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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Sem rei nem roque

José Carlos Pereira, 12.12.17

As redes sociais criam agora ondas de clamor perante reportagens que desvendam gestão danosa e falta de ética, para dizer o mínimo, em certas IPSS e outras entidades sem fins lucrativos. A realidade da Raríssimas ou de algumas Associações Humanitárias de Bombeiros é multiplicada por muitos outros casos, por todo o país. 

Instituições que gerem muito dinheiro, com acesso a fundos públicos, são pasto fácil para a prática de abusos por quem ocupa a gestão dessas entidades, às quais falta quase sempre o devido escrutínio dos associados, dos próprios órgãos sociais e, em muitos casos, das entidades públicas financiadoras. A super-estrutura dirigente assegura o controlo da instituição como bem quer. E quanto maior for a instituição, maior é a impunidade e a falta de escrutínio. Não faltam exemplos.

Belmiro de Azevedo (1938-2017)

José Carlos Pereira, 29.11.17

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Morreu um dos mais destacados empresários portugueses. Belmiro de Azevedo criou o maior grupo privado português e marcou uma época. Fez escola e promoveu as competências que fizeram com que vários dos seus quadros tenham seguido carreiras autónomas de sucesso. O seu percurso não foi feito apenas de vitórias, mas soube sempre retirar ensinamentos dos reveses por que passou, nomeadamente nas suas investidas na banca.

Belmiro de Azevedo levou consigo o nome da terra que o viu nascer e à qual regressava com satisfação. Marco de Canaveses perde um dos seus cidadãos ilustres, alguém com um temperamento abrasivo e difícil, que procurava em todas as circunstâncias fazer prevalecer os seus pontos de vista, não se importando que tal pudesse ser levado à conta de arrogância e impertinência. Era assim perante os principais governantes do país ou mesmo perante os seus conterrâneos e respectivos autarcas, como sucedeu com a intervenção infeliz que fez no congresso que evocou, em 2012, os 160 anos da fundação do concelho de Marco de Canaveses (como aqui então assinalei).

Um país libertado

José Carlos Pereira, 18.07.13

O nosso país encontra-se no epicentro de uma crise política, que surge na sequência de um longo processo de ajustamento económico e financeiro que tem deixado marcas profundas na sociedade. É o suficiente para ouvirmos quase todos os dias queixas sobre o país que somos e os políticos que nos governam. Não falta quem se lembre de dizer que o que fazia falta era "um Salazar" ou então que se devia entregar o poder a um conjunto de iluminados, acima dos partidos, logo, à parte do regime democrático.

Pois bem, a essas pessoas talvez valha a pena lembrar que o regime nascido em 1974 pode ter sofrido muitos atropelos e desvios, mas proporcionou-nos uma melhoria tremenda da qualidade de vida, como o atestam todos os indicadores. O "Expresso" começou esta semana a lembrar como era o país em 1973, ano da sua fundação, e as comparações evidenciam o salto qualitativo que Portugal deu nos últimos trinta anos.

Em 1973, a esperança de vida era de 67,6 anos e em 2010, com os últimos dados disponíveis, era de 79,6 anos. A taxa de mortalidade infantil passou de 44,9 para 3,4 em 2011. No início da década de 1970, 53% das casas não tinham água canalizada, 40% não tinham esgotos e 37% não tinham electricidade. A taxa de analfabetismo era de 25,7% e a população com ensino superior representava apenas 0,9%.

Este país acabrunhado, pobre e analfabeto libertou-se e encontrou um caminho novo. Como somos de antes quebrar do que torcer, também saberemos encontrar a saída para a crise que vivemos.

 

Um país sob pressão

José Carlos Pereira, 05.05.12

Tenho reflectido sobre os impactos que o crescimento do desemprego, o agravamento da carga fiscal, os cortes nos salários e subsídios e a quebra do rendimento disponível vão provocar na forma como a sociedade portuguesa se comporta e reage perante os decisores políticos, económicos ou empresariais. Os brandos costumes vão perdurar até quando?

Esperava que a semana entre as comemorações do 25 de Abril e do 1º de Maio pudesse contribuir para ajudar a perceber até onde vai a paciência e a tolerância dos portugueses. Esta análise foi deturpada pelo fenómeno “Pingo Doce”, sobre o qual já muito se escreveu. Há interpretações para todos os gostos, mas continuo a crer que o grupo Jerónimo Martins, cujo líder é sempre tão interventivo e cáustico em relação a políticos e sindicatos, não fez a promoção naquele dia por acaso. Quis vergar os cidadãos comuns ao seu poder, mostrando a políticos e dirigentes sindicais que os populares preferem obter o ganho material imediato à defesa de grandes princípios e valores. Os consumidores acima dos cidadãos, como bem referiu Carvalho da Silva. Adiante.

Dos discursos dos protagonistas políticos e sindicais não vieram novidades substanciais. Pela negativa destacou-se o primeiro-ministro quando disse, com o maior dos à vontades, que temos de nos habituar a um nível de desemprego mais elevado do que aquele a que estávamos habituados. Já a presidente da Assembleia da República, com a clareza que a caracteriza, sublinhou que “a democracia tem hoje a sua prova de fogo no bem-estar social e económico”. Nem mais. Essa deve ser uma preocupação central das actuais lideranças e vai de encontro ao que escrevi no início desta prosa.

Poucos dias depois, dois dos cronistas que leio habitualmente, Martim Avillez Figueiredo e Pedro Adão e Silva, escreviam sobre o mesmo. O primeiro reflectia sobre a possibilidade de se estar a esfumar o sonho de uma classe média que dera um salto substancial em relação à condição social dos seus progenitores. O segundo pegava no mesmo tema para questionar se a queda financeira, económica e social não provocará inevitavelmente uma queda política com reflexos no regime em que vivemos.

Pacheco Pereira interrogava-se também sobre quanto tempo Portugal vai estar assim, quando se assiste ao soçobrar da classe média e à incapacidade das elites que nos lideram em dar respostas às pessoas que vêem ser posta em causa a qualidade de vida que tinham dado como adquirida.

É neste ponto que estamos. A observar uma transformação social que começa a sentir-se de forma irreversível e que provocará danos de toda a espécie. O que fazer? Que caminhos apontar? Que estratégias seguir? Que futuro? Que implicações? Interrogações que convidam a uma reflexão profunda dos vários agentes, com vista a uma intervenção atempada perante o autêntico desmoronamento social a que começamos a assistir.

Maçon golden

José Carlos Pereira, 13.01.12

Nunca se falou tanto da maçonaria como nestas últimas semanas. Simbologias, origens, ritos, reuniões, obediências, de tudo se tem falado, tendo por base o caso que envolveu a investigação sobre as secretas, o relatório parlamentar, as ligações ao grupo Ongoing e a participação numa mesma loja maçónica de deputados e responsáveis da Ongoing.

O meu conhecimento sobre a maçonaria resume-se aos princípios iluministas que estiveram na sua origem. A igualdade, liberdade e fraternidade, o predomínio da razão, a rectidão, o debate e a reflexão livres, em suma, a procura de valores que no início do século passado a república veio a acolher em Portugal e que foram também o terreno onde germinou muita da oposição ao Estado Novo.

Contudo, desde que me lembro de intervir social e politicamente, a participação na maçonaria sempre foi identificada com centros de interesse, que arquitectavam lógicas de poder nas instituições políticas, culturais e sociais. Já na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, que frequentei em meados dos anos 80, se dizia à boca cheia que o poder se disputava entre a maçonaria, no caso através de um ex-ministro do bloco central e de um deputado socialista, e a opus dei.

Olho hoje para a maçonaria, e para o pretenso secretismo que lhe está associado, como algo anacrónico. A própria parafernália que é utilizada é um pouco ridícula nos tempos que correm. Contudo, as pessoas são livres de se associarem e de pertencerem aos clubes e entidades que muito bem entenderem. Logo, também podem pertencer às lojas que quiserem e participar nos respectivos rituais.

A “porca torce o rabo”, porém, quando vemos o que veio recentemente a público e se constata que aquilo que associa as pessoas já não é a racionalidade dos valores iluministas, mas sim os interesses puros e duros. Certas pessoas que foram dadas como pertencendo à loja Mozart devem ter tido nessas notícias a sua recompensa maior, já que, para elas, saber-se que pertencem a esse mundo dito secreto, é um “must”. Alguns deles, aliás, se fossemos avaliar os princípios e os valores que os regem, não serviam para integrar sequer uma associação de bairro, quanto mais uma loja maçónica.

Devem os maçons identificar-se e declarar a sua condição quando exercem cargos públicos? Creio que sim. É mais aquilo que se ganha para a comunidade do que aquilo que cada um perde em privacidade. É importante que quando fazemos escolhas políticas, por exemplo, se assegure que a acção política não é desvirtuada por outras cumplicidades, do domínio do privado. E, em boa verdade, que razão há para que se pratique o secretismo em relação à maçonaria? Ou à opus dei? O que é que se faz por lá que aconselha a manter no anonimato os respectivos membros, numa sociedade livre e democrática como a nossa? Não alcanço…

Notícias recentes de um mundo estranho

JSC, 27.06.11

Uma fotografia rara de “Billy the Kid” foi leiloada por 2,3 milhões de dólares (1,6 milhões de euros) nos Estados Unidos.

 

O vestido cor de marfim, esvoaçante, que Marilyn Monroe usou no filme “O pecado mora ao lado”, de 1955. Foi leiloado neste sábado e quem ficou com ele pagou 5,6 milhões de dólares (cerca de 3,9 milhões de euros).

 

Um casaco que o cantor norte-americano Michael Jackson usou no teledisco 'Thriller', em 1983, foi leiloado no domingo em Beverlly Hills, Califórnia, por 1,2 milhões de euros, foi esta segunda-feira anunciado.

 

O Programa Alimentar Mundial (PAM) da ONU anunciou hoje que vai cortar a assistência alimentar a mais de três milhões de afegãos em cerca de metade das 34 províncias do país por falta de fundos.

O estranho sindicalismo na CP

JSC, 30.05.11

Não conheço bem as razões para o pessoal da CP ocupar tantos dias com greves. Sabe-se que na CP o que mais há são sindicatos. Um Sindicato opta por convocar uma greve e os comboios param. Depois, outro convoca nova greve e os comboios voltam a parar. É assim a vida da CP. É assim o incómodo dos utentes da CP.

 

A CP, tal como a TAP, pode parar porque uma categoria profissional decide fazer uma greve. Isto é uma coisa que não tem grande sentido. Mas é assim. Mesmo que a maioria dos trabalhadores da CP discordem da greve, basta que um grupo profissional a convoque para tudo parar. E quem discordar bem pode passar por ser um grandessíssimo reaccionário porque, dirão, a greve é um direito sagrado.

 

Apesar de também reconhecer o inalienável direito à greve, discordo destas greves flutuantes da CP. Só uma vez ousei discordar de uma greve. Era uma greve promovida por quadros superiores e dirigentes. O resultado foi o meu saneamento, decidido, por braço no ar, num plenário animado por quadros superiores e dirigentes.

 

Sem risco de voltar a ser saneado, discordo das greves anunciadas por estes três Sindicados da CP – SNTSF, SMAQ, SFRCI – não por alguma razão especial, apenas porque não concordo com greves festivaleiras. Um Sindicato não é uma Comissão de Festas nem uma organização de fins-de-semana prolongados.

 

Aqueles sindicatos têm greves marcadas para o mês de Junho, que continuarão a assegurar fins de semana de 3 dias. Marcaram greves para a véspera do feriado nacional de 10 de Junho e para a véspera de feriados locais associados aos festejos dos santos populares e outros, designadamente, a 13, 23 e 24 de Junho.

 

Os sindicatos da CP estão a dar uma péssima imagem do sindicalismo. Pior, estão a criar os argumentos para que alguém apareça a cercear o direito à greve.

 

No Pingo Doce os Sindicatos não entram

JSC, 22.02.11

Há dias, em declarações passadas na TV, sem qualquer comentário crítico, o patrão da Jerónimo Martins, por entre remoques ao primeiro ministro, disse que não entendia como se perdia tanto tempo a debater “a porcaria do aumento do salário mínimo” . Confesso que foi esta parte que me chocou e me levou a colocar, definitivamente, aquele Senhor na lista das pessoas (eticamente) pouco recomendáveis.

 

Esta notícia do Público mostra os princípios laborais dos patrões do grupo Pingo Doce. Agora percebe-se melhor os lucros de quarenta e tal por cento. Tamanhos lucros só poderiam ter origem em resultados extraordinários (o que parece não ter sido o caso); prática de preços bem acima do aceitável (o que também não é o caso, veja-se a publicidade e a concorrência) ou do pagamento aos trabalhadores bem abaixo do valor justo e aceitável.

 

É de crer que os lucros milionários obtidos em 2010 resultaram não só de baixos salários, como do silenciamento e esmagamento de qualquer acção reivindicativa.

É por isso que o badalado slogan “No pingo Doce o IVA não entra” deve ser substituído por:  “No Pingo Doce os Sindicatos não entram”.

Recado para os Deolinda

JSC, 15.02.11

  

 

Aproveitando a onda das manifs, está em curso a preparação de uma manif em terras lusas, para mostrar que não há uma “geração parva”, “o país é que está a ser parvo”. Confesso que fiquei confundido com a profundidade da coisa. Acredito que milhares de jovens na rua vão conseguir mostrar que não são eles os parvos mas sim o país a que pertencem.

 

Tudo isto partiu de uma canção dos Deolinda, que muitos elegeram a hino de uma geração, ombreando-a com canções do Zeca, do Sérgio Godinho e do Mário Branco.  A tal canção dos Deolinda nada tem de especial, salvo constatar uma realidade, que o pessoal hoje não desampara a loja dos pais, o que mostra que esta geração de parva não tem nada.

 

 Os promotores da manif dizem que são a geração mais qualificada. Acredito que sim. O problema é que muitas das qualificações que têm de pouco servem para o país. Foram fornadas de licenciados em relações públicas, marketing, relações internacionais, estudos europeus, literaturas comparadas, direito, estudos sociais, ciências da natureza, jornalismo, ciências da educação, estudos medievais, filosofia e outros tantos cursos superiores que apesar de fazerem elevar as estatísticas das qualificações académicas, não tinham País nem mercado para tanta competência em domínios tão generalistas e de difícil aplicabilidade.

 

Entretanto, faltavam os licenciados na área das engenharias tecnológicas, da medicina, da gestão. E porque é que faltavam? Pela simples razão que estes cursos obrigavam a mais trabalho, a dominar as matemáticas, a física, química, a biologia. Será que os Deolinda sabem disso? A geração parva dos Deolinda não o é pelas razões que os Deolinda parecem indicar, antes pelas opções académicas que esses jovens fizeram no seu percurso escolar.