Subitamente, no Porto…
«Na medida em que não está, por natureza, voltado para fins estáveis, o homem é maleável (…). A espécie humana é aquilo que quisermos fazer dela».
Myriam Revault d´Allonnes
Que processos sócio-culturais envolventes podem condicionar uma tal atitude? Será ela explicável apenas tendo em conta a dinâmica e a psicologia de grupo? Poderá ser atribuível a um preconceito, sendo a vítima transexual? É imputável à influência dos conteúdos violentos da programação televisiva?
Nos anos oitenta, houve um boom de violência juvenil em Washington (sim, a capital dos E.U.A.). No centro do aceso debate que se travou para analisar as respectivas causas e tentar reagir ao fenómeno, houve um dado que inquietou os investigadores e estudiosos: um grupo de menores afirmara ter agredido um outro até à morte «just for fun» (só para gozo, só por brincadeira).
É sabido que os comportamentos dos jovens mimetizam os padrões que os media difundem, (algumas vezes até com intuitos pedagógicos).
A violência juvenil provocada pela exclusão social é verificada na Família, na Escola e na Rua.
É na Rua, também, onde outros fenómenos sociais resultantes da exclusão são expostos, como a mendicidade, a toxicodependência, a prostituição.
O que se passou no Porto é uma manifestação de dois pólos da mesma realidade, infelizmente crescente nas sociedades contemporâneas do Ocidente europeu. Um grupo de jovens com comportamentos delinquentes – oriundos de uma margem social não inserida – seviciou, até à morte, uma pessoa ela também socialmente excluída (imigrante ilegal, transexual e toxicodependente), aparentemente sem qualquer das motivações mais frequentes para este tipo de crime (no momento em que se escreve não está estabelecido se a morte foi resultado pretendido pelos jovens, mas foi, pelo menos, consequência do seu comportamento).
E choca-nos o desprezo manifestado pelo valor Vida e Dignidade, que devem ser valores absolutos. È difícil compreender um tal comportamento.
Mas, pretender observar as causas mais superficiais do fenómeno da violência juvenil é um erro metodológico. Querer atribuir exclusivamente aos modelos de institucionalização de jovens a responsabilidade (pelo menos, a culpa in vigilando) por semelhantes ocorrências é perverso, porque se toma a «nuvem por Juno».
Por um lado, seria ignorar que tais modelos também têm casos de sucesso.
Por outro, seria irresponsável, porque se estaria a branquear todo o processo causal e anterior que determina a institucionalização das crianças e jovens.
Isto, sem prejuízo de poder haver alguma negligência na guarda e uma certa omissão na intervenção cívica e social sobre os jovens institucionalizados (de que não temos absolutamente quaisquer dados seguros).
Assim, quando um jornal pergunta «Como foi possível?», deveria, antes, questionar «Como é possível não acontecer mais vezes?».