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Incursões

Instância de Retemperação.

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au bonheur des dames 594

d'oliveira, 05.10.25

A efeméride

Notas de um republicano não praticante

mcr, 5-10-10

 

Recordo sem demasiada nostalgia os tempos em que comemorávamos a implantação da República

Parafraseando o magistrado supremo “eramos ignorantes mas não o sabíamos”. 

De facto nesses longínquoas anos 60, antes de se publicar a “história de Portugal”  de A H Oliviira Marques (que é de 1972...) a informação sobre os eventos do 5 Outubro era pouca , praticamente desaparecida (quando não proibida ) e o pouco que se sabia jazia em pobres livros de propagandistas republicanos que também não se distinguiam pela probidade histórica. 

Digamos: era o “reviralho” ou o que restava dele que se mobilizava  cansadamente e organizava umas jantaradas, algum comício disfarçado, uma romagem aos cemitérios (o mesmo  acontecia com a celebração do “31 de Janeiro” sobre o qual João Chagas disse tudo se é que ainda andam por aí em venda – sempre nos alfarrabistas – alguma das obras deste notável escritor melhor como tal do que com político...).

Em Coimbra, a juventude universitária la se juntava como podia  mas sempre num clima de vigilância policial que assustava muitos e deixava os poucos celebrantes sob o olhar suspeitoso de polícias e de donos de cafés ou restaurantes qu, de resto, em pouco número, lá aceitavam umajantarada comemorativa.

Recordo duas ocasiões: a primeira, passase no café Mandarim onde um esforçao estudante de Letras entendeu berrar um “Viva a República” e ouvir rapidamente voz de prisão.De todo o modo a detenção foi de poucas horas  na sede da PSP pelo que aglória alcançada foi moderada. 

Da segunda vez, e em 1968, lá se terá conseguido uma participação maior (seríamos mais de vinte) mas a PIDE (aliás DGS) apaeceu e assustou muito a jovem estudante que tinha tratado do jantar. A pobre rapariga, verde nestes afazeres conspirativos,  substituía   o namorado que a atirara para a frente. Ao ver-se perante um agente da pide-dgs rompeu em lágrimas mais de nervosismo que de susto ou pelo menos foi isso que depois correu. 

Ignoro se, nessa época, a Câmara de Lisboa, celebrava a efeméride. Se sim a coisa devia ser mais postiça  do que uma cabeleira de teatro barata. 

Nesse dia, todos nós, que poucos éramos, valha a verdade, comprávamos o jornal  “Repúblca” e pavoneava-mos com ele pela rua e pelos cafés que frequentávamos.  Era pouco mas mesmo assim havia muito boa gente que nos olhava como se fossemos enviados do Anticristo. E a polícia, claro, lá apontava os nomes e o número de “republicanos reviralhistas em flor  e presumíveis comunistas"  (que para as autoridades tudo o que saísse do ram-rram quitidiano trazia o selo de Moscovo).

Agora o 5 de Outubro pode não ter direito a parangonas no jornal (hoje não vi qualquer menção no jornal que diariamente compro e que, sem qualquer sombra de dúvida é o que está mais à esquerda na imprensa diária) . Mais para a tarde a Camara de Lisbos assinalará a data com a presença de um sortido naco de luminárias políticas mas, parece que não haverá discursos  mas tão só o içar da bandeira .

Neste ponto, permitam-me os meus escassos leitores  (abençoados sejam)  que recorde um outro içar de bandeira, desta feita em Caxias, dentro da cadeia propriamente dita onde tive a duvidosa honra de estagiar por mais tempo do que devia. Na derradeira vez em que por aí veraneei tive a sorte de ocupar uma cela con+m vista para o rio e para a estrada. Também podia assistir à chegada dos familiares dos presos porquanto as famílias tentavam fazer o percurso do pátio exterior o mais afastadas dos muros que podiam para o que a malta encafuada nas celas pudesse ver quem vinha e eventualmente saber quem estava noutras celas. 

Todavia, o momento alto ocorria ao  domingo, dia sem visitas. Um pequeno destacamento de guardas republicanos (ou prisionais...) perfilava-se junto ao mastro da bandeira que, por feliz acaso, era justamente em frente ao meu “quartinho” (cito o carcereiro). O sargento ou algo semelhante que comandava aquela tropa fandanga resmungava “vamos lá ver s esta merda sai hoje bem..”. Ordem era dada ao corneteiro para cornetear enquanto o pessoal apresentava armas e a bandeira subia. Havia um cão que a partir do primeiro aorde começaa a uivar, e sempre , mas mesmo sempre, ou a corneta se calava antes da bandeira estar completamente erguida ou esta já flutuava ao triste vento da manhã dominical enquanto o dom desafinava sem brilho ou o cão deixava o seu lamento a destempo. Eu do meu janelo também uivava de riso porque aquilo, aquela mostra de patrotismo  bandeirante e armas apresentadas era o retrato perfeito de um regime miserável  que governava um país  sem futuro e com um passado mais que falsificafo pela “História oficial”

Depoos de um isolamento de meses, nos dois últimos dias em que permaneci em Caxias tive plea primeira vez um companheiro de cela, o Toy Ribeiro da Cinha, mais novo e irmão de outros amigos de sempre, entre eles o Octávio e o Fernando. O Toy ao içar da bandeira exterior içava a capa vermelha e reluzente de um chocolate que o pai, o médico Sizenando Ribeiro da Cinha,  oposicionista dos quatro costado fornecia em doses generosas (mas sempre vermelhas) ao abencerragem prisioneiro. Este velho senhor organizava na sua pequena aldeia (S João de Loure) uma festa do 5 de Outubro  muito concorrida sem que as autoridades se atrevessm a incomodá-lo. Há tempos li que tal festividade ainda era organizada pelo filho Fernando, também médico e sempre recordado com profunda amizade. Bem me poderia convidar que a essa festa eu não falataria.Não  por republicanismo agudo mas por simples e velhíssima amizade.

***

Quando acima disse que naquela época ignorávamos tudo ou quase da revoluçãoo republicana referia-me ao facto de desconhecermos não só os acontecimentos do dai, ou seja o equivoco que se gerou e levou à confraternozação de tropas leais à monarquia e tropas da Rotunda e que surpreendentemente tornou o dia bem menos sangrento do que se presumia. Também não se sabia que Machado Santos forçrara a direcção política republicana  a apoiar a sua acção, que alguns líderes republicanos entretanto se escafederam assustados, que o almirante Reis se suicidara pensanfo que tudo fracassara enquanto Miguel Bombrda era assassinado por um doente mental  seu paciente. 

Também não sabíamos que a ª Republica duraria 16 penosos anos, daria origem a 51 governos (um dos quais durou apemas um dia) fota alvo de contínuas intentonas, revoltas, golpes de Estado  e pequenos intervalos quase ditatoriais. As mortes da noite sangrenta (entre a as quias as de Machado Santos e Carlos da Maia, artífices e principais actores do 5 de Outibro  e de António Granjo, um ex-presidente do Conselho de Minisros apanhados e abatidos como cães vadios por assassinos tripulando  uma camioneta fantasma cuja  chefia terá pertencia a um tal  “Dente de outo” que aterrorizou a noite fatal)  A Repúblca, aquela república, não foi um momento alto da história pátria, nem da Democracia. Basta recordar o célebe episódio da retirada solene do voto depositado  por Baetriz Anfelo que por ser viúva tinha conseguido ultrapassar a proibição do voto feminino. Também vale a pena referir que o universo eleitoral foi reduzido a metade por se temer que a Monarquia  (uma monarquia “republicana” sem vigor e mais do que dividida entre clãs que se odiavam ainda mais do qu aos seus adversários republicanos) conseguisse volltar ao poder se todos os seus eventuais mas duvidosos apoantes conseguissem votar. A implantação da república foi fundamentalmente lisboeta, um pouco portuense e o resto fez-se pelo telegrafo. Aliás a monarquia dessangrada  também não mobilizava  (tirando Pava Conceiro) ninguém. 

Ignorávamos finalmente que até houve um prsdiente monárquico mas militar que aceitou o cargo pelo que ele interpretou como patriotismo. 

Convenhamos quando o regime caiu e foi substituído pelo conservadorismo mais serodio, rural, catolicão e afascistado, a Republica estava exangue. Terá sido isso que permitiu a um lente manhoso de Combra, governar tantos e tão demorafos anos Foi ao poder apoiado por militares e o seu sucesspr caiu às mãos de outros militares. Como diriam os franceses “a boucle est bouclée”

 

(nota em Porttugal não se põe a questão de regime, A ideia monárquica não reúne praticamente ninguém e o movimento que a sustenta não consgue qualquer expressão eleitoral . Ou seja, não suscita qualquer espécie de militância que o combata. Portanto não vale a pena encher a boca com a defesa  da Republica.)

A menos que alguém se lembre de acabar com o feriado...