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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Diário Político 205

mcr, 06.10.15

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Calma, malta! Isto não o fim nem o princípio de coisa nenhuma

É só fumaça!

 

Vamos por partes.

Quarenta e três vírgula sete por cento dos portugueses não se deram ao trabalho de ir votar.

Três vírgula sete por cento votou branco ou nulo.

Dos cinquenta e quatro por cento restantes há os resultados que se conhecem. Há, é um modo de dizer. Ninguém garante que os cadernos eleitorais não continuem pejados de fantasmas, de mortos e enterrados que por inércia não foram varridos dos mapas.

 

Seria bom que os cavalheiros que abrem a boquinha para em nome dos seus partidos (sempre vencedores, ou quase: só o PS confessou a derrota. O resto ganhou tudo. Vão todos à taça dos campeões, ou algo do mesmo género e substância!) proclamam êxitos piramidais fizessem o grande favor de não emitirem opiniões sobre o estado de alma do povo português e do seu ódio medonho aos senhores Coelho e Portas. Pede-se serenidade, e calma à rapaziada que se entusiasmou demais.

Apenas os votantes disseram o que queriam. Mesmo que se não presuma que os não votantes estão de acordo com o Governo convirá não ver na sua abstenção um sinal contra o PAF. De facto, mesmo se o voto não é obrigatório, irou não ir pôr o papelinho na urna é, também um acto político.

E agora os partidos:

Um pequeno e simpático grupo obviamente mais ecologista do que a senhora Apolónia, entrou no Parlamento. Saliente-se o feito tanto mais que essa entrada coincide com o afocinhamento dos deliquescentes ex-bloquistas, do eterno MRPP, e do senhor Marinho e Pinto. Só isto, a derrota desta criatura, já é uma prova do bom senso dos portugueses que anteriormente o tinham sufragado à boleia de um partido que ele, uma vez eleito abandonou miseravelmente.

O BE (esquecido dos tempos em que, de faca nos dente,s uivava pelo Syriza e prometia uns amanhãs cintilantes de sangue e sirtaki) conseguiu apanhar todos os indignados que por aí andavam órfãos e muitos eleitores do PS que acusavam o partido de coisas inomináveis.

Já agora, convém saber se todos estes eleitores subitamente bloquistas estão de acordo com as teses do partido sobretudo as que tratam da Europa, do euro, da mundialização etc...

Se, por acaso, mero acaso, não estão, então não me levem a mal: enganaram-se no voto, desperdiçaram-no e nem sequer conseguiram com isso a tão miraculosa unidade da esquerda. Tal situação continua a ser uma miragem no deserto e nem Santo Antão o Cenobita vale aos que pedem, como o derrotado Tavares (hoje, no “Público”) unidade, unidade e mais unidade. Como era um entusiasta da unidade Tavares formou um partido a juntar ao copioso número dos que já existiam...

Destes votos de descontentes com o Governo que desaguaram no BE, extrai-se outra conclusão. No seu afã de esmagar o governo “ultra-liberal” desarmaram o único partido que, apesar de tudo (e eu não votei no PS) poderia derrotar o PAF! É obra!

O PC, solitária voz que também clama no deserto onde desde sempre se acoitou, viu-se ultrapassado pelo BE. De todo o modo cantou vitória. Canta sempre. Desta feita celebra três mil e tal votos a mais. E veio solenemente recordar ao povo amigo que sessenta por cento dos eleitores rejeitaram o PAF.

Esqueceu-se, o PC, pouco dado a contas de subtrair e somar, que noventa por cento dos mesmos eleitores o rejeitaram a ele!

De todo o modo, o PC segurou os seus eleitores, manteve a sua área de influência e deu outra vez boleia a uma coisa inexistente chamada “os verdes” que serve sempre para dizer no Parlamento alguma coisa que o PC acha não dever dizer.

O PS, pela voz de Costa (e confesso que o admirei!...) veio dizer que perdeu! Caramba, homem, isso é a única coisa que se não diz! Ou se o dizemos, logo de seguida, arranjamos uma desculpa, repartimos as culpas. Tivesse Costa usado da mesma linguagem na campanha, outro galo lhe cantaria. Agora, ali está, desafiando os adversários internos, a sair da toca (alguém os viu na campanha? Não? Eu também não os lobriguei. Mas vão aparecer para uma noite vagamente de “facas longas”). Há, porém um problema: não se vislumbra, naquela contestária arruaça ninguém com peso, percurso e autoridade, para enfrentar Costa. Ou alguém acha que o senhor Álvaro Beleza, uma sublime insignificância, ou a senhora Ana Gomes, anteontem tão chorosa, são capazes de ir a jogo?

A ideia, bronca e trucidadora, de que mal há uma derrota se deveMas substituir o líder prova a nossa inenarrável incultura política.

E os vencedores? Para a oposição impotente, eles foram derrotados por não conseguir a maioria absoluta! Não tenho, por mera culpa minha, mau feitio e neurasténico pessimismo, qualquer simpatia por Portas ou por Passos. O defeito é meu, claro.

Todavia, lembraria algum leitor mais indignado, que ali por Abril, Maio, Junho, mesmo Julho, não havia ninguém que não augurasse uma tremenda derrota da coligação. Estão feitos, dizia-se. Confesso que, por desfastio, apostei um par de almocinhos na vitória da coligação. Mas esperava perder...

Pertenço ao escasso grupo de pessoas que gosta, mesmo com o risco de perder a aposta, de contrariar os politicamente correctos e, mais ainda, os que acham que a política pede muita fé, muito entusiasmo, muita arruada e muita colagem de cartazes. E pouca, nenhuma, reflexão. O povo, para muitos destes cavalheiros, é uma abstração. O povo por quem eles, arrogantemente, pensam, ou julgam pensar.

Ora bem: nada disso ocorreu. O povo ordeiro e composto não está convosco!

As pessoas anseiam por segurança, estabilidade e detestam a aventura. E o desconhecido. Apanharam no lombo com uma carga de varapau de austeridade. Começaram, mal ou bem, a ver uma pequeníssima hipótese de melhorar a vida. Como a heroína de Gil Vicente, preferem “asno que os carregue do que cavalo que os derrube”. Conviria a um par de excelentes amigos meus reler os clássicos. Todos os clássicos e não apenas Mestre Gil. E a História pátria, a boa e não a panfletada que por aí corre a título de boa e progressista.

Desculpem esta tirada populista mas eu andei numa escola recheada de gente muito pobre e mantive durante muitos anos contactos com esses colegas humildes que fizeram pela vida, subiram a pulso, puseram os filhos a estudar, não recuaram perante nenhum sacrifício, emigraram, souberam o que era dividir uma sardinha por dois. Essa gente vota. Mesmo sem ter feito o liceu e, muito menos a universidade sabem da poda, da política e da propriamente dita. E sabem defender os seus interesses.

Agora, diz-se, abre-se um novo ciclo político. Nem tanto, nem tanto. Governos minoritários tivemos já uma boa meia dúzia. Soares esteve minoritário, Cavaco idem, Santana Lopes e Guterres e até o inefável Sócrates cuja sombra perpassou pela campanha e prejudicou largamente o PS. De cada vez que Soares ia visitar o “preso político” (só em Portugal é que alguém sem corar diz esta barbaridade e não é imediatamente chibatado pela imprensa!) os cidadãos escaldados viam nisso um recado de e para o PS.

De todos os governantes minoritários, destacam-se Soares que soube dar a volta ao texto e Cavaco (a quem todos atiram pedras e pedregulhos...) que aproveitou as burrices dos adversários para firmar a mais longa carreira de primeiro ministro desta Terceira República.

Eu não me atrevo a dizer que a coligação ganhou por mérito próprio. Mas que a campanha confusa dos seus adversários deu uma ajudinha, ai disso não duvido. E quando falo de adversários não meto só o PS. O PC e o BE tanto falaram no lobo que as pessoas deixaram de ouvir.

Agora, rezemos a Santa Rita de Cássia, padroeira das mulheres maltratadas e dos impossíveis: vamos lá a ver se como europeus, que presumimos ser, se consegue andar para a frente. O verdadeiro patriotismo está em pensar na melhor maneira de sair da alhada e não em convocar cruzada sobre cruzada (com a conhecida inutilidade e piores consequências que estas tiveram) contra o PAF. Falar e negociar é a chave do êxito. Não de A ou de B mas dos cidadãos simples que andam por aí.

( o folhetim traz demasiadas referências cristãs. É puro artifício. De facto o dia de anteontem era, no calendário patafísico perpétuo, 27 de Absoluto, festa das Santas Gigolette e Gaufrette, dogaresas. E o que se passou neste canto da Europa deve ser analisado nessa perspectiva).

d’Oliveira fecit (29 de Absoluto, hunyadi, festa de Le Jet Musical)

 

 

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