hão de ter frio e no caso dos segundos fome e medo. que algum Deus seja ele qual for lhes ponha a mão por cima

*na vinheta : Sudão, um país paup´érrimo, uma guerra civl icriminosa, um povo em fuga

 

 

 

estes dias que passam 953

mcr, 24.12.24

Foi mesmo há 50 anos? 

mcr, 18-12-24

 

 

Os números do relatório da OCDE sobre literacia e numeracia (rio de neologismo!...) em Portugal deixam-nos entre os piores da OCFE e revelam que 40% (número arredondado por defeito)  dos cidadãos tem forte dificuldade em ler e fazer contas simple. Digamos, para ser generosos, que lá conseguem aviar um texto curto e feito de frases curtas. no capítulo da "numeracia" limitam-se a contas muito simples  e mesmo assim...

Estamos na cauda dos países estudados só à frente de Chile o que não é nada lisonjeiro. 

Este relatório teve como alvo a população entre os 16 e os 65 anos. 

Deixemos para já os mais novos e lembremos que a "educação" foi desde os primeiros anos da revolução o ai Jesus dos políticos e já nos anos 90 Guterres elevava a fasquia do amor fatal pela educação a níveis ultrassónicos (ouvi com estas que a terra há de comer  a temível declaração de amor que, aliás, se seguia a outras anteriores saídas das boquinhas mimosas de diferentes responsáveis políticos de todas as cores e feitios. 

Pelos vistos o resultado é o que por ora se vê.  

Ao fim de 50 anos de Abril só estamos à frente do Chile. Isto é um naufrágio pior do que o Titanic que, pelo menos, encontrou um iceberg fugido ass frios polares. Nós nem isso. O desastre é só nosso, muito nosso, tagicamente nosso e n\ao vale a pena vir galar da "longa noite fascista" como desculpa esfarrapada.

A "geração mais preparada de sempre" na sua vertente  licenciada, mestrada e doutorada mostra menores capacidades que a rapaziada finlandesa que termina o ensino secundário!!!

Anda por aqui muita culpa do eduquês, do novo ensino universitário que à boleia de uma coisa cozinhada em Bolonha facilitou até ao gargalo o ensino universitário.

Má universidade significa maus professores no básico e no secundário, quiçá até no primário.

ao longo da minha vida profissional deparei-me com licenciados que não conseguiam escrever um português decente e compreensível- chefieu, uma vez, uma divisão de técnicos superiores onde licenciadas em História e em Germânicas se mostravam incapazes de em duas folhas breves escreverem um "parecer" compreensível e eficaz. Todavia eram a excepção e não a regra e tinham fugido do ensino para outra função (pública, aliás) que necessitava de alguma preparação cultural, de alguma curiosidade intelectual e sobretudo de um método de trabalho que elas não tinham, Nem estavam interessadas em ter... Isto de ser funcionário público dá para tudo e sobretudo é seguro. É preciso ser medonhamente p´éssimo para ser corrido de uma carreira e de uma fumnção que se protege a si própria.

O jornal que compro e leio diariamente dá abrigo a um par de criaturas que se afirmam doutoradas e escrevem sobre variados temas. Ao lê-las fica-se com a penosa sensação que além de sofrerem de estrabismo cultural, ético e político, devem ter uma noção da língua pátria grotesca e desastrada. 

Outras há que, sabndo alinhar três frases se esquecem que escrevem num jornal que é para todos os públicos. trpeçam nos conceitos,são mai chatos do que a potassa e sobretudo produzem artigos maçudos, e herméticos. Em estilo, numa escala de 10 a 20 ficam-se por um sete, vá ´lá um oito, com boa vontade natalícia algum nove.Digamos que se eventualmente conseguem escapar à mediocridade, se ficam, impantes e orgulhosos, num sofrível mesquinho.

Resumindo, como ocorre nas edições jornalísticas de fim de ano: situação desesperada mas não grave. AEuropa cida de nós, perdoa as burrices, aconchega os dislates e trata-nos como aborígenes de um sul com sol e sal. 

E acolhe os nossos emigrantes sejam eles artesãos capazes ou licenciados em qualquer coisa que não caia na vulgata "estudos humanísticos".

A Europa acolhe médicos enfermeiros eletricistas engenheiros, marceneiros, paga-lhes bem mas evita os restantes.

Os meus amigos livreiros já desistiram de vender livros em qualquer língua que saia do português e do inglês (técnico...). A sorte é ,imja que, no caso dos alfarrabistas vou apanhando abaixo quase de borla espanhóis, franceses e italianos. Ainda há pouco consegui  mais  uma boa edição de "Tutte le poesie" do Salvatore Quasimodo  por dez euros. Está guardada para oferecer a quem merecer e saiba italiano...

   E, cerja mo bolo, ia-me esquecendo, as notas de matemática dos jovens estudantes do secundário comtinuam igualmente más ou seja pioraram nos últimos tempos.

Por outras palavras, a paixão (exacerbada, fatal, ) pela educação de que os nossos primeiros ministros com Guterres à frente, manifestaram num arrebato lírico mas pelintra, não foram correspondidas.A única boa notícia é que os amantes preteridos não se suicidaram. Provavelmente por falta de leitura dos ultra-românticos portugueses do século XIX.

Bom Natal, caros leitores. Dêem-lhe no bacalhau mas rabanadas e no bom queijo da Serra. E acompanhem este último deum bom vinho do douro, da Bairrada, do Dão ou do Alentejo, tanto faz. E que seja tinto, claro. 

 

o leitor (im)penitente 275

mcr, 20.12.24

thumbnail_IMG_1633.jpg

"Tomemos, cá, do O'Neil..."

mcr, 19-12-24

 

 

Hoje. 19 de Dezembro. Alexandre O'Neil faria 100 anos. Para celebra a data e o enorme poeta que me acompanha desde o ínicio dos anos sessenta deixo aqui um poema menos conhecido que muito me diz pois é dedicado a Manuel Bandeira, prodigioso poeta brasileiro  que, com João Cabral de Melo Neto (outro gande) é muito cá de casa e também da de O'Neil.

Também descobri estes dois ao mesmo tempo de A O N. Acho que tenho todos os poemas e livros de qualquer dos três e a eles recorro comovido mas feliz sempre  que posso. 

No ultimo Jornal de Letras  (14 a 24 de Dezembro, nº 1414) podem ler-se com farto e gozoso proveito duas entrevistas ao poeta assinadas por outros dois amigos meus (Fernando Assis Pacheco e António Mega Ferreira que também já não andam por aí). Todavia, leitores, nesta época em que gastamos dinheiro à fartazana ofereçam-se a vós mesmos um presente: As "poesias completas" que já vão na 3`ou 4`edição  (!!!) valem o seu peso em ouro ou em prazer, a escolha é vossa

 

 

Alô, Vovô!

A Manuel Bandeira, nos seus 80 anos.

 

 

Esperei vê-lo por aqui um dia, seu dentuças,

travar-lhe do braço e contar-lhe como o Maximiliano do México foi parar ao Rossio

(toda a gente julga que é Pedro IV o pedestalizado),

apontar-lhe o frustrâneo cotovelo lusitano

no mármore dos cafés,

comer com Você joaquinzinhos inteirinhos e duma só vez,

fazer boca ou boqueirão com o vinho (que era) de tostão,

mostrar-lhe como eu e o Cinatti caprichamos nas saladas

(aqui não põem coentro na salada, calcule Você!),

saladas de alface, agrião,

coentro,

rabanete, tomate,

mais coentro,

mas «cebola, não!»…

Ch’bola, non!

… que não sai nem com o desodorizante que chamam de halazon.

Um pulo à casa onde nasceu Pessoa, sim?

(Nós não somos pessoas assim à toa, não!)

E em minha casa, à Rua da Saudade, a cavaleiro do rio,

Você podia fumar escondido dos adultos

como na outra Saudade do seu Recife de menino.

Depois: broto ou brisa

com Anarina, mas sem Adalgisa…

Atenção, Poeta: re-cepção!

Iríamos deixá-lo à porta da recepção,

da sessão de autógrafos,

de antropógrafos,

às mãos dos vestibulantes tão (p)restantes.

À saída lá estaríamos pra levá-lo ao hotel

e, esquecida a poesia, a literatura,

num repente de ternura pegar-lhe na mão:

– Sua bênção, Vovô Manuel !

Remessa

Drinka, trinca

connosco, Manuel,

sem autógrafo nem cóquetel,

que nós não podemos ter os teus oitenta,

nem com uísque, nem com água de Juventa,

Manuel!

 

*na gravura um livro de ONeil publicado pela Einaudi em 1966, com tradução de Joyce Lussu, uma intelectual italiana de grande prestígio e resistente contra o fascismo. O nome Lussu vem do marido, Emílio, também ele conhecido na esquerda europeia e italiana e autor de vários importantes ensaios entre eles "A teoria da insurreição". Ambos foram resistentes e "partigiani".  Emílio foi (depois do Partido da Acção sarda. um dos fundadores do PSIUP, senador membro da Assembleia constituinte italiana. Há mesmo um museu Joyc e Emilio Lussu que guarda um enorme espólio de obras de ambos. Durante um pequeno período Emílio e Joyce estiveram em Portugal mas ele cedo partiu para Inglaterra tendo depois entrado clandestinamente em França (ocupada) para com outros membros da Esquerda Itliana constituir um dos primeiros núcleos políticos contra o regime de Mussolini. Durante a estadia em Portugal Joyce conheceu os poemas de O Neil e preparou esta edição de "Portotogallo mio rimorso"  que comprei por duas vezes pois ofereci o primeiro exemplar a uma amiga italiana e andei mais de trinta anos atrás de um novo que já consegui na rede alfarrabista italiana, sinal que mesmo aí o poeta foi lido, apreciado e guardado.

** O título do folhetim recorda uma excelente antologia   ("Tomai lá do O'Neil", ´círculo de leitores,  1986) organizada por António Tabucchi com fotografias de  Alexandre Delgado O'Neil, 1º filho, já falecido, do poeta

 

estes dias que passam 952

mcr, 14.12.24

Nôtre Dame, fénix para o século XXI 

mcr 13-12-2024

 

Há cinco anos quem viu o incêndio da catedral nunca pensou voltar a vê-la tal como ao longo de dez séculos ela sefoi fazendo, lentamente, com altos e baixos no meio de uma cidade abençoada que existe ou vê gente há (eventualmente) um largo par de milénios (há anos descobriu-se uma piroga que teria((?)) 6000 anos!).

Mesmo os alucinados optimistas de cujo club devo ser sócio fundador nunca esperaram voltar a ver ND em tão curto espaço de tempo.

Porém, uma vez sem exemplo, o milagre cumpriu-se. A catedral está de pé, mais bonita e mais segura (espera-se)  permitindo-nos vê-la à luz do que seria quando os seus construtores a fizeram. com as cors, a pedra lavada, os vitrais a reluzir de novos.

Eu faço parte dos happy few que começaram a conhecer ND bem antes de a poderem ver, sequer avistar do parvis em que hoje ela se mostra (e esta vista é de certo modo recente pois  como se sabe a igreja medieval estava rodeada de casario que só os grandes trabalhos de renovação de Paris permitiram destruir. 

Teremos perdido um Paris medieval e pitoresco msas ganhámos uma cidade luz e isso, é bom que o reconheçamo, deve-se ao pouco entusiasmante Napoleão IIi e ao barão Haussman  que destruiu o casario à volta e em frente da igreja.

Aliás, muito do que hoje se vê é resultado de restauros  porquanto a catedral foi vítima de revoluções e tentativas de destruição desde a grande revolução até à comuna. Em boa verdade, suceeram-se os milagres pois por vontade de um par de enloyquecidos revolucionários a catedral poderia ter tido o destino das Tulherias

Qundo, em pleno rescaldo, o presidente Macron anunciou um ambicioo plano de restauto com um prazo de cinco anos quase ninguém acreditou que isso seria possível. 

Todavia, dois mil artesãos e artistas (incluindo arquitectos, historiadores  para além dos reconstrutores pedreiros, ferreiros, electicistas, carpinteiros, pintores e estucadores restauradores de toda a ordem) mostraram que se há país onde subsistam de forma exaltante as melhores tradições da compaognonage e saber fazer bem esse país é a França. 

Segui, comovido, interessado e exaltado todas as reportagens feitas pelas televisões francesas nos últimos tempos  e vi como homens e mulheres de toda a França se atiraram com entusiasmo e competência à gigantesca tarefa  proclamada por Macron. 

O resultado é absolutamente extraordinário  e espero que seja brevemente publicitado em catálogo ou por outro meio eficaz. Ver um especialista (coadjuvado, é certo, por  outros) restaurar os 8.000 tubos do órgão  ou ouvir os sinos recuperados é algo de extraordinário, emocionante. O mesmo se diga dos lenhadores e dos carpinteiros que renovaram a "floresta" interior dos telhados ou os restauradores dos vitrais e das pinturas. 

De certo modo, estes homens e mulheres redouraram o brasão do made in France.  

E tenho por mim que esta aventura colectiva , nesta especial altura política e social da França poderá ter efeitos benéficos no modo como os franceses encaram o momento político. sobretudo se nos lembrarmos do modo bizarro como o último Governo caiu graças a uma indisfarçavel aliança política entre as extremas Direita e Esquerda. Por muito que se abomine o  governo centrista de Macron, a imprudente convocatória de eleições legislativas  cuja origem, motivação e espectativas são absolutamente compreensíveis para qualquer analista político e até para qualquer contumaz jogador de casino...) este resultado esta conivência contra cnatura so podia dar resultados suicidários mesmo para os democráticos. A escolha do par Le Pen Melenchon é apesar de tudo ainda mais horrenda do que o voto em Macron  mesmo sabendo que este acaba por ser o homem que jogou a desesperada e inútil cartada de eleições parlamentares antecipadas.

Se afinal tudo isto apenas serviu para abrir caminho a um François Bayrou, político de segunda seja por que angulo for, então teremos (ou os franceses terão) de pedir muito a Notre Dame para sair do fosso onde caíram ou se meteram. 

E para tal não bastam 2000, 20.000 ou 2 milhões de grandes artesãos e patriotas.

Apetece lembrar Sade e o seu famoso título français encore um effort si vous voulez être républicains 

 

   

estes dias que passam 951

mcr, 08.12.24

images.jpeg

Na 2ª metade  do sec. XX, um Homem: Mário Soares

mcr, 8-12-24

 

Se a 1ª metade do sec. XX português foi marcada, e de que maneira!, por um cavalheiro rural da cabeça aos pés, conservador,  misógino, estudioso, avesso a banhos de multidão , herdeiro de uma desconfiança genuína e ancestral à Democracia e à vida partidária, eis que na viragem dos anos 50 surge o seu contrário, igualmente incansável, bonacheirão,, alegre, laico , apaixonado pela liberdade e disposto a combater por ela fosse em que circunstância fosse. Igualmente devorado pela paixão política, enfrentando a asversidade com uma crença absoluta no Homem e no futuro, Mário soares foi. digam o que quiserem dizer, o anti-Salazar por excelência, o eterno e corajoso adversário criador da única e verdadeira alternativa política, social e cultural ao Estafo Novo .

Hoje, cem anos após o seu nascimento, podemos celebrar uma primeira vitória: o regime democrático já ultrapassou em duração os temíveis 48 anos do anterior regime liberticida. 

Para mim, também a liberdade já faz parte da minha vida mesmo se durante, trinta e três anos  tenha vivido sob um regime contra o qual comecei a lutar em 1958.

Curiosamente, só comecei a apreciar devidamente Mário Soares nas vésperas da sua esforçada campanha presidencial. 

Antes, sobretudo nos finais dos anos sessenta, mais exactamente depois da crise académica de Coimbra, fiz parte de uma geração que, exaltada pelo Mai 68, pela luta vitoriosa de 69, desconfiava de Soares, da ASP, da CEUD (que se opunha à CDE que federava a Esquerda democrática e o PC).

Justamente, por essa época, Soares recem regressado do desterro em S Tomé, resolveu ir a Coimbre, conversar co alguns dos estudantes que tinham sido dirigentes da crise. 

Tal encontro (a que não terão sido convidados os estudantes tidos por próximos do PC) foi organizado por Luís Filipe Madeira nas instalações da República dosKagados que, se bem recordo, era a mais antiga de Coimbra. 

Devo dizer, com a enfraquecida memória de mais de 50 anos, que entre nós (uma boa dúzia de convidados, não reinava exactmente especial entusiasmo por Soares. em boa verdade, reconhecíamos-lhe a coragem, a persistência  a pulsão democrática mas os fumos de Maio daziam-no parecer "apenas" um herdeiro moderno do "Reviralho" eventual chefe de uma (ainda) futura organização social democrática que considerávamos pouco ou nada revolucionária. 

Logo que nos juntámos na citada república travei conversa com um dos companheiro

 de Soares, Joaquim Catanho de Meneses, um advogado de que vagamente ouvira falar por se dedicar a defender presos políticos. Este ponto foi o bastante para conversarmos durante uma boa vintena de minutos sendo que fui eu uem fez as despesas da conversa expondo-lhe o que na época pensava da nossa aventura da crise.

Isso terá bastado para, depois de apresentado a Soares este me tenha dito que "gostaria muito" que eu ficasse a seu lado. Na altura a coisa não me envaideceu bem pelo contrário. Os fumos ou os fogos do Maio francês, algum fascínio pela China e a recente crise coimbrã faziam-me olhar para o futuro líder socialista  como um "social-democrata", alguém que perpetuava os velhos valores da "oposicrática"   reviralhista  que sempre me irritou. Quando a coisa cheirava (ou cheira...) a 1ª República, tapo o nariz e desando. A nossa conversa terá sido banal tanto mais que de de vários lados surdiam perguntaas (e talvez uma que outra pequena provocação) que Soares ia aparando cortês mas veemente. 

Os anos passaram depressa, veio o 25 de Abril, as grndes batalhas pela democracia, a primeira e mais importante para mim terá sido a da "unicidade sindical" onde brilhou Salgado Zenha

eu entrara no MES deonde sairia um ano depois logo depois do grupo sampaista (com quem me identificava mais) ter batido a porta.   Nessa época, mesmo um pouco antes fizera alguns longos estágios nas Europas e, vista de longe, a proto-revolução portuguesa (e sobretudo o patético Vsco Gonçalves) pareciam fruto de uma grndiosa ignorância política combinada com a mais triste ingenuidade revolucionária  e também com um descarado desconhecimento do país. Um PREC delirante, um cerco à Assembleia da República, e um golpe militar levado a efeito por uma dúzia de oficiais seduzidos por uma caricatura do Che Guevara (esse elo menos combatia, morreu de armas na mão...)  com uma turbamulta de paraquedistas ignorantes e atontados, deu no que deu. E a figura de Soares, claramente, desde a Fonte Luminosa, um vencedor e um democrata  não me levaram para o PS mas dissiparam-me algumas ideias que tinha sobe o homem e o seu partido. Votei continuamente neles  sem estados de alma nem  hesitação. 

quando passada que foi a presidência de Eanes  se começou a falar nas diferentes candidaturas de esquerda especialmente em Zenha - que ainda hoje admiro. Lurdes Pintasilgo e Soares  aderi com entusiasmo, convicção e alegria a esta última. E logo durante a pré campanha tive oportunidade de reencontrar aquele político bonacheirão mas determinado que, além do mais demonstrava um enorme coragem fisica moral e política. E foi assim que a primeira vinda de Soares ao Porto para uma sessão de esclarecimento na sede da Ordem dos Médicos , teve três (!!!) pessoas à espera dele em Campanhã(Rui Feijó, Dolly Cochofel sua mulher e eu a servi de motorista). 

Acreditem ou não mas quando o rui se preparava para me apresentar a Soares, estes retorquou que "éramos velhos conhecidos" desde uma ida dele a Coimbra. Fiquei estarrecido, envaidecido  e grato por ele ter omitido o meu fraco desempenho a seu lado. 

Nunca mais o perdi de vista até porque estava no MASP de alma e coração. Um velho amigo meu afirmava que durante a mais que crítica e dificil campanha eleitoral só eu e o Major Valentim Loureiro (raio de azar) o tratávamos por senhor presidente com uma convicção que só (no meu caso) a teimosia permitiasustentar. Durante a campanha fomo-nos encontrando e nessa altura já conversávamos como velhos conhecidos (não me atrevo a usar a palavra amigo porque para isso é preciso bem mais do que alguns encontros esporádicos. Mais tarde tive a honra de o receber enquanto Delegado Regional de CUltura fo Norte em duas ou três ocasiões em que ele veio a eventos organizados pela minha equipa. E foi sempre o mesmo tom amigável e franco, o mesmo cuidado em relembrar encontros anteriores, um par de gostos comuns (pinuira, os grandes romances franceses...). A última vez que o vi foi na sua biblioteca perto da cidade universitária, o famoso sótão carregado de livros  que me deixou alucinado. aquilo para um leitor empedernido com uma biblioteca que já ultrapassou os 25.ooo espécimes, era a autêntica caverna de Ali Babá. E só lá fui porque, outra vez, o casal Dolly Rui fora convidado telefonicamente estando eu com eles. O Rui ter-lhe-á dito que eu estava em Lisboa e com a gentileza que nunca esquecerei Soares estendeu o convite.

Convem, em nome da verdade, dizer que apesar de o admirar profundamente, não apoiei a sua terceia candidatura à Presidência da República. Primeiro sempre entendi que dois mandatos chegam (como de resto chegaram) e depois o adversário era o Manuel Alegre meu amigo desde Coimbra. Não hesitei e repeti a dose mesmo sabendo que era praticamente impossível levá-lo a Belem. Amicus certus in re incerta certitur

Mais tarde estive com o Jorge Sampaio em duas eleições essas sim triunfantes. Digamos que em ermos de presidentes da República estou fifty-fifty pois acrescento-lhe a segunda eleição de Eanes.

Ter participado  livremente durante estes últimos cinquenta anos em dezenas de eleições, ter sempre comparecido nos locais de voto, sem uma única falha, eis algo que indubitaelmente devo a Mário soares. como é que isso poderia suceder vivendo a 300  quilómetros de distância.

 Não fomos amigos,  mas  apenas, e com grande honra e prazer meus, conhecidos, Cordiais mas meramente conhecidos e isso já me chega. 

Mário Soares

José Carlos Pereira, 07.12.24

mario-soares.jpg

No dia em que se assinala o centenário do nascimento de Mário Soares, recordo o texto que aqui publiquei no dia da sua morte:

"Mário Soares morreu hoje, aos 92 anos, após vários dias de internamento hospitalar. Foi uma vida longa e plena. Oposicionista ao regime do Estado Novo, destacando-se como activista das candidaturas de Norton de Matos e Humberto Delgado, foi preso várias vezes, deportado e exilado. Fundador do Partido Socialista, regressou a Portugal logo a seguir ao 25 de Abril, foi primeiro-ministro por três vezes, Presidente da República durante dez anos, vencedor da eleição para o Parlamento Europeu aos 74 anos e recandidato presidencial aos 80 anos.

Mário Soares nunca foi uma personalidade consensual, como nunca o são as personagens marcantes da história. A ruptura com a esquerda mais extremista, que permitiu a consolidação da democracia em Portugal nos anos de brasa de 74/75, e as repercussões à direita de um doloroso processo de descolonização contribuíram muito para que Soares gerasse uma oposição forte em determinados sectores.

O país, contudo, deve-lhe muito. A implantação e consolidação do regime democrático e a adesão à Europa tiveram na sua acção um contributo determinante. Mário Soares é, sem qualquer dúvida, um dos pais fundadores da nossa ainda jovem democracia.

Soares manteve-se orgulhosamente fiel ao princípio de lutar e resistir às adversidades, mas, como bem lembrou Henrique Monteiro no “Expresso” aquando do seu 90º aniversário, o discurso inflamado desse período do ajustamento da troika e as palavras às vezes excessivas mereciam ser devidamente enquadradas e temperadas. A verdade é que todos nós gostamos de uma forma especial dos amigos e familiares que atingem tão bonitas idades.

Encontrei-me duas vezes com Mário Soares, nas campanhas eleitorais presidenciais vitoriosas, que apoiei convictamente. Na primeira campanha, integrei a pequena comitiva que o recebeu à entrada do município de Marco de Canaveses e daí seguimos para um comício bem sucedido em que também intervim. Recordo com saudade o abraço apertado e emocionado que me deu no final desse comício, quando as perspectivas de vitória eram ainda longínquas. Esta minha intervenção, quando era então um jovem militante da JSD, valeu-me, aliás, uma inconsequente ameaça de expulsão. Cinco anos depois, já livre de militâncias partidárias, voltei a conversar com Mário Soares num evento da sua campanha no Porto.

Lamentei a sua decisão de se candidatar novamente à presidência da República em 2006 e decidi, por isso, não corresponder ao convite para ser o seu mandatário concelhio em Marco de Canaveses. Já não era o tempo de Mário Soares, embora percebesse o que o fazia avançar. Não o apoiei, mas também não votei contra esta sua última investida.

Até sempre, caro Presidente Mário Soares!"

Pág. 1/2