Nunca se falou tanto da maçonaria como nestas últimas semanas. Simbologias, origens, ritos, reuniões, obediências, de tudo se tem falado, tendo por base o caso que envolveu a investigação sobre as secretas, o relatório parlamentar, as ligações ao grupo Ongoing e a participação numa mesma loja maçónica de deputados e responsáveis da Ongoing.
O meu conhecimento sobre a maçonaria resume-se aos princípios iluministas que estiveram na sua origem. A igualdade, liberdade e fraternidade, o predomínio da razão, a rectidão, o debate e a reflexão livres, em suma, a procura de valores que no início do século passado a república veio a acolher em Portugal e que foram também o terreno onde germinou muita da oposição ao Estado Novo.
Contudo, desde que me lembro de intervir social e politicamente, a participação na maçonaria sempre foi identificada com centros de interesse, que arquitectavam lógicas de poder nas instituições políticas, culturais e sociais. Já na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, que frequentei em meados dos anos 80, se dizia à boca cheia que o poder se disputava entre a maçonaria, no caso através de um ex-ministro do bloco central e de um deputado socialista, e a opus dei.
Olho hoje para a maçonaria, e para o pretenso secretismo que lhe está associado, como algo anacrónico. A própria parafernália que é utilizada é um pouco ridícula nos tempos que correm. Contudo, as pessoas são livres de se associarem e de pertencerem aos clubes e entidades que muito bem entenderem. Logo, também podem pertencer às lojas que quiserem e participar nos respectivos rituais.
A “porca torce o rabo”, porém, quando vemos o que veio recentemente a público e se constata que aquilo que associa as pessoas já não é a racionalidade dos valores iluministas, mas sim os interesses puros e duros. Certas pessoas que foram dadas como pertencendo à loja Mozart devem ter tido nessas notícias a sua recompensa maior, já que, para elas, saber-se que pertencem a esse mundo dito secreto, é um “must”. Alguns deles, aliás, se fossemos avaliar os princípios e os valores que os regem, não serviam para integrar sequer uma associação de bairro, quanto mais uma loja maçónica.
Devem os maçons identificar-se e declarar a sua condição quando exercem cargos públicos? Creio que sim. É mais aquilo que se ganha para a comunidade do que aquilo que cada um perde em privacidade. É importante que quando fazemos escolhas políticas, por exemplo, se assegure que a acção política não é desvirtuada por outras cumplicidades, do domínio do privado. E, em boa verdade, que razão há para que se pratique o secretismo em relação à maçonaria? Ou à opus dei? O que é que se faz por lá que aconselha a manter no anonimato os respectivos membros, numa sociedade livre e democrática como a nossa? Não alcanço…