au bonheur des dames 444
Mulher. Negra. Artista de variedades. Resistente. Heroína.
No Pantheon !
Eu creio que alguma vez aqui terei escrito sobre Josephine Baker, uma grande senhora do music hall francês, cidadã de duas pátrias, resistente quando isso implicava perigo de morte, mãe adoptiva de uma boa dúzia de crianças de várias cores, raças e credos, em suma um símbolo de tudo o que conforta a alma do cronista e, supõe-se, de muitos leitores.
Resumindo, JB foi uma talentosa dançarina de burlesque, negra e americana que cedo percebeu que na sua pátria não era mais do que uma “nigger”. Desandou , como aliás muitos dos melhores nomes do jazz americano para as mais clementes paisagens europeias, fundamentalmente para França onde em pouco tempo se tornou a coqueluche do tout Paris de entre guerras. Vibrante, inteligente, sensual e talentosa ousou tudo e tudo lhe correu de feição. Multidões aguardavam-na nas digressões por capitais europeias, Viena e Berlin incluídas. É verdade que com ela vinha um perfume de escândalo, de nudez, de “bal négre”. Mas tudo isso revestido do seu extraordinário talento, da sua voz (cantava muito bem) e do seu imenso humor.
Por duas ou três vezes tentou regressar aos Estados Unidos de onde o racismo dominante a expulsava.
Quando a guerra chegou, estava no auge da fama e disso bem se aproveitou para, militando na Resistência (foi uma gaulista da primeira hora, a hora dos bravos, dos mortos e dos heróis), e nas suas deslocações artísticas servia de correio importantíssimo da França Livre.
Quando estava em casa, um castelo, diga-se de passagem, acolhia judeus fugidos e aviadores aliados derrubados e em fuga. A todos protegeu desvelada e corajosamente. No final da guerra, ei-la alvo das melhores condecorações francesas, (tornara-se entretanto cidadã francesa) E foi assim, fardada como tinha direito que, compareceu ao lado de Martin Luther King na memorável jornada de Washington. Compareceu e foi a única mulher a discursar!
Não vou fazer aqui a biografia desta extraordinária artista de variedades que hoje é nome de rua, de estação de metro, sei lá do que mais.
Entra, agora, no Pantheon por pleno direito. E acarinhada pelo reconhecimento unânime dos franceses e lembrança do Presidente Macron. Os grandes cabarets de Paris estão em festa, como se esta entrada na imortalidade oficial uma vez mais celebrasse Paris, a alegria de viver a par da honra, da dignidade, da coragem.