au bonheur des dames 527
Caem como tordos...
Mcr, 14-09-22
Convenhamos: o capitalismo já não é o que era. Pelo menos na Rússia, onde, nos últimos vinte/trinta anos, tinha aparecido uma nova espécie de milionários muito semelhantes à que cevou nos EUA em pleno sec. XIX e que, na altura, foi crismada como o pouco honroso epíteto de milionários ladrões. (ou piratas ou qualquer outra coisa do mesmo género e espécie).
Ali no ex paraíso dos trabalhadores, na insalubre pátria do “sol na terra”, apelidaram-nos de oligarcas. Este género de criaturas, todas saídas directamente do serralho aparatchik soviético, aliou-se naturalmente ao novo poder /vindo também ele do mesmo sistema fechado mormente dos antigos serviços secretas e da polícia política.
Como ricaços de primeira geração, cedo se mostraram como adeptos de um luxo desenfreado e pouco diferente (há que dizê-lo) daquele estilo que se tornou conhecido com Trump (Donald, não confundir com o amável pato nem mesmo com o tio Patinhas).
O mesmo mau gosto berrante, os mesmos imensos barcalhões, as mesmas acompanhantes femininas, planturosas, jovens, boas até dizer basta.
Ora, por razões que me escapam (ou talvez não, que os negócios requerem paz e harmonia e em vez das guerras inúteis e pouco recomendáveis basta untar, bem untadas, todas as mãos necessárias, para que o business continue as usual ) um número significativo destas criaturas não apoiou com o delirante entusiasmo que se esperava a famosa “operação militar especial russa.
E num regime do tipo do que vigora na “santa” Rússia quem não é claramente por mim é, com um forte grau de probabilidade, contra mim.
Portanto, e ao contrário do indigente PC russo (irmão de um outro nosso velho conhecido) que constitui a vanguarda dos apoiantes putinescos e dos fautores da guerra a qualquer custo, estes cavalheiros (de industria) foram de uma discrição patriótica gritante.
Devem ter esquecido que viver na Rússia, mesmo que vagamente dessoviétizada, é viver no gume da faca. Por lá, e desde há muito (lembremos a picareta de gelo que liquidou Trotsky, inaugurando uma longa série de crimes de Estado), que os inimigos ou os pouco amigos sabem que há sempre um guarda-chuva envenenado, uma bala, um suicídio encomendado, uma queda fatal de um quinto andar, enfim uma panóplia de acasos tremendos e mortais.
Y, sempre ele mas acompanhado de W, K e da Juju Cachimbinha (tudo malta do conhecido grupo “Sétimo ano de praia com latim e grego por fora” e que ainda respiram sem máscara de oxigénio), ao ler o rascunho deste texto, propuseram outro título “Está a dar o béri-béri nos oligarcas!”
Eu gosto da palavra “béri-béri” mesmo se sou incapaz de recordar de que maleita se trata. Tenho a ideia que a coisa ocorre sobretudo nos países menos desenvolvidos e com menos teor de vitaminas, mas fico-me por aí. De todo o modo, cair como tordos significa morrer em grande quantidade e, valha a verdade, é isso que está a suceder na Moscóvia.
As notícias sobre esta pandemia dos ricaços muito ricaços daquelas bandas orientais e semi-asiáticas, já nem causam sensação. “Olha, lá foi mais um!” _””que a terra lhe seja pesada”, retorquimos, enquanto aviamos mais uma bica.
No entanto, e enquanto não sabemos mais pormenores da paupérrima campanha brasileira ou do “imbrochável” e pasmamos com o conforto sentido pelo Sr. Presidente da República, vale a pena, por mera distração, revisitar a longa lista de inexplicáveis falecimentos de milionários russos. Da internet, e sem especial pesquisa, extraí uma lista incompleta que com prazer (oh, quanto!...) aqui ofereço aos esforçados leitores:
Aleksander Subbotin (encontrado morto após um tratamento contra a ressaca!)
Aleksander Tiullyakov(caído da janela de um hospital
Andrei Krukovsky (caído de um penhasco durante um passeio!)
Leonid Schulman (enforcado)
Mikahil Watford (encontrado morto na garagem de uma casa em Inglaterra)
Ravid Maganov (também caído de uma janela alta do hospital onde estava internado)
Sergei Protosenya (acusado de matar a mulher e a filha cometendo posterior suicídio)
Vladislav Avaiev (encontrado morto ao lado da mulher grávida e da filha também mortas
Vassili Melnikov (?)
A lista, suponho, já terá catorze nomes mas estes foram os que mais depressa me apareceram. Vale a pena reparar que as mortes já não são tão diversas quanto eram antes. Prova de falta de imaginação como o desenvolvimento da guerra de agressão já comprovava?
A Juju, que não é exactamente uma perita em “kremlinlogia”, avisa que estas mortes foram todas misericordiosas. Quando se trata de oposicionistas políticos mais duros, as autoridades russas recorrem aos velhos e experimentados métodos comprovados desde o tempo dos czares: prendem os oponentes em enxovias horrendas depois de processos infames e humilhantes na directa linha dos dos anos trinta, os famosos processos de Moscovo onde, para além detudo o mais, os réus tinham de confessar que eram agentes nazis, trotskistas, anti-partido, capitalistas e mais qualquer coisa que o “vichinsky de serviço” se lembrasse. Havia que desonrar primeiro e liquidar depois. Vê-se que os tempos mudaram, apesar de tudo. Mesmo quando se encontram os “suicidados” ao lado de familiares também “abatidos”. Nourtos tempos não escaparia (como agora escaparam) nenhum membro da família para não falar na hipóteses de irem também na leva amigos, vizinhos e conhecidos...
Logo no início da “operação especial” circulou a notícia que o portuguesíssimo “sefardita” português Abramovitch se propunha doar o produto da venda do Chelsea às vítimas ucranianas. Se eventualmente isso for verdade, temo bem que este cavalheiro, mesmo nacional e nosso, segundo a comunidade israelita do Porto (a quem também não falta imaginação e transbordante!...) apareça um destes dias mais morto do que uma múmia egípcia da XVª dinastia.