au bonheur des dames 573
Outro amigo desaparece
(cada vez mais sobrevivente)
mcr, 3-3-23
mcr, 3-3-23
O jornal traz a notícia; morreu o Zé Manel Galvão Teles. Éramos amigos desde há mais de cinquenta anos, mesmo se eu já sabia dele pois ele fazia parte de um pequeno mas decidido e corajoso grupo de advogados (e de políticos) que começou a ser (mais) notado a partir das campanhas de fins dos anos sessenta.
Em 1974, apareceu-nos por cá, no Porto, e convenceu-nos a embarcar na aventura do MES.
Ele o seu grupo de amigos (melhor dizendo os “sampaístas”) duraram pouco no MES. Em boa verdade, a saída deles tinha toda razão de ser e, estará aí o início de um processo de abandono do Movimento. Dois meses depois, foi a minha vez de bater com a porta. Em boa verdade só não saí com eles por lealdade com o grupo com que (por influência do Zé Manel) aderira ao MES. Acompanhei a aventura do G I S (Grupo de intervenção Socialista) e durante muitos anos fiz parte do grupo de almoçantes no “Florida” melhor dizendo aparecia certíssimo quando estava em Lisboa, o que ocorria duas a três vezes por mês. Desse grupo já desapareceram vários e bem que me temo que não tenha conhecimento de todas as mortes. Claro que isto é malta que anda toda nos oitenta ou muito perto disso. Assim de repente já cá não andam o César Oliveira, o Luís Nunes de Almeida, o Jorge Sampaio, o João Bénard da Costa e o Nuno Brederode. Todos excelentes amigos, lutadores indómitos e inconformados. É uma geração que desaparece sem demasiado ruído mesmo se quase todos tenham tido uma forte intervenção a partir do anos sessenta.
Alguns estiveram na origem de um pequeno mas interessante movimento (o MAR, movimento de acção revolucionaria) que entretanto estava demasiado à frente do seu tempo e, por isso, fora a “frente cultural” que muito se estribava na colaboração com “O Tempo e o Modo”, e na defesa e auxilio de presos políticos não deixou um rasto especialmente palpável. O mesmo, aliás, ocorreu com o GIS cujos elementos foram depois integrados no PS.
A última vez que nos encontrámos numa acção política foi por ocasião dos “Estados Gerais” (conselho coordenador) do PS que anunciou o fim do cavaquismo e a entrada (frustrante) de Guterres no Governo. A nossa última campanha terá sido a da eleição de Jorge Sampaio para a Presidência da República.
Olhando melancolicamente (mas sem ira) para trás, não me arrependo de nenhuma destas batalhas comuns e esse pequeno mas especial grupo de amigos e companheiros continua a parecer-me que fazia parte do sal da vida.
O Zé Manel teve uma vida plena, muito bem sucedida tanto política como profissionalmente. Além de brilhante advogado, era um homem culto, bem humorado e dele poderia dizer-se que era o “amicus certus in re incerta certitur”. Sai de cena com a elegante discrição que era uma das suas (muitas) mais evidentes qualidades.
*na vinheta JMG com César de Oliveira, um amigo desde o nosso comum ano de caloiros (1960-6) em Coimbra