au bonheur des dames 619
O Artur Pinto Faria já é só uma saudade
ncr, 28-10-24
Quando se chega a esta minha idade, a palavra "sobrevivente" adquire uma forte consistência quase sempre nimbada pela tristeza, pela ausência, pelo espanto de continuar vivo quando os mortos mais e mais nos cercam.
Desta vez, foi o Artur Pinto de Fari, bm mais novo do que eu, uma amigo que de certo modo me concedeu o privilégio de o ter podido acompanhar nas últimas semana
de vida.
Avisado por sua mulher da doença que o prendia em casa e contra a qual tentava, com coragem e espírito, l lá o consegui visitar algumas escassas vezes para as últimas conversas de um longo rosário de encontros em que nos fomos conhecendo, percebendo, entendendo até esta fatal anormalidade que é o ver morrer alguém bem mais novo.
Aqui estava um homem bom, culto, inteligente que conheci já tardiamente mas ainda a tempo de ter podido desfrutar de um conversador brilhante que, ainda por cima, não se ficava pelo Direito e pela advocacia, duas coisas de que eu me gabo de já não ser praticante.
Conheci, ao longo de uma também longa vida, muita e boa gente (mesmo se também me defrontei com muita outra que bem poderia ter passado ao largo). Reconheci nele, para além da viveza, da inteligência, da cordialidade e da extrema cortesia, alguém que aliava a curiosidade à reflexão e a um bom senso a toda a prova.
para boa parte, provavelmente a imensa maioria, dos leitores que me aturam, o seu nome não significa nada. Para quem com ele conviveu, conversou à rédea solta sobre tudo o que vinha à rede, e nós pescávamos em qualquer mar!..., a falta do Artur Pinto Faria é já mais um peso para os dias que continuarão a suceder-se indiferentes à vida e à morte.
Todavia, e já por muitas vezes, aqui o escrevi, há ausências que magoam que nos fazem sentir mais sós, mais abandonados.
Boa viagem, caro Amigo. que o barqueiro te conduza depressa e bem à outra margem onde um dia destes também chegarei com darta dose de novidades que nos farão conversar até tarde, entre gargalhadas e boa disposição como sempre nos sucedeu ali em baixo na esplanada onde tantas vezes nos encontrámos com alegria e prontos a falar de tudo, excepto de Direito, coisa que eu sempre lagradecerei.
