2005
Não vou comer passas, nem formular desejos. Comi passas e passas e formulei desejos e desejos em anos que já passaram e os desejos não se confirmaram. Desta vez, vou à luta em vez de formular desejos, vou retomar o olhar firme, o passo certo, a largueza dos gestos, as palavras exactas, marimbar-me para os sentimentos de culpa - injustos - que me plantaram, e voar sobre os sentimentos de culpa - justos - que já paguei. Conversa acabada!
O ano velho morreu. Com ele, morrerá o que envelheceu em mim. Vou voltar a ter prazer em comprar fatos novos, em ganhar dinheiro compatível com os sucessos e os sacrifícios, em trocar de carro, em reler o que já quase esqueci, em estudar, em transformar a minha casa caótica num sítio civilizado onde os meus amigos possam estar. Talvez me entusiasme e publique um novo livro, desta vez, com o cuidado dos académicos.
Estou cheio de "pica", como se vê. Não me lembro de estar assim... Não se trata de euforia de uma qualquer disfunção bipolar, é mesmo assim, e eu sei que é assim.
Verei os meus filhos como a prioridade, mas não ficarei refém dos meus filhos, tão habilmente usados para me abater, a mim, que tenho o rosto marcado pela intempérie de noites sucessivas sem dormir, mas de coração mole, o coração que permitiu que gente sem alma se colocasse nas minhas costas para subir na vida, gente injusta, que não sabe o que é a alma e que vive das aparências e que já nem aparências tem...
Nos próximos dias, irei a Fátima. Gosto de Fátima. Pela Fé. E porque, também, estive lá, jovem repórter-e-estudante-de-direito, quando Khron tentou matar João Paulo II, e quando, poucos anos mais tarde, voltei, para escrever coisas sobre Fátima, coisas boas e coisas más. Irei a Fátima - peregrino. Não sei rezar, mas sei ficar paralisado no silêncio que a imagem de Fátima me dá, com as minhas lágrimas inquietas e com as lágrimas quietas que a Virgem me mostra, mesmo que apenas eu as veja, porque eu quero vê-las.
E quero continuar aqui. A escrever coisas que são minhas, muito minhas, demasiado minhas para um sítio público, uma exposição que não me assusta, porque não tenho nada a esconder, por muito que tenha uma vida de estórias.
E quero - quero mesmo -, que todos, aqui, sejam felizes. Em 2005. E sempre.
Um abraço do carteiro. De novo apaixonado pela vida.