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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

missanga a pataco 77

d'oliveira, 19.11.09

Querida televisão

Isto de dizer que a tv que nos caiu no regaço é de uma mediocridade a toda a prova é de uma banalidade confrangedora. Notem que nem sequer estou a falar das quatro anãzinhas principais que aquilo nem anãs são, são mostrengos, excrecências, coisas herdadas de tempos obscuros que estão aí vivas e eternas para nos castigarem de termos inventado a descoberta da Índia, com a ajuda “irrelevante” de um prático de navegação de Melinde.

Estava apenas a referir-me a um desses  canais em que nos debitam uma versão aligeirada (oh quão aligeirada!...) de cultura e que, entre duas leviandades e três erros de tradução, nos servem uma poçãozinha de cantáridas de sapiência com que mais tarde possamos brilhar num salão politico-cultural cheio de génios formados por essas novas e brilhantes universidades privadas.

Tomemos o exemplo de hoje com o canal “História”. Anunciava-se um longo documentário sobre Bismarck o chanceler que transformou a Prússia no motor do Reich alemão em versão Hohenzollern.

Com a evangélica paciência que costumo adoptar quando tenho algo entre mãos e preciso de som de fundo, resolvi aproveitar a boleia já que, ao fim e ao cabo, pouco sabia da biografia do velho Otto.

O documentário era, aliás, alemão, o que dava alguma garantia. Do que ouvi nada tenho a dizer de especial excepto que o tradutor para português tinha um conhecimento parco, modesto, modestíssimo, do alemão e mais ainda do português. Por exemplo, desconhecia que Graf quer dizer conde e não é nome próprio de quem quer que seja; que Freiherr não é homem livre mas, isso sim, um nome próprio. E que a guerra entre a Prússia e a Áustria foi fraticida e não fraternal. Convenhamos que com 45000 mortos a fraternidade estava um pouco de monco caído.

Poderia multiplicar os exemplos mas não vale a pena: no reino dos canais temáticos instalou-se uma mafia tradutora que consegue o impossível: tornar mais confusos e mais pobres os temas tratados. Nisso batem-se bem com os quatro grandes (!?#) canais generalistas nacionais.   

missanga a pataco 76

d'oliveira, 29.09.09

D. João Qualquer obstáculo, qualquer impedimento, qualquer entrave seria para mim um alivio. Até me sinto doente só de pensar nesse homem. Tudo o que contrariar os seus desejos reforçará os meus. Como é que podes impedir este casamento?

Borachio Por uma via pouco honrosa, senhor, mas de tal modo escondida que nada de desonesto poderão ver nos meus actos

(Muito barulho para nada, Shakespeare,  Cena 2ª, 2º Acto) 

 

missanga a pataco 75

d'oliveira, 26.09.09

Votar com o coração e com a razão

 

Não vou votar útil. Ou melhor vou votar útil porque vou votar de acordo com os meus princípios, com a minha vida passada e com o que desejo para mim e para o meu país.

Isso implica algum rigor e sobretudo uma ideia de fundo: vota-se para que, para lá de uma vitória ocasional, se possam criar condições para uma vitória futura.

Dito isto, facilmente se percebe que, depois do que aqui fui dizendo ao longo destes cinco anos, terei de inflectir o meu tradicional (mas sentido) voto. O PS não cumpriu minimamente as expectativas que nele se depositaram há quatro anos. E que lhe deram uma vitória esmagadora preparada é certo pela liderança corajosa de Ferro Rodrigues e ajudada (e de que maneira) pela errática governação de Barroso e Santana Lopes.

E convém parar aqui por momentos. É que costuma atribuir-se a Lopes a derrota fortíssima do PPD como se fosse possível abstrair da “fuga” de Barroso. Barroso esse que, agora, concitou os votos do PS português por motivos imbecilmente “patrióticos” (vê-se aqui o apego à União Europeia!...), prova mais que evidente que o desnorte na governação interna se estende a insuspeitadas latitudes de que é última notícia o voto na Unesco onde Portugal conseguiu votar ao arrepio de boa parte dos amigos e aliados dando a sua voz a um cavalheiro egípcio anti-semita e queimador de livros (e fiel membro de um governo tirânico e ditatorial, mas isso deve ser coisa pouca para as robustas luminárias democráticas que nos desgovernam).

Todavia, algumas sereias que sempre abundam nestes períodos vieram ultimamente (com a ajuda compreensível do dr Soares e surpreendente de Alegre) pedir um último e desesperado quadrado defensivo à volta do PS para barrar o caminho à Direita. Quanto à Direita remeto para o que foi alegado pelo bloco de Esquerda e pelo PC para não ter, outra vez, que explicar que grande parte (e a fundamental) da actividade governativa destes quatro anos serviu interesses conservadores e situacionistas fossem eles a negação do casamento dos homossexuais (que agora foi apressadamente brandido como bandeira) até ao descarado apoio a certos bancos ou ao mais alarve abandono da agricultura entregando-se ao CDS a sua defesa e devolvendo-se à União Europeia verbas importantíssimas por falta de uso das mesmas!!!

A rua, certa rua, desde os professores aos operários e empregados, foi ocupada por manifestações multitudinárias que só têm paralelo com as dos anos de brasa 74-76. Algumas criaturas surdas ou autistas não viram, não ouviram não perceberam. Ou viram naquilo apenas  a mão de Moscovo ou melhor da Soeiro Pereira Gomes. Ou seja, viram o fantasma grave de Marx de mão dada com o senhor Jerónimo de Sousa (e já agora com o senhor Antero de Quental...) a amotinar professores e magistrados, tropas e funcionários públicos, intelecuais e proletários para não falar de camionistas e armadores de pesca. E de rurais, claro.

Como de costume, passou-se adiante e assobiou-se para o lado. As urnas decidirão.

Querer, porém, que perante o perigo hipotético do regresso do dr Salazar mal interpretado por um patético José Junqueiro (que de certeza não sabe nem nunca saberá quem foi o homem) as multidões se juntem à volta do farol do socialismo que é, dizem, o senhor José Sócrates parece demais. A mim isso estomaga-me.

Vou pois votar útil. Em branco para ser mais preciso. Para dizer a essa gentuça do leque partidário que daqui não levam nada sequer uma mão que os salve do atoleiro.

Não ganharei seguramente as eleições mas não perderei a alma. E isso para mim é o mais importante. Passem bem, votem, e tenham um bom domingo. Ainda não é desta que o país vai ao fundo. Ou que sai dele...

 

missanga a pataco 74

d'oliveira, 09.07.09

Beato tra le donne!

Já está na rua o novo outdor (raio de palavra!) do P.S. Nele pode ver-se José Sócrates entre um grupo de mulheres (6 ou 7 e, eventualmente, um cavalheiro de costas para nós. A menos que seja uma senhora de cabelo muito curto).

O slogan, um pouco surpreendente, é Avançar Portugal e como sub-mensagem, P.S.: juntos conseguimos.

Detenhamo-nos um pouco nesta imagem. Ainda estou para perceber a insistência nas mulheres, quase todas jovens e bonitas. Será que o P.S. entende ser este grupo social o mais vulnerável à sua mensagem? Será que descrê dos homens em geral e das idosas em particular? Os feios votarão nos restantes candidatos, pelo que se desistiu deles?

E o slogan? Avançar Portugal? Que é que isto quer dizer? Que se vai avançar com o país? Que se vai fazer avançar o pais? É que um infinito verbal dá pano para mangas mas parece, ao mesmo tempo, muito pouco expressivo. Alguém me dirá que seria diferente qualquer coisa como “amar Portugal”, “proteger Portugal”, "engrandecer Portugal” Aqui o verbo pede um complemento claro o que não ocorre com avançar Nos primeiros casos há subjacente a pergunta “o quê?” coisa que não existe com o verbo avançar. Avança-se com, para, por mas não o quê. A menos que se use um português mais de algibeira: ó mcr avanças-me aí com cenzinhos? Ou mcr não me orientas uns euritos para uma sopinha?

Eu já não me espanto muito com a imaginação dos publicitários, mesmo destes que me dizem serem dos caros. Aquilo, desculpem lá, parece-me um pontapé na gramática, enfim um safanão, minime um empurrão forte.

A segunda parte do slogan (P.S.) juntos conseguimos também não me parece particularmente feliz. À uma, lembra invariavelmente o Yes we can de Obama. Eu bem sei que este quer dizer sim, é possível, será possível ou podemos tornar isso possível. São afirmações fortes, ressumam confiança nas pessoas, apelam a elas caso se juntem. O que não é exactamente o caso com a formulação usada no slogan português.

Depois a forma do presente do indicativo (ou do pretérito perfeito!) “conseguimos” não tem força. Seria importante dizer “conseguiremos”, um futuro explícito, claro, definidor de ambição. Este pálido "conseguimos" refere-se a hoje, que não a ontem. Ou então é apenas portuga básico!...

Resumindo: parece-me que se perdeu uma bela oportunidade. Ou que o P.S. de Sócrates perdeu uma ocasião de marcar pontos quer graficamente quer como mensagem. A única coisa de que me lembrei ao ver o cartaz foi esta: há uns seis ou sete anos, havia em Itália um concurso chamado “beato tra le donne” onde se punham à prova uns rapazolas. A cada um era feito um interrogatório perante um júri de belíssimas raparigas de fato de banho e numa piscina. Os candidatos derrotados iam sendo atirados à água por uma jovem que os inspeccionava com ares de mulher fatal (que o era em todos os sentidos da palavra|). O vencedor era coroado “bendito entre as mulheres” ainda que eu não recorde exactamente qual o prémio. Mas isso era um concurso bem humorado e recheado de bonitas raparigas numa televisão conhecida pela tendência erotizante dos seus concursos.

Por cá não sei se houve algum sucedâneo desse concurso que teve epígonos em vários países e televisões europeias. Mas eram meros concursos e não programas eleitorais, que diabo!

Não sou moralista nem me importa nada o facto de ver o Primeiro Ministro com mulheres perto. Está aliás na moda, Berlusconi que o diga, o recurso a mulheres, mesmo se no caso dele a coisa vá muito mais longe do que me pareceria curial. De todo o modo, não deixo de pensar que se fosse Santana Lopes a aparecer entre mulheres, desta maneira, já teríamos por aí um escarcéu feminista dos diabos.

Olá se teríamos.    

missanga a pataco 73

d'oliveira, 03.07.09

 Aos costumes parlamentares disse tudo

 

 

Palavras, para quê? É um artista português em toda a sua baça grandeza. De inutilidade ministerial comprovada durante quase quatro penosos anos passa agora a anormalidade democrática improvável. 

E depois não me venham dizer que o desnorte não tomou já conta de tudo. É para isto que se pagam impostos? 

 

 

missanga a pataco 72

d'oliveira, 06.06.09

 

 

votar com o coração 

Os blogs não estão sujeitos à lei ridícula que impede as pessoas de discutirem até ao fim os problemas políticos que as afligem mesmo que isso possa (o que nunca se provou) influenciar as eleições. 

Todavia, eu vou respeitar essa regra absurda, mesmo protestando vivamente contra ela. A democracia é isto: respeito pela lei, pela legalidade, liberdade de criticar. 

Assim sendo, venho aqui gastar o meu latim com uma campanha útil. 

Que tal contribuir para o Banco Alimentar? Há, como se sabe, muitos compatriotas a passar um maus bocado. Não falo dos cavalheiros que meteram dinheiro nesses bancos piratas e que agora se viram para o Governo para exigir que alguém lhes devolva dinheiros cupidamente metidos em instituições pouco credíveis. Falo dos cidadãos que envergonhadamente batem à porta do BA pedidndo mantimentos. Porque perderam o emprego, porque estavam já desempregados e ninguém emprega pessoas com mais de quarenta anos, porque acreditaram na miragem do consumo fácil, da casa própria enfim porque nunca ninguém, e sobretudo os responsáveis, os avisaram seriamente dos riscos que corriam. 

Ora, para além das campanhas de recolha de alimentos, agora os supermercados têm à venda nos balcões estes pequenos vales. Estes que se mostram valem globalmente pouco mais do que euro e meio!  O mais caro custa 59 cêntimos e o mais barato 39. Isto ou algo parecido pode matar a fome a uma pequena família. 

Caros leitores, custará muito comprar um vale destes (ou 2 ou 10, o que quiserem) de cada vez que passarem pelo "super"? Até se pode fazer uma espécie de percentagem: por cada dez euros um vale. Ou por cada vinte! Se formos muitos, e poderemos sê-lo, eis um modo prático, gratificante, digno, de sermos solidários, de nos sentirmos solidários, de sairmos da loja com uma vaga cantiga no coração. O pouco de cada um pode ser o muito de muitos. 

A fome num país europeu é uma infâmia de que todos somos responsáveis. 

E no mundo, idem, mas o melhor é começar cá por casa. Com a embalagem que adquirirmos para o ano estamos a ajudar a África. Valeu? 

Votar é bom, agir também! 

Bom domingo, bom almoço de domingo (para vós e para os outros...)

missanga a pataco 71

d'oliveira, 31.05.09

Duas observações

A conquista da Taça, a quinta dobradinha, mostra só o que uma organização e muita disciplina, podem fazer.

É uma lição para quem a quiser receber.

Um clube que sabe enfrentar a sua massa associativa defendendo o seu treinador porque sabe que nisto de futebois a persistência e a prudência não andam uma sem a outra merece ser recompensado com resultados desportivos.

Pinto da Costa terá seguramente muitos defeitos. Todavia, vis a vis com a grande maioria dos dirigentes desportivos dos outros adversários é um gigante. Por várias razões que aliás fazem dele o dirigente desportivo português com o melhor palmarés de sempre, tem suscitado controvérsia, inveja, ataques nem sempre leais. E. Por vezes, apetece perguntar se ele não fosse Pinto da Costa, presidente do Futebol Clube do Porto se alguns desses atques e acusações se teriam verificado.

Quem me lê sabe que o FCP me é rigorosamente indiferente. Faço parte do pequeño grupo que não põe o futebol nos altares e que, ainda por cima (clube ainda mais pequeño) é adepto de um clube quase desconhecido. E só. Sou da Associação Naval 1º de Maio que aliás, felizmente, e para grande gozo pessoal, já surpreendeu o FCP.  Talvez isso me dê suficiente perspectiva para poder dizer que o clube da cidade onde vivo (enquanto não consigo morar em Paris…) ganha porque é disciplinado, rigoroso e obstinado. Ora aquí está uma receita para os meus amigos de Lisboa…

Aos numerosos portistas deste blog (devem ser a maioria) um abraço de parabéns e, para o ano, a esperança que a Naval os volte a surpreender.

 

missanga a pataco 70

d'oliveira, 26.05.09

          

  Um debate perdido

 

Vi durante alguns minutos o debate sobre a justiça no prós e contras da RTP.  E digo durante alguns minutos (10, 15 ou um pouco mais) porque não aguentei mais. E não aguentei por uma razão simples: Laborinho Lúcio falava em alhos e os seus companheiros de mesa respondiam em bugalhos. Ou, por outras palavras, LL ia-lhes perguntando se queriam aumentar ou dominuir os direitos e garantias e eles respondiam que a justiça não funcionava. O caso mais espantoso passou-se com o dr Henrique Granadeiro. Ele acha que tudo está inquinado e que a culpa vai direita para os clãs jurídicos. É uma opinião que deveria ter sido provada com factos. Mas isso ficou no tinteiro. O dr Lobo Antunes disse, e bem, que a Saude e a Justiça devem ser direitos acessíveis a todos. E não apenas aos ricos. E que isso ocorria na Justiça. Que quem tem dinheiro safa-se sempre ou quase. Conviria ao dr Lobo Antunes ir de vez em quando a um Centro de Saude ou espreitar uma urgência de um grande hospital. E perguntar se porventura lá vê algum rico. E, já agora, responder se são iguais os meios de um doente rico e um doente do SNS para enfrentar por exemplo um cancro…

Um senhor sacerdote que confessava a sua absoluta ignorância, em concreto (sic), das questões jurídicas afirmava que não basta ao agente da justiça ler cartapácios. Claro que não. Mas dizia, depois, que é preciso uma consciencia ética apurada. Sem dúvida. Só se esqueceu de dizer como é que se chega a esse ponto, como é que se recruta o agente com a dita alta consciencia ética. Aliás até poderia dizer se, no seio do seu grémio, a Igreja, isso ocorre. Ou se ocorre sempre. Se todos os religiosos regulares ou seculares detém essa “alta consciência ética”. E por aí fora.

Vivemos um tempo dificil. Como também LL disse a máquina da justiça portuguesa está pensada para vinte ou trinta anos atrás. Competiria a todos, mormente a quem legisla mas não só, definir que justiça queremos, que meios lhe damos, que recursos lhe afectamos, que liberdades e garantias desejamos, que limites devemos impor ao simples accionar dos recursos, que penas queremos para o perjúrio (saberão os leitores, e saberá o dr Lobo Antunes a que pena se sujeita um falso testemunho nos EUA e porque é que um cidadão como o senhor Madoff rapidamente se declara culpado? Tenho a percepção que não.), como é que pretendemos organizar os tribunais, etc, etc.... Alguém em seu perfeito juizo entende que os códigos penal e de processo penal, solenemente votados na Assembleia protegem os cidadãos inocentes e punem com adequada severidade os criminosos. Alguém, em seu perfeito juízo, acha boas as regras em vigor para a aplicação de penas suspensas?

Mas não, na maior parte dos casos, assobiamos para o lado e “eles”, juizes, advogados, procuradores e criminosos, que se entendam. Não é connosco. Nada é connosco. As fugas de informação de processos virão todas do procurador ou do juíz de instrução? E não andará por aí um (só um) advogado manhoso a alimentar a curiosidade dos jornalistas? Ou um familiar do arguido? Que diabo, seremos assim tão ingénuos?

Estes debates deveriam servir para perceber. Para tal deveriam ter como intervenientes pessoas que conhecessem os temas. E que fizessem o trabalho de casa. E que, além de gostarem de se ouvir, de pensarem que têm algo para dizer, tivessem também tempo e paciência para ouvir o que os outros dizem. Para dar o braço a torcer se for caso disso. Mas, desculpem-me a franqueza, aquilo ao fim de um quarto de hora já era uma cacafonia. Assim não vamos lá. 

missanga a pataco 69

d'oliveira, 11.03.09


As fotografias nunca são inocentes

O meu caro Manuel Sousa Pereira mandou-me uma série de fotografias de Moçambique. Fotografias antigas, mais antigas do que eu, ou quase. Esta que se mostra relembra a praia da Polana tal qual a conheci em 54. Tratava-se de uma praia com protecção contra tubarões cercada como eventualmente se poderá ver por uma ampla barreira de arame. Ao meio havia uma torre de saltos. Entre a torre e a margem havia uma corda, recurso para quem se cansasse.
A praia era servida por um Pavilhão (era aliás assim que se chamava) onde havia, se bem me recordo vestiários, instalações sanitárias, um amplo restaurante com esplanada na varanda e(provavelmente) mais serviços de que só recordo um rudimentar posto de enfermagem.
Para alem da natural nostalgia, cumpre espreitar melhor a fotografia e reparar na ausência de crianças negras. Parece-me mesmo que nem mulatas aparecem. Em primeiro plano talvez haja uma menina indiana: está vestida com algo que é bem mais recatado do que os recatadíssimos fatos de banho femininos da altura.
A impressão que tenho é que esta fotografia é dos anos quarenta. Ou seja vinte e poucos anos antes de rebentar a guerra colonial.
Porventura está também aqui uma referência à origem da insurreição: quando a maioria dos cidadãos é invisível mesmo numa pequena praia gradeada por via dos tubarões, algo está mal. Claro que se poderá sempre dizer que os meninos negros não gostavam de mar; não gostavam de praias contra tubarões; não gostavam de se misturar com brancos; preferiam outros locais menos multitudinários; preferiam o mar livre e aberto e a aventura que isso necessariamente implicava.
Todavia, para o comum dos mortais fica a ideia de que talvez aqui funcionasse essa regra não escrita: proibido aos não brancos. Como na África do Sul vizinha, a do apartheid.
Só que os brandos costumes lusitanos ou luso-tropicais detestavam essa afirmação tão torpe e substituíam-na por um silêncio tão prenhe de negação que “até mesmo um rapazinho negro a percebia”.


missanga a pataco 68

d'oliveira, 21.02.09
Para que não fiquem dúvidas:

Exm.ª Senhora Presidente do Conselho Executivo do
AE Territorio Educativo de Paredes de Coura

A confirmarem-se as notícias vindas a publico sobre a suspensão de actividades previstas no Projecto Educativo e no Plano de Actividades dessa Escola, e na salvaguarda primeira das obrigações da esola - cumprir a sua missão de processos de socialização e de aprendizagem para os alunos, razão central porque definiu as actividades de Carnaval nos documentos de acção educativa anteriormente referidos.
Tomando por base estes pressupostos, determino:
1. o cumprimentos das actividades com os alunos previstas para esta época;
2. o envio a esta DRE de um memorando clarificador dos problemas que têm vindo a ser denunciados pelas estruturas representativas;
3. Sendo certo que muitos docentes não se aceitam o uso dos alunos nesta atitude inaceitável, acompanharemos de muito perto a defesa do bom nome da escola dos professores, dos alunos e de toda a população que muito tem orgulhado o nosso país pela valorização que à escola tem dado
Margarida Elisa Santos Teixeira Moreira

Respeitou-se cuidadosamente (e com a difícil neutralidade que se imagina) o surpreendente português em que o texto é vertido. Se de português se trata, claro.
Fica-se com a penosa sensação que já há dois países distintos neste jardim à beira mar plantado: um, aquele em que frequentámos a escola que nem sempre era risonha e franca mas que cumpria (mesmo naqueles negros tempos) com uma função essencial: socializar a criança indefesa pondo-a a falar um português aceitável , outro, o da senhora directora Margarida Elisa Santos Teixeira Moreira em que se usa esta esdrúxula redacção em que há professores que não se aceitam o uso de alunos para não referir, com uma desconsolada gargalhada, a passagem do primeiro para o segundo parágrafo.
Também parece desnecessário referir o tom ameaçador do último parágrafo e a patetice apologética da defesa do bom nome de várias criaturas que ao que parece muito tem orgulhado o país da dita senhora pela extraordinaráia valorização que dá à escola.
Eu não sei onde é que esta criatura estudou, se estudou, quem lhe ensinou português se culpados de tão nefanda acção existem ou existiram mas, pelos resultados aqui exuberantemente visíveis, seria aconselhável (se acaso ainda vai a tempo) um curso género novas oportunidades com muita insistencia na língua pátria e obrigatório exame da antiga terceira classe ao fim.
Isto que acima se lê é o retrato puro e duro do Ministério da Educação e dos seus distritais sátrapas. Isto provaria à saciedade algo de que há muito se sabe: a fidelidade partidária vence toda e qualquer outra noção de qualidade para prestar serviço público. Quando a senhora ministra refere a má vontade dos professores deveria ler estas charadas da autoria dos seus dedicados agentes para perceber o estado a que chegou a chamada Educação Nacional. E tirar daí as necessárias consequências...
Mas isso seria pedir muito, demasiado mesmo.