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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Au bonheur des dames 616

mcr, 17.03.24

ai que frenesi!

mcr, 17-3-24 

 

Desde sexta que ando numa angústia, num frenesi, num repelão, sem conseguir adivinhar o resultado das eleições na Rússia 

.

Quem ganhará? 

Só há um única incerteza: será que naquele país, tão espiritual,  a IIIª Roma, o fantasma de Navalny, n\ao virá perturbar o normal e pacífico desenrolar das eleições. Eleições Livres, acrescente-se. Há mais três candidatos (entre os quais o apresentado pelo partido comunista que já não é um fantasma a afugentar a taiga siberiana diga-se em desabona de Marx e Engels) que num grave exercício de observância democrática já explicaram que não pretendiam ganhar as eleições.

Consta, nas isso deve ser boato, fake new, que ainda se falou em mais quase uma dúzia de pretendentes mas, pelos vistos, aquilo era tudo um bando de traidores, de pacifistas, que foram proibidos de se apresentar pelo governo que, no caso em apreço, apenas se limitou a a representar muitos milhões de russos indignados com essa espécie de agentes do Ocidente, da NATO, da Europa viciosa, enfim dos terroristas ucranianos.

E, em boa verdade, há que ter as máximas cautelas com essa gente. Refibarias russas a muitas centenas de quilómetros ardem atingidas por diabólicos drones, sabe-se que nas ruas dos territórios "libertados" há uma turbamulta de agentes inimigos infiltrados que pretendem impedir o livre exercício da votação. Felizmente os governos dessas regiões regressadas à mãe pátria, entenderam destacar soldados para os postos de voto, enquanto que brigadas de cidadãos "leais e honrados" acompanhados de agentes da polícia percorrem as ruas e vão de casa em casa recomendar aos habitantes mais relapsos (que os há!...) e aos outros o sagrado dever de votar. 

Como estamos muito a ocidente, seguramente que logo à noite, à hora do noticiário, saberemos em que ficou este importante acontecimento  e poderemos responder à angustiante pergunta: será que Putin foi eleito?

Até lá, vai ser um roer de unhas medonho...

au bonheur des dames 615

mcr, 14.03.24

Viva a informação livre! 

Vivam os jornais!

Vivam os os jornalistas!

 

Desde os meus dezoito anos que pago os jornais que leio. Até aos 35 anos procurava perceber nas entrelinhas que a censura não brincava em serviço-

Paralelamente assinava revistas (Seara Nova, Vértice e o tempo e o Modo. A elas juntava "Le Monde", e mais tarde o "Comercio do Funchal" onde, como na Vértice, cheguei a colaborar.)

Depois do 25 A continuei a ler jornais nacionais e estranjeiros e com o fim ou o declínio das revistas acima citadas comecei a ler mais orgãos estranjeiros  (el páis, LÉxpresso, La República ou Charlie Hebdo de que era leitor desde os tempos da sua 1ª versão - Harakiri.

concomitantemente, gastei a mair parte dom nmeu dinheiro enquanto estudante e mais tarde nos primeiros anos de vida profissional em variadas revistas de pendor mais literário e/ou artístico. Delas conservei um bom milharde exemplares mormente números monotemáticos.

A minharotina matinal começa pela compra do Público antes mesmo de tomar o primeiro café.  Sou um leeitor omnívro de imprensa e há um bom número de publicações que sigo desde o primeiro número. 

Ler jornais e revistasé-me tão natural quanto respirar, esteja eu onde estiver.

or isso, hoje, não poderia estar senão com os jornalistas que estão em greve. Se houver "fundo de greve" e aceitarem alguma ajuda, cá estou. Não concebo o mundo sem jornais, radios e televisão. Muitos, variados, sem distinguir diferenças ideológicas desde que assumidamente livres e sem o ferrete da censura interna ou externa.

Os jornais, a imprensa foram sempre a marca distintiva da liberdade e da democracia.

Leiam jornais! comprem o vosso jornal. qualquer jornal. Verificarão que ficam mais ricos, mais capazes de perceber  omundo e de, eventualmente, o melhorar.

 

au bonheur des dames 614

mcr, 11.03.24

o milagre dos pães e dos peixes

(versão Portugal, 2024)

mcr, 11-3-24

 

Como boa parte dos leitores também eu fui educado na Igreja Católica e, à conta disso, tive aulas de catequese. Estas eram dadas por um excelente senhora, piedosa e ingénua, que me perdoou muitas gazetas  em que antecipando a saída futura do rebanho eu ia brincar na praia ou na mata de Sotto Maior.  

Em boa verdade, lá aprendi o que havia para aprender desde as pias histórias de Jesus até uma apreciável quantidade de orações  e preceitos indispensáveis a quem solenemente iria fazer a primeira comunhão. Se bem me recordo terei tido 13 valores na catequese, favor que devo à referida senhora que provavelmente seria doente do meu pai.

Um dos milagres que mais me terá impressionado foi aquele em que Jesus conseguiu alimentar quatro ou cinco mil seguidores com cinco pães e dois peixes. (Mateus 8.1-9 )

Não são especialmente bíblicos estes dias que passam, mesmo se o Papa cá tenha estado a abençoar quase um milhão de jovens vindos dos quatro cantos do mundo.  Porém, ontem, dia 10 multiplicaram-se por 9 quase por 10 os votos numa coisa desconhecida que, garbosa mente se auto-baptizou de ADN

Mais concretamente, de 10933  votos em 2022  voou para 100044. Nem o Chega, indiscutível vencedor nestas eleições conseguu proeza semelhante. Nem o LIVRE que quadruplico de mandatos sequer pode pedir meças a esta avalanche, a esta enxurrada, a este tsunami de entusiasmo popular .

A AD durante o dia foi recebendo (alegadamente) queixas de eleitores que se teriam enganado pondo a cruzinha no ADN quando pensavam estar a votar no dr. Montenegro. 

Convenhamos que o estrepitoso caudal de votos numa coisa mais desconhecida o que os buracos negros numa galáxia distante dá que pensar. 

Eu, sempre generoso, poderia aceitar que os desconhecidos méritos do progama deste ajuntamento tivessem feito duplicar a sua freguesia. Digamos que de cerca de 10.000 duplicasse para 20.000 o número de adeptos

sobrariam, entretanto, oitenta mil votos que, no caso da AD poderiam ter proporcionado mais um par de deputados, daqueles que ficaram a um passo de ascender ao augustíssimo Parlamento.

Alguns dos envergonhados eleitores pediam que se transferisse o seu incerto voto para o local desejado mas isso, é obvaimente impossível. 

E foi messes termos que a comissão eleitoral respondeu, afirmando que a AD deveria ter previamente solicitado ao Tribunal Constitucional  uma qualquer medida que evitasse a confusão.

Eu tenho pela comissão nacional de eleições (ou lá como se chama)  escassa simpatia mas percebo que aquilo sempre dará uns cêntimos aos seus esforçados componentes. Não é a única instituição inútil que existe, bem pelo contrário, nem será eventualmente a que menos onerará o erário público. (Devo porém dizer que desconheço de todo  em todo a sua composição e os emolumentos dos seus membros pelo que se porventura a coisa seja pro bono aqui ficam antecipadas desculpas.  e a minha única razão é esta: não acredito em milagres nem mesmo estes incomparáveis com a anterior e já citada explosão de votos).

 

Deixemos o "mistério dos votos no desconhecido" para futuras eventuais oportunidades e passemos a um não milagre absoluto: a imparável ascensão venturoso ajuntamento que dá pelo intratável nome de Chega.

Eu não posso ser acusado de ter citado esta coisa por mais de duas ou três vezes. E sempre para avisar que falando no mal ele vai começando a tomar forma até que aparece em todo o seu horrendo esplendor. 

O pobre dr. Montenegro foi durante largos meses acusado de estar mancomunado com aquele estrepitoso bando.  vê-se, finalmente, e até ao momento, que   não queria tal impetuoso nanorado. Ele bem que clamou tal facto mas, pelos ivstos, também biblicamente, era apenas uma vox clamantis in deserto. Como de costume, este género de vozes nunca é escutado. 

Agora que terá de governar vamos lá ver como é que se consegue mexer entre a tal oposição forte do PS, menos forte dos partidos à esquerda  e a esganiçada algazarra dos colegas de Ventura. 

É verdade que neste omento, a Direita pura e dura está na moda. Na europa, nas Américas, na Rússia nos EUA enfim por todo o lado incluindo Israel a cuja Direita religiosa, laica, estúpida , o Hamas fez um inestimável mas sangrento favor. 

Todavia, por cá, a Direita que sempre por aí rondou  (enquanto uns patetas juravam que a pátria era o mais Esquerda possível...), tinha contra ela a memória ainda fresca das desventuras do Estado Novo. Não punha o pé na rua por falta oportunidade, refugiava-se na abstenção, na Direita da Direita,  e esperava pacientemente pelo seu momento. 

Faltava-lhe um líder carismático, faltavam-lhe os mil e um erros duma governação que exterminava lentamente a classe média que a lumpen-proletarizava. 

O seu momento chegou e verdade seja dita, o homem que diz tudo e o seu contrário, federou os protestos, as desilusões, as antipatias. E foi pelos extremos do leque partidário que o Chega se afirmou. em terras do Alentejo, primeiro depois por todo o lado. 

Nunca precisou de um programa sólido. Bastou-lhe estar contra. contra  o socialismo, contra o sistema contra os Bancos (os bancos!...). Agora vão ter que aguentar mais de três dúzias de energúmenos (ou nem tanto) que mostrarão ao ex-presidente da AR (se este conseguir ser eleito) como é a sua cruzada foi mal conduzida. 

Há quem compare este ajuntamento com o falecido PRD, uma anomalia nascida do duvidoso conúbio de Eanes com umas dezenas de personalidades que se achavam mal percebidos pelo PS ( e também, um pouco, pelo PPD).

Aquilo conseguiu um amontoado de votos que num ápice desperdiçou numa estúpida moção de censura para a qual o PS se deixou molemente arrastar.  A coisa permitiu a Cavaco Silva duas gigantescas maiorias absolutas e ao PS uma diíicil travessia do deserto (outra vez a Bíblia...)  que bem poderia ter ensinado qualquer coisa ao eng. Guterres . (Não ensinou, como se sabe).

O PRD desvaneceu-se em pouco tempo e, pelos vistos, agora, como Marx ensina, reaparece desta vez como farsa, como caricatura violente, perigosa , ajudada pelos "ventos da história".

Eu não sei se Ventura irá irremediavelmente pelo cano , mesmo que o espere ansiosamente. entretanto, algum mal fará, sobretuso se verificarmos que sozinho tem quase o dobro de mandatos de toda a Esquerda que o citou continuamente. 

Há quase cem anos, durante a guerra civil de Espanha, multidões gritavam contra Franco e restante comandita "No pasarán!"  O resultado foi o que se sabe. Passaram sem demasiada dificuldade e mantiveram-se no poder durante décadas. Por cá, umas alminhas inocentes e ignorantes andaram por aí a berrar o mesmo. Mau sinal! 

 

(a CDU, pseudónimo estafado do PC, vai perdendo votos e deputados á medida que os seus militantes vão envelhecendo e morrendo. . O PAN e o BE mantêm a mesma ou quase a mesma votação, Só o LVRE pode cantar vitória ao quadruplicar os mandatos. De pouco vão valer numa assembleia triangular sobretudo porque, ao que parece, não está disponível para quaisquer conversas com a AD mesmo que esta exclua das suas reuniões o Chega. 

Vamos assistir a votações pelo menos esotéricas...

 

au bonheur des dames 613

mcr, 12.02.24

 

 

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breve apontamento carnavalesco

mcr, 12-2-24

a televisão, todas as televisões esfalfam-se para nos mostrar o caricato torrãozinho de açúcar a imitar o carnaval do Rio.

Convenhamos que é tarefa impossível: falta o calor, as escolas de samba, as mulatas, oo delírio e os mecenas que vem do sector mais clandestino da sociedade brasileira.

Também faltam os letristas e os compositores  e a tradição .

Por cá os desfiles são pífios, mesmo se atraem gente, a chuva e o frio chateiamo público e torturam os desfilantes. 

No meio daquela tristura ainda aparecem uns pobres diabos vestidos de mulher  vulgo matrafonas invenção que atinge as raias da pobreza de espírito catatónica. 

E no entanto...

E no entanto há algumas velhas, luzidas, coloridas tradições carnavalescas que se conservaram em Trás-Os-Montes e até mereceram distinção da UNESCO. E, pelos vistos atraem também curiosos que aproveitam para petisca o melhor fumeiro de Portugal e um vinho que pede meças aos melhores. 

Viva Podence, vivam os caretos, vivam os artesãos que fazem as máscaras e os fatos. 

(quando refiro Podence, quero falar de todas as restantes aldeias onde os caretos chocalham)

 

au bonheur des dames 612

mcr, 01.02.24

 

Os educadores do povo

(e dos automobilistas)

 

mcr, 31-1-24

 

No texto anterior ficou por dizer algo que parece evidente: há nos cavalheiros do metrobus e nas pessoas que os apoiam uma clara sanha ao uso do automóvel. Na falta de condiçoes de circulação decentes (e o estreitamento das faixas de rodagem das avenidas do Marechal Gomes da Costa e da Boavista, bem como as modificações já visíveis nos acessos a   esta última não garantem uma melhoria como seria previsível em obras desta dimensão e ambição)poderá pensar-se que há uma deliberada má vontade contra o automóvel.

 

Percebe-se que haja quem julgue o transporte individual o suprassumo do progresso ambiental. Seria bom recordar o transporte marítimo, os aviões, o fabrico de toda a espécie de produtos industriais e, sobretudo, valeria a pena lembrar que o mundo é um só e sem o acordo de mais de metade do mundo (refiro apenas a China, a Índia e toda a África, sem esquecer a Rússia e seu imenso território). Isto não significa que se advogue a inacção mas apenas que neste tipo de obras públicas o bom senso é essencial.

Em tempos que já lá vão o pais assistiu divertido e surpreendido ao aparecimento de um "grande educador do proletariado" indígena , numa das inúmeras capelinhas políticas da extrema Esquerda. Nem o MRPP nem o seu líder, Arnaldo de Matos  (o "educador em questão) perceberam o ridículo desta fantasiosa imitação do pior que a Revolução Cultural (aliás  "grande revolução cultural e proletária)chinesa produziu. 

Obviamente não quero misturar alhos com bugalhos nem sequer comparar os ideólogos das obras do metrobus com as aberrantes denominações políticas mencionadas. Por duas razões: o metrobus é dirigido por uma série de cavalheiros solidamente burgueses e de boys que aí tirocinam para mais altos voos. A segunra é evidente: Arnaldo de Natos que conheci razoavelmente era alguém inteligente mas devorado pela paixão política. Não queria eliminar os automóveis das ruas mas apenas levar os seus utentes aos cumes da revolução utópica que o fintou toda a vida. 

Os metrobuseiros devem acreditar piamente que ao tornar mais dificila circulação automóvel, tornam os portuenses mais felizes mesmo se esta experiência em curso vá sobretudo atingir duas zobs de classe alta e nuito alta. E, bo que toca a população, aqui a percentagem atingida é mínima pelo menso nos dois eixos principais onde se  desenrolará a aventura do novo meio de transporte.

Há neste género de tentativas uma odeia subjacente que é a de "educar" o indigenato local, a populaça. A coisa já foi visível com as leis do taco e da sua venda que, espantosamente, atingiam sobretudo as gentes do interior .Proibir a venda de cigarros nos cafés, ultimos redutos de povoações que viram fugir serviços públicos de toda a espécie, que não estão junto de tabacarias (uma miragem) nem de estações de serviço onde a venda de tabaco e  a de álcool são permitidas!!

Suponho que na mente evangélica da ministra que se lembrou de tal lei estava a imagem horrenda dos malefícios do tabaco (malefícios mesmo e não  da peça de Tchekov, personagem de que a senhora nunca terá ouvido falar) e a bondosa ideia de nos salvar dessas atrocidades. 

De quando em quando o Governo (os governos na generalidade) lembra-se da sua missão de pastorear a grei e toma lá disto. Mais uma lei para nos salvar do inferno. Os fumadores (de que, com infinita saudade, já não faço parte  vai para quase trinta anos) não tem sequer direito a uma salinha de chuto na aldeia perdida entre montes e vales. 

E só ainda andam de automóvel porque depois de uma lei imbecil e salvífica do do clima o Governo caiu e para não enfrentar um milhão de proprietários de carros velhos voltou atrás mandando os seus títeres parlamentares anular a medida. 

Dirão que sou um incrédulo mas aposto um contra dez em como os passeios alargados irão servir de estacionamento aos carros . De certo modo, será um progresso porquanto sempre que subo ou desço a Avenida estão muito carros estacionados em dupla fila, há camiões sempre a descarregar material diverso, os táxis param onde lhes dá na mona para deixar um passageiro e se alguém reclama berram que estão a trabalhar. E isso, essa má criação continuará a existir.

O grande educador da classe operária já morreu, o seu partido está em morte cerebral desde há muito, o proletariado continua a ouvir embevecido as sereias da "reacção" e a sonhar com um totoloto que o livre da sua triste condição  e noutros pequenos partidos exóticos continua a tentação de educar as massas que, indóceis e réprobas votam nos partidos tradicionais ou caem na abstenção. Nos sítios destinados à educação faltam meios, professores, instalações decentes  e as famílias desesperam. mas isso já não é novidade apenas o país que temos.

 

apêndice que nada (ou tudo?)em a ver: as contas públicas de 2023 fecharam com um saldo inesperado de 4.700 milhões de euros. 12% a mais do que o Orçamento previa. Pergunta-se se os autores do mais importante documento político anual são incompetentes, erram contas ou foram apenas traídos por quem devia executar o Orçamento. 12% não é uma surpresa maravilhosa. É uma brutalidade. Saia um educador ou um explicador de matemática para esta gente. Depressa!

 

au bonheur des dames 611

mcr, 31.01.24

 

 

 

 

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ligar o complicador

mcr. 31-1-24

 

 

Um pacote de livros expedido fez na passada segunda feira três semanas chegou finalmente ao destinatário, Hoje, porque ontem o dedicado e diligente carteiro entendeu deixar um papelinho na caixa do correio cominando-me que o fosse levantar hoje numa papelaria. 

Note-se que o devotado trabalhador dos CTT  entrou no prédio e teve a trabalheira de ir colocar o aviso cominatório na minha caixa de correio. Poderia ter tocado para o meu apartamento ou mesmo, esforço tremendo ter tomado o elevador para me entregar os livros. 

Eu sei que usar o elevador (e no prédio são 4) é algo de ousado, de perigoso, de maçador mas, enfim, já que cá estava dentro... 

Vinte e dois dias  para cobrir a distância Lisboa Porto parece-me um feliz regresso ao sec XVIII no tempo do senhor Rei D João V  quando as estradas eram perigosas e as pessoas prudentes preferiam fazer a viagem de barco.

Devo dizer que, por incúria da vendedora, os livros (que eram razoavelmente valiosos ) não vinham com registo. Mesmo assim, mesmo que os CTT entendam que essa falta deve ser punida, vinte e dois dias, três semanas passante, parece punição exagerada sobretudo para o destinatário.

Todavia, os livros chegaram o que, dado alguns antecedentes, já foi uma proeza. Com efeito, uma encomenda de França, da Amazon também de livros e no valor de cerca de 250 euros nunca me chegou às mãos. Quando, avidado pelo vendedor, reclamei  os CTT jraram que tinham entregue o embrulho a uma tal Elisabete (sic). Na falta de Elisabete  na minha morada voltaram à carga com uma Elisa, Nem esse desconto de letras serviu porque aqui nunca viveu nenhuma Elisa. A pandemia meteu-se de permeio e já não disseram mais nada, Provavelmente ainda tentariam, sempre na mesma lógica de redução do nome, com alguma Eva.  Nada! 

Com este antecedente, foi uma vitória ter recebido os livros. Mesmo sem registo. Vivam os CTT, abnegados recoveiros do sec.XXI!

 

Na cidade do Porto, o Metro ou quem nele manda entrou numa euforia de obras que pôs o trânsito em pantanas. Bão contentes com obras numas linhas multicores , eis que descobriram a Avenida da Boavista. Melhor dizendo, redescobriram-na pois já há um par de anos tinham olhado embevecidos para uma artéria que liga o centro (ou quase...) ao mar. Vencidos na primeira investida por um movimento cidadão que explicou e provou que aquilo era um desparrame de dinheiro para um escasso número de futuros utentes, , roeram o freio mas entenderam voltar à carga. E agora com um "metrobus" que, a meio do caminho se divide em dois percursos de também duvidosa utilidade.

E vai de começar a obra. E de começarem os atrasos, claro está. A avenida está num estado caótico que só não é horrendo porque felizmente foi planeada com largura. 

Do que está feito verifica-se que se manterão os dois sentidos e no meio a passagem do metrobus.

Por razões que ninguém entende, os cavalheiros metrobusianos entenderam complicar, reduzindo  a sua largura os acessos laterais a outra ruas. Tmbém acharam que deviam sacrificar pequenas zonas reivadas e/ou  arborizadas. Iremos ter, em contrapartida passeios mais largos, faixas de rodagem mais estreitas e ainda é discutida a questão das paragens. Tudo isto com o tradicional atraso nacional e indígena. Porém, mesmo que os trabalgos se concluam em Julho, o metrobus não funcionará porque os veículos só chegaão (é o jornal que o afirma em duas inteiras páginas!) lá par o fim do ano!

Ou seja ,seis meses depois da alegada (e usada!) previsão do fim das obras. E provavelmente um ano ou ainda mais se os prazos iniciais se cumprissem.

No meio desta feira de vaidades, convém sublinhar que a partir do meio do percurso, o metrobus servira duas zonas de vivendas isoladas por jardins  seja em que sentido for. Imagino a alegria dos proprietários ricos dessas mansões  a babarem-se de gozo com a possibilidade de, uma que outra vez, deixarem os carros na garagem e misturarem-se com o povo que, no caso, também é sobretudo classe média alta! 

Vai ser um fartote! Mas vamos ficar parecidos com Nantes em França. Poderia pensar-se em Lyon, Marselha ou Bordéus, quiçá, mesmo, Toulouse, mas só nos cabe Nantes...

Au bonheur des dames 610

mcr, 26.01.24

 

 

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noutra esplanada, o mesmo sol de inverno e os anos 60 a insistirem 

mcr. 26-1-24

 

Faço parte da minoria que ainda lê jornais pelo que as culpas da crise da imprensa escrita não me atingem se bem que me preocupem e aflijam  mais do que as peripécias da vida política nacional que, justamente, vegeta por falta de leitores atentos e capazes de se indignar.

O "Público" de hoje (26 de Janeiro) ataca em várias frentes um caudal de recordações  que me remete para os anos da minha inquieta juventude, essa década que persiste  como se verá na  continuação deste arrazoado.

Comecemos, fugindo a qualquer cronologia, com a notícia da morte de Melanie, uma cantora que hoje estará, por cá, terra desmemoriada, esquecida mas que brilhou intensamente nesses sessentas e culminou no Woodstock de 69, num dia de chuva à luz de milhares de velas de resistentes ao tempo que fazia. Melanie cantava "Lay down" que mais tarde terá passado a "lay down, canfles in the air)" devido justamente a esse dia glorioso no festival dos festivais cuja música ainda hoje é ouvida em múltiplas rádios.

Longe de casa, é-me impossível verificar se os seus LP ainda constam da minha discoteca ou se,  por razões alheias à minha vontade, habitam outros imerecidos lares. 

E já que me dá vontade de saber por onde andam peças que, por vezes com sacrifício,  comprei deu-me para  ir por um grande livro de James Baldwin, cuja leitura devo à Maria João Delgado,  "The fire next time" ou, agora, em recentíssima tradução, "Da próxima vez o fogo"  (Alfaguuara). Não foi o primeiro livro sobre a questão negra americana que li  (lembro-me do grande enorme, Richard Wrigh, "Os filhos do pai Tomás", "Filho nativo;  de Ralph Ellison, "O homem invisível" e de Landgston Hughes de que li uma antologia de poemas e a versão francesa do "Simple" que é simplesmente admirável. E para terminar um autor branco: Erskine Caldwell e o poderoso "Motim em Julho". Tudo isto porque o livro de Baldwin é agora traduzido para português.

Outra tradução: "Dersu  Usala" de Vladimir Arseniev. Foi no Festival de Cinema da Figueira que tive a sorte de ver o filme de Kurosawa com o mesmo título. Neste festival que revelou grandes cineastas e deu oportunidade a muitos realizadores portugueses,  conheci um bom par de amigos de que destaco o Francisco  Belard, fino conhecedor da melhor literatura  e cinema do nosso comum tempo e que bem poderia publicar uma antologia dos seus mais significativos textos aparecidos no "Expresso"

Foi por essa altura, início de 70 que, neste festival. tive  oportunidade de conhecer o Zé Fonseca e Costa,  o Lauro António (que com o Eduardo Prado Coelho, outro excelente amigo) já por cá não estão. 

Vivos que eu saiba ainda por aí andam o Eduardo Geada e o Luís Filipe Rocha mas há muito que os não vejo. Como também não verei a Marguerite Duras que também esteve na Figueira e de quem guardo uma imagem estranha e fortemente alcoolizada.  Por isso tardei bastante tempo em me aproximar do seu universo literário que agora tenho em muito boa conta. 

Ainda no mesmo "Público" deparei-me com mais um belo texto de Ana Cristina Leonardo que refere dois outros autores que comecei a ler nesses sessentas: Borges e Mrguerite Yourcenar. Para não variar, agora apenas vivem pelos extraordinários livros que nos deixaram.

Porém, deixei para o fim deste desfiar de memórias de descobertas a razão que tudo isto une. Uma leitora que, pelos vistos se dedica à escavação arqueológica, escreve-me sobre um texto meu publicado em 2006 (e não em 2005 como ela refere) e que tem por base mesmo que o não refira o "When I'm sixty four" e que se chamou "carta a um amigo que entra  na 3ª idade, Diário Político  33, 30 de  novembro de 2006

 A dita entrada  como se sabe ocorria aos 65 e não aos 64 como os Beatles eventualmente anunciavam. Ora este fraco rosário de lembranças literárias, musicais e cinéfilas tem por base o , para mim, ano de todos os assombros, 1960 altura em que, carregado de ilusões e ingenuidade cheguei à Faculdade de Direito de Coimbra.

 Há exactamente 64 anos...

 

vai esta em memória da prima Maria Manuel Viana, e do filho,  Manuel Viana Abrunhosa., 

E com um abraço, ao felizmente vivo, Francisco Bélard, amigo há mais de cinquenta anos e que muita falta  faz ao jornalismo cultural e de opinião.

 

 

na vinheta: Langston Hugres, um grande escritor, um lutador pelos direitos civis e um grande americano. Para quando uma edição portuguesa do  "The best of Simple" ?   

au bonheur des dames 609

mcr, 06.12.23

 Arre que está frio

mcr, 6-12-23

 

Hoje na esplanada toda a gente dizia que o frio era de rachar. Em boa verdade, não se enganavam. Às primeiras horas da manhã, leia-se das dez para as onze,  os telemóveis andavam entre os 9 e os 10 graus.  Havia um aquecedor pequeno e a funcionar no nível mais baixo  ou seja, para aquecer  as 10/!2 mesas ainda era preciso esperar mais uma ou duas horas.

Eu, friorento, me confesso: estava bem artilhado de roupa ( o adjectivo foi-me fornecido por um cavalheiro militar, major reformado, que pela manhã faz as palavras cruzadas do jornal mesmo antes de o ler. No resto é uma excelente criatura e, cereja no bolo, um bom jogador de bridge... coisa que era comum entre os oficiais de antigamente).

Com a idade a resistência ao frio diminuiu. Felizmente posso dar-me ao luxo de comprar roupa quente e suficiente para enfrentar o "briol" que, ao que dizem vem da Sibéria. Bem se vê que dali nem bom vento nem bom casamento...mesmo que isso dantes se aplicava a Espanha.

De todo o modo, os restantes paroquianos das manhãs estavam todos bem agasalhados inclusive os mais novos e os empregados que nos iam deixando cafés e demais bebidas quentes. 

Isto, no dizer, de um artista plástico também já bem entrado em anos, era Portugal por uma pena. Verões abrasadores e agora quase sem se dar por isso frios invernos mesmo se para o inverno ainda faltem quinze dias.

Do resto do mundo chegam imagens tremendas: cheias nas Filipinas e no sul d Índia, nevões homéricos por essa Europa fora. Lembrei-me logo do primeiro nevão que passei em Berlin no longínquo ano de setenta. A João, minha mulher nessa época enlouqueceu e saiu para o pátio da residência estudantil com um casacão vermelho e até se rebolou na neve. Eu, mais fleumático e sem casaco de qualquer cor limitei-me a ver os flocos caírem enquanto fumava um par de cigarros. Depois, retirei-me pra sítio menos refrescante abandonando a legítima  à neve que caía ininterrupta

Ou snt les neiges d'antan?  

(e onde estará a muito casta Heloísa por causa da qual Pierre Esbaillart foi castrado?)

Como é que me fui lembrar de Villon, esse poeta três vezes maldito e mil outras glorificado por inteiras gerações de amadores da poesia e estúrdios rapazolas que devotaram parte da sua oisive jeunesse à gaudriole tão propícia a quem só tem pela frente o futuro e a aventura?

O que faz o inverno antecipado a quem já entrado no inverno da sua vida relembra alvoroçado  uma mocidade longínqua mesmo se balizada pelos tempos escuros 

(e aqui poderia citar-se Brecht que roga aos humanos que depois dele vierem alguma piedosa compreensão pela sua sacrificada geração)?

Aqui chegados (cite-se por uma e única vez o dr Marques Mendes) leitoras haverá que desconfiam (e com que razão!...) do cronista que se deixa levar por uma qualquer secreta volúpia invernal e desata a tentar perder-se nos poetas perdidos no frio dos tempos e na desatenção das gentes como é o caso de Augusto Gil, presença constante nos manuais de leitura de antigamente e que, hoje, só se encontra em raros alfarrabistas...

Aprendia-se de cor a balada da neve que é, digam lá o que disserem, um belo poema solidamente construído mesmo, se eventualmente, aquela oficina literária fosse, também ela "branca e leve, branca e fria"...

Já nem sei se a li e ouvi na escola de Buarcos  ou só depois no pequeno liceu da Figueira. O que tenho por vividamente certo e recordado é que ao irmos para a escola havia no inverno uma finíssima camada de gelo nas poças de água da chuva naqueles caminhos citadinos mas maltratados pela incúria municipal.

Leitoras e leitores o frio ataca-me os humores e as meninges. Há que fazer boa cara ao inverno que entra de rompante, seguir o antigo conselho "abifa-te, abafa-te e avinha-te" que os tempos estão difíceis como também outro poeta, desta vez o Ferré cantava. 

Vejo na televisão terras alemãs cobertas de neve, entre elas Berlin ou Munique onde passei tempos amáveis e recordo que na Baviera, ou pelo menos em Murnau, quando alguém desatava num discurso descosido como este, logo se comentava que o Fohn, um vento do sul, tinha feito mais uma vítima.

Pelos vistos, neste caso, bastou ver a cidade coberta de neve 

 

 

au bonheur des dames 608

mcr, 25.11.23

 

 

 

 

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Mário Brochado Coelho

mcr, 25-11-23

 

Conheci o Mário num longínquo Outubro de 61, em Coimbra, no Teatro Avenida, por ocasião do único comício autorizado da Oposição por altura das eleições para a "Assembleia Nacional". 

Nessa altura, o jovem MBC, estudante de Direito, entendeu gritar por uma oposição católica e progressista. Foi a primeira vez que vi um "católico progressista" e mal eu sabia que das depois havíamos de nos cruzar no CITAC, um dos dois grupos de teatro universitário  onde, o seu nome proposto para a Direcção concitou uma pequena oposição justamente por ele ser assumidamente católico.

De todo o modo, mesmo tendo deixado a Igreja, entendi que era quase admirável haver católicos na oposição a Salazar. Data pois desse tempo tempestuoso uma amizade de mais de sessenta anos.

No ano seguinte, 1962, a crise académica volta a juntar-nos, ou melhor continua a juntar-nos na mesma barricada. Tive mais sorte do que ele pois enquanto fui preso (cm mais 43 companheiros) para Caxias por um mês, ele fez parte dos 32 estudantes expulsos da Universidade por períodos variáveis. A ele tocaram-lhe 30 meses.

Como tantos outros da mesma geração, MBC fez parte de todas as iniciativas cidadãs e democráticas que, desde a sua época de estudante até ao 25 de Abril, tentaram tornar menos cinzento, menos triste e menos violento este país. Relevo tão só a permanente disponibilidade para defender presos políticos e/ou oponentes ao Estado Novo como também, foi um dos mais activos membros da Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos (outra razão para lhe estar pessoal e directamente agradecido...). Tive oportunidade de o acompanhar na primeira destas iniciativas e bastante me ajudou nos primeiros processos em que intervim como defensor de estudantes e de oposicionistas nos tribunais miseráveis em que estes eram alegadamente julgados. Aliás, depois da minha quarta (e pior) detenção em Caxias resolvi passar uma procuração em seu nome para me defender caso voltasse a ser preso. Só lhe entreguei essa procuração muitos anos depois porque, passada em inícios de 73, nunca foi preciso acioná-la.

Logo que cheguei ao Porto e comecei a minha vida profissional reatei as relações interrompidas depois da sua saída de Coimbra. Melhor dizendo tornaram-se mais fortes e frequentes e, como não podia deixar de ser, tiveram os seus pequenos momentos conspirativos. Durante algum tempo, sempre qu ia a Paris trazia-lhe farta cópia de publicações políticas, a maior parte delas vindas da embaixada da China ou de livraria afectas ao chamado movimento marxista-leninista. quando resolvi traduzir e policopiar alguns desses documentos que eu mesmo financiava e distribuía, o Mário era quase sempre o primeiro a recebê-los. Não sei se, alguma vez, percebeu qual era proveniência desses textos e só mais tarde percebi que também ele tinha acesso à documentação distribuído por Pequim e que terá ajudado a moldar parte da sua posterior acção política que já não acompanhei por, entretanto, ter escolhido outros rumos, coisa que, de resto nunca nos incomodou. 

Depois da Revolução, fui convidado para presidir a uma Caixa de Previdência sob indicação dele (e de Mário Cal Brandão) facto que também só muito mais tarde descobri. Quando finalmente falámos sobre isso, o Mário disse-me que se tinha perdido um advogado mas eu garanti-lhe que não só se ganhara alguém para outras e mais gratificantes actividades mas também um jogador de bridge e que o Direito fora apenas a escolha menos desagradável que fizera já que a minha família desaconselhava fortemente o curso de História.

Durante estes anos todos até pouco antes da pandemia lá nos íamos encontrando numa esplanada frente ao mar e nas celebrações dos aniversários do nosso grupo de teatro coimbrão. Terá sido mesmo no último a que fui que o encontrei pela derradeira vez. Era o dia do seu aniversário mas o Mário estava murcho, cansado e tristonho mesmo se, com o encontro de velhos amigos do nosso tempo de teatro e aventuras conexas, lá tivesse arrebitado um pouco.  dir-se-ia que os anos lhe pesavam  ou que os rumos políticos do país o desanimavam. De todo o modo, a pandemia e as suas, dele, eventuais maleitas tivessem tido como resultado o fim desses encontros amigáveis a quem alguém chamou de "conversas de velhos combatentes".

Quando nos morre alguém querido lamentamos sempre os contactos que foram rareando mas isso é mesmo assim.

Dele tenho aqui dois livrinhos "Lágrimas de guerra" e "Cinco passos ao sol" bem como a soberba "Em defesa de Joaquim Pinto de Andrade" um texto jurídico que também é político que demonstra não só a sólida formação jurídica do autor como a sua generosa e abnegada campanha por Joaquim Pinto de Andrade, hoje um nome quase esquecido de um dos pais fundadores da liberdade de Angola.

 

Com Rui Polónio de Sampaio, António Taborda, Vasco Airão Marques ou José Luís Nunes, o Mário Brochado deixou uma marca forte no panorama jurídico do Porto e fez parte da geração que esteve em todas as lutas do combate pela democracia. Outros houve mas apenas cito estes porque, além do seu talento e mérito próprios, foram determinantes na Coimbra que me recebeu e com os quais tive a enorme honra de partilhar algumas tarefas como advogado nos tempos difíceis.

 (E foram todos do CITAC... e alguns também vítimas da repressão que se seguiu à crise de 62 em Coimbra) 

au bonheur des dames 607

mcr, 23.11.23

Ler ou tresler?

mcr, 23-11-23

 

O texto "teoria do copo de água" (au bonheur des dames 606 de 12 deste mês ) mereceu, ,mais de uma semana depois, comentários de três leitores  que ou não leram o que escrevi ou tendo lido não perceberam ou, pior ainda, tentam mover-me um processo de intenções que felizmente umasimples leitora do parágrafo (logo o primeiro!) desmonta e nega. De facto eu começava por recordar a minha "ida às sortes" no longínquo ano de 1961, mais precisamente nos primeiros dias de Janeiro, estava o país tranquilo, ronronando sem perceber que três meses depois a guerra irromperia em Angola.

E irrompeu, apanhando o Governo, os militares, a PIDE (que nas colónias servia de serviço de informação) de "calças na mão"

Mais. apanhou toda a oposição de surpresa, incluindo até as poucas dezenas de estudantes angolanos que frequentavam a universidade de Coimbra. Estou absolutamente certo disso pois, por essa época, era uma espécie de "cabide" da "República dos 1000-y-onarius" constituída apenas por estudantes vindos de Angola. 

É verdade que nas franjas mais radicais da 2oposicrática" juvenil já circulava a contestação ao sistema colonial, já se contavam histórias sinistras da repressão em certas zonas, nomeadamente da repressão aos camponeses negros que por várias vezes e em Angola como em Moçambique se revoltavam contra as administrações coloniais, sobretudo as locais. Porém, mesmo entre a velha oposição republicana a questão colonial ainda não se punha, bem pelo contrário como alguém mais curioso poderá verificar lendo o livrinho de Cunha Leal "O colonialismo dos anticolonialistas". Ou, querendo, desandar para uma biblioteca e pedindo para consultar os jornais da época, "República" incluído.

Quando o dr Salazar soltou o seu famoso grito de guerra "para Angola já e em força" pode afirmar-se sem receio que uma grande percentagem da população ouviu, consentiu ou até se mostrou entusiasmada. Mesmo nos círculos estudantis progressistas a questão teve ecos diversos sobretudo porque o levantamento da UPA no norte de Angola se revestiu de extrema violência não poupando mulheres, crianças brancas e negras ou mulatas  e servidores negros recrutados noutros pontos da colónia e, portanto, não ba-kongo.

Deita esta pequena síntese histórica voltemos à minha inspecção militar efectuada, repito, meses antes da eclosão da guerra ou até das histilidades que em Luanda a precederam mesmo se de origem partidária diferente. 

Como contei, fui inspeccionado  nas instalações degradadas de um dos famosos "colégios" universitários mandados .construir por D João III

A equipa inspectora era constituída por três oficiais  superiores idosos  sentados  lá ao fundo e por um jovem médico miliciano aspirante ou alferes e que eu vagamente conhecia justamente de meios relacionados com a República acima mencionada. 

É provável  que esse jovem "ultramarino" soubesse de algo e tivesse querido poupar o magricela desengonçado que eu era. Por isso me perguntou se eu fazia questão em fazer a tropa. Respondi-lhe sem grande esforço ou fervor que não que a coisa não era o meu ideal de vida. Foi por isso que, ele me subiu um par de centímetros à altura e me abateu outro tanto de quilos aos miseráveis 57 quilos que eu pesava. 

Três leitores que, pelos vistos, só leram parte do parágrafo (o primeiro em dezanove!!!) entenderam

a) que eu adoro cunhas (as que são a favor...) e me sinta embaraçado por o confessar (!!!)

b) que graças a uma cunha não parti para África pelo que outro foi em  meu lugar (e até pode ter morrido...)

c) que "sempre fui amigo de cuinhas" o que significa que "para beneficiar um outro fica para trás"

 

Nenhum se deu ao trabalho de assinar sequer de usar um pseudónimo. 

É com eles mas confesso que fico surpreendido com tanta  e solidária comunhão de sentimentos sobretudo quando em parte alguma do meu texto se vislumbra sequer um murmúrio de pedido ao jovem médico algo que, efectivamente  nunca me passaria pela cabeça solicitar tanto mais que estavam ao fundo os três idosos oficiais que poderiam ouvir ou desconfiar se me vissem dizer fosse o que fosse a minha concordância foi murmurada e rápida).

Em boa verdade, livrei-me da tropa mas não me livrei de catorze anos de oposição activa, de prisões várias, de interrogatórios bastante duros com incidência nas habituais práticas de "sono" e de "estatua". Durante esses anos leei a cabo várias passagens de fronteira conduzindo desertores e refractários para Espanha tendo inclusive, como também aqui relatei, sido uma vez detido por um par de horas pela "Guardia Civil" que me tomou por "passador " a troco de dinheiro.

Se, porventura, tivesse sido reinspeccionado teria saído imediatamente do país sem sequer esperar pela passagem por Mafra.

Como também já aqui escrevi, mesmo estando de acordo com a fuga à guerra por deserção ou mesmo como refractário, nunca condenei todos quantos ou não souberam ou não puderam evitar África e as frentes de combate. De resto um importante partido político português  entendia que os seus militantes deveriam na medida do possível ir para África e fazer aí "trabalho político" contra a guerra e pela libertação das colónias. Pessoalmente sempre discordei pois tais tarefas eram quase impossíveis e levavam (basta lembrar o Manuel Alegre) o seu autor rapidamente à prisão militar.

Tudo o que acima digo também por aqui foi sendo escrito ao longo destes quase dezoito anos de blogue. Há mesmo um par de textos em que tive o cuidado de defender e justificar combatentes que não tiveram outro remédio senão ir para África e para frentes de combate. Uns porque acreditavam no mito do império, no Portugal do Minho a Timor, outros porque não queriam emigrar ou abandonar familiares, a terra e os amigos.

Não faço parte dos recém conversos de 26 de Abril, dos Ferrabrazes  radicais que propsperaram durante o PREC ou até agora que, desconhecendo a História, o País e o Povo prometem tremendod amanhãs que cantam como se os que, in illo tempore, foram notícia e slogan não tivessem acabado em sangue, pobreza, prisão e medo.  

Não sei nem pretendo saber o que é que estes meus três comentadores (uma espécie de trindade laica redutível à unidade tantas são as convergências de opinião...) pensam disto tudo, qual a razão porque me imputam um exacerbado amor pela cunha, logo eu que nunca as meti  por mim e tão pouco aceitei no decusso da minha vida profissional. A menos que não saibam o que é uma "cunha", coisa sempre possível nestes tempos de português ultra básico.

Um dos comentadores (basta ir à caixa de documentários ainda acrescenta que eu não respondo a comentários o que é uma tolice pois aí está de novo a caixa dos comentários para o desmentir. Aqui só não se responde a despropósitos ou a opiniões que nada tem a ver com o que publico. Se alguém quiser dizer o que pensa do mundo, da vida, da política que faça o favor de se dirigir ao blogue (não a mim que nunca soube como isto funciona) e diga de sua justiça. Ou que crie um blogue coisa que provavelmente não será difícil. 

Finalmente, fico sem perceber como é que em 19 ou vinte parágrafos as atenções se fixem logo no primeiro. Será que depois desse tremendo esforço intelectual de leitura as pessoas se cansaram e deixaram o resto para as calendas gregas?  Também podem ter detestado os parágrafos remanescentes  e por isso terem apenas respondido ao primeiro. Com um problema: não responderam. Porque não o leram, ou então, tresleram. É com elas.  Conversa acabada.