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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Au bonheur des dames 523

d'oliveira, 29.08.22

Não deve ser fácil ser mulher e poderosa

mcr, 29-8-22

 

Confesso que nunca pensei ter de voltar (se é que ja tratei  o tema) aos temívis trabalhos a que as mulheres políticas se sujeitam. Ou melhor, ao escrutínio minucioso, cerrado,  impiedoso,  a que estão sujeitas.

Aquilo que se perdoa a um figurão torna-se escândalo se praticado por uma mulher. Mulheres políticas houve que, à semelhança de Golda Meir, antiga primeira-ministra de Israel  e ,sem dúvida, a melhor que  o país teve , mereceram uma frase em que o elogio é quase uma injúria (“o único homem no governo de Israel”!!!).

Indira Ghandi, Margaret Tatcher, Angela Merkelou ou Sirimavo Bandaranaike foram destratadas como mulheres e aplaudidas pela pose masculina de deterem o poder.  A senhora Merkel era para Helmuth Kohl, seu padrinho político  “a rapaiga” (sobretudo depois de ela o ter substituído...) mas as restantes sofreram durante toda a sua vida política um tratamento desdenhoso, invejoso e apoucador das suas qualidades. Valha a verdade que elas aguentaram a pé firme as burrices, as trapalhadas e as rasteiras. E deixaram uma imagem indelével e forte das suas capacidades. 

Desta feita, temos mais uma manobra rasca contra uma primeira ministra da Finlândia. Por acaso, ou talvez, não de uma responsável política que dez inflectir a política de neutralidade do país para uma aproximação à NATO, coisa que desagradou  a muita gentinha, mesmo por cá. 

A senhora Sanna Marin  é uma política experiente, competente e, oh escândalo!, jovem e bonita. E, pelos vistos, gosta de coisas normais como dançar e cantar coisas que fará na sua vida privada com a qual nada temos a ver. 

Pois foi justamente por isso, por cantar e dançar, numa festa ente amigos, numa casa privada, que sucedeu a blasfémia: cantou e dançou como qualquer mulher ou homem com 35 anos de idade (eu só dançava – e mal!- pois a partir do dó entro em desafinação aabsoluta) .

Ai Jesus que a pátria se afunda!

E vieram os dichotes, os dedos apontados, os gritos de horror. A criatura dança! E canta! Jesus Maria José! Onde é que já se viu?

Na civilizada, altamente educada, liberal tranquila Finlândia o rumor cresceu mais depressa do que a calúnia de Rossini!

Claro que muita gente, pasmada  com o burburinho entendeu tomar a defesa normal, normalíssima, da ténue desenvoltura de Sana. 

Porém, ainda os clamores iam no auge, eis que novo escândalo surgiu. Um vídeo privado, na piscina privada da residência de Sana mostrou duas mulheres de seios nus a beijarem-se. 

Caíram o Carmo e a Trindade nórdicos e não nórdicos!

Ninguém, pelos vistos, se levantou contra a merda da devassa da vida privada, por vídeos bisbilhoteiros, ilegais! Ninguém!

Perante estas duas sucessivas malfeitorias de Sanna, eis que ela, política que sabe o terreno minado que pisa, veio a terreiro pedir desculpa dos acontecidos, submeter-se a um test inútil de despistagem da cocaína e garantir que nada do que acontecera a impedira de trabalhar eficientemente no que realmente interessa: o governo de uma nação!

 

Ora ocorre, e é este o vero objectivo do folhetim, que, mais uma vez (uma enésima vez!...), uma senhora comentadora num jornal de referência vem condenar a pobre defesa apresentada  por Sana. “Saída não honrosa” (sic), exclama a moralista. A primeira ministra devia fazer peito às balas anónimas e soezes e não tentar desculpar-se. 

 Ora cá está o típico exemplo do mau argumento. Pode ser que a defesa seja fracota mas o que importa salientar nisto é que o(s) ataque(s)  foi/foram canalhices, injustificados e, convenhamos só existiram porque o alvo era uma mulher jovem, inteligente, política que acabar de pisar muitos canlos sobretudo russos e russistas.

Este é que é ponto. Dar crédito político (político, reparem) a uma festa privada, normal e simples; fingir-se ultrajado/a pelo facto de duas criaturas anónimas, mas mulheres, presumivelmente amigas  da mulher criticada, se beijarem, é, para mim que sou um velhadas, educado nos austeros e melífluos princípios morais do Estado Novo onde o escândalo rondava tudo, incluindo o não uso de peitilho nos fatos de banho masculinos,  uma infâmia, um ultraje e uma sacanice. Dos falsos pudibundos para começar, dos julgadores/as  isentos/as que, salomonicamente,  distribuem elogios e criticas   a torto e a direito. Nem sequer desculpo a eventual falta de assunto para encher a crónica que é paga pelo jornal. 

Aqui o que conta é um miserável ataque  e não as desculpas mesmo fracas d wuem é atacdo. aqui o que importa é não aceitar o ataque , defender sem "mas ou meios mas" a pessoa injustamente atacada.  Depois, muito depois, se for necessáriio poderá abrir-se uma esteril discussão sobre os modos como a pessoa agrdida se defendeu.

O cacauzinho dá  imenso jeito mas, que diabo!, est modus in rebus (expressão muito usada por juristas que, no meu tempo em que se aprendia latim, servia para muito  Uma tradução divertida era a expressão ”calma no Brasil que Portugal ainda é  nosso”.) 

sei bem quanto  é aterrorizante  “o chiar das botas do moço da tipografia no corredor à nossa porta” mas o moralismo saloio deveria ainda meter mais pavor ao/à escriba.

O  que não sucedeu!